A. J. M. Conde

Um Sonho de Movimento - fotografia de Evgen Bavcar - 1997
As actividades físicas mais indicadas para os alunos com deficiência
visual
são
semelhantes àquelas aconselháveis para os alunos que vêem. Em qualquer classe existem
variações
no grau de habilidade dos alunos. Um professor que sabe adaptar a aula
dentro
dos limites superior e inferior das capacidades dos alunos, será também
capaz
de integrar as crianças com deficiências visuais.
Instruções
individualizadas e
concretizadas podem ajudar o aluno a vencer seus limites.
Por exemplo, saltar à corda não exige adaptação: os alunos deficientes
visuais podem
ouvir o barulho da corda batendo no chão. Uma falta (de batida) seria ouvida
como uma interrupção do ritmo. Eles podem também saltar à corda, sozinhos,
por ser uma actividade intrinsecamente ritmada e que não exige deslocamento.
De facto, uma estratégia útil, quando se ensina crianças que vêem a saltar à
corda,
é pedir que fechem os olhos para se concentrar no ritmo, sem se deixarem
distrair
pelos movimentos da corda.
Sugestões de Materiais, Estratégias e Adaptações
Metodológicas para o Ensino da Educação Física aos Alunos com Deficiência Visual
Organização e constância são elementos essenciais
em relação ao
equipamento.
Por exemplo, antes de uma aula de Educação Física será preciso orientar os
alunos,
com deficiência visual, a respeito da locomoção, do equipamento, e depois
disso
evitar mudanças de lugar sem avisá-los. Seguindo esta sugestão, em todas as aulas de Educação Física, os alunos
com
deficiência visual serão capazes de se movimentar, independentemente e sem
receio, no ginásio ou no campo.
Se houver um aluno com deficiência
visual assistindo a um jogo, deverá ser designado um “locutor” que fique a seu
lado
e lhe descreva o desenrolar do jogo.
Ao ensinar Educação Física a alunos com deficiência visual, siga estas
linhas de acção para modificar as experiências de aprendizagem:
SELECCIONAR UMA AcTIVIDADE
QUE NÃO NECESSITE DE MODIFICAÇÕES
Uma pessoa, com pouca ou nenhuma visão, pode participar de muitas actividades
e desportos sem modificações: remo e bicicleta com uma pessoa
que vê no
banco
da frente, competição de remo com timoneiro, bowling para pessoa
com visão de túnel, bowling sonoro para os cegos,
esqui aquático usando
sinais
sonoros, luta (corpo a corpo). De facto, os lutadores com deficiências
visuais têm
uma história de vitórias contra os que vêem (Buell, 1966).
Um professor criativo será capaz de incluir os deficientes visuais
numa ampla
variedade de actividades, desde que raciocine do ponto de vista da cegueira.
MODIFICAR AS REGRAS DA ACTIVIDADE
Muitos
desportos foram modificados em função dos participantes com
deficiência
visual. Pequenas modificações, que não alteram a natureza do desporto, são
as mais
aconselháveis. Por exemplo: para compensar as dificuldades de orientação
e mobilidade no jogo de futebol e de
beisebol utiliza-se uma bola com guizos
e de tamanho maior do que a oficial, que é localizada e acertada com maior
facilidade.
As regras de pistas e corridas também podem ser modificadas permitindo
que
os alunos com deficiência visual se guiem por um arame ou corda colocados à
volta da parte interna da pista ou corram segurando no braço (acima do
cotovelo)
de um colega, com bambolês, bastões ou ainda por intermédio de pista
sonora.
MODIFICAR AS
TÉCNICAS DAS HABILIDADES
A natação é um excelente
desporto aeróbico que não exige a visão. As
braçadas
são aprendidas através de feedback cinestésico e auditivo. Os separadores de
pistas
ajudam o nadador a uma linha recta. Contar com o número de braçadas
necessárias
para atravessar a piscina previne um nadador com deficiência visual para
diminuir
a velocidade antes de alcançar a borda, ao nadar de costas, bruços, mariposa
e de
lado. O “crawl” não precisa de adaptações porque neste estilo de natação os
braços
chegam sempre antes da cabeça.
MODIFICAR A TÉCNICA DE ENSINO
Talvez a maior modificação no ensino de técnicas seja a inclusão da instrução
verbal, da manipulação das demonstrações visuais. Colocar o aluno com
deficiência visual de modo que ele possa vê-lo ou tocá-lo quando necessário.
Para o aluno que não for cego congénito será útil a utilizações de imagens
visuais. Quer os alunos cegos, quer os de baixa visão, beneficiam com uma linguagem
precisa
do professor, como por exemplo: “A raquete deve ficar 10 a 12 cm acima do ombro
direito”, em vez de “segura a raquete assim...”
Pesquisas feitas por Dye (1983) mostraram que, para crianças com
deficiências
visuais, o feedback cinestésico é potencialmente um método de aprendizagem
mais eficiente do que o feedback auditivo. Esses resultados sugerem que os
professores deveriam posicionar correctamente o corpo da criança quando
ensinam
habilidades motoras, a fim de ajudar o aluno a aprender, pois eles não
observam
diferentes organizações corporais.
MODIFICAR O
AMBIENTE, INCLUINDO ESPAÇO, FACILIDADE E EQUIPAMENTO
Bolas de cores fortes, marcadores de campo e
balizas que contrastam com o
fundo
possibilitam aos alunos com deficiências visuais a utilização da visão
residual.
Pelo facto de a natureza das limitações visuais variar muito, é importante
falar
com o aluno para saber quais modificações poderão ajudar mais. Há alunos que
vêem melhor objectos luminosos multicoloridos sob luzes fortes,
enquanto
outros precisam de objectos coloridos sólidos sob luzes moderadas que não
produzam brilho.
No voleibol, a utilização de uma bola de praia facilita o seguimento visual
e
torna
mais lento o ritmo da partida. Ao seleccionar as actividades para os alunos
com
deficiências visuais, a prioridade deveria ser dada aos desportos que podem
ser
praticados ao longo da vida, como o bowling, ciclismo, remo, natação, futebol,
basquetebol, vela, dança aeróbica, ioga, judo, corrida (jogging), dança de
salão e
danças folclóricas.
Sugestões de
Desportos e Actividades para Deficientes Visuais
-
Natação;
-
Atletismo;
-
Musculação;
-
Ginástica escolar;
-
Judo;
-
Goalball e Torball;
-
Ginástica Postural e Correctiva;
-
Futebol de salão;
-
Basquetebol;
-
Ciclismo;
-
Corrida de Orientação;
-
Xadrez.
Sugestões ao Professor de
Apoio para trabalhar com o professor de Educação Física
O Professor de Apoio de crianças com deficiência visual, pode ajudar os
Professores de
Educação Física de várias maneiras:
-
Fornecendo a descrição do aluno: qual a visão útil, quais os exercícios
contra-indicados no caso de perigo de descolamento de retina e glaucoma,
informações do oftalmologista, etc.;
-
Explicando aquilo que o aluno pode e não pode ver. Isto será de muito
auxílio,
se o aluno não conseguir explicar-se por si próprio;
-
Discutirem juntos (os professores) as possíveis modificações, inclusive
a
necessidade de óculos de protecção;
-
Sugerir que o professor de educação física avalie individualmente o
aluno
com
deficiências visuais, quanto ao seu actual nível de desenvolvimento motor,
antes
de colocá-lo numa classe de Educação Física;
-
Uma vez que o aluno deficiente visual tenha sido incluído numa classe,
entrar frequentemente em contacto com o professor para acompanhamento e avaliação.
Um apoio contínuo e sugestões são importantes;
-
Oferecer-se para transcrever o material sobre Educação Física para braille,
letra ampliada ou fitas gravadas.
Pode acontecer que uma criança cega seja colocada numa classe de Educação
Física com um professor que não se sinta à vontade com a sua presença. Tente
determinar a razão desta relutância. Se for necessária uma preparação extra,
trabalhe com o princípio de dedicar mais tempo ao professor. Procure fazer
com
que o professor visite ou conheça um programa de educação física, no qual
alunos
com deficiência visual estejam satisfatoriamente integrados.
A contribuição da
Educação Física para a saúde e o bem estar dos indivíduos
com deficiência visual pode ser significativa. A Educação Física pode
diminuir a distância entre as habilidades motoras existentes entre os deficientes
visuais e os seus pares. As pessoas que vêem têm maiores oportunidades de
aprendizagem incidental para aumentar as habilidades motoras e refinar o
sentido cinestésico.
Actividades - que desenvolvam a aptidão física, o equilíbrio, habilidades
motoras,
imagem corporal e alinhamento do corpo (postura adequada) - podem ser
indicadas
juntamente com desportos que promovam a integração com amigos e
família.
Os aspectos mais fáceis de ser mudados são os equipamentos e as
regras.
Os
aspectos mais difíceis de mudar são as atitudes segundo as quais pelo facto
de
uma pessoa não ter visão, não ter também a capacidade de participar
plenamente
dos desportos (Sherrill, 1976). A contribuição mais significativa, do
professor de
alunos com deficiência visual, pode ser a de trabalhar os outros, a fim de
eliminar
estas atitudes negativas.
Propostas de Adequação Curricular para Programas de Educação
Física de Alunos com Deficiência Visual
● Reconhecimento (conceptualização e mapa mental) das áreas, implementos e
materiais a serem utilizados nas aulas de Educação Física. Ao aluno cego
deve ser dado o tempo necessário ao completo reconhecimento do ambiente
de aula.
● Uso de pistas (referências) ambientais: o vento entrando por uma porta ou janela, uma
fonte
sonora localizada num ponto constante, um odor característico, a posição
do sol, a textura de solos e paredes. Ao aluno que vê, serão indicações sem a
menor
importância, para o aluno cego, são pistas essenciais para a sua orientação e locomoção e
a
formação do mapa mental do ambiente físico.
● É absolutamente necessário que o professor saiba o nome de seus alunos
com deficiência visual. Essa necessidade, além da questão afectiva, assume
um papel importantíssimo na segurança do aluno. Eles não responderão a
expressões comummente acompanhadas da gesticulação “Ei!, Tu aí!, Para!,
Vem aqui”!.
● Tratando-se de uma escola especializada, na formação de turmas de
Educação Física é altamente indicada a mesclagem entre alunos cegos e
de baixa visão, tendo em vista o aumento considerável das possibilidades
de exercícios em duplas ou grupos; o mesmo
em turmas regulares, em que se tenha somente um ou poucos alunos com
deficiência visual.
● A formação em roda, de mãos dadas ou com a utilização de uma corda
circular
é muito adequada e fácil de ser alcançada.
● A verbalização é a principal arma do professor de cegos. Uma voz de
comando
clara e tranquila facilita em muito a percepção do comando solicitado.
● Existindo uma limitação óbvia à demonstração, o professor, além da voz
de
comando, poderá utilizar a ajuda física e a percepção táctil-cinestésica,
tocando
em seu aluno e deixando que ele o toque.
- Procure evitar ambientes profundamente ricos em estímulos sonoros, que
podem desorientar o aluno. Lembre-se da importância das pistas sonoras e
da voz de comando.
● Não tenha melindres em alertar
o seu aluno cego sobre qualquer impropriedade no vestuário. Enfatize a higiene pessoal. Além da importância fundamental para a
saúde,
as boas condições de higiene são importantíssimas no convívio social.
● Não saia de uma conversa com
o seu aluno cego sem avisar da sua saída,
nem chegue junto de um grupo de alunos cegos sem identificar-se.
● Não julgue que o seu aluno cego conte passos para localizar objectos ou
portas.
Ele utiliza a memória cinestésica que todos nós temos, mas desenvolve-a
muito mais. Na etapa pré-escolar e primeiros anos, ele pode lançar mão desse
recurso.
● Conduza o seu aluno cego oferecendo-lhe o braço. Ele segurará acima do
cotovelo e caminhará meio passo atrás de você. Se o aluno for pequeno, ele
segurará o seu pulso.
● Nunca pré-julgue o seu aluno cego ou de baixa visão como incapaz de
realizar
um exercício ou actividade; lembre-se que a vida dele será um contínuo superar
obstáculos. Tente e, principalmente, use o bom senso.
● Não demonstre superproteção ao seu aluno cego ou de baixa visão inserido
numa turma de não deficientes. Lembre-se sempre que ele, antes de mais
nada, quer ser tratado com igualdade.
● Não generalize predicados ou defeitos de um deficiente visual a todos os
outros.
Lembre-se que as diferenças individuais constituem parâmetros básicos do
processo educacional e as generalizações são componentes do preconceito.
● Toda a criança gosta de brincar. A brincadeira desempenha um papel
importante no seu desenvolvimento. A criança cega ou de baixa visão não é
diferente. Ela gosta e tem necessidade de brincar, correr, pular, dançar.
● Embora possam acontecer desfasamentos psicomotores, a criança cega, quanto
ao
interesse por actividades recreativas faz o seu desenvolvimento em consonância
com a criança de visão normal da mesma faixa etária.
● É uma tendência natural do ser humano o temor do desconhecido.
Empregue estratégias que lhe propiciem experimentação física e a formação
de conceito ambiental.
● O aluno de baixa visão, com patologia de descolamento de retina, não
deverá
ser submetido a exercícios nos quais haja possibilidade de traumatismo na
cabeça.
Há uma grande incidência de problemas neurológicos, com crises
convulsivas,
em alunos com deficiência visual. Na natação, é importantíssimo que o
professor tenha essa informação e atente para os aspectos de segurança
nesses
casos.
● O sentido rítmico é inerente a todo ser humano. À criança cega deve ser
dada
a possibilidade de, inicialmente, exteriorizar livremente através do
movimento o seu ritmo próprio. Ela não tem, naturalmente, padrões de expressões rítmicas
corporais. Esses padrões, se inseridos pelo professor, poderiam
demonstrar-se
contraproducentes e inibidores na pré-escola ou nos primeiros anos do ensino
básico. Nessa fase, o mais importante é que o movimento corporal
aconteça, sua performance, aí não deve ser enfatizada.
● Na pré-escola e até
aproximadamente aos oito anos de idade, a criança cega não tem a
possibilidade de fazer abstracções. A sua aprendizagem
deve ser o mais concreta possível. Depois dessa idade o professor de Educação
Física poderá utilizar maquetas e plantas baixas em relevo
para apresentar aos alunos modelos de campos desportivos e instalações de
educação física.
● O professor de educação física deve
obter informações relativas à anamnese
médica, social, familiar, psicológica e académica de seu aluno deficiente
visual. Essas informações vão certamente dar-lhe parâmetros básicos para a sua
intervenção. [...]● O aluno com deficiência visual é um ser lúdico, como todo o ser humano.
Em algumas ocasiões ele tem necessidade de ser despertado para isso,
principalmente nos casos de cegueira adquirida. O professor de Educação
Física terá também a função de incitar-lhe para o lúdico e para o prazeroso,
buscando ampliar suas possibilidades de opção de lazer.
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excertos de:
Actividades
Físicas
adaptadas ao
Deficiente
Visual Autor: A.J.M.
Conde Revista Integração Brasília, SENEB, ano 3, n. 07, Ed. Especial, p. 10-11, 1991.
Δ
28-Fev-2008
publicado
por
MJA
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