Paradigmas da escola inclusiva
Sendo a escola
considerada por muitos o modelo preferencial para a educação
de crianças com necessidades educativas especiais vai, portanto, receber uma grande
diversidade de alunos e deve estar preparada para lhes oferecer uma multiplicidade de
respostas pois, a escola, não tem como única função transmitir saberes, tem também
responsabilidades na promoção do desenvolvimento psicossocial dos alunos. Esta
opinião é partilhada por Santos (2007), segundo o qual a função primeira da escola é
“tomar decisões e criar condições de processos democráticos, funcionando como um
centro cultural e educacional dos alunos e da restante comunidade escolar. Segundo a
opinião do autor, a escola deve ainda promover nos alunos o desenvolvimento integral
numa perspectiva de preparação para a vida social, profissional e como cidadãos
críticos e constitutivos” (Santos, 2007:19).
Ao falarmos de educação inclusiva estamos a referirmos a um novo paradigma
em termos educativos, ou seja, de uma nova concepção de escola onde todas as
crianças sem excepção têm a mesma igualdade de oportunidades independentemente
dos valores culturais ou limitações físicas e intelectuais.
Porter (1998) e Correia (2005) defendem a educação inclusiva como sendo um
sistema de educação onde os alunos com necessidades educativas especiais
frequentam ambientes de sala de aula regular, apropriados para a idade, com colegas
que não têm deficiência/dificuldades e onde lhes são oferecidos os apoios necessários
às suas necessidades individuais de modo a atingirem os mesmos objectivos que os
seus pares mas por caminhos diferentes.
Perrenoud (2000) afirma que a educação inclusiva é uma aposta que envolve a
escola e que a leva a novas políticas organizacionais e pedagógicas no sentido de
uma maior abertura à comunidade obrigando à mudança de atitude não só daqueles
que estão directamente envolvidos no cenário escolar mas a toda a comunidade
envolvente e, por contágio, a toda a sociedade.
Assim, tendo por base a linha orientadora da inclusão partilhada por Porter
(1998), Correia (2005) e Perrenoud (2000), e sabendo que os alunos são os principais
actores da educação, há a necessidade de repensar as estruturas presentes nas
escolas para que estas possam responder às necessidades de todos aqueles que as
frequentam, quer sejam ou não portadores de deficiência.
É, pois, grande o desafio que se coloca à escola inclusiva porque, mais do que
aceitar a presença de alunos com necessidades educativas especiais na escola de
ensino regular, há que construir e promover a existência de um único sistema
educativo em desfavor da dualidade de sistemas (regular e especial) tantos anos
praticado na educação nacional. Contudo, há que ter em conta a diversidade e
promover o uso de estratégias pedagógicas e recursos escolares alternativos que se
adeqúem às diferentes necessidades dos alunos.
No sentido de optimizar os princípios onde se alicerça a inclusão a escola deve
reconhecer as necessidades dos discentes que a frequentam bem como fazer um
esforço para satisfazer as suas necessidades individuais, adaptando-se aos vários
estilos e ritmos de aprendizagem, garantindo um bom nível de educação para todos,
através de currículos adaptados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas diferenciadas e diversificadas, de utilização de recursos e de cooperação
com a comunidade (Rodrigues, 2007). Porém, os mesmos autores sublinham que não
é objectivo da escola inclusiva baixar o nível de exigência aos alunos. A escola
inclusiva não pretende eliminar barreiras à aprendizagem, mas sim acompanhar o
discente e ajudá-lo a ultrapassar os obstáculos com que se depara na longa
caminhada da sua vida de estudante de modo a obter sucesso escolar.
Porter (1997) delineou o que para ele eram os quatro princípios norteadores do
sucesso da escola inclusiva, os quais passamos a citar:
-
Formação contínua – a formação de professores quer do ensino regular quer
de educação especial é fundamental para a monotorização de conhecimentos
e competências;
-
Diferenciação curricular – o currículo comum deve assegurar um ensino
diversificado de modo a possibilitar o acesso à aprendizagem de todos os
alunos do grupo-turma;
-
Ensino com níveis diversificados - o professor do ensino regular deve preparar
as unidades curriculares de acordo com as necessidades dos alunos;
-
Equipas de resolução de problemas – a existência destas equipas são uma
mais valia para a escola inclusiva no sentido que contribuem para a resolução
dos problemas escolares, bem como para fazerem um acompanhamento
directo a todos os professores.
Por seu lado, Ainscow, (1996) considera que para o sucesso da escola inclusiva,
esta deverá ser acompanhada de uma liderança eficaz da equipa directiva da escola
apostada em dar respostas às necessidades de todos os alunos. Correia (2005) partilha desta opinião ao afiançar que “como elemento – chave no processo de
implementação de uma escola inclusiva, é ao órgão directivo que cabe a tarefa de dar
o pontapé de saída no que diz respeito à transformação da escola numa comunidade
de aprendizagem (…) que tenha por base os princípios da inclusão.” (Correia,
2005:23,24).
Outro factor a ter em conta para o bom funcionamento da inclusão escolar é a
presença de pessoal docente empenhado em proporcionar uma grande variedade de oportunidades curriculares a todos os alunos sem excepção. De facto, os professores
são peça fundamental para a promoção da filosofia inclusiva e por isso, devem mudar
de atitude e serem suficientemente flexíveis para se adaptarem às novas exigências
da profissão.
Acentua-se, deste modo, a indispensabilidade de reformulação da
formação/aceitação de todos os professores, em especial os professores de ensino
regular, para trabalharem com a diversidade de alunos na sala de aula com o objectivo
de promover uma educação mais flexível alicerçada em princípios educativos que
contribuam para melhorar a resposta educativa a dar a todos os alunos,
particularmente daqueles que se encontram em situações de maior vulnerabilidade
(Costa, Leitão, Morgado, Pinto, 2006). Sublinhamos por isso, a necessidade de
fomentar a formação contínua de professores na área da Educação Especial para que
estes possam responder às dificuldades que a escola inclusiva encerra em si. A
formação, em nosso entender, favorece ainda a sensibilização dos professores de
ensino regular para a aceitação da presença dos alunos com necessidades educativas
especiais na sala de ensino regular, ajudando-os, com sugestões pertinentes e
oportunas, no trabalho a desenvolver com este grupo de discentes.
Relativamente aos benefícios que a educação inclusiva traz aos alunos, Correia
(2005:54) advoga “que a filosofia da inclusão tem benefícios para os alunos com
necessidades educativas especiais, mas também traz vantagens para os alunos sem
necessidades educativas especiais, uma vez que lhes permite perceber que todos
somos diferentes e, por conseguinte, que as diferenças individuais devem ser
respeitadas e aceites.” (…) “a inclusão promove a consciencialização e a
sensibilização dos membros de uma determinada comunidade, porque permite uma
maior visibilidade das crianças com necessidades educativas especiais. Assim, a
sociedade percepciona essas crianças como parte de um todo, aceitando-as,
progressivamente, como tal” (Correia, 2005:55)
Neste sentido, Santos (2007) apresenta um conjunto de vantagens
proporcionadas pela inclusão tanto aos alunos com necessidades educativas
especiais, como aos alunos sem necessidades educativas especiais, que importa
referir:
Vantagens da inclusão para os alunos com necessidades educativas especiais:
-
A inclusão reduz os efeitos da educação segregada,
nomeadamente os
efeitos negativos da categorização e atitudes negativas promovidas pela
falta de convivência com crianças sem deficiência;
-
A inclusão possibilita às crianças observar e aprender novas competências
através da imitação de modelos diferentes dos seus;
-
A inclusão faculta a convivência entre todas as crianças com idades
similares abrindo assim as portas a interacção espontânea facto que
permite aumentar a competência social e comunicativa;
-
A inclusão proporciona às crianças com necessidades educativas especiais
vivências reais que são uma ajuda fundamental para a vida em sociedade e
mais tarde para a entrada no mundo do trabalho;
Vantagens da inclusão para os alunos sem necessidades educativas especiais:
-
A inclusão permite
às crianças sem deficiência desenvolverem ópticas mais
realistas e adequadas sobre os seus pares com deficiência;
-
A inclusão cria oportunidade para que as crianças desenvolvam atitudes
positivas face à presença dos colegas portadores de deficiência na
escola e mais tarde na comunidade;
-
A inclusão promove a aprendizagem de comportamentos altruístas bem
como e quando usar tais comportamentos;
-
A inclusão permite a compreensão de que, apesar das limitações dos pares
com necessidades educativas especiais, estes conseguem ter sucesso em
não poucos domínios.
Perante tão significativos benefícios concluímos que quanto mais cedo se
iniciar o caminho da inclusão escolar mais positivo será, tanto o desenvolvimento das crianças com necessidades educativas especiais, como a sua aceitação no seio da
sociedade. “A inclusão, mais do que uma dimensão técnica, tem uma dimensão ética,
social e politica. Nas sociedades actuais a exclusão da escola tenderá a constituir-se
como o primeiro passo para a exclusão social” (Morgado, 1999). A inclusão ensina a
cada um de nós que todas as pessoas são membros importantes da sociedade, como
se de peças de um puzzle se tratasse, e que vale a pena incluir todos sem excepção.
Desafios colocados ao professor pela escola inclusiva
Numa
sociedade constantemente em mudança são novos e exigentes os
desafios colocados aos professores, pelo que, há que repensar a profissão no sentido
de transformar tanto os métodos de trabalho, como os modos de relacionamento com
os alunos e com a comunidade.
De facto, hoje em dia, é atribuído ao docente um papel de mediador
intercultural, organizador de uma vida democrática e intelectual que não se limita a
transmitir saberes mas que é um agente que luta pela mudança e que coloca na
primeira linha, práticas reflexivas que, em muito, contribuem para o real
desenvolvimento da sua actuação como profissional da educação. (Perrenoud 2000).
Para Gomes (2001), “ser professor no século XXI é ser alguém que, sobretudo,
sabe relacionar-se pessoalmente com cada aluno e com cada pessoa, respeitando a
diferença que identifica cada um. Esta atitude implica um processo crítico, reflexivo e
construtivo do professor capaz de promover a educação dos sentimentos, do amor e
dos valores, como forma de ajudar os outros a serem felizes, a encontrarem-se a si
próprios, a aprenderem a ser e a saberem respeitar o outro”. (Gomes 1997in Santos,
2007:201).
Face a esta nova realidade, para a profissão docente, é necessário introduzir
nas escolas de ensino regular conhecimentos científicos e pedagógicos que ajudem e
preparem o professor para o trabalho a realizar com a diversidade do público escolar.
Segundo Ainscow (1996), Tilstone (2003) e Correia (2005) um dos principais
meios para dar resposta aos desafios da escola actual é a aposta na formação inicial e contínua de professores. Mais afirmam que, para além da formação contínua, deve ser
disponibilizado tempo para que os professores se entreajudem e explorem aspectos
da sua prática pedagógica num clima salutar, evolutivo e reflexivo da pedagogia
praticada nas suas escolas e, mais particularmente, nas suas aulas. Tanto a formação
contínua como a disponibilidade de tempo são muito importantes e pertinentes pois
ajudam os docentes a identificarem e partilharem os sucessos e os insucessos da
prática pedagógica ajudando-os a melhorar as suas acções futuras tanto no trabalho a
desenvolver com os alunos sem necessidades educativas especiais como com os
alunos com necessidades educativas especiais. (Santos, 2007).
Na mesma linha de pensamento, Holloway (2000) afirma que “é necessário que
as universidades e escolas de formação de professores aprofundem a qualidade e
densidade dos aspectos curriculares relativos ao ensino diferenciado e que as escolas
e equipas de professores estimulem e apoiem o desenvolvimento profissional do
professor” (Holloway, 2000 in Correia, 2003:84).
A propósito da formação de professores, Costa (2005) deixa-nos algumas sugestões, as quais ilustramos seguidamente:
-
A formação inicial deve contemplar os conhecimentos e as competências
subjacentes ao desenvolvimento de modelos e práticas educativas
promotoras de inclusão e qualidade;
-
Em termos de desenho curricular deve ser salvaguardado o princípio do
isomorfismo da formação;
-
Os conhecimentos pragmáticos deverão estar presentes, não só através de
unidades curriculares próprias, mas também como conteúdo recorrente em
todo o desenho curricular;
-
Deve ser incentivada a componente prática dos cursos de formação inicial
e dos cursos de especialização, para que os formandos sejam expostos a
modelos positivos de educação inclusiva. (Costa 2006:29).
Não obstante, o êxito da escola inclusiva não depende apenas da formação de
professores. A par de uma boa formação devemos pôr enfoque na prática pedagógica
que os docentes operam no exercício das suas funções.
Porter (1998) afirmaque as boas práticas pedagógicas são benéficas para
todos os alunos, quer sejam ou não portadores de deficiência, pois todos eles têm
pontos fracos que necessitam de ser colmatados. É um factor enriquecedor da
dinâmica das escolas e dos professores criar ambientes e estratégias que facilitem a
aprendizagem de todos os alunos independentemente das suas diferenças, sejam elas
de ordem social, económica, cultural, física ou familiar.
Santos (2007) sublinha que “Os professores, ao protagonizarem práticas de
ensino, promovem novas exigências à organização escolar. Surgem desta forma os
professores como agentes de mudança e a escola como centro motor da mesma,
constituindo a expressão da sua função social ao nível do comportamento dos alunos
e ao nível da actuação dos professores. Neste quadro, os professores são
construtores profissionais do currículo, trabalham em colaboração, estabelecem
diálogo e negoceiam as suas propostas com os pares.” (Santos, 2007:198).
Mas, para que isto aconteça, o professor deve estar atento às dificuldades que
o grupo/turma apresenta, no sentido de a sua acção pedagógica ir ao encontro de um
caminho que responda à diversidade e permitindo, assim, que a mensagem chegue
aos discentes qualquer que seja o seu nível de desenvolvimento. Quer isto dizer que,
para que a aprendizagem ocorra o professor tem de ir ao encontro do aluno, percorrer
e analisar o percurso por ele gizado na tentativa de compreender e colmatar as
dificuldades encontradas pelo discente. Só assim poderá fomentar estratégias
eficazes e adequadas às características individuais de cada discente. Desta forma os
professores contribuem para o crescimento de uma escola com perspectivas amplas
no âmbito do desenvolvimento curricular, de ensino-aprendizagem, da organização da
sala de aula e das respostas às necessidades educativas individuais dos alunos,
contribuindo para o sucesso de uma escola cada vez mais inclusiva. (Tilstone, 2003).
Cabe assim, ao professor a responsabilidade de flexibilizar os currículos e de
efectuar adaptações curriculares que promovam a progressão dos alunos dentro da
diversidade que é a escola e mais especificamente a sala de aula. Actualmente, é o
aluno que dita os conteúdos a apreender, o ritmo de aprendizagem e os processos de
aprendizagem. É um ensino virado para o aluno e para as suas capacidades e limitações passando o professor para um papel de retaguarda que este não está
habituado a desempenhar, daí a dificuldade que alguns docentes sentem ao
trabalharem com a diferença.
Outro aspecto que não podíamos deixar de frisar é a importância que a prática
reflexiva dos professores tem para o sucesso escolar. Ainscow (1996) defende a
prática reflexiva como sendo uma estratégia para a resolução de alguns problemas
vividos na escola uma vez que este procedimento encoraja os professores a
aprenderem com a sua própria experiência fomentando a busca de soluções práticas
para os obstáculos quotidianos e promovendo ainda o trabalho cooperativo entre
professores. Assim, de acordo com Santos (2007) “Com base na reflexão, os
professores constroem o seu saber profissional, potenciando o desenvolvimento de
uma acção responsiva e ajustada às situações contextuais” (Santos, 2007:208)
Para fazer face à diversidade de situações de sala de aula, Sanches (2003)
sublinha que o professor deve,
-
Estar disponível para enfrentar imprevistos porque cada situação demanda
uma resposta diferente;
-
Ser capaz de controlar a ansiedade e não elevar as expectativas;
-
Consciencializar-se que a escola para além de instruir também tem um papel
socializante, papel esse, que para os alunos com necessidades educativas
especiais é talvez o mais importante;
-
Relacionar-se positivamente com os alunos problemáticos mesmo que tenha
de abdicar de alguns idealismos;
-
Conquistar, quotidianamente, a sua autoridade;
-
Estabelecer objectivos para cada aluno tendo em conta os saberes já
adquiridos;
-
Avaliar os alunos de acordo com as aquisições e progressos dos mesmos.
(Sanches 2003)
É deste modo que o professor vê alargado o seu campo de actuação e
assumem “novas condições pedagógicas: organiza situações de aprendizagem,
observa a acção dos alunos e intervém em função das necessidades que diagnostica
para fazer com que os discentes adquiram os meios de conhecimento e de acção
necessários à sua progressão nas aprendizagens. (Postic, 1995:22), tais como a
flexibilização dos currículos, adaptações curriculares e a diferenciação pedagógica.
Flexibilização, e adaptações curriculares
Antes de entrarmos
propriamente no tema deste ponto, e dada a especificidade
do mesmo, parece-nos pertinente fazer um breve apontamento sobre flexibilização e
adaptações curriculares. Estamos conscientes do cariz redutor das definições
apresentadas, no entanto, não é nosso objectivo aprofundar os conceitos, pois é tema,
que por si só, se prestava a um trabalho específico sobre cada um deles.
Assim, por currículo, Pacheco (1996) explica que pode ser o programa de
disciplina, plano de estudos de um curso académico, ou até mesmo uma série
estruturada de objectivos e de aprendizagens que se concretizam através da
sequência progressiva entre ciclos de escolaridade e em que cada um deles tem por
função completar e alargar o ciclo anterior. Roldão, por sua vez, (1999) entende por
currículo “o corpo de aprendizagens socialmente reconhecidas como necessárias,
sejam elas de natureza científica, pragmática ou humanista, cívica, interpessoal ou
outras.” (Roldão, 1999:47).
Flexibilizar o currículo, segundo Leite, in Sim-Sim (2005), consiste em abrir o
currículo às aprendizagens que uma determinada sociedade considera pertinentes
para nela se inserirem todos os indivíduos que a constituem. Quer isto dizer que,
tendo como pano de fundo o currículo nacional o vamos reajustando às necessidades
de aprendizagem da realidade social e escolar de cada região. No entanto, para
Roldão (1999) “flexibilizar o currículo “não significa libertá-lo de balizas; muito pelo
contrário, só é possível flexibilizar dentro de um quadro referencial muito claro”
(Roldão, 1999:54)Adaptações curriculares são “as alterações ou suplementos ao currículo com o
fim de maximizar o potencial do aluno (…) As adaptações curriculares requerem do,
professor uma atenção especial muito orientada para os conteúdos a leccionar e para
a forma como eles devem ser apresentados, tendo em conta a sua compreensão e
memorização” (Correia, 2005:44), ou seja, a adaptação curricular é a “diferenciação
curricular que se faz a nível de um só aluno” (Leite in Sim-Sim, 2005:14)
Face à diversidade que se vive hoje em dia no ambiente escolar surgiram
algumas questões pertinentes para as quais urgia procurar uma solução. Quer isto
dizer que, os professores ao tentarem dar resposta às necessidades dos alunos com
necessidades educativas especiais na sala regular vêem-se confrontados com alguns
desafios, nem sempre de fácil resolução. Um desses desafios é, sem dúvida, a
optimização da flexibilização curricular. A flexibilização curricular deve manter algumas
das competências e dos objectivos básicos do currículo nacional, mas diferenciar a
forma de organizar os conteúdos, as metodologias, os espaços e os tempos, bem
como o sistema de avaliação, no intuito de promover o sucesso da inclusão de todos
os alunos na escola.
Costa et al (2006:14) consideram que “o currículo deve ser estruturado e
flexível, acessível a todos os alunos, organizando-se na base de uma gestão
colaborativa e participativa, de forma a proporcionar a todos o desenvolvimento dos
conhecimentos, competências e valores, que a sociedade espera que os seus
cidadãos adquiram. “
Também Correia (2005) comunga desta linha de pensamento quando defende
a flexibilidade curricular como meio de resposta à diversidade que se vive na escola da
actualidade.
Para flexibilizar um currículo, a escola não pode continuar presa às amarras
dos currículos nacionais com conteúdos predefinidos e com ritmos e estratégias de
aprendizagem balizadas. Deve sim, adaptar-se aos conteúdos, aos ritmos, aos estilos
de aprendizagem e às condições concretas dos alunos, accionando a
operacionalização da autonomia escolar. No âmbito da escola inclusiva “é fundamental
conceber a aprendizagem, não num sentido restrito e académico, mas num sentido
mais lato de oportunidades de aprendizagem que enfatizem competências e
conhecimentos que sejam, pessoal e culturalmente, relevantes e funcionais para os
alunos.” (Costa et al, 2006:14). O Currículo não deve ser visto como um fim em si mas como um contexto através do qual a escola pode proporcionar um veículo de
aprendizagem. (Tilstone, 2003).
Alguns autores, dos quais destacamos Roldão, (1999), Santomé, (1995),
Pardal, (1993) citados por Santos, (2007) vão mais longe ao afirmarem que o currículo
deve ser encarado de forma ainda mais ampla, nomeadamente numa perspectiva
ecológica, prática e emancipatória, na qual todos os elementos de decisão negoceiam
as soluções para os problemas com que se confrontam. Defendem ainda que, o
currículo faz parte integrante do universo escolar, da experiência do aluno bem como
da sociedade e da cultura onde está inserido logo, deve ir ao encontro de todas estas
vertentes de modo a dar a melhor resposta possível às necessidades reais do público
com necessidades educativas especiais.
Tendo em conta o exposto, ultimamos que o currículo emerge como uma
construção social e educativa que se vai adaptando aos interesses e necessidades
dos alunos num processo de inacabamento. No entanto, a sua implementação exige a
mudança de algumas práticas por parte dos docentes. Compete à escola, e aos seus
actores, organizarem uma resposta educativa válida e de acordo com dois princípios
fundamentais, se por um lado a escola tem de possibilitar aos alunos com
necessidades educativas especiais o acesso ao currículo igual ou idêntico ao dos
outros alunos, por outro tem de o moldar às suas necessidades especificas.
Cabe aqui frisar que não estamos a falar de idear currículos específicos e
completamente distintos do currículo normal, trata-se de, tendo por base a espinha
dorsal do currículo nacional, introduzir e desenvolver as adequações necessárias às
especificidades da diversidade.
Com o fim de operacionalizar a flexibilização dos currículos a um aluno
específico, a escola, através dos professores, terá de desenhar um conjunto de
alterações as quais, no meio, são designadas por adaptações curriculares. As
adaptações curriculares individualizadas emergem com o objectivo principal de
favorecer as intervenções individuais e implicam uma reorganização do currículo tendo
por base a avaliação diagnostica que serve de pilar às futuras tomadas de decisões.
Esta deverá ter em conta o nível de competências do aluno, particularmente a sua
competência curricular, os factores que interferem com esse nível de competência e
quaisquer outras informações relevantes para a compreensão da situação e da planificação da resposta educativa considerada, num dado momento, como sendo a
mais adequada.
Contudo, é evidente a presença na escola de alunos que nunca conseguirão
seguir o currículo nacional e alcançar as competências exigidas de final de ciclo.
“Neste caso, já não estamos a falar em gestão flexível do currículo ou em processos
de diferenciação para assegurar o acesso ao currículo comum, mas de currículos
especiais (Leite in Sim-Sim, 2005:24)
Perante situações deste cariz há que ponderar, conscientemente, com pais,
professores, psicólogos e demais técnicos a aplicação dos tão conhecidos currículos
funcionais.
Diferenciação pedagógica
No sentido de responder de modo adequado perante as necessidades
educativas especiais dos alunos, o professor deve partir do principio de que o público
que tem à sua frente é dissemelhante e, por isso, serão diferentes os seus objectivos
escolares, as suas motivações, os seus modos de agir, os seus pontos fortes e fracos.
No entanto, concepções e as práticas de alguns docentes continuam a ser as
mesmas. Muitos esperam que os alunos de uma mesma turma consigam atingir os
mesmos objectivos com o mesmo ritmo de trabalho, através das mesmas actividades
e sob a mesma metodologia de ensino, apesar da evidência da diversidade de estilos
de aprendizagem do grupo com o qual trabalhavam.
Mas, ensinar a muitos como se fossem um só revelou-se, ao longo do tempo,
uma prática pouco eficaz, senão muitas vezes injusta, uma vez que são muitos os que
não alcançam o sucesso escolar.
Perante esta situação, o professor é confrontado com o facto de ter de planear
o seu trabalho mediante o perfil de aprendizagem dos seus alunos. Neste ponto,
vários são os autores que consideram a “ importância da diferenciação pedagógica,
nomeaddamente, (Morgado, 1999; Niza, 1996; Postic, 1995; Perrenoud, 2000), entendida como gestão das interacções e actividades para que cada aluno seja, o
mais frequentemente possível, confrontado com situações didácticas que são
fecundas para si.” (Aleixo, 2005:32).
A diferenciação pedagógica tem como objectivo primeiro o sucesso educativo
de cada um na sua diferença, ou seja, não é um método pedagógico isolado em si
mas sim todo um processo de educação em que o aluno é o centro condutor das
acções e actividades realizadas na escola (Boal, 1996).
Perrenoud (1986) considera a diferenciação pedagógica como sendo o
processo utilizado pelos professores para fazerem progredir no currículo uma criança
inserida em grande grupo. Para tal accionam os meios mais apropriados e adequados
possíveis à aprendizagem dos alunos.
Para Tomlinson, (2008) diferenciação pedagógica é programar “as actividades
educativas à luz do “conceito de múltiplos caminhos” para o conhecimento em prol de
diversas necessidades, e não em termos do que é normal e diferente. Logo, o princípio
norteador do professor deve ser, em primeiro lugar, a avaliação do discente no sentido
de o posicionar num nível de aprendizagem e, consequentemente, ir ao encontro das
suas necessidades fazendo-os progredir na aprendizagem. (Tomlinson, 2008:31).
Para Grave-Resendes (2002), Niza (1996) e Benavente (1994) in (Gomes,
2001) diferenciar não significa individualizar o ensino: significa que as regulações e os
percursos devem ser individualizados num contexto de cooperação educativa que vão
desde o trabalho contratado ao ensino entre pares.
A diferenciação pedagógica opõe-se à uniformização dos conteúdos e condena
a uniformidade de ritmos, de métodos, de didácticas e de práticas pedagógicas.
Podemos então afirmar que a diferenciação pedagógica é um procedimento que
procura empregar um conjunto diversificado de meios e de processos de ensino e de
aprendizagem, a fim de permitir a alunos de idades, de aptidões, de comportamentos,
mas agrupados na mesma turma, atingir, por vias diferentes objectivos comuns
(Gomes, 2001).
Esta concepção de diferenciação pedagógica salienta o papel do professor
como organizador de respostas para que a aprendizagem de cada aluno possa acontecer. O aluno é autor da sua aprendizagem e parceiro do professor e dos
colegas, ficando assim invertido o sentido tradicional da docência.
Para que tal aconteça é indispensável que o docente se capacite da diferença
e crie, no exercício da sua prática pedagógica, abordagens pedagógicas diferenciadas
no sentido de dar resposta a todos os alunos que frequentam a escola. Neste âmbito é
necessário que o professor repense a sua prática, no que respeita à organização do
trabalho, do tempo, dos materiais, da partilha de poder com os alunos e da autonomia.
“É necessário que o professor mude a seu papel dentro da sala de aula, não sendo o
monopolizador do saber. Há que dar lugar ao aluno para que ele próprio procure o
saber e execute as etapas necessárias à sua apropriação” (Sanches, 1996:42).
Na perspectiva de Heacox (2006) a diferenciação pedagógica pode ser feita de
três maneiras:
-
a nível de conteúdo – quando o professor simplifica os objectivos
curriculares às capacidades dos alunos;
-
a nível do processo – quando o professor
diversifica as tarefas a realizar pelos discentes de acordo com o seu perfil;
-
a nível de
produto – quando o professor utiliza formas variadas para os alunos demonstrarem as
aprendizagens efectuadas.
Não obstante a dificuldade que a diferenciação pedagógica possa causar à
primeira vista ao professor, cabe referir que, mesmo dentro de um grupo tão
heterogéneo como aquele que a escola inclusiva abarca, há sempre características
comuns que tornam viáveis a sua educação conjunta. O cerne da questão está em
saber-se transformar o conjunto de diferenças em vantagens educacionais que
facilitem a progressão das aprendizagens entre pares. (Aleixo, 2005).
De qualquer forma, não temos dúvidas de que, no terreno, não é fácil
operacionalizar a mudança de uma pedagogia centrada no professor e no ensino igual
para todos para uma pedagogia centrada no grupo, não se limitando a escola a
oferecer a igualdade de oportunidades em termos de acesso à educação, mas sim
diversidade de respostas no processo educativo. Cabe, portanto à escola, pela figura
do professor, concretizar esta mudança cujo primeiro passo, a nosso ver, é limpar as
teias de aranha do passado que se apoderaram das mentalidades docentes e abrir
uma janela a esta tarefa hercúlea de mudança mas que, na maior parte das vezes, só
necessita de disponibilidade psicológica para emergir.
Como dizia Piaget, (1969) “ A realidade dolorosa da Pedagogia, assim como
da Medicina e outros ramos do conhecimento que abrigam ao mesmo tempo em si
arte e ciência, é o facto de os melhores métodos também serem os mais difíceis”
(Piaget, citado por Tomlinson, (2008:59).
ϟ
excerto de
Concepções e práticas de professores de 2º e 3º ciclo
do Ensino Básico face à inclusão de crianças com Necessidades Educativas Especiais
AUTORA:
Maria da Conceição Almeida Rebelo
Dissertação apresentada à Escola Superior
de Educação de Lisboa para obtenção do grau de
mestre em Educação Especial,
2011
Δ
1.Jan.2014
publicado
por
MJA
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