Kay Alicyn Ferrel

Você acabou de saber que seu filho é cego ou possui
visão subnormal. Ele é um portador de deficiência visual. Nesse momento, ainda
não sabe, precisamente, o que tal coisa quer dizer; não tem certeza do que isso
significará para o crescimento e o desenvolvimento da criança e a que
corresponderá quando ela for para o colégio. Você está cheio de dúvidas,
inquietações, perguntas e quer algumas respostas agora.
Esses sentimentos são normais. Você tem todo o direito de sentir-se assim por
algum tempo. Porém, achamos que gostaria de saber um pouco mais sobre crianças
cegas ou com visão subnormal. Outros pais de crianças deficientes da visão
fizeram muitas dessas mesmas perguntas. As respostas que você ler aqui poderão
ajudá-lo, levantar outras questões, ou fazê-lo sentir que seu filho não se
ajusta a qualquer das perguntas ou respostas. Mas, pelo menos o texto lhe dará o
primeiro impulso. Vai dar certo. Talvez não hoje, nem amanhã ou mesmo no próximo
mês – mas vai dar certo.
O que devo esperar?
Primeiro, espere que seu filho seja como todas as outras crianças. Não importa a
idade que tenha, ou o quanto é deficiente – seu filho tem as mesmas necessidades
que outras crianças:
-
amor;
-
afecto;
-
carinho;
-
nutrição;
-
disciplina;
-
educação;
-
brincadeira;
-
compreensão;
-
paciência.
Seu filho talvez faça algumas coisas de maneira diferente das outras crianças –
como olhar um livro muito de perto – e pode aprender algumas coisas mais
rapidamente que outros – como memorizar enigmas e canções; lembre-se, apenas,
que seu filho é um indivíduo. Você não conseguirá predizer como seu filho será,
assim como seus pais tampouco puderam fazê-lo em relação a você.
Pôr-se no lugar da criança e imaginar como é ser deficiente visual, poderá
ajudá-lo. Feche seus olhos e escute por alguns minutos. Se você estiver lendo
isto na cama, talvez tudo que ouça seja o silêncio – talvez ouça seu bebé
respirando, o tic-tac do relógio, ou um cachorro latindo lá fora. Mas,
provavelmente, sabe de onde os sons estão vindo. Se estiver lendo isto num lugar
muito barulhento – a televisão ligada, as crianças gritando lá fora, a chaleira
assobiando, os cachorros latindo – não só é mais difícil ouvir o bebé respirar e
o relógio fazer tic-tac, mas, também, dizer de onde esses sons estão vindo.
Seu filho deficiente visual aprenderá sobre os sons à medida que crescer, mas
precisará de ajuda para identificá-los e entender quais são importantes ouvir
(tráfego, vozes, noticiários radiofónicos), e os que podem ser ignorados (o
zumbir das luzes vindas do candeeiro, o sopro do vento).
Depois, tente imaginar como você aprenderia um desporto novo ou jogo se não
enxergasse bem: não poderia imitar uma braçada, se não pudesse vê-la. Mas alguém
poderia lhe ensinar a fazê-lo, movendo seus braços para você.
Crianças deficientes da visão usam sua audição, seu olfacto, suas próprias mãos e
todo seu corpo para aprender sobre o mundo. Assim, espere que seu filho:
-
seja curioso;
-
faça perguntas;
-
escute;
-
goste de brincar;
-
fique perto de objectos;
-
pegue-os;
-
precise que se mostre como fazer coisas;
-
não saiba do que não se aproximar, a menos que você lhe diga;
-
não perceba que é deficiente visual, ou compreenda o que isso significa, até que
você ou outra pessoa lhe diga.
Lembre-se que a criança que nasceu cega não sabe o que é enxergar, tampouco tem
consciência que outras pessoas enxergam.
O que meu filho vê?
Essa é uma pergunta realmente difícil de responder. Ninguém saberá o que seu
filho vê até que ele possa falar. Seu médico – oftalmologista, optometrista ou
pediatra – pode lhe explicar a condição do olho de seu filho, os sintomas e as
características de cada tipo de patologia. Peça a seu médico um relatório, por
escrito, de cada exame ocular de seu filho (caso você não o compreenda, peça ao
médico que escreva numa linguagem mais acessível). Guarde esses relatórios para
consultá-los de vez em quando. Eles também serão de grande utilidade para
auxiliar o professor de seu filho, quando ele for para o colégio ou entrar num
programa para crianças.
Quanto ao que seu filho realmente vê, terá que esperar que ele lhe diga. E,
provavelmente, ele o fará muito antes que possa falar. Qualquer um destes
comportamentos lhe dirá algo sobre o que e quanto vê:
-
piscar ou fechar os olhos perante
a luz solar ou perto de um candeeiro;
-
piscar ou fechar os olhos quando sair para o ar livre, ou vice-versa;
-
aproximar comida ou outros objectos para perto dos olhos ou de um só olho;
-
virar a cabeça em direcção a uma fonte luminosa ou virar seu rosto buscando
afastar-se de uma luz forte;
-
inclinar sempre a cabeça de certo modo;
-
tentar alcançar coisas de um só lado, somente a certa distância ou apenas as que
estejam directamente à sua frente;
-
esbarrar com coisas (altas ou baixas);
-
seguir objectos móveis com os olhos ou com a cabeça;
-
procurar objectos com os olhos ou com as mãos.
Não perca de vista estas coisas, se seu filho as fizer, e tente observar se ele
as faz todo o tempo, às vezes, ou só em determinadas situações (como quando as
luzes estiverem obscurecidas, ou quando você o estiver ajudando). À medida que
ele for ficando mais velho, você descobrirá um pouco mais sobre sua visão pelo
manuseio que faz de livros, pinturas, lápis e papel. De início é impossível
prever quanta visão ele terá, ou se será um leitor de braille ou de letras
impressas. É esperar e ver.
É importante lembrar que, na maior parte dos casos, as crianças com visão
subnormal usam melhor sua visão à medida que ficam mais velhas porque ficam mais
sagazes, experientes e dedutivas, tendo um expressivo ganho, pelo uso, em sua
visão funcional.
E se meu filho for cego?
Muitas crianças e adultos são totalmente cegos – e eles se saem bem. As pessoas
cegas vivem, aprendem, amam, trabalham e fazem tudo o que as pessoas que vêem
fazem. Quando você vir uma pessoa cega, lembre-se: provavelmente, uma vez ela
foi uma criança cega. O adolescente ou adulto que seu filho vier a ser,
dependerá, em grande parte, do que vocês, como seus pais, fizerem agora. Se você
não lhe ensinar a ter responsabilidade, ele não a terá. Se não esperar que tenha
sucesso, ele também não o esperará. Se lhe fizer sempre as coisas enquanto
criança, alguém terá de fazê-las para ele, quando adulto.
Certamente, crescer sem visão torna-se um pouco mais difícil aprender sobre o
mundo e mover-se nele. Mas seu filho cego não sabe que o seu modo de aprender é
diferente do das outras pessoas. Na prática, a cegueira na infância quer dizer
que:
-
Os acontecimentos usuais, comuns e quotidianos, podem precisar de explicação.
Faça seu filho saber, por exemplo, que ovos mexidos, fritos e cozidos sempre
começam como ovos crus.
-
Alguns eventos ficam fora da experiência directa de seu filho. Conte-lhe sobre os
pássaros voando e dê-lhe a chance de tocar e segurar um. Fale das nuvens, do
céu, do sol, da lua.
-
Seu filho pode precisar de ajuda para reunir partes e formar um todo. Seu filho
não pode tocar um cachorro inteiro de uma vez só, mas ele pode sentir-lhe o
nariz, orelhas, corpo, pernas, patas e rabo, separadamente. Você pode ajudá-lo,
então, a entender que estas partes separadas, quando juntadas adequadamente,
fazem um cachorro inteiro.
-
A imitação gestual é mais difícil. Seu filho precisará que se lhe mostre como
utilizar a expressão gestual: é grande assim – bem pequeno – lá longe – ali
daquele lado – lá em cima, são algumas das expressões que, quando usadas,
geralmente são anexadas às suas expressões gestuais correspondentes. Seu filho
não fará isso por imitação. Pegue em seus braços e ensine a ele.
-
A aprendizagem não vem naturalmente por imitação. Você não pode ter certeza de
que seu filho se levantará e caminhará um dia, se ele nunca tiver visto alguém
caminhar antes. Tampouco espere que roube um biscoito da lata se ele não souber
onde a lata está.
-
Experiências reais têm mais valor do que as descrições das mesmas. Você pode
contar a seu filho sobre ovos mexidos, fritos, cozidos e crus, mas significará
mais se ele puder rachar, quebrar e cozinhar os ovos por si mesmo.
Seu filho não pode esperar que o mundo venha a ele. Você tem, inicialmente, que
levar o mundo a seu filho – com palavras, movimentos, sentimentos,
interpretações e oportunidades para aprendizagem.
Sua contribuição é necessária, porque seu filho desconhece até onde foi bem. Se
ele tentar alcançar algo e não conseguir da primeira vez, como saberá o que
precisará fazer da próxima, a menos que alguém lhe diga “quase”, “um pouco mais
à direita”, ou “ei, você conseguiu!”?
E se meu filho tiver outra deficiência
- deficiência múltipla?
Crianças deficientes visuais podem ter uma outra deficiência associada. Se isso
se der com seu filho, as mesmas regras de aprendizagem se aplicam:
-
providencie experiências reais;
-
ajude partes a se ajustarem ao todo;
-
crie oportunidades de aprendizagem;
-
dê sua cooperação;
-
demonstre como fazer as coisas.
Dependendo da deficiência de seu filho, algumas coisas que você faz com ele
talvez tenham que ser repensadas. Por exemplo, se seu filho tiver paralisia
cerebral ou uma outra deficiência motora, você necessitará aprender as melhores
maneiras para posicioná-lo e carregá-lo. Se tiver deficiência auditiva, você
precisará aprender mais sobre os modos de comunicar-se com ele. Há pessoas
especializadas que poderão lhe dar “dicas” para criar seu filho.
Por que meu filho parece mais lento que outras
crianças?
Todas as crianças, deficientes ou não, são diferentes entre si, isso é próprio
da natureza humana, assim como também o é comparar seu filho com outras
crianças. Mas como seu filho é deficiente visual ele tem um modo diferente de
aprender e de fazer as coisas. Na verdade, não sabemos se as crianças
deficientes da visão, no geral, aprendem mais lentamente que as outras, mas
sabemos que suas chances e oportunidades para aprendizado são menores, em razão
da deficiência. Ela limita o que a criança pode imitar ou apreender sozinha, mas
não significa que não consiga aprender. Significa, ao contrário, que ela terá
que depender de você e de outros para ensinar-lhe e mostrar-lhe o que,
inicialmente, não pode aprender de modo natural.
Por que meu bebé parece tão quieto?
Um dos primeiros comentários que muitos pais fazem sobre seus filhos cegos ou de
visão subnormal é que são quietos – que parecem imóveis em seus berços. Outros,
dizem que seus bebés não gostam de ser tirados de lá – toda vez que o são,
arqueiam as costas, se retesam, ou ainda, parecem querer se afastar. Isto
acontece, de fato, com muitos bebés, mas por uma boa razão.
Quando você enxerga bem, vê, o tempo todo, o que acontece a seu redor. Se
quiser, pode fechar seus olhos no momento que desejar e não ver. Com a visão,
você tem o controle de tudo.
Entretanto, quando não vê bem, a história é diferente: pode ver de modo
indistinto ou, talvez, só claridade e vultos. Dependerá de sua audição, olfacto e
tacto para saber o que acontece ao seu redor. Ao mexer-se na cama, não
escutará muito, excepto o som de seu próprio movimento. Os bebés cegos e
deficientes da visão ficam quietos e imóveis, por muito tempo, porque ficam
escutando o que acontece à sua volta. Além disso, não podem fechar seus ouvidos
para deixar de ouvir – têm que aprender o que cada som significa e por que eles
são importantes.
A reacção, ao ser apanhado, está relacionada com a aguda atenção que o bebé
presta ao mundo. Se ele estiver atento ouvindo, sentindo-se seguro deitado na
cama e, de repente, perceber que o estão movimentando, jogando para o ar – claro
que vai se assustar e ficar transtornado. E seu modo natural de reagir é gritar,
querer se afastar e voltar para onde estava.
Isto não quer dizer que não deva perturbar seu filho ou apanhá-lo. Significa que
você deve pôr-se no lugar dele e imaginar como gostaria de brincar e ser
apanhado. Desejaria algum aviso, de ter ideia do que está se passando. Isso
também é verdadeiro para seu filho deficiente da visão. Diga-lhe o que faz,
dê-lhe uma chance para responder e conte-lhe o que está fazendo, enquanto o
fizer.
Embora pareça convidativo deixar seu filho aprender sobre o mundo em suas
próprias condições, nem sempre essa é a melhor ideia. Experiências de movimento
– ser conduzido ou mover-se sozinho – ensinam muito sobre o corpo: onde está
situado no espaço e a maneira de usá-lo. Considerando que a visão é uma das
maneiras que aprendemos sobre movimento, as crianças que têm pouca visão podem
não se movimentar tanto quanto devem, justamente porque não tiveram chance de
compreender por que o movimento é divertido.
Assim, faça com seu filho cego, deficiente da visão ou portador de deficiência
múltipla o mesmo que você faria com seus outros filhos – apanhe-o, embale-o,
faça-lhe cócegas, carinhos, carregue-o nas costas, brinque com ele. Se seu filho
possuir mais de uma deficiência, faça as mesmas coisas, mas consulte um médico
ou fisioterapeuta para descobrir se há modos especiais que você deva utilizar.
Por que meu filho não se movimenta muito?
Crianças aprendem a gatinhar e a andar porque vêem algo no quarto que desejam,
ou porque assistem às pessoas a seu redor se movendo. Se seu filho não consegue
ver um objecto, o qual, por sua vez, não faz qualquer ruído, provavelmente não
sabe que o objecto lá está – e assim, não tem nenhuma razão para ir alcançá-lo.
É natural que você tente criar experiências tais para seu filho, que acabe
levando com demasiada frequência, o mundo para ele. Não poderá fazer isso
sempre. O que realmente deve fazer é encorajar seu filho para que “vá à luta”
– que seja curioso, que explore, que descubra que existe outro mundo além da
ponta de seus dedos. Você pode encorajá-lo a isso, ajudando-o a:
-
Juntar dois e dois (“Está ouvindo? É o cronómetro na cozinha. Vamos ver se os
biscoitos estão prontos... Vou tirá-los do forno... Deixemos que esfriem um
pouco... Pegue um para você!” Fale sempre muito com seu filho);
-
Ir buscar o que quer (Papai está aqui. Venha me pegar!” “Olhe a bola aqui, venha
pegá-la”
-
Usem os verbos olhar e ver de maneira natural, não os troquem por
outros);
-
Brincar de jogar bola e de esconder.
Tudo isso ensinará a seu filho que pessoas e objectos existem, até mesmo quando
ele não os estiver tocando, ouvindo ou provando.
Seu filho não vê outras crianças gatinhando, caminhando, correndo ou saltando.
É uma boa ideia mostrar-lhe como e ajudá-lo a fazê-lo.
Por que meu filho não se diverte muito com
brinquedos?
Até que seu filho saiba o que um brinquedo é e como usá-lo, não terá uma noção
correcta de como brincar com ele. Escolhemos muitos dos brinquedos que damos a
nossos filhos porque nós gostamos das cores – não porque o som seja
particularmente atraente à criança, porque seja agradável, ou porque a criança
pode fazer algo com ele. Os móbiles de berço que adquirimos são um notável
exemplo disso. Eles parecem muito graciosos de onde estamos, mas do berço, onde
o bebé está deitado, não têm qualquer interesse, a menos que se movimentem ou
que façam barulho.
Não sabemos muito sobre a razão pela qual alguns brinquedos são mais
interessantes que outros para crianças cegas e deficientes da visão. No entanto,
sabemos que elas não conseguem brincar se não souberem que os brinquedos estão
lá. Você pode ajudar seus filhos a achar os brinquedos à frente e atrás deles,
pelo quarto, nas gavetas, em armários. E pode fazer disso uma diversão,
brincando com seu filho e dando-lhe informações de como está indo: “Muito bem!
Você pôs o bloco redondo no buraco redondo!”, “Veja como essas argolas de
empilhar se ajustaram; uma em cima da outra.” e “Você sabe acelerar seu
gravador? Está tentando achar sua canção favorita?”
Quando você comprar brinquedos para seu filho, procure os que têm as seguintes
características:
-
inquebráveis;
-
não pontiagudos;
-
de cores luminosas (vermelho, amarelo, laranja, cor-de-rosa forte);
-
com grandes contrastes (amarelo e preto, preto e branco);
-
com partes móveis;
-
sonoros;
-
agradáveis ao toque;
-
com texturas diferentes.
Crianças cegas e de visão subnormal não brincam com muitos dos animais de
pelúcia, fantoches e bonecas que compramos até que tenham o poder de abstrair do
modelo para o real. Um cachorro com enchimento não parece, cheira ou soa como um
cachorro e o rosto duro de plástico de uma boneca não se assemelha ao rosto de
um bebé de verdade. Isso não quer dizer que você não deva dar a seu filho
bonecas e animais de pelúcia; significa que você precisará brincar com ele e
mostrar-lhe como ele pode usar sua imaginação, deixando que as abstracções se
façam na idade certa.
Por que meu filho faz algumas coisas repetidamente
(maneirismos)?
Crianças cegas, de visão subnormal ou portadoras de deficiência múltipla às
vezes desenvolvem hábitos, como balançar-se, esfregar o olho ou mexer os dedos e
os braços. Isso pode exasperá-lo, envergonhá-lo ou frustrá-lo como pai. É
tentador pôr a culpa dessas coisas na deficiência de seu filho. Mas, na verdade,
toda a gente tem alguns hábitos irritantes – enrolar o cabelo, enrugar o nariz, ou
coçar. A diferença é que as pessoas com visão podem ver os outros fazendo essas
coisas ou olhar-se em um espelho e resolver, baseando-se no que vêem, se querem
continuar a fazê-las. A criança cega frequentemente conserva esses maneirismos,
porque não sabe com o que se parecem.
Há muitas teorias sobre por que crianças cegas desenvolvem de maneira tão forte
esses maneirismos. Algumas pessoas dizem que é porque bebés deficientes da visão
ou portadores de deficiência múltipla não são suficientemente activos; outros,
que não tiveram bastante estimulação motora e cinestésica – isto é, não se
movimentaram o bastante para sentir seus corpos em diferentes posições no
espaço. Outros ainda acham que os bebés deficientes da visão apertam os olhos
porque isso faz flashes de luz (fará para você, também). Os maneirismos podem
parecer particularmente fortes em tempos de stress – quando seu filho estiver
tendo dificuldade em fazer algo ou estiver assustado. Claro que seu filho
deficiente da visão ou com deficiência múltipla também pode, simplesmente, achar
isso bom.
Mas, na verdade, não importa por que seu filho faz o que faz. Esses
comportamentos podem ser, no futuro, um factor dificultador no seu processo de
convívio e de participação social. É importante modificar o padrão de
comportamento – corrigindo-o, lembrando-o sobre o que está fazendo ou desviando
sua atenção para outra actividade. Um professor pode ser de grande ajuda, se
decidir que quer mudar o comportamento de seu filho. Mas você tem que se lembrar
de ser constante – não pode corrigir uma vez sem fazê-lo na próxima, porque isso
dará a seu filho uma mensagem confusa. Talvez você queira dizer isso, talvez
não. Ele continuará a testá-lo inúmeras vezes, até um de vocês dois se cansar
(geralmente você!).
Por que meu filho repete tudo o que digo?
Ecolália – repetir ou ecoar o que as outras pessoas dizem – é uma fase pela qual
todas as crianças passam. É um modo de treinar a fala e aprender sobre a
linguagem e a comunicação. Às vezes, nas crianças cegas e de visão subnormal
essa fase parece durar muito tempo. A linguagem é abstracta. As palavras
representam pessoas, conceitos ou coisas. Enquanto a criança não compreender
isso, será incapaz de juntar as palavras para fazer seu próprio discurso.
Repetir o que outros dizem é mais fácil.
Se tentou, algum dia, aprender um idioma estrangeiro, poderá avaliar o que seu
filho está tentando fazer: você repetiu palavras e frases antes que soubesse
usá-las de maneira conexa e coerente. Só quando soube o que as palavras
estrangeiras significavam, pôde colocá-las numa frase feita por você mesmo. E é
assim para seu filho. Entretanto, é um pouquinho mais complicado para a criança
que não pode ver aquilo sobre o que está falando. Pode demorar um pouco mais até
que dê o salto da fala imitativa para a comunicação.
Você pode ajudar seu filho deficiente visual ou portador de deficiência múltipla
fazendo-se algumas perguntas:
Estarei apenas nomeando as coisas para meu filho, ou as estou descrevendo,
falando sobre elas, relacionando-as a outros acontecimentos de sua vida?
Estarei apenas repetindo as palavras que meu filho diz ou estou lhe dando, a
cada vez, um pouco mais de informação?
Estarei lhe fazendo perguntas demais?
Estarei lhe dando uma chance de responder às perguntas que faço?
Antecipo o que deseja ou espero que me diga (através de palavras ou acções) o que
quer?
Se for cuidadoso com a maneira como usa a linguagem, você poderá ajudar seu
filho a passar da ecolália para a linguagem real.
Como meu filho saberá onde está?
Se você não é deficiente da visão ou portador de deficiência múltipla, pode-lhe
ser difícil imaginar como seu filho aprenderá a identificar onde está e se
localizar nesse espaço. Você se baseia em sua visão para saber onde está. Seu
filho se baseará em sua audição, tacto e olfacto para sabê-lo.
Em sua casa, cada quarto dá pistas diferentes, através dos materiais que forram
o chão e as paredes, e para que objectivo o quarto é usado. Por exemplo, a
cozinha pode ter um chão de cerâmica e cheirar a comida; o banheiro cheira a
humidade e até se pode sentir as paredes ligeiramente húmidas; a sala de estar
pode ter um tapete no chão e um relógio fazendo tic-tac alto; o quarto pode soar
“macio”, porque a cama absorve todos os sons. A janela da cozinha é grande, por
lá entra sol e vento. À medida que seu filho cresce, ele começa a usar outros
marcos para ajudá-lo a saber onde está.
Se ensinar, logo cedo, seu filho a prestar atenção nessas coisas, não lhe será
difícil aprender. Faça com que ele forme o mapa mental do ambiente de sua casa –
onde fica o banheiro em relação ao seu quarto, enfim, qual a localização de
todos os compartimentos e a relação espacial entre eles.
Quando meu filho precisará de uma bengala?
Essa também é uma decisão individual, que depende de seu filho e de você.
Bengalas oferecem protecção à criança ou ao adulto, principalmente, porque dão
informação sobre o que está à frente, antes de colidir. Por isso, seu filho pode
não precisar de uma bengala até estar pronto a agir sozinho – como completar uma
incumbência para você ou ir sozinho para a escola.
Entretanto, muitas pessoas acham que as crianças deveriam ter bengalas o mais
cedo possível – até mesmo logo que começam a caminhar. Já outras dizem que a
bengala só deve ser adoptada a partir dos treze ou catorze anos de idade. Você
deve pedir as opiniões de professores e instrutores de Orientação e Mobilidade
antes de tomar sua decisão. Algumas das perguntas seguintes talvez o ajudem:
-
Meu filho precisa de bengala? Para que a usaria?
Meu filho consegue caminhar direito?
Meu filho usa suas mãos para conseguir informação ou se agarra a objectos sem
realmente explorá-los?
Como a bengala afectaria seu equilíbrio ao andar?
Como a bengala afectaria suas brincadeiras com as crianças vizinhas?
Ele precisa da bengala o tempo todo?
A bengala para ele seria um instrumento de segurança e locomoção ou apenas um
brinquedo?
Ele com a bengala deixa de absorver e utilizar as informações tácteis, auditivas
e olfactivas do ambiente?
Com ela parece estar sem orientação espaço-temporal?
Todos terão uma opinião sobre bengalas, mas a sua opinião e a de seu filho,
principalmente, é que contam.
Quando meu filho aprenderá o Sistema Braille?
Seu filho cego, portador de visão subnormal ou de deficiência múltipla aprenderá
o Sistema Braille quando estiver pronto para começar a aprender a ler, e o fará
do mesmo modo que as crianças videntes aprendem a ler em tinta. Um professor de
crianças deficientes da visão pode fazer algumas etiquetas plásticas em Braille
para você pôr pela casa em portas, cadeiras, pias, etc., o que exporá seu filho
à palavra escrita. Também pode adquirir histórias de crianças em sistema comum,
com páginas plásticas em Braille, assim, enquanto você ler, ele poderá “segui-la
em Braille”, mesmo sem saber ler ainda. Agora, já se consegue comprar vários
livros de criança em fita cassete.
É importante que a criança cega tenha o contacto com a palavra escrita em Braille
o mais cedo possível. A criança de visão normal vê as palavras em tudo – TV,
revistas, livros, cartazes. Seu primeiro contacto com a palavra escrita se dá
muito cedo. Já a criança cega, na maior parte da vezes, tem o primeiro contacto
com a palavra escrita no momento de sua alfabetização.
Todas as crianças deficientes da visão podem aprender o Braille, independente de
conseguirem ou não ler em tinta. Contudo, hoje, as crianças com condições
favoráveis, são encorajadas a ler impressos, e com os vários auxílios
electrónicos e ópticos disponíveis, muitos deficientes da visão, portadores de
visão subnormal, podem usar livros de estudo em tipos comuns. Embora lhe pareça
que a escolha entre o Braille ou a impressão está longe, quando o tempo chegar,
você, como pai, deveria:
-
discutir o assunto com um professor de deficientes visuais;
-
lembre-se de que a prontidão para
a aprendizagem do Braille depende da habilidade da criança em
conseguir informação através de seus dedos, e esse processo começa na primeira
infância;
-
procure o ponto de rendimento insuficiente. Se seu filho lutar cada vez mais com
a impressão, talvez faça sentido ensinar-lhe Braille – ou ensinar-lhe a leitura
do Braille e da tinta ao mesmo tempo, e permitir-lhe que faça a escolha.
Claro que a vantagem de ler a tinta é que todos os livros e jornais são em
tinta, enquanto que livros em Braille nem sempre estão disponíveis. Mas com os
novos dispositivos de leitura electrónicos – computadores que falam e o Braille
sem papel, por exemplo – talvez isto não seja um problema, no futuro.
Eu tenho que aprender o Braille?
Isso, realmente, depende de você. A maioria do material de Braille que seu filho
precisa para a escola já está disponível; se não, é da responsabilidade da
escola e do professor dos deficientes da visão providenciá-lo. Entretanto, se
você souber Braille, e ler, visualmente, as palavras (em Braille) será mais
fácil ajudar seu filho nas lições. Como adulto que já lê, você não terá que
gastar muito tempo aprendendo; assim, não pense em sair correndo, enquanto seu
filho for pequeno, para fazer um curso de Braille. Há tempo para pensar sobre
isso.
Onde posso procurar ajuda?
Algumas escolas e centros de atendimento públicos e particulares têm programas
especiais para crianças e pré-escolares cegos e portadores de visão subnormal.
Para descobrir o que há disponível em sua comunidade, confira primeiro com o
serviço de saúde de sua comunidade e peça a recomendação de um programa de
estimulação precoce para seu filho.
Lembre-se que essa etapa lhe é absolutamente fundamental e imprescindível. Não
deixe de buscar um serviço de estimulação para seu filho deficiente visual.
Faça valer o direito de acesso de seu filho portador de deficiência visual aos
serviços de saúde, estimulação, educação, reabilitação, recreação, lazer,
prática de actividades físicas, cultura e a todos os outros disponíveis em sua
comunidade.
O que acontecerá quando meu filho for para o
colégio?
Toda criança cega, de visão subnormal ou portadora de deficiência múltipla tem
direito à educação apropriada. Isso significa que o tipo de educação que recebe,
e onde a recebe, depende de suas necessidades, a qualquer momento. Como pai, você
tem o direito de participar das decisões.
Crianças deficientes da visão e portadoras de deficiência múltipla podem
frequentar a escola em qualquer dos seguintes modelos:
-
Sala de aula regular: (ensino inclusivo) aqui seu filho assiste à aula a que
assistiria se não fosse deficiente, trabalhando directamente com seus colegas normovisuais. Um professor itinerante vai à escola para instruir seu filho em
competências especiais.
-
Sala de recursos: aqui seu filho ainda está na sala de aula regular, mas fica
mais tempo em outra sala, projectada especificamente para a instrução especial.
Normalmente, há várias crianças que trabalham nessa sala de recursos, em
diferentes momentos do dia.
-
Sala de aula especial: aqui seu filho trabalha a maior parte do dia numa sala de
aula com outras crianças deficientes, entretanto, não necessariamente
deficientes da visão. A sala de aula fica numa escola regular, e seu filho,
normalmente, passa tempo com crianças não-deficientes no intervalo, na hora do
almoço e talvez durante as aulas de música e de arte.
-
Escola especial: nesse lugar, seu filho frequenta uma classe e escola que só tem
crianças deficientes, nem todas deficientes da visão. O professor de seu filho
pode ou não ter formação no ensino de cegos e deficientes da visão, mas se não
for, seu filho receberá os serviços de um professor itinerante de deficientes
visuais.
-
Escola especializada: aqui, seu filho fica numa escola especializada para
crianças cegas e de visão subnormal com a presença de professores e outros
especialistas treinados para trabalhar com elas. Seu filho pode viver na escola
a semana inteira ou se você morar bastante perto, pode ir e voltar da escola,
diariamente.
Seu filho pode entrar e sair de quaisquer desses lugares, dependendo de suas
necessidades educacionais, a qualquer momento específico. Por exemplo, ele pode
precisar de ajuda extra quando for pela primeira vez ao colégio, mas depois,
poderia frequentar sua escola de bairro. Ou vice-versa. O importante é que sejam
dados toda a educação e os serviços especiais de que seu filho precisa, e que os
receba no ambiente o mais adequado possível.
Provavelmente, é difícil imaginar como seu filho se sairá na escola, já que pode
ter dificuldade para ver o quadro ou usar o livro de exercícios.
Professores de deficientes da visão têm muitas maneiras de adaptar materiais
para seu filho utilizar. Se estiver interessado em aprender sobre alguns, leia o
artigo “Quando você tem uma criança deficiente da visão em sua sala de aula:
sugestões para professores”, publicado na revista Benjamin Constant, número 8.
O que os outros pais fazem?
Muitos pais acham útil conversar com pais de outras crianças cegas ou de visão
subnormal. Pais de crianças mais velhas podem contar suas experiências e dar uma
ideia do que acontecerá a seguir. Com pais de crianças da mesma idade que seu
filho, você pode compartilhar alegrias, sucessos e trabalhar os problemas em
conjunto. Ninguém tem, exactamente, os mesmos sentimentos que você, mas outros
pais chegam muito próximo deles.
ϟ
Título: Parenting preschoolers: suggestions for
raising young blind and visually impaired children.
Autor: Kay Alicyn Ferrel
Edição: American Foundation for the Blind Press, 1984
Tradução: Vicky Adler Amádio
Adaptação livre de Antonio Menescal
Δ
26.Mai.07
publicado
por
MJA
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