Elizabeth Ferreira de Jesus

imagem: cozinha adaptada
para pessoas com deficiência visual
I - INTRODUÇÃO
Na educação da criança cega ou portadora de visão subnormal, cabe
ressaltar a importância da actividade de Vida Diária - AVD, cujo objectivo é proporcionar
à criança condições para que, dentro de suas potencialidades, possa formar hábitos de
auto-suficiência que lhe permitam participar ativamente do ambiente em que vive.
Ao nascer, a criança encontra-se num estado de dependência total,
situação esta que, gradativamente, desaparece com seu crescimento e, já na fase
pré-escolar, começa a alimentar-se, vestir-se, ir ao banheiro sozinha e escovar os
dentes sem necessitar de ajuda ou apenas com ajuda parcial. Em relação à criança cega
ou portadora de visão subnormal, como isso ocorre? Como proporcionar-lhe a satisfação
de necessidades tão fundamentais? Quais os anseios e dificuldades experimentados pelos
pais em tais circunstâncias? Na educação da criança cega ou de visão subnormal
destacamos a actividade de Vida Diária - AVD - como área específica de atendimento, por
julgarmos indispensável ao seu ajustamento social.
Se os hábitos à mesa, a postura, a adequação para se vestir e a
higiene pessoal são comportamentos adaptativos, há necessidade de um treinamento
intensivo, porque a criança cega pode apresentar atitudes inadequadas em algumas dessas
situações. Sem dúvida, ela, no espaço maior ou menor de tempo, acabará por realizar
as mesmas tarefas que as de visão normal, tomando-se em conta, é claro, as diferenças
individuais e a restrita capacidade de imitação de quem não vê. Muitos pais, diante
das dificuldades de seus filhos, tornam-se superprotetores e, assim, impedem a criança de
vivenciar experiências que contribuirão para sua autonomia.
É de grande importância a realização de um trabalho com os pais,
paralelamente ao que é feito com seus filhos, através de encontros e/ou reuniões,
oportunizando-lhes a prática das actividades de Vida Diária, com eles desenvolvidas na
escola. Enquanto professora nesta área, fiz com que os pais vivenciassem uma actividade de
vida diária de olhos vendados, explicando-lhes sempre que tal circunstância não era,
nem pretendia ser, representativa da cegueira, a fim de evitar que, pela associação
desta com a escuridão total, desenvolvessem ou aumentassem o sentimento de piedade por
seus próprios filhos.
A experiência foi proveitosa, pois eles sentiram e perceberam algumas
dificuldades, medos e inseguranças de seus filhos cegos ou de visão subnormal e, assim,
encontraram a melhor maneira de ajudá-los e orientá-los em casa, nunca impedindo de
realizarem algumas actividades aparentemente perigosas para quem enxerga mas, ao
contrário, motivando-os sempre, contribuindo assim, cada vez mais, para sua
independência e conscientizando-se de que, também, são elementos importantíssimos no
processo de aprendizagem de seus filhos.
E a situação do indivíduo portador de deficiência visual adquirida
na idade adulta?
Por vezes, a perda da visão é gradativa, dando condições a que o
indivíduo, aos poucos, processe a sua readaptação. No entanto, não são raros os casos
de cegueira súbita, por acidentes ou etiologias diversas. Como tais pessoas nada sabem
sobre a cegueira, não compreendem como possam continuar a viver no mundo que eles
aprenderam a construir e entender através dos olhos. A reabilitação dessas pessoas é
um desafio para elas, familiares e educadores, no sentido do ajustamento à sua nova
condição de vida, visando minimizar os efeitos psico-sociais causados pela perda visual.
II - ACTIVIDADES DE VIDA DIÁRIA (AVD).
"Calçar meias é complicado, até para quem não tem problemas de
coordenação. Mesmo que não pareça, o acto de calçar meias envolve uma série de
passos. Porisso, a professora ajuda Lia colocando a meia até o calcanhar. Só falta ela
dar o último puxão. Na próxima vez, a professora coloca a meia no pé e Lia precisará
puxá-la até o calcanhar e depois para cima. Mais um pouco e ela já conseguirá calçar
a meia sozinha". (Windholz, 1988)
A criança só aprende aquilo que vive concretamente. É importante que
ela faça suas próprias descobertas através da manipulação, exploração do ambiente
físico-social. Para isso podem e devem ser exploradas situações referentes à
alimentação, higiene pessoal, saúde, segurança, às actividades domésticas e ao
vestuário.
Assim, através do treinamento em A.V.D., a criança cega e de visão
subnormal aprende, entre outras coisas: localizar os alimentos no prato; cortar alimentos;
controlar a quantidade de comida do prato sem derramar; controlar a quantidade de comida
no talher; servir-se à mesa; encher copos e garrafas; receber visitas; vestir-se
adequadamente; cuidar de sua aparência pessoal; caminhar, sentar e gesticular de maneira
adequada; prevenir-se contra acidentes e remediá-los.
II.1. ALGUMAS
actividades ESPECÍFICAS..
II.1.1. ALIMENTAÇÃO:
- beber liquído com auxílio de canudos;
- ingerir alimentos pastosos (sopa, mingau);
- morder e mastigar biscoitos;
- mastigar pão;
- descascar e mastigar bananas;
- beber liquídos usando o copo;
- espetar com o garfo alimentos e levá-los à boca;
- colocar em seu prato alimentos que estejam numa vasilha maior;
- usar a faca para passar manteiga (patê ou etc) no pão ou biscoito;
- alimentar-se usando garfo e faca;
- servir-se de líquidos contidos numa jarra ou garrafa;
- usar a faca para descascar e cortar frutas, legumes e pão;
- mastigar de boca fechada;
- usar o guardanapo para limpar a boca, após as refeições.
II.1.2. HIGIENE.
- pedir para ir ao banheiro e usar o vaso sanitário (de modo adequado);
- limpar-se após o uso do vaso sanitário;
- lavar e enxugar as mãos usando água, sabonete e toalha;
- lavar e enxugar o rosto;
- escovar os dentes;
- pentear os cabelos;
-tomar banho;
-trocar diariamente as roupas de baixo;
- cortar as unhas regularmente, com auxílio;
- reconhecer as roupas que estão sujas e lavá-las.
II.1.3. VESTUÁRIO:
- brincar com bonecas despindo-as e vestindo-as;
- despir-se e vestir-se;
- desatar os cordões dos sapatos;
- tirar os sapatos e as meias;
- calçar meias e sapatos;
- identificar os seus sapatos entre vários outros pares;
- engraxar sapatos;
- manejar diversos tipos de botões ( em tamanhos grandes ) utilizados nas peças do
vestuário;
- abrir e fechar ziper de casacos ou vestidos;
- abrir e fechar fivelas de seus próprios cintos;
- retirar e colocar blusas que entrem pelo decote, reconhecendo a parte de trás pela
etiqueta que deve estar presa;
- guardar roupas em gavetas
- colocar camisas, blusas e vestidos em cabides.
II.1.4. SAÚDE E SEGURANÇA.
- reconhecer a importância do médico e do dentista;
- reconhecer a importância dos exames de saúde e submeter-se a eles quando necessário;
- tomar adequadamente os remédios indicados;
- reconhecer alguns instrumentos médicos, como termômetro, balança etc;
- reconhecer e saber para que serve gaze, algodão, esparadrapo, tesoura, mercúrio cromo,
água oxigenada etc;
- cuidar de pequenos arranhões ou ferimentos;
- organizar uma caixa de primeiros socorros;
- discar e falar ao telefone;
- atender sinal de chamado (campainha, telefone);
- subir e descer escadas com cuidado, segurando o corrimão;
- riscar fósforos para acender velas e fogões;
- saber utilizar o fogão em actividades simples, apagando-o convenientemente ao término
da tarefa;
- ligar e desligar o rádio e a televisão.
II.1.5.
actividades DOMÉSTICAS
- varrer o chão;
- usar a pá de lixo;
- colocar o lixo na lixeira;
- lavar o chão;
- limpar as mesas e as cadeiras;
- limpar e arrumar o armário;
- arrumar a cama;
- colocar fronha no travesseiro;
- lavar e passar roupas;
- tampar garrafas;
- preparar a mesa para as refeições;
- preparar pequenas refeições;
- fazer pequenas compras ( feiras e supermercados).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
1- Apostila de actividade de Vida Diária. Secretaria de Estado de
Educação e Cultura do Rio de Janeiro. Coordenação de Educação Especial. n. 5. 1985. 2- JESUS, Elisabeth Ferreira. actividade de Vida Diária. Apostila. Rio de Janeiro. 1994. 3- WINDHOLF, Margarida Hofman. Passo a Passo, seu Caminho. São Paulo. EDICON. 1988.
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ELISABETH FERREIRA DE JESUS
é Professora e Coordenadora do Programa Educacional
Alternativo - PREA - do Instituto Benjamin Constant.
Δ
publicado
por
MJA
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