Michele Pereira de Souza
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| Este artigo visa mostrar que é possível que pessoas
portadoras de deficiência visual participem das aulas de educação
física, ressaltando sua importância e seus benefícios, principalmente com
relação à construção de seu esquema corporal, organização espaço-temporal e
conhecimento de seu corpo. Além disso, reforça a relevância da inclusão e do
grande ganho que crianças especiais e as ditas "normais" tem na convivência
diária e na troca de experiências.
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A educação física enfatiza o
conhecimento e domínio corporal e busca, através de actividades lúdicas e
desportivas, servir como importante elemento de desenvolvimento geral, aumentando
o potencial de experimentação corporal de situações de aprendizagem e de
aquisição de conceitos básicos. Desenvolve a auto-confiança, a auto-iniciativa e
a auto-estima, além de actuar como elemento facilitador de um desenvolvimento
motor adequado e propiciador de situações de interacção social.
Há
algumas actividades comumente praticadas pelos deficientes visuais como: natação,
judo, musculação, dança, recreação, atletismo, futebol, futebol de salão,
xadrez, além de thorball e o goalball (modalidades desportivas que foram
inventadas e desenvolvidas especificamente para pessoas portadoras de
necessidades visuais especiais).
As pessoas cegas, especialmente as
crianças, geralmente apresentam desempenhos inferiores nas áreas motora,
cognitiva e afectivo-social. O desfasamento apresentado não é próprio da condição de
cego, mas sim função de um relacionamento familiar inadequado e,
principalmente, é causado pela própria problemática da realização motora. A
família, muitas vezes super protege a criança cega e isso dificulta o seu
desenvolvimento motor geral. Como já foi dito antes, quanto menos a criança cega
interage fisicamente no ambiente, menos ela experimenta situações de
aprendizagem, menos oportunidades ela tem de formar conceitos básicos, menos ela
se relaciona com o ambiente e com as pessoas e mais ela se fecha dentro do seu
mundo particular e restrito pela falta de informações visuais.
Com
relação ao domínio sócio-afectivo, frequentemente apresentam medo de situações e
ambientes desconhecidos, dependência, dificuldade de relacionamento e
integração, insegurança, baixa auto-estima e auto-confiança. Já no campo
cognitivo podemos observar limitação na captação de estímulos e dificuldade na
formação de conceitos. Ainda tem um grande comprometimento na área psicomotora,
principalmente pela impossibilidade de imitação que dificulta a aprendizagem e
diferentes vivências motoras e sensoriais.
Sem dúvida a educação
física é um importante aliado na interacção social, no incremento das funções da
inteligência e principalmente no desenvolvimento das condições motoras dos
indivíduos cegos. Através de actividades lúdicas, podemos alcançar os 3 domínios
e melhorar a qualidade de vida dessas pessoas. Os desfasamentos no desenvolvimento
geral da criança cega, que se apresentam como estatisticamente relevantes, são
mais acentuados na área motora. Estas se dão, não por um déficit
anátomo-fisiológico inerente à criança congenitamente cega, mas sim pela
limitação de experiências motoras em diversos níveis.
Os estágios de
desenvolvimento motor da criança cega apresentamcom freqüência os seguintes desfasamentos:
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Mobilidade prejudicada
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Equilíbrio falho
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Esquema corporal e cinestésico não internalizados
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Locomoção dependente
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Postura defeituosa
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Expressão corporal e facial muito raras
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Coordenação motora bastante prejudicada
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Lateralidade e direccionalidade não estabelecidas
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Inibição voluntária não controlada
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Falta de resistência física
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Tónus muscular inadequado
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Falta de auto-iniciativa para acção motora
A chamada educação física adaptada ou especial consegue minimizar e optimizar esses problemas, se o trabalho for realizado por um profissional
competente e habilitado. Ela utiliza o corpo da criança cega como instrumento.
Partindo do conhecimento e domínio deste corpo, ela usa o movimento controlado
como meio, o respeito absoluto da individualidade do aluno como estratégia
básica, o prazer da descoberta de poder fazer como reforço [...], buscando propiciar
condições favoráveis à sua trajectória académica e, futuramente, à sua
emancipação social.
A criança portadora de necessidades visuais especiais tem absoluta
necessidade de descobrir, conhecer, dominar e relacionar o seu próprio corpo com
o ambiente e com as pessoas. Somente assim ela se identificará como ser inédito,
formando o seu "EU", interagindo no ambiente e em seu grupo social. É uma etapa
de seu desenvolvimento que não pode ser queimada. Essa criança necessita de acções que permitam construir uma nova postura em relação a sua realidade,
superando os comprometimentos físicos e estabelecendo um comportamento de
interacção e integração com as pessoas e o mundo a sua volta.
Conclusão
É importante ressaltar o grande valor que a educação
física adaptada ou especial tem, pois proporciona às pessoas portadoras de
necessidade visuais especiais uma melhor qualidade de vida, socialização,
bem-estar, treino dos sentidos, conhecimento do esquema corporal, além de
outros estímulos e vivências que em outras actividades não seria possível.
Utilizar a educação física para promover e despertar as
potencialidades de uma pessoa cega é muito mais do que gratificante, é um dever
muito prazeiroso.
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Michele Pereira de Souza
é graduada em Licenciatura plena em Educação Física - UFRJ e
Professora de Educação Física do CEINC - Rio de Janeiro - escola especial
Excerto de artigo publicado na
Revista Digital - Buenos Aires - Año 12
- n.° 111
Δ
5.Nov.2007
publicado
por
MJA
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