J. Kirk Horton

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CAPÍTULO 1
TIPOS DE PROGRAMAS EDUCATIVOS
Há dois tipos principais de programas educativos para crianças
deficientes visuais (crianças cegas, cuja visão é nula, e crianças deficientes visuais
com uma visão utilizável reduzida):
1. Programas de escolas especiais;
2. Programas de educação integrada.
1. Programas de escolas especiais
As escolas especiais são estabelecimentos em que todos os alunos são deficientes
visuais. Trata-se muitas vezes de internatos onde as crianças vivem e estudam durante o
ano escolar, indo a casa aos fins-de-semana e/ou nas férias.
A primeira escola desse tipo abriu em França em 1785. E eis que agora, passadas mais
de duas centenas de anos, as escolas especiais constituem o corpo principal do sistema
educativo das crianças deficientes visuais.
2. Programas de educação Integrada
No quadro dos programas de educação integrada, os deficientes visuais frequentam uma
escola regular na zona onde vivem. São geralmente alunos externos e frequentam os mesmos
estabelecimentos de ensino que os seus irmãos, irmãs e amigos que vêem. Seguem os
mesmos cursos que eles, ministrados pelos mesmos docentes, nas mesmas salas de aula, mas
beneficiando de uma ajuda complementar ou de um apoio pedagógico dado por um professor
especializado no trabalho com cegos. Lançado em 1900 nos Estados Unidos, esse sistema
difundiu-se rapidamente por todo o território norte-americano, bem como nos outros
países, a partir da segunda metade dos anos 60.
QUAL O MELHOR SISTEMA?
Desde que o primeiro programa de educação integrada foi
lançado em 1900, nunca mais deixou de ser levantada a questão de se saber qual o melhor
sistema para educar as crianças cegas e com visão reduzida. Os especialistas em cegueira
há muito que estudam e discutem esta questão que, no entanto, não obteve ainda uma
resposta absoluta. Ambos os sistemas têm certas vantagens e inconvenientes. Há
excelentes escolas especiais para deficientes visuais. Outros estabelecimentos do género
não passam, contudo, de lares onde os deficientes visuais são depositados sem que lhes
seja dispensado um ensino adequado. O mesmo se poderá dizer relativamente aos programas
de educação integrada. Alguns deles funcionam muito bem, assegurando um ensino de
primeira ordem. Outros deixam muito a desejar, e as crianças cegas ou com visão
reduzida, relegadas para o fundo da sala de aula, são simplesmente ignoradas. É, pois,
mais importante conhecer as vantagens e os inconvenientes destes dois sistemas do que
saber qual deles é o melhor.
VANTAGENS DAS ESCOLAS ESPECIAIS
1 - Os docentes das escolas especiais recebem ou uma formação
especial, ou uma formação contínua em educação de crianças cegas ou com visão
reduzida. Assim, as crianças estão constantemente em contacto com um ensino capaz de
lhes facultar a ajuda específica de que necessitam. O mesmo não sucede necessariamente
nos programas de educação integrada. O professor pode ser qualificado para o ensino de
crianças com visão normal e não para o de deficientes visuais. As crianças cegas ou
com visão reduzida que necessitam de sessões especiais de formação arriscam-se a
verem-se obrigadas a aguardar a presença do professor especial no estabelecimento.
2. Uma vez que todos os alunos das escolas especiais são cegos ou com visão reduzida, o
estabelecimento disporá mais facilmente dos meios para adquirir equipamentos especiais,
obras em Braille, livros impressos em caracteres ampliados, materiais destinados ao tacto,
etc. É mais difícil para uma escola regular adquirir equipamentos e livros para uma ou
duas crianças deficientes visuais.
3. Nas escolas especiais, o número de alunos por turma é, em geral, mais reduzido. Daí
resulta, naturalmente, uma maior possibilidade de o ensino ser mais individualizado. Em
contraponto, nos programas integrados, o professor tem de se ocupar, para além do aluno
cego ou amblíope, de outras 30 a 40 crianças. Não terá, portanto, a possibilidade de
dedicar a cada uma delas tanto tempo quanto o seu colega da escola especial.
4. Sendo muitas vezes alunos internos as crianças que frequentam as escolas especiais, o
educador dispõe de mais tempo, antes, durante e depois das aulas, para ensinar aos
deficientes visuais determinadas matérias especiais que não figuram no programa, tais
como a orientação e a locomoção, as actividades da vida diária, etc. No quadro dos
programas integrados, é mais difícil encontrar tempo para ensinar essas matérias
importantes, já que o aluno só se encontra no estabelecimento durante o período normal
de escolaridade diária.
5. As escolas especiais podem pôr em prática programas especiais de ensino para
matérias susceptíveis de colocar mais dificuldades aos deficientes visuais. Nos
programas integrados, a criança cega ou com visão reduzida segue o programa normal, dado
que é escolarizada num estabelecimento comum.
VANTAGENS DOS PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO INTEGRADA
1. Nestes programas, os alunos necessitados de uma atenção
particular vivem nas suas casas e frequentam os cursos das escolas regulares situadas nas
proximidades dos seus domicílios. Não são separados dos seus pais, irmãos e irmãs,
continuando a viver no seio das suas famílias. Em oposição, nas escolas especiais, as
crianças são geralmente afastadas da família para passarem a viver no próprio
estabelecimento de ensino, acontecendo, frequentemente, não estarem com os seus
familiares mais do que uma ou duas vezes por ano. As suas relações com pais, irmãos e
irmãs são, pois, muito reduzidas.
2. Os programas integrados são menos dispendiosos do que as escolas especiais. Uma escola
especial necessita de um terreno destinado à construção dos edifícios escolares,
dormitórios, cozinhas, refeitórios, etc., o que se pode tomar muito caro. Além disso, a
escola especial tem também de suportar as despesas com a alimentação, vestuário e
saúde dos internos. Os programas de educação integrada não comportam uma tal carga,
podendo, assim, proporcionar serviços educativos de custos muito mais reduzidos.
3. Nos programas integrados, as crianças cegas ou com visão reduzida são misturadas
com as demais crianças que não sofrem de qualquer deficiência visual, com as quais têm
a possibilidade de brincar e aprender diariamente. Essa interacção ajuda-os a melhor
compreenderem-se mutuamente. Nos internatos especiais, pelo contrário, os deficientes
visuais não têm oportunidade de conviver com outras crianças sem deficiência visual.
Os seus colegas de turma e de escola são, muitas vezes, todos cegos ou com visão
reduzida. Chegados ao fim da escolaridade, correm o risco de não possuírem nem as
aptidões, nem a experiência, nem a confiança necessárias para viverem e trabalharem
num mundo de pessoas com visão normal.
4. As crianças têm, frequentemente, dificuldade em pôr em prática, em casa e nas
suas vizinhanças, os conhecimentos que adquiriram num estabelecimento especial. Mesmo que
tenham aprendido a utilizar uma bengala para se deslocarem até à escola sem a ajuda de
terceiros, eles não serão necessariamente capazes de utilizá-la noutros percursos,
porque conhecem mal o local ou porque os pais não os autorizam a deslocarem-se sós, sob
o pretexto de ser demasiado perigoso. Este problema coloca-se com menor acuidade nos
programas integrados, pois as crianças recebem a sua formação próximo de suas casas.
Não têm que operar essa transferência de conhecimentos. Além do mais, os pais assistem
de perto ao treino dos seus filhos, praticado sob a orientação de um educador
especializado, podendo, dessa forma, apreciar melhor o que eles são ou não capazes de
fazer por si sós.
Passámos em revista algumas das vantagens e dos inconvenientes das escolas especiais e
dos programas de educação integrada. É importante que os docentes os conheçam, porque
terão de fazer um esforço particular para ultrapassarem as insuficiências do sistema em
que trabalhem. Se, por exemplo, exercerem numa escola especial, é necessário que saibam
que as crianças cegas e com visão reduzida experimentam uma dificuldade considerável no
relacionamento com as crianças que vêem. É necessário um esforço no sentido de
minimizar esses inconvenientes das escolas especiais, encontrando os meios de proporcionar
às crianças ocasiões de convívio com crianças sem problemas de visão. Se, pelo
contrário, se situarem no quadro de um programa integrado, é necessário que estejam
dispostos a encontrar o tempo indispensável, antes ou depois das aulas, na escola ou em
casa da criança, para lhe transmitir os ensinamentos de que ela tem necessidade e que
não fazem parte dos programas escolares.
Quaisquer que sejam essas vantagens e esses inconvenientes, é preciso que se saiba que
nenhum dos dois sistemas assegura uma melhor educação do que o outro. Desde que
funcionem em boas condições, ambos proporcionam uma educação válida. A qualidade
dessa educação é mais função da formação dos docentes e dos administradores, dos
materiais e livros disponíveis, etc., do que do quadro - escola especial ou programa
integrado - em que se inscreve.
O tipo de programa escolar que convém a uma criança cega ou com visão reduzida
depende de diversos factores. Em primeiro lugar, que tipo de programa é oferecido? Se
não houver nenhum programa de educação integrada a funcionar na zona de residência da
criança, ela deverá ir para uma escola especial. Em segundo lugar, que tipo de programa
é o mais adaptado às necessidades da criança? Determinadas considerações, por exemplo
acerca da pobreza da família que a impede de alimentar devidamente a criança, podem
tornar preferível colocá-la numa escola especial. Pode também acontecer que a cegueira
não seja o único problema da criança e que, por isso, se lhe torne difícil frequentar
a escola regular. Uma escola especial será, então, mais propícia à sua aprendizagem.
Por outro lado, a escola especial poderá ficar numa grande cidade, a 500 Km da
residência da criança, e os pais não quererem mandá-la para tão longe. Nesse caso, é
sem dúvida preferível optar pelo sistema de educação integrada.
Qualquer que seja o tipo de programa inicialmente escolhido, a criança não deverá,
por esse facto, ser forçada a manter-se nesse sistema durante a duração total da sua
escolaridade. Alguns alunos poderão necessitar de uma ajuda especial importante durante
os primeiros dois ou três anos de escolaridade e, depois, de um apoio já mais reduzido.
Será, então, talvez preferível que comecem por frequentar uma escola especial,
regressando depois a casa a fim de seguirem programas integrados. O inverso poderá
também ser verdadeiro. A escolha do tipo de programa educativo mais conveniente para uma
criança poderá variar em função da evolução das suas necessidades.
Há diversos tipos de programas de educação integrada. De entre eles, há três mais
comuns nos países onde o sistema funciona.
Sala de apoio
Uma sala de apoio é uma sala com uma vocação bem definida dentro da escola regular.
É lá que trabalha, a tempo inteiro, um educador ou professor especializado chamado
professor de apoio. Esta sala de apoio está equipada com o material e apetrechos
necessários para dar resposta às necessidades da criança. O deficiente visual é
integrado na classe regular, mas pode recorrer à sala de apoio sempre que necessite de
uma ajuda particular do educador especializado.
A existência de uma sala de apoio só se justifica se na escola houver pelo menos
quatro crianças cegas ou com visão reduzida. Caso contrário, seria um desperdício de
dinheiro e do tempo do educador ou professor especializado.
O facto de a palavra SALA aparecer na expressão SALA DE APOIO, não significa que se
trate sempre de um local propriamente dito. Com efeito, conforme o estabelecimento
disponha ou não do espaço necessário, o "local" em questão poderá
reduzir-se a um simples canto da secretária do professor, a um espaço reservado no
gabinete do director da escola ou ao fundo de uma sala de aula. Já vimos "salas de
apoio" a funcionarem em átrios de escolas. De facto, a "sala de apoio" é,
antes do mais, uma ÁREA, um ESPAÇO.
Programa itinerante
Nesta modalidade, o técnico (educador ou professor) especializado em vez de passar
todo o seu tempo num dado estabelecimento, desloca-se regularmente a diferentes escolas em
que se encontrem crianças cegas ou com visão reduzida. A frequência dessas visitas
dependerá das necessidades das próprias crianças, podendo variar de uma a cinco por
semana.
O modo de transporte utilizado pelo técnico é função do que existe na zona em que
exerce a sua actividade. Alguns têm viatura própria: outros deslocam-se a pé; outros
ainda vão de um estabelecimento ao outro de autocarro, de mota, de bicicleta, a cavalo,
de riquexó, de barco, ou até mesmo de avioneta. O tempo consagrado a essas deslocações
varia consideravelmente com as distancias e o transporte utilizado.
Conselheiro pedagógico
Trata-se de uma variante da fórmula do técnico itinerante. O conselheiro pedagógico
desloca-se de escola em escola mas de um modo bastante irregular. Ele passa a maior parte
do tempo que consagra a cada visita na companhia do professor, e não em contacto directo
com o aluno. Este programa adapta-se bem a crianças que necessitam apenas de um apoio
mínimo.
Estes três tipos de programa são os mais difundidos, mas também se encontra com
alguma frequência a fórmula da classe especial dentro da escola regular. Trata-se de uma
turma especial da escola regular, reservada aos alunos cegos ou com visão reduzida que
seguem a sua escolaridade sem serem integrados nas turmas normais. É como que uma escola
especial a funcionar dentro de um estabelecimento regular. Também se encontram, por
vezes, internatos situados na proximidade de uma escola regular. A criança segue a sua
escolaridade nessa escola mas, ao fim da tarde, em vez de regressar a casa, ingressa no
internato. O tipo de programa integrado aplicado depende de dois factores:
1. O grupo de alunos (número de alunos residentes numa determinada zona);
2. As necessidades dos alunos.
1. Organização do grupo: Quando haja um número considerável de alunos
residentes numa mesma zona, na proximidade de um mesmo estabelecimento, poderá ser criada
uma sala de apoio. Mas é mais frequente as crianças serem distribuídas por uma
determinada área ou região, longe umas das outras ou da escola. Um programa itinerante
é, então, preferível.
Estar-se-ia a fazer um mau uso do tempo e das competências dos técnicos se se pusesse
em prática um programa de sala especial num estabelecimento com apenas um ou dois
deficientes visuais, porque o educador especializado não teria trabalho que justificasse
a sua presença. Quando se tenta fazê-lo, acontece frequentemente que os docentes das
classes regulares, constatando que o educador especializado tem apenas um ou dois alunos a
seu cargo, enquanto eles têm 30 ou 40, começam a sentir-se lesados, levando a que, para
ocupar o professor especial, as crianças deficientes visuais passem cada vez mais tempo
na sala especial e menos na classe normal. Pouco a pouco, o programa integrado
transforma-se assim numa classe segregada.
2. Necessidades: Certas crianças tem mais necessidade do que outras da
assistência de um educador especializado. Esta constatação ajuda também a definir o
tipo de programa integrado a por em prática. Desde que uma criança consiga acompanhar o
ritmo de aprendizagem dos seus colegas de turma, necessitando apenas de alguns livros com
determinadas particularidades, não é necessário que o educador especializado siga a
criança com grande regularidade. Será porventura suficiente que a criança, o respectivo
professor e o educador especializado se reunam uma ou duas vezes por trimestre. Em tais
casos, a solução do conselheiro pedagógico é a mais apropriada. Se a criança
necessitar de uma ajuda mais importante da parte do educador especializado, será
preferível o programa itinerante.
Por vezes, o educador especializado está simultaneamente envolvido nos três tipos de
programas. Pode passar quatro dias numa sala especial e o quinto noutras escolas, para aí
contactar com outras crianças. Poderá também visitar, uma vez de dois em dois meses,
crianças que não necessitem de um apoio regular. Dessa forma, o seu trabalho
articular-se-á simultaneamente com os três tipos de programas integrados.
O tipo de programa pode variar de um ano lectivo para outro. Num determinado ano,
quatro crianças podem, por exemplo, residir nas proximidades da mesma escola,
justificando-se desse modo a existência de uma sala de apoio. No ano seguinte, porém,
uma das crianças termina a sua escolaridade, uma segunda muda-se para outra cidade, e os
pais da terceira decidem transferi-la para um internato. Resta apenas a quarta. É
possível continuar a assegurar a esta criança os apoios necessários mantendo a sala de
apoio, mas será melhor passar a um regime de programa itinerante. Pode também acontecer
que a partir desse segundo ano, as quatro crianças estejam em condições de acompanhar
uma classe regular com um apoio mais reduzido do educador especializado. As necessidades
das crianças alteraram-se. Apesar de continuar a haver quatro crianças deficientes
visuais na mesma escola, uma sala de apoio torna-se desnecessária. Um programa itinerante
será o que melhor convirá a estas crianças.
CAPÍTULO 2
RESPONSABILIDADES DOS PROFESSORES
Nos programas integrados, o professor do ensino regular e o educador
especializado têm, cada um, responsabilidades específicas. É importante que elas sejam
claramente definidas.
RESPONSABILIDADES DO PROFESSOR DO ENSINO REGULAR:
1. O professor do ensino regular é o responsável principal pela
educação dos deficientes visuais que lhe estão confiados. Cabe-lhe a tarefa de ensinar
todas as crianças da classe, incluindo as cegas e as de visão reduzida. O educador
especializado dispensa um apoio que permita que as aulas do professor do ensino regular
possam ser seguidas pelos deficientes visuais.
2. O professor do ensino regular deve dispensar aos deficientes visuais a mesma atenção
que aos demais alunos da turma e dar-lhes o mesmo apoio. Não é necessário que defina
regras particulares a aplicar-lhes ou que lhes exija menos trabalho.
3. O professor do ensino regular deve comunicar livremente com o educador especializado,
devendo informá-lo dos progressos da criança, bem como dos problemas que a mesma possa
ter. Deverá também fornecer-lhe os textos dos trabalhos de casa, dos exames e de outros
documentos que seja necessário transcrever para Braille ou para caracteres ampliados ou
modificar de modo a que os alunos cegos possam compreendê-los.
RESPONSABILIDADES DO PROFESSOR DE ENSINO ESPECIAL:
1. Seria difícil falar de ensino integrado numa situação em
que uma criança fosse colocada numa classe regular mas sem usufruir de qualquer tipo de
apoio. O educador especializado tem por missão proporcionar os apoios necessários para
que a criança cega possa ter sucesso escolar numa classe regular. Todas as
responsabilidades do educador especializado se encontram, de algum modo, ligadas ao apoio
directo que ele deverá dispensar à criança, ao respectivo professor ou família. É bom
não esquecer que não cabe ao educador especializado a responsabilidade do ensino da
criança cega. É ao professor do ensino regular que compete fazê-lo.
Ao educador especializado cabem, entre outras, as seguintes responsabilidades:
1. Dar apoio ao professor do ensino regular, respondendo às suas dúvidas sobre a
cegueira, bem como contribuir para que os outros alunos se sintam à vontade com a
criança cega. Poderá também assistir a aulas do professor regular, a fim de fazer
eventuais sugestões ou demonstrar modos de procedimento que possam conduzir a melhores
resultados no ensino da criança.
2. Inculcar nas crianças as "aptidões suplementares" de que possam necessitar.
Aptidões e conhecimentos esses que são os que a criança cega ou com visão reduzida
necessita para se adaptar às exigências da vida num mundo de pessoas que vêem:
conhecimento do Braille, orientação e locomoção, actividades da vida diária,
educação sensorial, utilização do ábaco, dactilografia, etc. Essas são aptidões que
o professor de ensino regular não está capacitado a desenvolver. Sendo elas
indispensáveis à criança, dever-lhe-ão ser transmitidas pelo educador especializado.
3. Adaptar os materiais didácticos, tais como questionários, folhas de exercícios,
mapas e gráficos, por forma a que a criança cega ou com visão reduzida os possa
compreender.
4. Pôr à disposição da criança todos os utensílios e equipamentos específicos de
que ela necessite: máquina Braille, livros em Braille, papel especial, ábaco, uma
máquina de escrever comum, livros com caracteres ampliados, canetas de feltro, papel
pautado próprio para visão reduzida, lupas, etc.
5. Assegurar ele próprio, ou fazer com que seja assegurada, a possibilidade de
recuperação ou apoio complementar nas matérias que a criança tenha mais dificuldade em
assimilar na classe regular. Esse apoio pedagógico virá juntar-se ao ensino dispensado
na classe e só será necessário quando o aluno revele dificuldade em compreender certas
partes de uma lição.
6. Servir de elo de ligação entre a casa e a escola, nomeadamente informando os pais
acerca dos progressos da criança e indicando-lhes os exercícios que ela deverá fazer em
casa sob a sua orientação.
As atribuições do educador especializado não são nem simples nem fáceis. Para
levá-las a bom termo, são necessários empenhamento e trabalho assíduo. Em mútua
colaboração, o professor do ensino regular e o educador especializado podem assegurar
uma escolaridade estimulante, não apenas às crianças cegas mas a toda a classe no seu
conjunto. Nos capítulos que se seguem, o leitor irá encontrar sugestões mais detalhadas
sobre a forma como poderá, enquanto educador especializado de um programa integrado,
assumir as suas responsabilidades e ajudar o professor do ensino regular a assumir as dele
próprio.
CAPÍTULO 3
APOIO AO PROFESSOR DO ENSINO REGULAR
Admitamos que o professor do ensino regular tem, pela primeira vez, um
deficiente visual na sua classe. Provavelmente, muitas serão as questões que se lhe
irão pôr e muitas as apreensões que, naturalmente, o assaltarão. O educador
especializado deverá dar resposta a essas interrogações e procurar ajudá-lo, a ele e
aos restantes alunos da turma, a sentirem-se à vontade com a criança cega ou com visão
reduzida. Eis algumas das questões que o professor do ensino regular poderá colocar:
1. O deficiente visual é diferente das outras crianças?
Não. É, antes de mais, uma criança, e só em segundo lugar, um deficiente visual.
Tem as mesmas necessidades, os mesmos desejos e sentimentos das outras crianças. Deve
sempre ser tratado como os outros.
2. Devo utilizar palavras como "ver" e "olhar"? Será que
inspiram aos deficientes visuais algum tipo de pena?
Não. Não se deve ter qualquer receio de utilizar tais palavras. Elas fazem parte do
vocabulário da criança, tanto quanto do de todos nós. Se a criança não tem a
possibilidade de utilizar os seus olhos para ver ou olhar, nem por isso essas palavras
têm para ela menos significado. Não há, pois, que hesitar quanto a empregar expressões
como "bem vês..." ou "está tudo visto".
3. Como é que a criança se irá deslocar até à escola e movimentar-se dentro da
sala de aula sem se magoar?
Se ainda for pequena, provavelmente será levada à escola por familiares ou amigos.
Quando crescer, poderá deslocar-se até à escola com o auxílio de uma bengala. O
educador especializado está encarregado de orientar a criança e de a familiarizar com a
escola e a sala de aula. Ele ensinar-lhe-á também algumas técnicas específicas que
evitarão que se magoe ao deslocar-se.
4. Como irá a criança aprender a ler e a escrever?
Tudo depende do grau de visão residual que possua. Certas crianças com visão
reduzida são capazes de ler e escrever textos em caracteres ampliados. Outras,
completamente cegas, utilizam o Braille (sistema de pontos em relevo que os cegos podem
distinguir através do tacto).
5. Como é que eu vou poder ensinar os alunos a ter e controlar os trabalhos que
façam em casa, sem saber Braille?
O educador especializado encarregar-se-á de ensinar o Braille à criança. O ensino
da leitura far-se-á da mesma maneira, quer a criança utilize textos impressos a negro
(escrita comum) ou em Braille. O educador poderá reproduzir o texto por cima do Braille,
de modo a que o professor possa seguir o que o aluno está a ler. Quanto aos trabalhos de
casa, o educador especializado pode transcrever para negro o que a criança escreveu em
Braille. Também poderá pedir à criança que lhe leia o que escreveu.
6. Como saberá a criança que é a ela que me dirijo?
Deverá chamar sempre a criança pelo seu nome, de maneira que ela saiba que é a ela
que se está a dirigir. É Inútil elevar a voz para lhe falar, a criança sofre de uma
deficiência visual, não auditiva. É igualmente Inútil perder o seu tempo a jogar ao
"Adivinha quem eu sou". Salvo se a criança o conhece bem, diga-lhe quem é. A
voz nem sempre é fácil de identificar, em particular no meio de muita gente e de
barulho. Se criar o hábito de chamar todas as crianças pelos seus nomes, isso
ajudá-las-á a lembrarem-se dos nomes dos colegas e, pela sua parte, acabará por deixar
de sentir qualquer incómodo pelo facto de ter de chamar um aluno deficiente visual sempre
pelo nome.
7. Como é que a criança vai ler o que eu escrever no quadro?
Poderá optar por ir lendo em voz alta aquilo que vai escrevendo no quadro, ou, em
alternativa, pedir a um aluno com visão normal que se sente junto do deficiente visual e
lhe vá lendo em voz baixa o que vai sendo escrito no quadro, de modo a não perturbar os
outros colegas. Se souber de antemão o que irá escrever, comunique-o ao educador
especializado, para que ele tenha a possibilidade de o transcrever para Braille ou
caracteres ampliados. Se, por exemplo, souber quais os exercícios de matemática que, no
dia seguinte, irá passar no quadro, entregue os respectivos enunciados ao educador
especializado, para ele os transcrever para Braille ou caracteres ampliados. Também
poderá convidar as crianças que possuam uma visão residual a aproximarem-se do quadro e
lerem o que escreveu.
8. Uma criança pode ficar cega pelo simples facto de brincar com outra que o seja,
ou de se sentar junto dela na sala de aula?
Não, a cegueira não é uma doença contagiosa, como a gripe ou outra do género.
9. É verdade que as crianças cegas possuem um sexto sentido, ou que os sentidos
que lhes restam, a audição, o olfacto, o paladar e o tacto, são mais desenvolvidos
nelas do que nas outras crianças?
Não. As crianças cegas não têm um sexto sentido e os sentidos que lhes restam não
são mais desenvolvidos nelas do que nas outras crianças. Em todo o caso, elas fazem mais
uso desses sentidos do que as crianças que vêem. Daí que muitas crianças cegas
conseguem tirar deles um maior partido, já que são levadas a exercitá-los
constantemente. Mas isso não é qualquer coisa de automático. E preciso ensiná-las a
explorar melhor os restantes sentidos.
10. Como ocupar a criança deficiente visual durante o recreio? Não será mais
seguro mantê-la na sala de aula?
É de todo conveniente não só permitir que a criança brinque com os seus colegas de
turma, mas incentivá-la mesmo a fazê-lo. Com efeito, a criança necessita de brincar
para fazer- exercício e para se socializar. Esclareça-se com o educador especializado a
respeito dos jogos e brincadeiras apropriados à criança.
11. Como submeter uma criança deficiente visual a testes de avaliação e exames?
Forneça, com a suficiente antecedência, o texto das provas ao educador especializado
para que ele o transcreva para Braille ou caracteres ampliados. Se tal não for possível,
peça ao educador especializado que leia o texto à criança. Também poderá fazê-lo
você mesmo, enquanto os outros alunos estiverem ocupados a copiar os seus próprios
enunciados.
12. Devo adoptar regras de disciplina especiais ou estabelecer um sistema de
classificação particular para a criança?
Não. A criança deve estar sujeita às mesmas regras que os seus colegas de turma. Se
não as observar, deverá repreendê-la. Não deverá adoptar regras de disciplina
especiais, nem estabelecer qualquer sistema de classificação particular. A criança
deverá ser classificada em função da qualidade do seu trabalho, como qualquer outro
aluno. Um sistema de classificação particular não daria uma imagem realista dos
resultados do aluno. Não seria justo nem para ela, nem para os colegas. Não felicite
especialmente a criança pelo simples facto de ela ter feito o que era suposto fazer. Não
é nada de extraordinário que um deficiente visual encontre por si só o seu lugar na
sala de aula ou que leia um texto em Braille. É suposto que o faça.
13. Que faz o educador especializado? Qual a frequência das suas deslocações à
minha escola?
O educador especializado tem por missão dar apoio. A si caber-lhe-á sempre o papel
de principal educador da criança. O educador especializado ajudá-lo-á trazendo
materiais, equipamentos e ideias. Ele ensinará à criança aquilo que você não está
apto a fazer: Braille, orientação e locomoção (a maneira de se deslocar a pé em
segurança), actividades da vida diária, dactilografia. Ele contribuirá também com todo
o apoio pedagógico de que a criança possa necessitar. A frequência das suas
deslocações ao seu estabelecimento de ensino será condicionada pelo grau de apoio de
que você próprio e a criança tenham necessidade.
14. Onde devo sentar um aluno que tenha uma visão residual? Que devo fazer se ele
coloca o livro muito próximo dos olhos? Será que, com isso, ele corre o risco de perder
a pouca visão que ainda lhe resta? Não seria preferível que ele poupasse a vista,
preservando-a para quando necessite de ver realmente qualquer coisa?
Não. Não é verdade que seja prejudicial para os olhos fazer uso da visão residual.
Muito pelo contrário, a criança deve ser encorajada a fazê-lo. Se, para ler, ela
precisar de colocar o livro junto aos olhos, não deverá impedi-la de fazê-lo. Tal não
contribuirá para lhe estragar a vista ainda mais. O lugar que o aluno deverá ocupar na
sala de aula dependerá do seu grau de visão e da causa da sua deficiência. De um modo
geral, deverá sentar-se na fila da frente para ver o quadro e seguir as demonstrações
do professor. Algumas crianças vêem melhor quando recebem luz directa. A outras, a luz
directa incomoda-as, e não querem sentar-se junto da janela. Aconselhe-se com o educador
especializado quanto ao lugar que o aluno deverá ocupar.
A presença de uma criança cega numa classe poderá constituir uma experiência
enriquecedora para todos. A criança aprende bastante em contacto com o professor e os
colegas, mas a inversa é igualmente verdadeira: professor e colegas descobrem que a
cegueira não é motivo para receios, e que fortes laços de amizade se podem estabelecer
entre deficientes visuais e outras pessoas.
CAPÍTULO 4
A FORMAÇÃO NA ÁREA DAS APTIDÕES SUPLEMENTARES
Cabe aos educadores especializados dotar a criança das aptidões
suplementares de que ela careça pelo facto de ser deficiente visual. Os professores do
ensino regular não têm formação para fazê-lo. Essas aptidões específicas, ainda que
não fazendo parte do programa escolar ordinário, deverão, todavia, ser ensinadas e
treinadas. Elas constam sobretudo do seguinte:
1. Educação sensorial
2. Orientação e locomoção
3. O ábaco
4. Leitura e escrita do Braille
5. Livros gravados
6. A escrita
7. Dactilografia
8. Actividades da vida diária
Cada um destes domínios será aqui abordado, e dadas sugestões para o seu ensino.
Ainda que o aluno não seja classificado quanto à aquisição dessas aptidões, é
importante que elas lhe sejam transmitidas para que receba uma educação completa. O
educador especializado terá de dispor do tempo que for necessário. Para algumas delas,
como as actividades da vida diária, é talvez preferível praticá-las na própria casa
da criança, antes ou depois das aulas. Outras, como a orientação e locomoção, têm de
ser transmitidas no exterior. A totalidade dessa formação não poderá ser levada a cabo
no quadro escolar.
1. Educação Sensorial
Programa Suplementar n.º 1
A educação sensorial consiste no desenvolvimento dos outros sentidos da criança. Um
deficiente visual não dispõe automaticamente de uma maior acuidade dos sentidos do
tacto, da audição, do olfacto ou do paladar. Ele terá de aprender a utilizá-los da
melhor forma possível. Esta secção do manual tratará sucessivamente de:
A - A audição
B - O tacto
C - O olfacto e o paladar
D - A visão residual
A AUDIÇÃO
A audição é muito importante para um deficiente visual. Através do ouvido ele
recebe inúmeras informações. Ele segue, assim, facilmente as actividades da classe, as
explicações dos professores e as trocas de impressões entre os colegas. A audição é
igualmente indispensável a uma boa orientação e à locomoção. A criança deve ser
capaz não só de ouvir e de seguir o que se diz, mas também de fazer uma selecção do
que ouve, captar as ideias principais, ignorar os barulhos importunos, identificar uma
actividade e localizar um objecto ou unia pessoa, a partir dos sons que lhe chegam.
Algumas dessas capacidades, como a de distinguir os pontos essenciais de uma história que
se lê, não se adquirem facilmente. Exigem tempo e prática. A sua aprendizagem deve
começar o mais cedo possível, logo desde que a criança é ainda bebé. A criança
deverá conseguir:
- ter consciência dos sons (Oiço qualquer coisa!);
- identificá-los (Que som é este?);
- distinguir um som de entre vários (Que som particular é este?);
- localizar os sons (De onde vem?);
- determinar a direcção de um som (Para onde vai?).
EXERCÍCIOS:
1. Atire uma bola ao chão e pergunte à criança quantas vezes a
ouve saltar. Este exercício ajudá-la-á a distinguir e localizar os sons.
2. Bata as palmas, bata no tampo de uma mesa ou utilize dois pedaços de madeira um contra
o outro para produzir um determinado ritmo. Peça à criança que reproduza esse ritmo.
Este exercício ajudá-la-á a tomar consciência dos sons e dos ritmos e a deles se
lembrar.
3. Utilize um som cujo volume possa variar (canto, rádio, etc.). Peça à criança para
se levantar quando o som aumentar e se sentar assim que o som baixar. A criança poderá
também levantar os braços à medida que o volume do som for aumentando, e juntá-los ao
corpo quando suceda o contrário. Este exercício ajudá-la-á a tomar consciência dos
sons.
4. Faça uma gravação em que intervenham diferentes sons. Dê-a a escutar à criança e
peça-lhe que identifique cada um deles. Este exercício ajudá-la-á a discernir os
diferentes sons.
5. Sentados ao ar livre ou durante um passeio, peça à criança que identifique e
localize todos os sons que ouvir. Este exercício ajudá-la-á a tomar consciência dos
sons, a identificá-los e distingui-los.
6. Faça coma criança o seguinte jogo: convide-a a adivinhar o que é que está afazer, a
partir dos sons produzidos em cada caso (andar, fechar a porta, rasgar papel, escrever à
máquina, etc.). Este exercício ajudá-la-á a identificar e distinguir os sons.
7. Leia histórias, oiça rádio, cante canções com a criança. Coloque-lhe, em seguida,
questões acerca do que acabou de ouvir. Este exercício ajudá-la-á a lembrar-se do que
ouviu.
8. Peça à criança que identifique os colegas e professores da sua escola a partir dos
sons que eles produzem (voz, maneira de andar, etc.). Este exercício ajudá-la-á a
identificar, distinguir e localizar os sons, bem como a determinar a sua direcção.
9. Ensine a criança a reconhecer os animais e os pássaros a partir das respectivas
"vozes" e cantos. Este exercício ajudá-la-á a identificar, distinguir e
localizar os sons.
10. Jogue com uma bola contendo no seu interior uma fonte sonora. Segundo as suas
dimensões, a criança deverá fazê-la rolar ou atirá-la e, em seguida, voltar a
apanhá-la. É fácil arranjar uma bola desse tipo a partir de uma bola de pingue-pongue e
alguns alfinetes. Corte a cabeça ao alfinete e introduza-o na bola. Cinco ou seis
alfinetes serão o bastante. Depois, tape o furo que fez na bola com um pouco de cola.
Também poderá encher com seixos uma lata cilíndrica. Ela fará barulho ao rolar. Estas
actividades são muito úteis, pois ajudarão a criança a habituar-se a seguir o
movimento de uma fonte sonora.
11. Efectue lançamentos de uma bola sonora para um cesto de basquetebol ou através de um
arco. Coloque uma fonte sonora numa caixa, num cesto de verga, num cesto de papéis, ou
atrás deles. Peça à criança que lance sobre esse alvo bolas pequenas, bolas maiores e
mais pesadas ou pedrinhas. Este exercício ajudá-la-á a localizar os sons.
12. Na berma de uma estrada, peça à criança que identifique os barulhos do trânsito.
Ela deverá reconhecer os diferentes tipos de veículos (automóvel, bicicleta, camião) e
indicar em que direcção circulam.
13. Utilizando uma fonte sonora imóvel, peça à criança:
(a) que identifique a proveniência do som: (b) que se volte de frente para o som; (c) que
se volte de costas para o som; (d) que se coloque à esquerda ou à direita do som; (e)
que se agache de maneira a que o som acima dele; (f) que se aproxime do som; (g) que se
aproxime do som, que pare, que o contorne em seguida de modo a ficar à sua esquerda ou à
sua direita.
14. Servindo-se de uma fonte sonora móvel, peça à criança: (a) que diga se o som se
dirige para ele ou se se afasta dele; (b) que assinale o momento em que o som se encontre
diante dele, à sua esquerda ou à sua direita; (c) que se mova seguindo o som,
mantendo-se sempre à frente dele, atrás dele, à sua esquerda ou à sua direita.
15. Utilizando, para começar, um som contínuo, peça à criança para avançar em
direcção a ele. Reduza progressivamente a respectiva duração. O som em questão pode
ser produzido batendo as palmas. De início, faça-o sem parar e peça à criança que
avance até si. Depois vá espaçando os batimentos até que um ou dois bastem para que
ela o localize. Procure permanecer imóvel e sem fazer outros barulhos durante o
exercício, a fim de que a criança não possa servir-se de outras pistas para detectá-lo
a não ser as suas palmas.
16. Ensine a criança a recordar-se dos sons. Alguns dos exercícios anteriormente
descritos contribuirão para isso. Eis mais alguns: (a) faça a criança repetir
fragmentos de frases ou grupos de números; (b) leve-a a aprender canções e poemas; (c)
peça-lhe que conte histórias.
NOTAS DESTINADAS AOS EDUCADORES
1. O tipo de actividade, o seu grau de complexidade e o modo de ensiná-la dependerão
da idade da criança.
2. Estas actividades deverão ser, inicialmente, levadas a cabo num lugar calmo; depois,
num ambiente mais barulhento.
3. Estas actividades não devem ser praticadas uma só vez, e depois esquecidas. Deverão
ser repetidas muitas vezes para se irem tornando progressivamente mais fáceis de
executar. Importa, igualmente, que sejam organizadas em diferentes quadros ou contextos,
para diversificar as experiências da criança.
B - O TACTO
É através do sentido do tacto que a criança deficiente visual adquire um
conhecimento concreto e preciso do mundo que a cerca. Só o tacto e a exploração táctil
estão em condições de fornecer informações exactas acerca da forma de um objecto, das
suas dimensões, do seu peso, da sua dureza, das características da sua superfície e da
sua temperatura. Uma criança a quem tenham descrito um cão mas a quem nunca tenha sido
dada a oportunidade de tocar num, não saberá com exactidão que aspecto tem esse animal.
Em contrapartida, se à descrição verbal se juntar uma experiência táctil, ele
apresentar-se-lhe-á de uma forma mais realista. A criança saberá onde se encontram a
cabeça e a cauda do animal, tomará consciência do seu tamanho e da sua forma,
familiarizar-se-á com o toque do seu pêlo. Quantas mais vezes ela mexa em cães, tanto
mais precisa será a ideia que deles fará. Descobrirá não apenas em quê todos os cães
se assemelham, mas também em que se que diferem.
A criança deverá iniciar a exploração táctil do mundo que a rodeia logo desde
bebé. É preciso que os pais a incentivem a tocar diferentes objectos situados em
diversos lugares da casa. Facultando à criança informações concretas acerca do
ambiente em que vive, essa exploração precoce começará a ensiná-la a servir-se das
mãos, a apalpar objectos, a aumentar a destreza dos dedos e a adquirir noções tão
fundamentais como a dimensão e o peso.
As crianças que não forem estimuladas a servir-se das mãos correm o risco de
sentirem dificuldade em:
1. Apanhar e segurar objectos. A criança terá tendência para utilizar a palma
da mão, em vez de agarrar os objectos com os dedos.
2. Passar objectos de uma mão para a outra. A criança terá tendência a deixar
cair o objecto ou, pelo menos, a realizar essa operação de uma forma desajeitada.
3. Explorar os objectos. A criança não saberá tactear o objecto na sua
totalidade, fazendo-o de uma forma sistemática. Apalpar-lhe-á uma parte mas ignorará
outra. Poderá ainda suceder que não se atreva a tocá-lo com a suficiente firmeza e
pormenor, contentando-se em "acariciar" ao de leve, com a ponta dos dedos, uma
ou duas zonas do objecto.
4. Mexer os dedos. A criança terá dificuldade e efectuar tarefas que exijam.
movimentos finos dos dedos, como, por exemplo, colocar pequenos pinos num painel.
Deixá-los-á cair constantemente, não conseguirá enfiá-los ou saltará furos sem disso
se aperceber.
Só a prática lhe permitirá aprender a utilizar convenientemente o seu sentido do
tacto. Os exercícios que se seguirão contribuirão para lhe desenvolver a coordenação
manual, a mobilidade dos dedos, a capacidade de discriminação táctil e a motricidade
fina (utilização de pequenos músculos como os dos dedos; o domínio desses músculos é
indispensável em certas actividades como, por exemplo, para escrever Braille fazendo uso
de uma pauta e um punção). Estes exercícios ajudá-lo-ão a incutir na criança
noções tais como as de:
- grande e pequeno;
- quente e frio;
- áspero e liso;
- quebradiço e inquebrável;
- mole e duro;
- pesado e leve;
- formas: redondo, quadrado, triangular, etc.
Muitas destas actividades são igualmente importantes para preparar a criança para a
leitura do Braille.
EXERCÍCIOS:
1. Peça à criança que efectue diversas operações
seleccionadas de entre as seguintes:
(a) abrir e fechar uma porta à chave; (b) enroscar e desenroscar a cápsula de uma
garrafa de plástico; (c) encher recipientes (chávenas, taças, etc.) com água ou areia;
(d) enfiar pérolas de colar, botões, sementes, flores, clips; (e) apertar atacadores de
sapatos; (f) brincar com barro, terra ou areia; (g) fazer papagaios, chapéus e aviões de
papel; (h) apertar porcas e parafusos; (i) confeccionar cestos, chapéus ou decorações
em vime, folhas de palma, palha ou ráfia; (j) reconhecer a forma (redonda, quadrada,
triangular) de objectos em madeira, em tecido, em papel ou em lixa de papel: (k) aprender
a dar nós; (l) contar e empilhar pedrinhas, pedaços de madeira, caixas de fósforos,
maços de cigarros, etc.; (m) fazer recortes e colagens; (n) montar puzzles simples de
cartão; (o) pregar pregos numa tábua com um martelo; (p) coser, tricotar ou fazer
croché; (q) utilizar um apara-lápis; (r) meter seixos numa garrafa de plástico; (s)
abrir e descascar cocos; (t) limpar e escolher legumes; (u) desenhar um motivo numa folha
de papel praticando pontos braille através do uso de uma pauta e um punção; (v) tecer
ou entrançar bases para colocar debaixo dos pratos ou jogos individuais de mesa; (x)
lançar, fazer rolar e voltar a apanhar uma bola contendo uma fonte sonora no seu interior
ou uma lata cilíndrica com seixos dentro; (y) brincar com pequenas marionetas ou
fantoches de papel manipuláveis com os dedos; (z) partir varas ou paus compridos em
pedaços de tamanhos diferentes (do comprimento de um braço ou de uma mão, com dez
centímetros, etc.).
Estas actividades podem ser praticadas quer em casa, quer na escola. A maior parte
delas requer apenas material simples, fácil de encontrar e pouco dispendioso. De facto, o
melhor material é o que é proporcionado pelo próprio meio natural, e não o que se
vende nas lojas especializadas. Ao mesmo tempo que contribuem para o desenvolvimento do
sentido do tacto, estes exercícios podem também inscrever-se no quadro dos lazeres, da
iniciação às actividades da vida diária e do artesanato.
2. Peça à criança que identifique e seleccione diferentes objectos (seixos, folhas,
pauzinhos, grãos, moedas, etc.) segundo os seguintes critérios:
(a) Objecto. Separar em dois montinhos os amendoins e os grãos de café.
(b) Tamanho. Separar em dois montinhos os seixos grandes dos seixos pequenos.
(c) Forma. Separar em dois montinhos as folhas pontiagudas das arredondadas.
(d) Comprimento. Separar em dois montinhos os pauzinhos compridos dos curtos.
(e) Peso. Separar em dois montinhos as pedras leves das pesadas.
(f) Textura. Separar em dois montinhos as moedas que tenham o bordo liso das de
bordo estriado.
A criança poderá também ordenar esses objectos por tamanhos, pesos, etc.
3. Elabore "cartas tácteis" recortando pedaços de papel ou de cartão com a
forma de cartas de jogar vulgares. Forme pares colando sobre duas cartas um objecto
idêntico: círculos de tecido, triângulos de lixa, botões do mesmo tamanho e forma,
fósforos dispostos com a mesma orientação, pedaços de cordel do mesmo comprimento,
clips do mesmo tamanho, etc. Socorra-se de lixa, pontos Braille, cordel, cartão, etc.,
para produzir diferentes formas (triângulos, quadrados, círculos). Certifique-se de que
os pares de cartas representam objectos, texturas e formas idênticos. Essas cartas
poderão: (a) servir para jogar a jogos como o da bisca; (b) ser escolhidas e agrupadas
por pares; (c) servir para transmitir noções tais como: áspero e liso, grande e
pequeno, etc.
4. Coloque três objectos sobre a mesa. Peça à criança que os apalpe e identifique.
Retire um dos objectos. Em seguida, volte a pedir à criança que apalpe os dois restantes
e diga qual é que falta. Vá aumentando progressivamente o número de objectos.
5. Construa um "painel de sementes" colando num cartão sementes de
diferentes formas e tamanhos. Peça à criança para designar ou contar todas as sementes
do mesmo tipo (arredondadas, alongadas, lisas, etc.). Poder-se-á também construir um
"painel de texturas" recorrendo a pedaços de tecido, de papel, etc., com
diversas texturas. A criança deverá dizer qual é o pedaço tecido ou de papel mais
rugoso, qual é o mais liso, qual o maior, etc.
6. Faça pequenos buracos num pedaço de madeira. Peça à criança que introduza
fósforos (aos quais, como medida de segurança, deverá cortar previamente a cabeça)
nesses buracos. Primeiro, em todos eles; depois, em buracos alternados, e assim
sucessivamente. Ou ainda, poderá pregar filas de pregos numa madeira e pedir à criança
que coloque um elástico em torno de uma série de três pregos alinhados em diagonal; de
dois pregos na vertical, etc.
7. Os jogos com cubos constituem um exercício excelente para a criança, pois
contribuem para o desenvolvimento da sua capacidade de manusear objectos. Os cubos podem
ser empilhados, empurrados ou puxados, encaixados uns nos outros e utilizados para fazer
construções (casinhas, estradas, etc.). Fabrique cubos em madeira, ou utilize caixas de
fósforos ou de cigarros vazias. Coloque-lhes dentro pedrinhas e feche-as muito bem:
farão barulho quando agitadas.
8. Ao construir puzzles destinados a crianças deficientes visuais, atenha-se a formas
e modelos simples. Os puzzles poderão ser recortados em madeira ou cartão.
9. Recorte pedaços de cartão de diferentes formas e tamanhos. Disponha-os por uma
determinada ordem. Em seguida, peça à criança que tacteie e reproduza o modelo. A
dificuldade do modelo deverá estar de acordo com a habilidade da criança. Poder-se-á
efectuar o mesmo exercício enfiando objectos num fio. Enfie dois botões, uma pérola e
dois clips: peça depois à criança que reproduza o modelo.
10. Construa "cartões de coser" fazendo furos numa folha de cartão ou
cartolina grossa. Utilize um pauzinho ou uma hastezinha de bambu como se fosse uma agulha.
Ate um fio ao pauzinho ou abra uma fenda no bambu através da qual fará passar uma ponta
do fio; a outra ponta será atada a um dos furos do cartão. A criança poderá
"coser" fazendo passar a "agulha" através dos furos abertos no
cartão. Este exercício serve não só para ensinar a criança a servir-se dos dedos e a
utilizar as duas mãos em simultâneo, mas também para lhe ensinar os pontos de costura
elementares.
11. Introduza diferentes objectos num saco, e peça à criança: (a) que reconheça
pelo tacto todos os objectos nele contidos; (b) depois de lhe ter dado um objecto a
apalpar, que encontre no saco um objecto semelhante; (c) que encontre no saco todos os
objectos de que nos servimos para comer, para vestir, etc.
NOTA: Inúmeros exercícios podem ajudar a criança a desenvolver
o seu sentido do tacto. A maior parte deles requer objectos muito simples. Comece desde
já a recolher esses objectos e a pô-los de parte para tê-los à mão quando forem
necessários. Coloque uma caixa grande no seu quarto. Quando achar um pedaço de tecido
velho, em vez de o deitar fora, meta-o na sua caixa! Se encontrar no chão uma garrafa de
plástico, apanhe-a, leve-a para casa, lave-a e meta-a na sua caixa! Se achar um botão no
chão, leve-o para casa e meta-o na sua caixa! Peça aos seus familiares e amigos que
procedam do mesmo modo. Em breve terá toda uma colecção de objectos que poderão servir
para as actividades atrás descritas.
C - O OLFACTO E O PALADAR
Considera-se, por vezes, que o olfacto e o paladar são sentidos pouco
importantes. É certo que a criança deficiente visual se serve deles menos do que se
serve da audição e do tacto, mas eles podem fornecer-lhe informações úteis sobre o
que as cerca. O cheiro pode ajudá-la a orientar-se quando se desloca, e o paladar é
precioso para a cozinha. No que se refere aos cheiros, a criança deve
adquirir as seguintes faculdades:
1. Estar consciente dos cheiros. (Cheira-me a qualquer coisa!);
2. Identificar e distinguir os cheiros. (Que cheiro é este?);
3. Localizar o cheiro. (De onde vem este cheiro?).
No que se refere ao paladar, a criança deve:
1. Ser sensível às diferenças de paladar. (Este alimento é ácido, é doce,
está condimentado, está estragado, etc.)
2. Ser capaz de identificar os alimentos pelo seu respectivo paladar. (Este
sabe a sal.).
EXERCÍCIOS:
1. Reuna objectos e alimentos usuais e peça à criança que os identifique só pelo
cheiro: cola; perfume; laranjas; petróleo; sabão; cerveja; caixa de conserva; peixe;
cebolas; flor; fumados. Peça à criança que identifique os alimentos a seguir indicados,
só pelo respectivo sabor: sal; pimenta; açúcar; limão; manga; caril.
2. Ensine a criança a determinar o estado dos alimentos através do seu cheiro. Por
exemplo, distinguir entre: leite fresco e azedo; carne, frutos e legumes frescos e
estragados; água limpa e suja; peixes e crustáceos frescos e deteriorados. Isso poderá
evitar que a criança seja vítima de intoxicações alimentares devidas à ingestão de
alimentos deteriorados.
3. Ensine a criança a reconhecer o cheiro das flores e árvores mais comuns. Esses
cheiros poderão servir-lhe de referências nas suas deslocações.
4. Peça à criança que identifique um odor e avance em direcção a ele. Isso
ajudá-la-á a determinar a proveniência dos cheiros.
5. Explique à criança. que determinadas divisões da casa, determinadas lojas e
determinados lugares (casas de banho, lixeiras, padarias, etc.) exalam, por vezes, um
cheiro característico. Isso ajudá-la-á a encontrá-los.
6. Incentive a criança a ajudar a mãe na preparação das refeições familiares, a
fim de que aprenda a reconhecer o cheiro e o paladar de diferentes alimentos, crus e
cozinhados.
D - A VISÃO RESIDUAL
Entende-se por visão residual os vestígios de visão que subsistem no indivíduo. É
da maior importância que a criança aprenda a utilizá-la; poderá ser para ela o mais
importante dos sentidos. Muita gente crê que, existindo uma visão residual, será
preferível não a utilizar, pois isso deteriorará ainda mais a vista. É falso. Se a
criança possui uma visão residual, é vivamente recomendável que a estimulemos a
servir-se dela na medida do possível. Mesmo que a sua vista não possa ser melhorada, a
criança pode aprender a explorar mais eficazmente o potencial que lhe resta de visão à
distância e de visão próxima.
1. Visão à distância
Certas crianças com uma visão residual têm dificuldade em se deslocar por não
saberem utilizá-la. São capazes de ver, mas não sabem interpretar o que vêem. Não
sabem observar, por assim dizer.
EXERCÍCIOS:
1. Ensine a criança a adquirir uma visão selectiva, ou seja,
a distinguir um objecto particular de entre muitos outros:
(a) Coloque alguns copos de plástico em cima da mesa e peça à criança para
contá-los. Faça a criança recuar progressivamente até que os copos preencham
perfeitamente o seu campo de visão. Ponha outros objectos na mesa - tigelas e livros, por
exemplo -, e volte a pedir à criança que conte apenas os copos;
(b) Com a criança no meio da sala, coloque um objecto de cor viva num sítio
qualquer. Peça-lhe que se vá voltando até ver o objecto e que o aponte com o dedo;
(c) Peça à criança que ande pela sala e que vá tocando em todos os objectos de cor
azul, ou que vá contando todos os objectos quadrados;
(d) Durante um passeio, peça à criança que identifique objectos. Peça-lhe que conte as
árvores por que vá passando: que caminhe de modo a passar por cima de todas as pedras
grandes que vir; que apanhe apenas flores vermelhas.
2. Ensine a criança a adquirir uma capacidade de exploração sistemática, ou
seja, a observar sucessivamente tudo o que a rodeia:
(a) Trace linhas verticais num quadro negro. Apegue vários segmentos de cada linha.
Peça à criança para se colocar diante do quadro e contar o número de interrupções
nas linhas. Procure que a criança observe bem toda a extensão do quadro, de um extremo
ao outro. Vá acrescentando, progressivamente, outras linhas interrompidas em diversos
outros pontos;
(b) Saia com a criança e peça-lhe que fique de pé com os olhos fechados. Coloque um
objecto (bola, pedra grande, etc.) num sítio qualquer. Peça à criança que abra os
olhos e que, em seguida, se vá voltando lentamente até encontrar o objecto.
3. Ensine a criança a seguir objectos em movimento:
(a) Peça à criança que corra conduzindo com os pés uma bola de cores vivas;
(b) No escuro, peça à criança que siga a luz de uma pequena lanterna de bolso;
(c) Ate um trapo colorido à ponta de um cordel. Vá puxando o fio, e peça à criança
que o siga tentando pisar o pano;
(d) Jogue com balões (que se possam soltar). Peça à criança que os apanhe, que os
atire, que procure rebentá-los. Este exercício apresenta várias vantagens: os balões
têm geralmente cores vivas, são baratos e movem-se relativamente devagar;
(e) Peça à criança que olhe para si e que o vá seguindo enquanto vai falando com ele e
deslocando-se para a frente, para trás e para os lados. Comece por deslocar-se lentamente
e, depois, mais depressa. Este exercício ajuda a criança a aprender a seguir objectos em
movimento e a habituar-se a olhar de frente para a pessoa que se lhe dirige.
4. Ensine à criança a localização habitual de certos objectos:
(a) Os painéis e placas de sinalização encontram-se geralmente colocados a uma
altura que ultrapassa a estatura de um homem;
(b) Os relógios de parede costumam encontram-se colocados perto do cimo das mesmas (mais
próximo do tecto do que do chão);
(c) As batateiras nunca crescem muito em altura, permanecendo sempre perto do solo, mas as
silvas podem crescer muito, chegando a atingir ou mesmo a ultrapassar a altura de uma
pessoa;
(d) As maçanetas das portas situam-se no lado, e não no meio, das mesmas;
(e) Os cachos de banana pendem sob as folhas da bananeira, não se encontram por cima
delas.
2. Visão próxima
A leitura e a escrita apelam para a visão próxima. Muitos "deficientes
visuais" têm uma visão residual suficiente para lerem textos impressos em
caracteres normais ou em caracteres ampliados. Muitas vezes, são obrigados a aprender
Braille pela simples razão de frequentarem uma escola para cegos. É um erro. Se uma
criança é capaz de ler caracteres de imprensa, dever-se-á dar-lhe livros comuns, e não
livros em Braille.
CONCRETAMENTE:
1. Dê à criança desenhos para colorir. Se ela não distinguir os contornos,
sublinhe-os a negro com uma caneta de feltro.
2. Faça a criança escrever com uma caneta de feltro preta sobre folhas de papel branco.
Isso proporcionará um contraste mais acentuado.
3. Se a criança tem dificuldade em distinguir ou seguir as linhas do caderno, avive-as
com uma caneta de feltro preta. Sempre que a criança escrever, deverá utilizar uma
caneta de cor diferente da que usou para realçar as linhas: caso contrário, arrisca-se a
não distinguir bem a parte inferior das letras quando for reler o que escreveu.
4. Assegure-se de que a criança não está a trabalhar na penumbra. Zele para que a luz
não seja velada pela sombra do próprio corpo da criança quando esta estiver a ler ou a
escrever. Evite igualmente os reflexos ofuscantes. Se a criança estiver sentada junto de
uma janela, certifique-se de que o sol não lhe incide directamente nos olhos.
5. Deverá sentar a criança na fila da frente da sala de aulas para que ela veja bem o
quadro. Se ela tiver necessidade de se levantar e se aproximar do quadro para ler,
incentive-a a fazê-lo.
6. Quando a criança for ler ou escrever, tente acentuar o contraste. Um filtro amarelo de
papel colocado sobre a página fará as letras parecerem mais negras. Poderá também
colocar sobre a linha impressa um cartão negro em que tenha aberto e retirado uma tira da
largura de uma linha de texto. Isso ajudará a criança a seguir a linha e a distinguir
melhor as letras.
7. Diga à criança que se sirva de um quadro branco e canetas de feltro pretas ou azuis.
Obtém-se assim um bom contraste, e a criança poderá escrever com um traço tão grosso
quanto necessite. Procure reduzir os reflexos o mais possível.
8. Se os livros estiverem impressos num papel muito fino ou de má qualidade, coloque uma
folha de papel negra por baixo da página a ler. Isso fará com que as letras ou imagens
da página de baixo não sejam visíveis através do papel.
9. Algumas crianças lerão melhor mantendo imóveis a cabeça e os olhos e deslocando o
livro diante deles.
10. Elabore cartões ou folhas de exercícios destinados a estimular as faculdades
visuais. São necessárias quatro etapas sucessivas:
Primeira etapa: Distinguir e reconhecer formas
geométricas; umas pintadas de negro, outras não.
Sobre rectângulos de cartão branco (ou de outra cor clara), desenhe quadrados,
triângulos, círculos, rectângulos e losangos. Cada forma do mesmo tamanho deverá ser
representada em quatro cartões (quatro círculos grandes, quatro círculos médios,
quatro círculos pequenos, e assim por diante). Em dois cartões, pinte a forma de negro.
Obterá assim dois círculos grandes negros, dois círculos grandes brancos, dois
círculos médios negros, dois círculos médios brancos, etc. Peça à criança para:
(a) identificar as formas (aqui é um losango, um quadrado, etc.);
(b) separar os desenhos segundo as suas formas (juntar todos os quadrados, todos os
círculos, etc.);
(c) seleccionar as formas segundo a dimensão (círculos grandes, círculos médios,
círculos pequenos).
Segunda etapa: Distinguir e reconhecer desenhos de
objectos totalmente pintados de preto; apenas limitados aos seus contornos; representados
pelos contornos e alguns detalhes.
Desenhe alguns objectos (taças, árvores, maçãs, flores, etc.) sobre cartões
brancos. Cada objecto, por exemplo uma taça, será representado em seis cartões: em dois
deles, pintado de preto; noutros dois, figurarão apenas os seus contornos; e com detalhes
nos restantes dois (por exemplo, uma árvore com folhas). Obterá assim duas árvores
pintadas de preto, duas árvores apenas delineadas nos seus contornos e duas árvores com
folhas. A criança deverá identificar e agrupar os cartões.
Terceira etapa: Distinguir e reconhecer:
(a) Um objecto isolado entre grupos de objectos. Numa folha de papel, desenhe cinco
objectos alinhados (um cão, uma maçã, uma casa, um copo, etc.). Peça à criança para
indicar um dos objectos na folha. (Onde está a casa?)
(b) As semelhanças e as diferenças entre os objectos. Numa folha de papel, desenhe cinco
objectos alinhados; quatro deles idênticos e um diferente (cinco árvores em que uma
esteja invertida, cinco chávenas em que uma tenha a asa do lado contrário, cinco setas
em que uma delas aponte em sentido oposto, etc.). A criança deverá assinalar o objecto
diferente.
(c) O objecto principal e o cenário. Servindo-se de fotos de revistas, peça à criança
que indique o objecto principal. (Onde está o cão? Mostra-me onde está a casa.)
(d) As letras do alfabeto. Desenhe em cada cartão uma letra do alfabeto. A criança
deverá identificar as letras. Acelere o movimento dos cartões para habituar a criança a
reconhecê-las mais rapidamente.
Quarta etapa: Reconhecer as palavras e as imagens. Desenhe uma maçã num
cartão. Num outro, escreve a palavra "maçã". Peça à criança que junte os
dois cartões.
11. Desenhe imagens a ponteado. Junto de cada ponto, escreva um número, e peça à
criança que complete os desenhos unindo os pontos 1 e 2, 2 e 3, etc.
12. Fabrique "puzzles". Cole uma imagem sobre um cartão e, em seguida,
recorte-o em pequenas peças de tamanhos e formas diferentes. Peça à criança que
reconstitua o "puzzle".
13. Coloque quatro objectos diferentes em cima da mesa. Peça à criança que os observe
e, depois, feche os olhos. Retire um dos objectos. Diga à criança que reabra os olhos e
pergunte-lhe que objecto falta. Aumente progressivamente o número de objectos, para ir
tomando o jogo mais difícil.
14. Se a criança mostrar dificuldade em ler o que está no livro, verifique a qualidade
da iluminação. Poderá ser demasiado fraca, não permitindo que a criança distinga os
caracteres. Ou, pelo contrário, a criança poderá estar a ser encandeada por uma luz
demasiado intensa. Se, depois de verificada a luminosidade, a criança continuar com
dificuldade em ler, trate de copiar (ou de pedir a alguém que o faça) o texto em
caracteres maiores. Isso ajudará a criança a lê-los e a distinguir melhor as letras e
os números que se assemelham, como o "a", o "e" e o
"o", o "f" e o "t", ou o "3"
e o "8".
2. ORIENTAÇÃO E LOCOMOÇÃO
Programa Suplementar n.º 2
O ensino da orientação e locomoção não se limita ao das técnicas de utilização
de guias, à aquisição das noções e capacidades que deverão anteceder o uso de uma
bengala, ou à técnica da sua utilização propriamente dita. É necessário, além
disso, desenvolver a mobilidade do corpo, consolidar a educação sensorial e estimular o
desenvolvimentos de determinados conceitos. No que se refere ao modo correcto de ensinar
as técnicas da utilização de guias, de criar os conhecimentos e as aptidões
preliminares ao uso de uma bengala, e a técnica da sua respectiva utilização. A
presente secção tratará das seguintes questões:
A - Mobilidade do corpo.
B - Educação sensorial:
1. A audição;
2. O tacto;
3. O olfacto.
C - Desenvolvimento de conceitos:
1. Conceitos corporais;
2. Conceitos espaciais;
3. Os conceitos de esquerda e direita;
4. Pontos cardeais;
5. Conceitos relacionados com aspectos da vida quotidiana.
Algumas destas questões foram já tratadas neste manual, na secção consagrada à
educação sensorial. Aqui elas serão apenas sucintamente abordadas nos aspectos em que
tenham repercussões na orientação e locomoção.
A - MOBILIDADE DO CORPO
Sem uma adequada formação especial nesse sentido, a criança
cega arrisca-se a não possuir um conhecimento correcto da mobilidade do seu próprio
corpo e a ter movimentos desajeitados. Quando começar a andar, a criança poderá ter
dificuldade em equilibrar-se, ou tender a manter uma postura muito rígida da parte
superior do corpo. Poderá, porventura, não saber dobrar-se, ou ter tendência a caminhar
com os pés muito afastados. Ao correr, poderá mexer rapidamente as pernas sem, com isso,
avançar na mesma velocidade.
Pecamos frequentemente por não ensinar a mobilidade. Pais e professores pensam que
todas as crianças aprendem espontaneamente a correr, saltar e pular. Não se dão conta
de que essas "competências" têm de ser adquiridas. As crianças que vêem
fazem essa aprendizagem por imitação dos seus colegas. Correr não é objecto de um
ensino formal; aprende-se pela observação e pela prática. Uma criança cega não
poderá proceder assim. Ela ouvirá falar na palavra correr numa conversa qualquer, e
dar-se-á conta de que se trata do movimento que o corpo faz ao "andar
depressa", mas isso não lhe diz como mexer o corpo para correr. Pode ser necessário
mostrar-lhe como movimentar as pernas, os braços, etc. Para esse efeito, o pai ou a mãe
podem correr lentamente, ou sem sair do mesmo lugar, convidando a criança a tocá-lo(a),
a fim de tomar uma consciência mais directa dos movimentos do corpo. Poderá também
fazer mexer o corpo da própria criança para lhe mostrar os diferentes movimentos
inerentes à corrida.
Pode ser necessário ensinar as aptidões motoras e os movimentos que enumeraremos a
seguir, dando à criança bastante tempo para aprendê-los e praticá-los: correr; saltar;
saltar ao pé-coxinho; saltitar; marcar passo; rodar; saltar para a frente; fazer
equilíbrio; voltar-se; tomar várias posturas
EXERCÍCIOS:
1. Ensine a criança a andar como certos animais. Isso ajudá-la-á a descobrir
diferentes maneiras de se deslocar.
(a) Andar como o caranguejo. Sentar-se no chão. Apoiar-se nas mãos e nos pés,
e deslocar-se para a frente, para trás e para os lados. Não deixar cair o corpo,
esforçando-se sempre por mantê-lo afastado do chão.
(b) Andar como o urso. Debruçar-se para a frente e pôr as mãos no chão. Manter
as pemas e os braços esticados. Avançar o braço e o pé direitos ao mesmo tempo.
Depois, avançar o braço e o pé esquerdos.
(c) Andar como o pato. Acocorar-se flectindo as pernas. Colocar as mãos sobre os
joelhos e andar. Manter as costas o mais direitas possível.
(d) Andar como um pássaro. Apoiar-se só numa perna. Dobrar a outra para trás e
segurar o pé. Saltitar para a frente e para trás ao pé-coxinho.
(e) Salto de rã. Acocorar-se flectindo os joelhos. Pôr as mãos no chão, à
frente dos pés. Levantar as mãos para fazê-las avançar, e dar um pequeno salto para
avançar os pés.
Para dar um carácter mais lúdico a este exercício, substitua os nomes destes animais
pelo de outros que sejam familiares à criança. Peça-lhe que lhes imite as
"vozes" enquanto anda. Poder-se-á igualmente ensinar-lhe diferentes modos de
andar de seres humanos. Como anda um adulto? E uma senhora gorda? E um velho? Todos eles
têm modos diferentes de caminhar. Podeis mostrá-lo à criança manipulando-lhe o corpo e
os membros de forma a que ela se aperceba dos movimentos a efectuar.
2. Ensine à criança alguns dos movimentos que se seguem. Eles também contribuirão
para familiarizá-la com os diferentes movimentos que pode ela executar.
(a) O pião. Na posição de pé, saltar dando meia-volta no ar, de forma a
ficar voltado na direcção oposta à inicial.
(b) O carrinho de mão. Uma criança deita-se no chão, estendido, em decúbito
ventral. Uma outra levanta-lhe as pernas de modo a que as mãos do colega passem a
suportar todo o peso do corpo. Nessa posição, a criança é, então, solicitada a
avançar apoiada nas mãos.
(c) A dança em fila indiana. Um grupo de crianças põe-se em fila indiana (umas
atrás das outras). Cada uma segura pela cintura a que a antecede e, todas juntas, dão
três saltos para a frente e dois saltos para trás; depois, novamente, três para a
frente e saltos para trás, e assim sucessivamente. Completar o exercício com música ou
outros movimentos do corpo, como, por exemplo, atirar uma perna para lado antes de dar o
salto para a frente, etc.
3. Tome as providências necessárias para que a criança faça todas as manhãs
consigo os seguintes exercícios:
- sentar-se no chão;
- flectir os joelhos;
- saltar como um macaco;
- tocar nas pontas dos pés;
- rodar a cintura para um e outro lado;
- correr sem sair do mesmo lugar.
Ao mesmo tempo que lhe ensinam movimentos, estes exercícios fortalecem fisicamente a
criança. Em geral, estas crianças passam muito tempo sentadas, pouco se mexendo, o que
não é saudável para elas.
4. Faça a criança saltar num só pé enquanto conta o número de saltos que vai
dando. Se ela tiver dificuldade em manter o equilíbrio, dê-lhe as mãos, ou deixe-a
apoiar-se na borda de uma mesa, de uma carteira, ou numa parede.
5. Faça a criança caminhar sobre uma trave de madeira deitada no chão (poder-se-á
também usar uma vara grossa e comprida de bambu). Ao tentar fazê-lo, a criança
melhorará o seu equilíbrio. Diga à criança que, procurando manter-se sempre em cima da
tábua, tente andar lateralmente, para a frente e para trás. Se a vara de bambu rolar,
mantenha-a no lugar fixando-lhe as extremidades com estacas, e certifique-se de que já
não apresenta nenhum perigo.
6. Melhore a postura da criança pedindo-lhe que caminhe com um livro ou um cesto à
cabeça. Muitas crianças cegas pendem a cabeça para a frente porque não mantêm o
pescoço direito. Isso não é bom, nem para a postura, nem para os músculos das costas.
Incentive a criança a manter-se sempre direita.
7. Corra com a criança, segurando, cada um, numa ponta de um lenço, ou de qualquer
outro pedaço de pano. Corra ao lado da criança ou um pouco adiante, mas nunca atrás
dela. Não puxe a criança; deixe-a correr ao seu ritmo. Verá que o pano, ou lenço, lhe
será útil para guiar a criança durante a corrida.
8. Os jogos com corda são excelentes para a mobilidade e a coordenação das
diferentes partes do corpo. Ensine a criança a saltar à corda. Não é fácil e exigirá
tempo, treino e paciência, mas é um óptimo exercício, pouco dispendioso e bastante
recomendável como actividade física.
9. Segure uma vara numa posição paralela ao solo. Peça à criança que veja a altura
a que a mesma se encontra do chão e depois lhe passe por baixo sem lhe tocar. Vá
aproximando progressivamente a vara do chão.
10. Os jogos com bola são também muito bons para desenvolver a mobilidade e, em
particular, conforme os jogos, a coordenação dos pés e mãos.
11. É muito importante ensinar as crianças a voltarem-se correctamente. Elas têm que
aprender "a sentir" em que consistem os quartos de volta, as meias voltas e as
voltas completas, efectuados com precisão.
(a) Mostre à criança como se voltar com precisão movendo os pés.
(b) Faça a criança andar à volta de uma mesa rectangular percorrendo-a sempre com a
mão. Em cada canto, ela dará uma curva de 90º.
(c) Para a ensinar a voltar-se, peça à criança para se colocar junto de uma parede.
Comece por pô-la de costas contra ela, braços caídos ao longo do corpo. Quando se tiver
voltado 90º, à esquerda ou à direita, um dos seus ombros estará a tocar na parede. Uma
meia volta (180º) pô-la-á de frente para a parede, e uma volta completa (360º)
deixá-la-á de novo na posição inicial. Quando a criança já conseguir voltar-se
correctamente graças às indicações que a parede lhe fornece, diga-lhe que se afaste
dela até à distância de um braço estendido. Peça-lhe que dê mais voltas, verificando
a posição estendendo o braço até à parede.
(d) Coloque quatro cadeiras em redor da criança (à frente, atrás e aos lados), a cerca
de um metro de distância dela. Peça-lhe para se voltar e avançar em seguida. Se se
tiver voltado correctamente, uma das cadeiras deverá encontrar-se diante dela.
(e) Faça a criança deslocar-se de um lugar para outro, seguindo as suas instruções.
Dê uma instrução de cada vez. "Dá três passos para a frente e pára."
"Vira 90º à esquerda e pára." "Dá cinco passos à frente e pára."
E assim por diante.
B - EDUCAÇÃO SENSORIAL
Já foram aqui descritos exercícios especiais de educação sensorial. Poderá reler
essas sugestões. Em todo o caso, a questão da utilização de cada um dos sentidos para
a orientação e locomoção não foi esgotada.
1. A audição
A audição é o único sentido de "longo alcance" de que a criança cega
dispõe. Podemos ouvir à distância, mas não podemos tactear e sentir senão as coisas
que se encontram próximo de nós. A audição tem, pois, um papel particular a
desempenhar no que respeita a ajudar a criança a deslocar-se em segurança e a não se
perder. O ruído de um automóvel a passar na estrada indica-lhe não só que é perigoso
atravessar nesse momento, como também a localização, direcção e sentido da estrada em
relação a si própria. Se a criança ouvir um carro a dar uma curva ou a passar por
barreiras sonoras, passará a saber onde está a curva, ou onde estão as barreira
sonoras, relativamente a ela. Isso poderá ajudá-la a não se perder. Mas também
pressupõe que ela é capaz de distinguir o barulho de um carro a dar uma curva, a
afrouxar, etc. Ela tem também de ser capaz de discernir de onde provém o som. É por
tudo isto que os exercícios sobre a localização dos sons que aqui foram descritos antes
é tão importante.
É preciso que conheça uma aptidão auditiva especial chamada visão facial.
É provável que já a tenha experimentado. Numa noite muito escura, regressa a casa por
um caminho ladeado de árvores ou arbustos. De quando em quando pára, porque
"sabe" que há um ramo à sua frente. Pode não o ver mas, de algum modo,
"sente" a sua presença. Estende então a mão, encontra o ramo, passa-lhe por
baixo e prossegue o seu caminho. Isso não tem nada de mágico. A investigação mostrou
que esta "visão facial" está associada à audição. O que se passa na
situação anteriormente descrita é que chega até si um certo de eco, talvez do barulho
dos seus próprios passos repercutido no ramo. É um efeito do tipo do que guia os
morcegos nos seus voos nocturnos. Certas crianças cegas têm esta aptidão
consideravelmente desenvolvida. Ao percorrerem determinado caminho podem ser capazes de
contar o número de árvores por que vão passando, sem lhes tocarem. Podem, inclusivé,
dirigir-se directamente para uma parede ou um muro, e parar antes de ir contra ele.
2. O tacto
Uma criança cega utiliza o seu tacto para:
(a) identificar obstáculos físicos (árvores, cercas, etc.);
(b) determinar o tipo de superfície sobre que caminha e a direcção dessa superfície
(relva, lama, cimento, a subir, a descer, irregular, etc.):
(c) explorar e identificar objectos (uma cadeira, uma chávena, etc.).
Quando passear com uma criança cega, lembre-se de lhe pedir para identificar o tipo de
superfície que pisa, e para assinalar todas as alterações que essa superfície registe
(textura, nível). Faça-a tocar e explorar os obstáculos físicos a fim de que possa
reencontrá-los e identificá-los mais tarde, quando sozinha. De nada serve dizer-lhe
"à tua direita, está uma cerejeira", sem a incitar a tocá-la e a gravar no
seu espírito um certo número de dados (localização da árvore em relação a outros
objectos interessantes que se encontrem nas imediações, caminho seguido para chegar até
ela, impressão provocada pela árvore ao tocar-lhe).
3. O olfacto
O olfacto faculta à criança informações úteis. Cada tipo de loja tem o seu odor. A
padaria, a farmácia, o lugar de frutas e hortaliças, e a estação de serviço podem ser
facilmente identificados pelo seu cheiro característico, o que poderá constituir uma
indicação preciosa para a sua orientação (nomeadamente, para quando a criança
pretenda deslocar-se a algum desses locais). O perfume das flores e das árvores pode, por
vezes, sentir-se a uma distância considerável, fornecendo também à criança uma
indicação acerca do local em que se encontra. Ainda graças ao seu olfacto, ela poderá
evitar pisar imundícies que se encontrem no seu caminho. Incentive-a a identificar todos
os cheiros que sinta e a encontrar a respectiva origem, indo tocar nas flores, entrando na
padaria, etc.
C - DESENVOLVIMENTO DE CONCEITOS
Grande número de cegos tem dificuldade em apreender os conceitos de posição, de
localização e de direcção. Se pedir a um deles para se inclinar, para colocar o livro
no centro da carteira, ou para se voltar para a direita, não é certo que ele saiba do
que é que lhe está a falar. Se lhe ensinar que um triângulo rectângulo isósceles tem
três lados, um ângulo de 90º e outros dois de 45º cada, ele não saberá do que é que
lhe está a falar se não compreender o significado das expressões triângulo, lado,
ângulo, 90º e 45º. Isso pode resultar de um insuficiente desenvolvimento de conceitos.
O que é um conceito? É uma representação, uma imagem ou uma ideia do que deveria
ser uma qualquer coisa (Hill). Um conceito é formado a partir de um agrupar de objectos,
de acontecimentos ou de experiências, em função do que há neles de comum. Toda a gente
elabora conceitos. Se eu pronunciar a palavra "cão", o leitor formará uma
imagem mental de um cão, apesar de os cães não serem todos idênticos. De facto, há
uma imensidade de raças de cães. Mas todas elas tem certas características em comum que
fazem dos seus exemplares "cães". Pelo facto de termos visto cães muito
diferentes, brincado com eles, havê-lo ouvido ladrar, havê-los acariciado e termos visto
imagens de cães, nós formámos uma ideia das características comuns que constituem um
cão. Assim, quando vemos na rua um animal com quatro patas, nós estamos aptos a dizer se
se trata ou não de um cão. Os nossos conceitos não se limitam a objectos concretos como
cães, gatos, automóveis, etc. Eles estendem-se também a ideias abstractas como o amor,
a honra e a beleza.
Como são elaborados os conceitos? O processo envolve duas fases (Hill). Primeiro,
retiramos informação do meio que nos rodeia. Recolhemos dados de toda a ordem e
procuramos agrupá-los. Aprendemos, antes do mais, que uma determinada coisa existe e que
ela difere (Ias outras. Em seguida, damo-lhe um nome. Temos, a partir daí, uma ideia
"da coisa" no seu conjunto. À medida que acumulamos informação, vamo-nos
familiarizando com os seus elementos e detalhes. Passamos, então, à etapa da
generalização. Isolando certas constantes da coisa identificada, procuramos ver a que
outras elas se podem aplicar, ou que outras coisas têm analogias com ela. Elaborámos,
assim, um conceito.
Assim exposto, poderá parecer complicado, mas, na verdade, todos nós estamos
constantemente a elaborar conceitos. E sem que disso tenhamos consciência! É graças à
vista que colhemos a maior parte da informação que chega do meio que nos cerca. Através
dos nossos olhos conseguimos abarcar os objectos no seu conjunto. Os cegos não dispõem
dessa faculdade. Quando apalpam um objecto, eles tacteiam sucessivamente os seus
diferentes elementos para depois os agruparem mentalmente uma ideia da aparência global
do objecto. Certos objectos não podem ser agarrados e explorados pelo tacto, ou porque
são demasiado grandes, ou demasiado pequenos. ou demasiado frágeis. Tomemos, como
exemplo, o conceito de casa. Uma casa é demasiado grande para que a criança possa
tactear a totalidade dos seus diferentes elementos. Poderá servir-se de uma maqueta para
obter bastantes informações acerca das suas formas: mas isso não lhe dará indicação
das suas verdadeiras dimensões. Além disso, uma só maqueta nada lhe pode ensinar acerca
de diferentes tipos de casas. Para que a criança elabore plenamente o conceito de casa,
é preciso que possa examinar muitas maquetas diferentes e explorar, pelo tacto, uma casa
verdadeira. Ela pode discernir a porta da entrada nas maquetas, mas e preciso que ela
possa também tocar a das casas verdadeiras.
Muitas crianças cegas, de tanto ouvirem falar as pessoas que vêem, são capazes de
dar uma excelente descrição verbal das coisas, sem que delas tenham uma verdadeira
compreensão. Limitaram-se a reter o que ouviram. É indispensável transmitir os
conceitos a uma criança cega. Para isso:
(a) Defina qual o conceito que pretende transmitir, e restrinja-se a ele. Não tente
ensinar seis ou oito ao mesmo tempo.
(b) Apresente o conceito de diferentes maneiras e em diferentes contextos.
(c) Adopte a pedagogia da eficácia: utilize tudo o que contribua para produzir o
resultado pretendido!
(d) A criança não pode assimilar conceitos, ouvindo-o apenas falar. Necessita de uma
aprendizagem activa.
(e) Forneça à criança experiências novas e diferentes, a fim de que ela possa
reforçar e desenvolver os conceitos já adquiridos.
1. Conceitos corporais
Os conceitos corporais (por vezes designados por "esquema corporal")
representam o conhecimento das partes do corpo, suas funções e seus movimentos. Em
muitas crianças cegas, eles são bastante rudimentares. Não compreendem totalmente as
diversas maneiras como se podem mover as diferentes partes do corpo. Os seus movimentos
são muito desajeitados porque não conceptualizaram suficientemente os seus corpos.
Uma criança deve conhecer bem todas as partes do seu corpo. A começar pelas
seguintes: cabeça, cabelos, dedos, olhos, pescoço, ancas, orelhas, ombros, pernas,
nariz, peito, joelhos, boca, estômago, pés, dentes, costas, calcanhares, língua,
braços, dedos dos pés, rosto, mão, punho, sobrancelhas, nádegas, tornozelo, queixo,
maxilares, lábios.
Com o tempo, é preciso familiarizar a criança com todas as partes do corpo de que se
fala correntemente (inclusivé nas suas designações populares ou em gíria, como
"cachimónia", "cachola", "carola" ou "caixa dos
pirolitos", em vez de "cabeça". Quando a criança crescer, esta lista
será aumentada, passando a incluir os órgãos sexuais masculinos e femininos e os
órgãos internos. A criança deve saber:
(a) A localização de cada parte do corpo. (Onde estão
os dedos dos pés?)
(b) As funções de cada parte do corpo. (Para que servem as
orelhas? O que faz o fígado?)
(c) As posições relativas das diversas partes do corpo. (O
que é que tens em baixo do nariz? O que é que tens na parte de cima da cabeça?)
(d) Os movimentos de cada parte do corpo. (Em quantas
direcções consegues mexer a língua? Até onde és capaz de levantar a mão? Es capaz de
tocar no teu cotovelo esquerdo com a tua mão esquerda? NÃO!)
A criança tem igualmente necessidade de conhecer as regiões ou zonas do corpo, tais
como a parte da frente, a parte de trás, o lado, a parte superior e a parte inferior.
EXERCÍCIOS:
1. Jogue com a criança a jogos como "O Tomás mandou". Após cada ordem,
pergunte à criança o que está ela a fazer. Isso torná-la-á ainda mais participante e
reforça verbalmente o conceito. O educador: "O Tomás mandou: Toca no teu joelho. Em
que é que tu tocas?" A criança: "Eu toco no meu joelho." Varie as ordens:
'Toca num sítio que esteja abaixo do teu joelho. Em que é que tocas?"
"Toca em qualquer coisa que suba e desça. Em que é que tocas?"
"Toca numa coisa que te serve para ouvir. Em que é que tocas?"
2. Cante cantilenas infantis e vá batendo as palmas no fim de cada estrofe. Depois,
substitua as palmas por outros movimentos: piscar os olhos, tocar na cabeça, puxar a
orelha, etc.
3. Ensine-lhe canções de roda como "Doidas andam as galinhas":
"Doidas, doidas, doidas
Andam as galinhas,
Para pôr os ovos
Lá no buraquinho.
Raspam, raspam, raspam
Para alisar a terra.
Picam, picam, picam
Para fazer os ninhos."
Acompanhe a cantiga com diferentes gestos. Podem cantar outras cantigas em que as
palavras digam respeito a partes do corpo em que têm de tocar ou de mexer.
2. Conceitos espaciais
Os conceitos espaciais respeitam fundamentalmente às noções de à frente, atrás, no
topo, na base, em cima, em baixo, no interior, no exterior, etc. São conceitos
importantes, e a criança tem de compreender-lhes o sentido numa larga gama de
situações. Poderá também ensinar-lhe variantes ou variações desses conceitos, tais
como:
- à frente: diante de, em frente de, defronte, para a frente, em frente (direcção);
- atrás: na parte posterior, por detrás, depois de (numa sequência);
- no cimo: em cima, por cima, no alto, alto, para cima;
- na base: debaixo de, sob, em baixo, baixo, para baixo, no fundo;
- no interior: dentro, em, por dentro, interno, para dentro;
- no exterior: fora, por fora, externo, para fora.
É também preciso ensinar outros conceitos espaciais, tais como: perto de, próximo
de, ao lado de, direita, esquerda, de lado, ao longo de, distante, longe, ao longe,
próximo, vizinho, aqui, ali, contra, no sentido dos ponteiros do relógio (sentido
directo), no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio (sentido retrógrado),
oposto, do outro lado, paralelo, perpendicular, em volta, em direcção a, ao contrário,
intermédio, entre, no meio, centro, diagonal, horizontal e vertical.
Alguns destes conceitos são extremamente difíceis e, por vezes, imprecisos (por
exemplo, um objecto pode "estar ao contrário" de várias maneiras). Logo que os
ensine, aplique-os:
1. À própria criança;
2. À posição da criança em relação a objectos;
3. À posição de certos objectos em relação a outros objectos.
EXERCÍCIOS:
1. Aplicação à criança
Dê ordens à criança; faça-a repeti-las e executá-las.
O educador: Toca na planta do teu pé. Que vais fazer?
A criança: Vou tocar na planta do meu pé. (A criança executa a acção).
O educador: Em que é que estás a tocar?
A criança: Estou a tocar na planta do meu pé.
Outras ordens possíveis:
Deita-te. Rebola-te no chão. Levanta-te. Põe as mãos diante do corpo. Balança o teu
braço no sentido dos ponteiros de um relógio. Mete o teu indicador na boca. Coloca a tua
mão esquerda junto à orelha e a tua mão direita na diagonal do teu corpo. Note que
todas estas instruções se relacionam com o corpo da criança.
2. Posição da criança em relação a objectos
Transmita os mesmos conceitos espaciais, mas relacionando agora a posição da criança
com a de um objecto (caixa, carteira, bola). Dê ordens à criança; faça-a repeti-las e
executá-las.
O educador: Põe as mãos debaixo da carteira. Que vais fazer?
A criança: Vou pôr as mãos debaixo da carteira. (A criança executa a acção).
O educador: Onde estão as tuas mãos?
A criança: Estão debaixo da carteira.
Outras ordens possíveis: Move o teu pé em direcção à parede. Põe a caixa em cima
da cabeça. Mete-te debaixo da mesa. Põe a tua mão em diagonal sobre a carteira.
Note que todas estas instruções fazem intervir uma parte do corpo da criança e um
objecto.
3. Posição relativa de dois objectos
Transmita a posição relativa de dois objectos.
O educador: Põe o livro em cima da carteira. Que vais fazer?
A criança: Vou pôr o livro em cima da carteira. (A criança executa a acção).
O educador: Onde está o livro?
A criança: Está em cima da carteira.
Outras ordens possíveis: Põe a cadeira ao pé da parede. Põe a cadeira do outro lado
da sala, em frente da porta. Põe o teu prato no meio da mesa.
Note que todas estas instruções fazem intervir conceitos de relação espacial entre
dois objectos. Aqui não intervém o corpo da criança.
3. Os conceitos de esquerda e direita
A criança deve ser iniciada nestes conceitos quando ainda pequena, devendo os mesmos
ser constantemente reforçados. Procure utilizar as palavras "direita" e
"esquerda" sempre que possível, de modo a que a criança tome contacto com elas
nas mais variadas situações.
CONCRETAMENTE:
1. Se uma criança tem dificuldade em distinguir a esquerda da direita, ate-lhe um
cordel ou uma fita em redor do pulso esquerdo. Ao dar-lhe as ordens ou instruções,
utilize ambas as palavras: esquerda e fita. "Levanta a mão esquerda - a que tem a
fita." Suprima progressivamente a palavra "fita", servindo-se unicamente de
"esquerda". "Levanta a mão esquerda." Quando a criança já souber
qual é a sua mão esquerda, retire-lhe a fita.
2. Sempre que tiver de referir-se a ambas as palavras, esquerda e direita, comece
sempre por "esquerda". Isso ajudará a construir os conceitos de sentido
utilizados na leitura e na escrita.
3. Não se esqueça de ensinar as noções de esquerda e direita em contextos que
tenham a ver com:
(a) partes do corpo (orelha esquerda, orelha direita),
(b) peças de vestuário constituídas por pares (sandália esquerda e sandália direita),
(c) os lados dos objectos (lado esquerdo da carteira, lado direito da porta),
(d) a colocação de objectos (coloca a tua roupa sobre o lado esquerdo da cama),
(e) os movimentos (vira à esquerda, atira a bola para a direita). Note que os lados
esquerdo e direito dos objectos dependem da posição em que a criança se encontra
relativamente aos mesmos.
4. Faça sentir à criança que, à semelhança do que se passa com ela e com outros
objectos, também as outras pessoas têm um lado esquerdo e um lado direito. Note que,
para as outras pessoas, eles não dependem da posição da criança em relação e elas. A
sua mão esquerda é sempre a sua mão esquerda, seja qual for o lado para que a criança
se encontre voltada. Trata-se de um conceito que pode ser difícil de assimilar pela
criança. De facto, é um conceito que também coloca problemas a inúmeros adultos que
vêem normalmente. Assim, quando se encontrar de frente para alguém, não se esqueça de
que o lado esquerdo dessa pessoa não está do mesmo lado que o seu. Se pretender que ela
se volte para a janela que está à sua esquerda, terá de dizer-lhe: "Volte-se à
direita." A isso chama-se "direccionalidade". Para ensiná-la, comece por
proceder do seguinte modo:
(a) Coloque-se ao lado da criança, atrás ou à frente dela, olhando na mesma
direcção. Peça-lhe que localize e toque em partes do seu corpo (na sua orelha esquerda,
na sua perna direita) ou que lhe passe objectos (Põe a bola na minha mão esquerda.
Coloca o lado esquerdo do livro junto da minha orelha direita.).
(b) Coloque-se de frente para a criança e peça-lhe que localize diferentes partes do
seu corpo. Será agora mais difícil, dado que o seu lado esquerdo se encontrará em
frente ao lado direito da criança.
4. Pontos cardeais
Os pontos cardeais - Norte, Sul, Este e Oeste - são muito importantes pois são sempre
constantes. São independentes da posição em que se encontre a criança. O Norte é
sempre o Norte; ao passo que o lado esquerdo da mesa valia com a posição em que se
encontra a criança. A imutabilidade dos pontos cardeais ajuda as crianças a
orientarem-se nas suas deslocações. É-lhes mais fácil lembrarem-se de uma série de
instruções baseadas nos pontos cardeais do que de uma série de instruções baseadas
nas noções de esquerda e direita. É-lhes igualmente mais fácil, quando se baseiam nos
pontos cardeais, retomar essas instruções começando pela última, de modo a voltarem ao
ponto de partida e estabelecerem itinerários alternativos a seguir em caso de
necessidade.
EXERCÍCIOS:
1. Quando começar a ensinar os pontos cardeais, faça-o usando como referência um
mostrador de relógio. O 12 corresponde ao Norte, o 3 ao Este, etc. Isso ajudará a
criança a dar-se conta da posição relativa das quatro direcções.
2. Nessa fase, procure que a criança se volte sempre para Norte. Ensine-lhe as outras
direcções relativamente a esse ponto cardeal (o Sul é atrás, o Este fica à direita e
o Oeste à esquerda):
(a) Diga à criança para se voltar para os diferentes pontos cardeais, seguindo as
suas indicações. Utilize os termos "esquerda" e "direita"
conjuntamente com os nomes dos pontos cardeais. Faça a criança regressar sempre à
posição inicial (voltada para o Norte) antes de lhe dar uma nova ordem.
(b) Logo que a criança comece a apreender as posições respectivas do Norte, do Sul, do
Este e do Oeste, suprima os termos "direita" e "esquerda" das suas
instruções.
(c) Uma vez que a criança tenha aprendido os pontos cardeais em relação ao Norte, siga
idêntico procedimento com o Sul, o Este e o Oeste.
Se a criança tiver dificuldade em se voltar numa dada direcção, faça-a apontar
nessa direcção antes de se voltar. Talvez ela tenha mais dificuldade em se virar
exactamente 90º e 180º do que em indicar os pontos cardeais.
3. Coloque a criança de frente para o Norte e diga-lhe em que direcção ela se
encontra voltada. Coloque-se diante dela, atrás dela e ao seu lado, e batam as mãos:
(a) Pergunte à criança em que direcção você se encontra em relação a ela. Ela
responde: "Estás a Norte (a Sul, etc.) de mim."
(b) Pergunte à criança em que direcção ela se encontra em relação a si. A criança
responde: "Estou a Sul (a Norte, etc.) de ti." Repare que a direcção utilizada
para responder a cada pergunta será diferente: se você estiver a Norte da criança, ela
estará a Sul de si.
4. Mostre à criança diversos locais da escola ou de casa dela, e situe-os em
relação a este ou aquele ponto cardeal:
- o passeio em frente da escola está orientado segundo a direcção Norte-Sul;
- logo que atravesses a porta, estarás voltada para Oeste;
- quando sentada na tua carteira, estás voltada para Este.
5. Peça à criança que descreva o caminho que percorre para se deslocar de casa até
à escola, utilizando os pontos cardeais em vez das noções de direita e esquerda.
6. Quando estiverem a treinar a orientação e a locomoção, empregue os pontos
cardeais em lugar das noções de esquerda e direita.
7. Enquanto a criança aprende os pontos cardeais, vá-lhe fazendo bastantes perguntas
a fim de reforçar a aquisição dos conceitos:
Se estiveres voltada para Norte, o que é que fica para trás de ti?
Se atravessares a porta e voltares à esquerda, em que direcção te encontras?
Quando atravessas o átrio de entrada da escola, que direcção fica para trás de ti?
8. Fabrique uma bússola para a criança, em papel com as letras em Braille. De cada
vez que se voltar, a criança deverá igualmente voltar a bússola de maneira a que ela
aponte na direcção que fica na sua frente.
5. Conceitos relacionados com aspectos da vida quotidiana
É preciso que uma criança aprenda os conceitos básicos relacionados com a sua vida
quotidiana. Eles ajudá-la-ão a familiarizar-se com o modo como se articula o espaço que
a circunda. Ser-lhe-á assim mais fácil não se perder e planificar os seus itinerários.
Um grande número desses conceitos, como os de rua e de quarteirão, não evocam
configurações sempre idênticas. Há inúmeras variantes, mas a criança tem de
assimilar os conceitos de base antes de poder apreender essas variantes. Um quarteirão,
por exemplo, é fundamentalmente composto por quatro lados e tem a forma de um
rectângulo, mas não é sempre esse o caso; há alguns com três ou cinco lados. Para que
a criança se aperceba dessas variações é preciso, em primeiro lugar, que ela tenha
assimilado a forma de base. A mesma coisa se passa com outros conceitos relacionados com
aspectos da vida quotidiana. Nem todas as ruas são direitas. Nem todos os cruzamentos
têm quatro ângulos. Mas antes que a criança comece a apreender as variantes (ruas que
encurvam, entroncamentos, etc.) é necessário que lhe tenham transmitido os conceitos de
base.
CONCRETAMENTE:
1 . Comece por ensinar à criança os conceitos mais fundamentais:
(a) o passeio ladeia a calçada;
(b) entre o passeio e a calçada existe um bordo, um desnível:
(c) ao lado do caminho há um terreno com ervas;
(d) as ruas e os caminhos têm dois lados;
(e) os cruzamentos são formados pela intersecção de duas ruas ou dois caminhos;
(f) nos cruzamentos e entroncamentos há ângulos.
Transmita esses conceitos utilizando maquetas e esquemas; depois, conduza a criança
aos próprios locais para reforçá-los através da experiência concreta. Diga à
criança para caminhar e tocar no passeio. Peça-lhe que dê uma volta ao quarteirão e
que conte quantos lados tem o mesmo. Diga-lhe que fique de um lado da rua enquanto você
vai para o outro. Fale-lhe de lá, para que ela se dê conta da largura da rua.
2. Inicie a criança em conceitos mais elaborados, utilizando os pontos cardeais:
(a) As ruas são orientadas segundo a direcção Este-Oeste ou Norte-Sul, mas não
segundo Este-Norte.
(b) Uma viatura que circule numa rua orientada segundo a direcção Norte-Sul, só poderá
deslocar-se num desses sentidos (Norte ou Sul); não para Este ou Oeste.
(c) Uma rua tem dois lados. Uma rua orientada segundo a direcção Norte-Sul tem um lado
Este e um lado Oeste. Uma rua orientada segundo a direcção Este-Oeste tem um lado Norte
e um lado Sul.
(d) Os quatro ângulos de um cruzamento são o ângulo Norte-Este, o ângulo Sul-Este,
etc.
(e) Nos países em que se conduz pela esquerda, as viaturas que circulam do lado Oeste de
uma rua orientada segundo a direcção Norte-Sul dirigem-se para Norte e as que circulam
do lado Este da rua, dirigem-se para Sul, etc. É um conceito muito importante para uma
criança que vá começar a utilizar os transportes públicos. É preciso que ela saiba de
que lado da rua se deverá colocar para apanhar um autocarro que vá na direcção que ela
pretende. Transmita estes conceitos utilizando maquetas; depois, conduza a criança aos
próprios locais para reforçá-los. As maquetas podem ser construídas colando réguas
com fita-cola sobre o tampo da carteira, para simular as estradas; as viaturas podem ser
representadas por caixas de fósforos vazias, e os peões por fósforos. Abra ligeiramente
as caixas de fósforos para assinalar a parte da frente do veículo.
3. Uma vez que a criança tenha compreendido os conceitos fundamentais relacionados com
aspectos da vida quotidiana, poderá começar a iniciá-lo nas respectivas variantes:
(a) Nem todas as ruas são orientada exactamente segundo a direcção Norte-Sul.
(b) Há entroncamentos em T e entroncamentos irregulares.
(c) Certos cruzamentos incluem rotundas.
(d) Em certos países, os veículos podem virar à direita nos sinais vermelhos.
Transmita estes conceitos utilizando igualmente maquetas e esquemas: deslocando-se
depois com a criança aos próprios locais.
3. O ÁBACO
Programa Suplementar n.º 3
O ábaco, criado na Ásia, é uma calculadora manual. Só recentemente ele foi adoptado
pelos cegos. Com o treino, é possível utilizá-lo para efectuar adições,
subtracções, multiplicações, divisões, cálculo decimal e operações envolvendo
percentagens e fracções, bem como obter raízes quadradas. Existe uma belíssima obra em
inglês para o ensino das diferentes utilizações do ábaco: THE ABACUS
MADE EASY, de Mae E. Davidow, 1978. Este livro é editado pela American
Printing House for the Blind. Nele se explica cada etapa das diferentes operações e é
fácil de seguir. Muitas são as razões que poderão incitá-lo a ensinar as crianças
deficientes visuais a servirem-se do ábaco. O emprego deste instrumento pode, com efeito,
facilitar a aprendizagem:
1 . reforçando os conceitos matemáticos;
2. contribuindo para tornar a matemática mais concreta e interessante;
3. permitindo encontrar mais rapidamente as soluções correctas dos problemas de
Matemática;
4. ajudando a desenvolver os movimentos finos dos dedos.
Ao ensinar a utilizar o ábaco, é preciso não esquecer:
1. Familiarizar o aluno com esse instrumento antes de começar a ensiná-lo a resolver
problemas de matemática. Mande-o contar-lhe as bolas e exercitar-se no seu manuseamento.
2. Usar de paciência e proceder por etapas. Fazer a criança exercitar-se até ter
assimilado completamente uma etapa antes de mandar passar à seguinte.
3. Utilizar uma linguagem simples e uniforme. Por exemplo, preferir o termo
"compor" a "escrever", empregando-o como se segue: "compõe o
número 40 e subtrai-lhe 10". Empregue sistematicamente essa palavra. Não utilize
ora "compor", ora "escrever", ora outra expressão qualquer.
4. Verificar se o aluno coloca correctamente as mãos sobre o ábaco. O indicador esquerdo
deverá estar sempre imediatamente à esquerda do indicador direito.
5. Redigir o enunciado de todos os problemas de Matemática e resolvê-los você próprio
no ábaco, antes de os dar ao aluno. Terá assim a certeza: (a) de que sabe como o
problema deverá ser resolvido; e (b) que não deu, inadvertidamente, à criança um
problema que inclua alguma operação que ela não tenha ainda aprendido. Se ela estiver,
por exemplo, a aprender a adição, tenha o cuidado de não lhe dar um problema que
implique uma operação mais complexa.
6. Seguir a progressão do livro de matemática do aluno. Assim, terá a certeza de seguir
uma ordem lógica e de não introduzir noções de matemática que não foram ainda
ensinadas nas aulas.
7. Se outros alunos da turma manifestarem interesse pelo ábaco, mostre-lhes como
funciona. Ensine um pequeno grupo de crianças (em que a cega esteja incluída) a
servir-se dele. Isso contribuirá para dar à criança cega o sentimento de fazer parte do
grupo e evitar-lhe-á a sensação de ter de aprender algo que as outras crianças não
têm necessidade de saber. Por outro lado, isso também ajudará as outras crianças a
melhorarem os seus conhecimentos matemáticos.
8. Verificar se a criança resolve os problemas simples através do ábaco, e não
mentalmente. Ela irá necessitar de conhecer os princípios básicos do funcionamento do
ábaco quando tiver de resolver problemas mais complexos.
9. Pedir à criança que aprenda de cor os "segredos" ou as "regras"
do ábaco, como se faz com a tabuada.
10. Não esquecer, por fim, que só à custa de treino, a criança dominará o ábaco.
NOTA: Mesmo se o ábaco não for o
auxiliar principal de que a criança se sirva em Matemática, a sua utilização poderá,
de qualquer modo, ser-lhe ensinada. Constitui um excelente meio de apreender e assimilar
os conceitos matemáticos.
4. LEITURA E ESCRITA DO BRAILLE
Programa Suplementar n.º 4
Esta secção abordará as seguintes questões:
A - O desenvolvimento do sentido do tacto antes da aprendizagem
do Braille.
B - Exercícios preparatórios da aprendizagem do Braille.
C - A mecânica da leitura do Braille.
D - O alfabeto Braille:
1. O ensino oral do alfabeto;
2. O ensino do alfabeto escrito.
E - A leitura do Braille:
1. O método global aplicado às palavras conhecidas;
2. As palavras novas;
3. O contexto.
F - O Braille abreviado
G - A pauta e o punção
A - O DESENVOLVIMENTO DO SENTIDO DO TACTO
ANTES DA APRENDIZAGEM DO BRAILLE
Antes de começar a aprender a ler e a escrever em Braille, a criança tem de apurar a
sua percepção táctil e de se habituar a utilizar os dedos com destreza. Se ele não
souber servir-se muito bem das mão, há que treiná-la antes de iniciá-la no alfabeto
Braille. Recorra aos exercícios sugeridos quando tratámos do sentido do tacto na
secção dedicada à educação sensorial. Lembre-se que o desenvolvimento do tacto exige
tempo e exercícios variados.
Importa também, nesta fase, que a criança comece a tomar consciência da linguagem
escrita (Olson). As crianças que vêem tomam consciência dela muito cedo. Elas vêem os
pais a ler o jornal. Vêem símbolos escritos quando passeiam, quando brincam. Ainda que
não saibam o que as letras significam, começam a compreender que elas existem e que os
objectos têm um nome que pode ser escrito. A criança deficiente visual não possui esse
trunfo. Para despoletar essa tomada de consciência, será útil colar etiquetas em
Braille sobre diversos objectos. Cole nas costas de uma cadeira uma etiqueta em Braille
onde esteja escrita a palavra "cadeira". Faça o mesmo com a cama da criança, a
escova de dentes, a porta da casa, etc. Os pais deverão indicar-lhe onde se encontra a
etiqueta e insistir para que a toque. A criança não será capaz de lê-la, mas
começará a aperceber-se de que o Braille existe e que pode ser utilizado para escrever o
nome dos objectos.
Será igualmente útil que transcreva para Braille um livro de histórias para a
criança. Escreva os caracteres Braille por cima das letras a negro. Assim, a criança
poderá seguir, linha por linha, a história que o pai ou a mãe lhe vai lendo. Ao
princípio, será porventura necessário que o adulto coloque as mãos da criança sobre o
Braille e as faça deslizar ao longo das linhas à medida que vai lendo o texto. Essas
duas actividades ajudarão a criança a familiarizar-se com o Braille e contribuirão para
que tome consciência da existência de uma linguagem escrita.
B - EXERCÍCIOS PREPARATÓRIOS DA APRENDIZAGEM DO BRAILLE
Uma vez que a criança tenha desenvolvido a sua capacidade de discriminação táctil e
a destreza dos dedos, faça-a executar diversos exercícios antes de a iniciar no Braille.
Dessa forma, a criança treinar-se-á a:
1. deslocar as mãos da esquerda para a direita
2. localizar os pontos
3. diferenciar os pontos
4. apurar o seu sentido do tacto.
Estes exercícios são muito úteis e podem anteceder a aprendizagem do Braille, quer
tratando-se de crianças, quer de adultos. Eles ajudam a fazer uso das mãos e estimulam a
sensibilidade táctil necessária à apalpação dos pontos, sem exigirem que se saiba que
letras eles representam. Acontece muitas vezes que, sem estes exercícios, a pessoa que
aprende a ler Braille nunca consegue mover correctamente as mãos, o que é importante
para aumentar a rapidez da leitura. Ela passa o tempo a tentar identificar os pontos
inscritos em cada rectângulo e não tem a possibilidade de adquirir um bom movimento das
mãos. Pode-se realizar estes exercícios antes de aprender o alfabeto Braille, e depois,
como "aquecimento" antes de cada lição de leitura.
As folhas de exercícios são fáceis de produzir. Se os pontos se esbaterem, faça-as
de novo. Isso levar-lhe-á escassos minutos. Procure evitar dar erros. O exercício
tornar-se-á mais difícil para a criança se ela tiver de distinguir os pontos das marcas
da borracha. Os pontos deverão estar limpos e nitidamente marcados. Lembre-se ainda de
que estes exercícios não se destinam a ensinar o alfabeto Braille, pelo que deverá
abster-se de referir o nome das letras.
Exercício A - Seguir as linhas em Braille:
Numa folha, trace quatro linhas em Braille de comprimentos diferentes, usando os pontos 3
e 6. Peça à criança que conte o número de linhas: que indique a mais longa, a mais
curta, etc. Prepare outras folhas com maior número de linhas. Peça à criança que as
siga pelo tacto, deslocando as mãos da esquerda para a direita.
Exercício B - Seguir a linha em Braille e indicar as descontinuidades:
Repita o exercício A, mas introduzindo agora uma descontinuidade de quatro células em
cada linha. Peça à criança para seguir as linhas e indicar onde se encontram as
descontinuidades. Prepare outras folhas com mais de uma descontinuidade por linha e com
descontinuidades mais pequenas (duas células em vez de quatro).
Exercício C - Seguir a linha em Braille e indicar qual o ponto mal colocado:
Trace quatro linhas em Braille, utilizando o ponto 3. Em cada uma das células, substitua
(uma só vez) o ponto 3 pelo 1. Peça à criança que indique a localização do ponto mal
colocado. Prepare outras folhas com maior número de linhas por página e maior número de
pontos mal colocados por linha. Peça à criança que descubra os "intrusos".
Exercício D - Seguir a linha em
Braille e identificar a forma mal colocada:
Exercício análogo ao anterior, mas em que utilize, em vez de uma linha em Braille, os
pontos 1, 2 e 3, e como ponto mal colocado, o ponto 2, ou os pontos 1 e 4. Prepare outras
folhas com maior número de linhas por página e diferentes combinações de pontos para
as formas fundamentais (1, 2, 4, 5), (1, 3, 5), (1, 3, 4, 6, etc.
Exercício E - Seguir a linha em Braille e contar os pontos:
Numa folha, trace quatro linhas em Braille de comprimentos diferentes, com a seguinte
sequência: ponto 1, dois espaços, ponto 1, dois espaços, etc. Peça à criança para
contar o número de pontos em cada linha. Trace outras linhas com outros conjuntos de
pontos (1, 2, 3, etc.) e sem deixar nenhum espaço entre as células.
Exercício F - Seguir a linha em Braille e dizer quantos rectângulos contêm pontos:
Trace uma linha composta pelo ponto 1 e por pontos 1 e 3, deixando dois espaços entre
cada duas células preenchidas. Peça à criança para contar o número de pontos em cada
rectângulo (um ou dois). Prepare outra folha, combinando o ponto 1; os pontos 1 e 3; e os
pontos 1, 3 e 5: e deixando um espaço entre cada duas células preenchidas.
Exercício G - Seguir a linha em Braille e contar todas as formas semelhantes à
primeira, ou encontrar a forma que é (ou não é) semelhante à primeira:
Trace linhas em Braille constituídas por seis células preenchidas, deixando dois
espaços entre cada duas delas. Utilize o ponto 1 para a primeira célula e para três
outras. Para os dois rectângulos restantes, utilize os pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 6. Peça à
criança para contar todas as formas semelhantes à primeira, ou para dizer, uma a uma, as
formas que são idênticas à inicial e as que são diferentes. Prepare outras folhas com
diferentes combinações de pontos a servirem de primeira forma.
Exercício H - Seguir a linha em Braille e indicar se os pontos se encontram dispostos
vertical ou horizontalmente:
Prepare uma folha com uma combinação de pontos 1 e 3 dispostos segundo a vertical e
pontos 1 e 4 segundo a horizontal. Deixe dois espaços entre cada formação de pontos.
Peça à criança para indicar se os pontos se encontram dispostos vertical ou
horizontalmente. Se ela tiver dificuldade em indicar se os pontos 1 e 4 se encontram
dispostos horizontalmente, experimente utilizar uma combinação de duas células, com o
ponto 4 na primeira delas e o ponto 1 na segunda. A criança terá assim um pouco mais de
espaço entre os pontos. Prepare outras folhas com os pontos 1 e 2 para a vertical, ou
experimente utilizar os pontos 1 e 6 ou 1 e 5 para os "caminhos que descem" e os
pontos 3 e 4 ou 2 e 4 para os "caminhos que sobem". Não se esqueça de fazer
também a criança executar estes exercícios, como "aquecimento", mesmo depois
de ela já ter começado a aprender a ler Braille. Peça-lhe para mover as mãos mais
depressa, e para tactear a folha com maior ligeireza a fim de se habituar a reconhecer
rapidamente os caracteres. É indispensável para aumentar a velocidade de leitura.
C - A MECÂNICA DA LEITURA DO BRAILLE
Ao começar a aprender Braille, uma criança deverá adquirir os seguintes hábitos
(Orson):
1. Manter uma boa postura
2. Ter bons movimentos das mãos
3. Ter uma boa posição dos dedos
4. Tactear com leveza.
CONCRETAMENTE:
1. Certifique-se de que a criança esta sentada com as costas bem direitas e de que o
texto em Braille está a uma altura cómoda. Se a carteira for demasiado alta, a criança
ver-se-á obrigada a erguer-se para manusear o livro, o que a fatigará.
2. Verifique a posição das mãos e dos dedos da criança. O Braille lê-se com a ponta
dos dedos. Os dedos devem estar ligeiramente flectidos e os pulsos um pouco
sobre-erguidos. Se os pulsos estiverem apoiados no livro, a criança não poderá
movimentar rapidamente as mãos sobre a página. Os dedos devem estar ligeiramente
flectidos e tocar levemente no texto. Se a criança não flectir os dedos, coloque um
livro sob a linha de Braille que ela estiver a ler. O livro deverá ter uma espessura
comparável ao comprimento da falangeta. Dessa forma, a criança terá de dobrar
ligeiramente a sua falangeta para conseguir tocar nos caracteres.
3. Assegure-se de que a criança utiliza as duas mãos para ler. Embora dois ou três
dedos sejam suficientes para ler a maior parte dos caracteres Braille, os outros
dar-lhe-ão diversas indicações: comprimento de uma palavra, distância que falta para o
fim da linha, etc. Servindo-se de ambas as mãos, ela será também capaz de encontrar
mais rapidamente a linha seguinte. Inúmeras crianças gostam de ler só com um dedo. É
preciso dissuadi-los, pois isso implica uma leitura muito lenta.
4. Peça à criança que toque levemente nos pontos. Não deve exercer, sobre eles, uma
grande pressão, nem tentar "esfregá-los". Para habituá-la a tocá-los com
leveza, polvilhe-lhe os dedos com pó de giz. Diga-lhe depois para seguir as linhas de um
livro em Braille até todo o pó ter desaparecido. Repita várias vezes este exercício, e
veja se a criança vai sendo capaz de percorrer cada vez mais linhas antes de o giz lhe
desaparecer dos dedos.
5. Procure levar a criança a não mover os lábios enquanto lê. É um mau hábito que
lhe retardará a leitura. Diga-lhe que coloque uma régua ou um lápis entre os dentes
enquanto lê. Ou que masque uma pastilha elástica. Isso impedi-la-á de mover os lábios
enquanto lê. Muitas crianças adquirem esse mau hábito por não lerem senão em voz
alta, diante do professor. Procure reduzir a duração dessas leituras em voz alta.
Poderá encontrar outros meios de saber se a criança compreende o que lê; por exemplo,
colocando-lhe questões depois de ela ter lido uma história em silêncio.
6. Faça-a praticar os movimentos das mãos e a passagem rápida de uma linha para outra.
Peça à criança que siga as linhas de um livro em Braille durante um minuto. Conte o
número de linhas percorridas. Faça a criança repetir este exercício, pedindo-lhe que
desloque as mãos cada vez mais depressa. A criança não precisa de decifrar o que nelas
está escrito; tem apenas de tocar e seguir as linhas. Isso ajudá-la-á a acelerar os
movimentos das mãos. Este exercício deverá ser repetido em cada lição de Braille.
D - O ALFABETO BRAILLE
1. O ensino oral do alfabeto
A criança deve aprender o alfabeto oralmente, antes de começar a aprender as letras
em Braille. Utilize canções e jogos baseados no alfabeto. À medida que aprende o
alfabeto, a criança deve aprender também o som das letras. Deve aprender que
"A" se pronuncia "a", que "V" se pronuncia "vê",
etc. Esse é um aspecto particularmente importante:
(a) dar-lhe-á conhecimentos fundamentais que serão utilizados na leitura;
(b) ajudá-la-á a melhorar a suas aptidões de leitura;
(c) aumentará a sua capacidade de "saber ouvir".
EXERCÍCIOS:
1. Faça com a criança o seguinte jogo: Dê-lhe uma palavra e pergunte-lhe por que som
e por que letra ela começa.
O educador: "Por que letra começa a palavra sabão?"
A criança: "A palavra sabão começa pelo som s-s-s, que é o da letra S."
Dê um objecto à criança e pergunte-lhe por que letra começa.
2. Repita o exercício anterior, mas perguntando à criança qual é a última letra da
palavra.
O educador: "Por que letra termina a palavra funil?"
A criança: "A palavra funil termina com o som il-l-1-1 que pertence à letra
L."
3. Dê uma letra à criança, e peça-lhe que lhe diga cinco palavras começadas por
essa letra: B = bola, barco, botão, bombom, batata.
4. Dê à criança três palavras, duas das quais comecem pelo mesmo som e a terceira
por um som diferente. Peça-lhe que identifique a palavra diferente:
bola, jogo, barco.
serpente, dança, dedo.
Aumente, progressivamente, o número de palavras. Faça o mesmo exercício mas com os
sons finais.
cor, dureza, grandeza.
pescoço, mão, joelho.
NOTA: Todos estes exercícios podem ser executados seja em que língua for. Não
necessita de empregar o Português. Dê à criança palavras na sua própria língua;
invente-as.
5. Jogue ao alfabeto.
O educador: "Eu vou ao mercado comprar um..." (um produto cujo nome comece
pela letra A, como "alperce").
A criança: (repete o que disse o educador e acrescenta-lhe uma outra palavra, começada
por B) "Eu vou ao mercado comprar um alperce e uma banana." O jogo prossegue. O
educador retoma as duas palavras encontradas e acrescenta-lhes uma nova, começada pela
letra C. O jogo termina quando um dos dois, o educador ou a criança, se enganar.
2. o ensino do alfabeto escrito
Há duas maneiras de ensinar o alfabeto Braille:
1 . Ensine as letras seguindo a sua ordem alfabética - A, B, C, ... até Z, e depois
as letras afectadas de sinais diacríticos - à, á,...
2. Ensine as letras começando pelas mais facilmente reconhecíveis pelo tacto, como o A,
o K, o O e o L, e depois as combinações de pontos mais difíceis.
Se um destes dois métodos não der bons resultados, experimente o outro. Tenha o
cuidado de:
(a) não avançar demasiado depressa ou ensinar demasiadas letras ao mesmo tempo - caso
contrário, a criança confundi-las-á;
(b) não ensinar, em simultâneo, letras em que uma seja o inverso da outra - por exemplo,
o E e o I, ou o H e o J;
(c) ensinar a escrever as letras, ao mesmo tempo que ensina a lê-las;
(d) pedir à criança para escrever palavras, e não apenas letras. Logo que ela saiba
escrever as primeiras seis letras do alfabeto, já poderá começar a escrever palavras
como, por exemplo: aba, baba, faca, face, fada, cada, abade.
Escolha palavras que a criança conheça e utilize. Deverá ensiná-la a soletrá-las.
É possível que nem sempre ela consiga fazê-lo correctamente, mas isso pouco importa. O
objectivo é fazer com que a criança se vá, pouco a pouco, habituando a escrever coisas
e não apenas letras.
EXERCÍCIOS:
1. Prepare cartas sobre as quais irá escrever letras em Braille. Destaque o canto
superior esquerdo da carta, ou inscreva uma linha de caracteres Braille por baixo das
letras, para a criança saber a posição em que deve utilizá-las. Caso contrário, não
se poderá distinguir certas letras como o F e o D, ou o H e o J. Escreva ainda na carta a
respectiva letra a negro, para verificar mais rapidamente se a criança leu correctamente
a letra em Braille.
2. Prepare folhas com letras que a criança conheça. Peça-lhe que as leia tão depressa
quanto possível. Cronometre a leitura a fim de ver se ela consegue ir aumentando a sua
velocidade.
3. Construa um jogo de loto em Braille. Escreva, em cada cartão, as letras em Braille e a
negro, para que a criança cega possajogar ao loto com os seus amigos não cegos. O jogo
do loto pode ser utilizado para ensinar os números, as palavras, o Braille abreviado e
problemas de matemática.
E - A LEITURA DO BRAILLE
A criança deverá ser iniciada na leitura desde o momento em que começa a aprender a
escrever o alfabeto Braille. O ensino da leitura do Braille visa desenvolver as mesmas
capacidades que a leitura de textos impressos. É ao professor que compete o ensino da
leitura, mas você poderá também contribuir de vários modos.
CONCRETAMENTE:
1. Escreva letras a negro por cima das letras em Braille, para permitir a quem o esteja
a ensinar ir seguindo o aluno à medida que ele lê.
2. Certifique-se de que a criança vai utilizar o mesmo livro que os seus colegas de
turma.
3. Verifique se o livro se encontra adaptado à experiência e à cultura da criança.
Se o livro falar de uma ida ao mercado, trate de saber se a criança já teve oportunidade
de fazê-lo. Se não, leve-a a um mercado, para que ela descubra do que se trata, quais os
seus cheiros característicos, etc.
4. Se utilizar um livro suplementar para dar lições particulares à criança,
certifique-se de que o mesmo se encontra adaptado à experiência dela. Se o livro falar
de elefantes e camelos, que a criança nunca viu nem tocou, tem três possibilidades:
(a) não utilizar esse livro e escolher outro mais adaptado;
(b) rescrever o livro, fazendo intervir nele animais que a criança conheça bem, como
porcos e galinhas;
(c) explicar à criança o que são elefantes e camelos.
5. Se não houver nenhum livro a ser utilizado na classe, deverá escrever um. É assim
que muitos professores ensinam a leitura aos seus alunos. Organiza-se uma actividade para
a turma: um passeio, por exemplo. Depois, os alunos descrevem-no por escrito. Se o
professor utiliza este método, providencie para que a narração ou o relatório que a
turma elaborou por escrito acerca da saída efectuada lhe seja entregue, e transcreva-a
para Braille logo que possível. Certifique-se, entretanto, de que a descrição:
(a) emprega termos que estão de acordo com experiência da criança:
(b) emprega palavras e frases simples;
(c) repete vária vezes as palavras fundamentais.
1. O método global aplicado às palavras conhecidas
À medida que as crianças aprendem a ler, devem exercitar-se no reconhecimento global
das palavras fundamentais sem terem de decifrá-las letra por letra. O mesmo se deverá
passar com as crianças que lêem Braille. Logo que tocam um certo grupo de letras
(pontos), elas reconhecem a palavra sem identificarem cada letra. Quando as crianças não
são capazes de aplicar este método, e lêem as letras uma por uma, fá-lo-ão muito
lentamente e terão dificuldade em ler. Quando acabam de decifrar uma palavra, já terão
esquecido a anterior.
CONCRETAMENTE:
1. Esforce-se no sentido de que certas palavras sejam frequentemente repetidas. Elas
podem ser utilizadas nas lições de leitura, de ortografia e de escrita.
2. Peça à criança que leia a mesma história ou o mesmo texto repetidas vezes. Mesmo
que se tenha a impressão de que ela acaba por recitar a história em vez de lê-la, isso
ajuda-a a desenvolver a sua capacidade de leitura global. Utilize as mesmas palavras em
histórias diferentes e peça à criança que releia várias vezes os mesmos textos.
3. Escreva palavras fundamentais (palavras-base) em cartões. Peça à criança que as
leia tão depressa quanto lhe seja possível. Cronometre a leitura a fim de ver se ela
consegue ir aumentando a sua velocidade.
4. Quando a criança acabar de ler um livro, peça-lhe que o releia, mas, desta vez,
concentrando-se unicamente na rapidez. Isso ajudá-la-á a movimentar as mãos cada vez
mais depressa.
5. Utilize, logo que possível, o Braille abreviado, a fim de a criança tomar contacto
com as palavras na forma em que sempre as irá encontrar. O símbolos podem ser
rapidamente apresentados à criança e por ela aprendidos. Os símbolos correspondentes a
"para", "e", "que", "tudo"
podem também ser ensinados logo que encontrados, para engrossarem o número de palavras
que a criança reconhece globalmente.
2. As palavras novas
A criança deve habituar-se a descobrir por si própria as palavras que não conhece.
Um dos meios de o conseguir é pronunciá-las. É muito importante empregar este método
porque ele ajuda a criança a reconhecer palavras novas por si mesma, o que lhe permitirá
melhorar a sua capacidade de escrita.
A criança deve começar a aprender a pronúncia das palavras desde os primeiros
estádios de aprendizagem preparatórios da leitura. Deverá aprender os sons fundamentais
das letras ao mesmo tempo que aprende o alfabeto. Logo que conheça os sons das letras do
alfabeto, inicie-a nos sons correspondentes à associação de duas letras, como
"nh", "lh" "gr", "fr"; depois, de três letras,
como "pra", "gru", "dis", etc. Repare que muitos destes sons
correspondentes a duas ou três letras, se escrevem em Braille por meio de um símbolo de
abreviatura ortográfica. O momento próprio para começar a ensinar-lhe esses símbolos
dependerá da idade da criança e do seu nível de capacidade de leitura. Recorra aos
exercícios anteriormente sugeridos para o ensino oral das letras do alfabeto e
respectivos sons.
CONCRETAMENTE:
1. Dê à criança uma lista de palavras novas e peça-lhe que as pronuncie. Ajude-a,
escrevendo as palavras com um intervalo a separar cada sílaba. Em certas línguas, as
letras podem ter sons diferentes conforme a palavra em que se encontrem. Em Português, a
letra A não se pronuncia da mesma maneira em "taco" e em "lupa".
Outras línguas há, no entanto, em que as letras têm sempre o mesmo som. Em Indonésio,
por exemplo, o A pronuncia-se sempre aberto como em "taco".
2. Dê à criança três ou quatro sons e peça-lhe para combiná-los de forma a compor
uma palavra.
3. Dê à criança uma palavra e peça-lhe para encontrar uma outra que rime com ela.
bala = mala, sala, pala.
4. Sempre que, no decurso de uma leitura, a criança encontre uma palavra que não
conheça, ajude-a a pronunciá-la em vez de lhe dizer o que é.
3. O contexto
O contexto geral de uma mensagem pode permitir subentender certas palavras que o
compõem. Procure habituar a criança a fazê-lo, pedindo-lhe que execute os exercícios
que sugerimos a seguir.
EXERCÍCIOS:
1. Após a criança ter lido uma história, apague algumas das principais palavras que
nela intervinham. Peça-lhe que releia a história tentando repor as palavras que lhe
faltam.
2. Escreva frases omitindo uma palavra. Assegure-se de que o resto da frase ajuda a
descobrir a palavra que falta. Peça à criança para encontrar essa palavra relendo a
mensagem para reflectir no seu conteúdo.
O João está doente. Ele vai ao...
Eu gosto de... Eles têm muito açúcar e fazem-me mal aos dentes, mas eu gosto deles
mesmo assim.
3. Quando, no decurso de uma leitura, a criança encontrar uma palavra que não
conhece, diga-lhe que passe adiante e leia o resto da frase. Ele poderá tentar descobrir
a palavra através do contexto.
F - O BRAILLE ABREVIADO
O Braille abreviado deve ser ensinado tão cedo quanto possível. Ele ajudará a
criança a melhorar a sua apetência para a leitura e a ler mais depressa. Aprender a
escrever e a ler uma palavra apresentada sob uma forma não abreviada, memorizá-la
globalmente, e depois aprender a lê-la e a escrevê-la sob uma nova forma, desorientará
a criança. Ela é forçada a aprender uma coisa que depois terá de
"desaprender" para aprender uma outra de novo. Ensine-lhe logo à primeira o que
ela deve saber, e evitar-lhe-á este tipo de complicações. E isto é tão válido para o
Inglês como para o Árabe, o Francês ou o Alemão. Se a língua comportar uma ortografia
abreviada, utilize-a.
Para inúmeros educadores, começar por aprender o Braille abreviado terá
repercussões negativas na ortografia. É, em parte, verdade; mas isso não significa que
seja necessário evitar o abreviado. Simplesmente, deverá ensinar a ortografia correcta
das palavras abreviadas, nas lições de ortografia. Muitos símbolos não sofrem qualquer
alteração (o "tb" de também, por exemplo). Poderá ensinar os
símbolos representativos das palavras inteiras, durante as lições de ortografia.
Certos educadores dizem que o Braille abreviado é demasiado difícil para as crianças
mais pequenas. Eles pensam, com razão, que há demasiadas coisas para aprender. Mas
esquecem-se de que muitos dos símbolos não figuram nos livros de leitura elementares,
cujo vocabulário é limitado. Não encontraremos termos como "personalidade" ou
"presentemente" nos primeiros livros de leitura. Não terá, pois, necessidade
de ensinar as formas abreviadas correspondentes a palavras que só muito mais tarde
aparecerão nos livros da criança. Deverá ensinar apenas os símbolos usados nos livros
em que a criança aprende a ler no momento.
Alguns educadores não gostam de ensinar o Braille abreviado porque não o dominam
suficientemente bem e têm consciência disso. Isso não é um modo correcto de tratar a
criança. O educador deveria consagrar mais do seu tempo a rever o Braille abreviado, ou
escrever os símbolos numa folha de papel para consultá-los em caso de dúvida.
Ensine o Braille abreviado logo desde o início. Faça uma lista dos símbolos que a
criança aprendeu. Se ela encontrar um que não conheça, reporte-se a essa lista. Se ela
simplesmente o tiver esquecido, reveja-o com ela. Se nunca o tiver aprendido, ensine-lho.
Não é justo permitir que uma criança se debata com uma coisa que não lhe foi ensinada.
Se ela não aprendeu um símbolo, diga-lhe o que ele significa, e peça-lhe que continue a
ler a história.
G - A PAUTA E O PUNÇÃO
Por muito desembaraçada que seja a criança a escrever na máquina Braille, ela
deverá aprender a servir-se da pauta e do punção. Na maior parte dos casos, a máquina
que utiliza durante a sua escolaridade não lhe pertence. Pertence à escola, e nela
ficará depois da criança dela sair. Uma máquina de escrever Braille é cara, e o seu
custo ultrapassa as possibilidades financeiras da maioria das famílias. Se a criança
tiver acesso a uma máquina Braille durante o seu período de escolaridade, perfeito! Mas
isso não significa que não deva aprender a utilizar também a pauta e o punção.
5. LIVROS GRAVADOS
Programa Suplementar n.º 5
Podemos aumentar o número de conhecimentos à disposição da criança
deficiente visual, gravando livros em cassetes audio. Os livros gravados apresentam
diversas vantagens:
1. A gravação de livros não exige nenhuma formação especial.
2. É mais fácil e mais rápido gravar um livro do que transcrevê-lo para Braille.
3. Os livros gravados ensinam a "ouvir" melhor.
4. Ouvir um livro leva menos tempo do que lê-lo em Braille.
Os livros gravados têm também dois inconvenientes:
1. Não ajudam a aprender a ler.
2. Neles, é mais difícil compreender problemas de matemática, gráficos, etc., dado
serem apresentados oralmente.
Por consequência, todos os manuais escolares básicos deverão ser transcritos, seja
para Braille, seja para caracteres ampliados. Os livros gravados podem servir como
leituras suplementares".
Regras a observar na gravação de um livro:
1. Existem vários tipos de gravadores e de fitas magnéticas. O tipo de aparelho mais
corrente é o leitor e gravador de cassetes. É o que normalmente se utilizará para
gravar livros, preferencialmente em relação aos modelos de bobina:
2. Escolha uma sala calma para efectuar as gravações. Feche as portas e as janelas
para evitar qualquer ruído de fundo:
3. Leia-o ou, pelo menos, dê "uma vista de olhos" pelo livro antes de
começar a gravá-lo. Isso familiarizá-lo-á com o respectivo conteúdo e adverti-lo-á
quanto à presença de palavras difíceis;
4. Comece cada cassete pelas seguintes indicações:
(a) título do livro;
(b) nome do autor;
(c) data de publicação;
(d) número e lado da cassete;
(e) deixe uma margem livre de uns 15 segundos antes de iniciar a leitura do livro.
Preenchê-la-á após ter terminado a gravação desse lado da cassete, com a seguinte
indicação: "este lado da cassete reproduz as páginas .... a .... do texto
impresso." É importante que estas indicações figurem no início de cada cassete. O
ouvinte saberá assim de que livro se trata e disporá de algumas informações básicas a
respeito do mesmo.
5. Se lhe acontecer tossir ou necessitar de aclarar a voz durante a gravação de um
livro, apague a correspondente zona da fita e volte a gravar a passagem. Esses ruídos
não deverão figurar na gravação porque distraem consideravelmente o ouvinte.
6. Leia a uma velocidade normal e no tom habitual da leitura. Não tente
"representar" a história, empregando diferentes vozes para diferentes
personagens. Não junte ao texto efeitos dramáticos, como suspiros, gritos ou outras
manifestações de emoção. Só um actor experiente se consegue sair bem desse tipo de
exercício.
7. Não se dirija à criança num tom condescendente e evite "falar à bebé"
quando ler histórias para crianças. Não introduza frases do género: "Agora,
senta-te e abre bem os ouvidos porque te vou ler uma história..."
8. Soletre todos os nomes próprios difíceis (que designem lugares ou pessoas) quando
os ler pela primeira vez.
9. Sempre que encontre no texto uma imagem ou um esquema útil à compreensão do
livro, explique-o por palavras. Prepare antecipadamente, por escrito, essa explicação a
fim de tê-la preparada no momento da gravação. Se a imagem tiver apenas intuitos
decorativos, não comportando qualquer informação adicional relevante, ignore-a.
10. Não altere uma única palavra do livro! Leia-o exactamente tal como ele está
escrito. Se o texto contiver palavrões que se recuse a ler, peça a uma outra pessoa que
grave o livro. Não efectue nenhuma gravação com omissões. Também não introduza
modificações no enredo da história. Mesmo que tenha um fim triste, isso não lhe dá o
direito de transformá-lo num fim feliz. Lembre-se de que você não é o autor, nem o
editor da publicação, nem censor. O seu papel consiste apenas em reproduzir fielmente o
texto, aquando da gravação do livro.
11. Não junte efeitos sonoros ao texto. Eles distraem consideravelmente o ouvinte. Os
efeitos sonoros resultam bem num programa radiofónico; não num livro gravado.
12. Uma fita magnética nunca deve terminar a meio de uma frase ou de um parágrafo.
13. Quando finalizar a gravação, coloque em cada cassete uma etiqueta indicando, em
Braille e a negro: número da cassete/número total de cassetes gravadas com a obra em
causa. Essas indicações permitirão a si e ao ouvinte verificarem se têm toda a
sequência das cassetes do livro.
14. Não se esqueça de voltar atrás, para indicar no início da fita - nos tais 15
segundos reservados para o efeito - os números das páginas gravadas na cassete.
15. Certifique-se de que a criança sabe trabalhar com o gravador.
16. Peça a outras pessoas que gravem livros por si. Assim, poupará tempo. Assegure-se
de que esses colaboradores compreenderam e observaram as regras aqui expostas.
6. A ESCRITA A NEGRO
Programa Suplementar n.º 6
A maioria dos educadores de crianças cegas negligencia esta importante dimensão da
formação. Eles crêem que uma criança totalmente cega não tem necessidade de aprender
a escrever a negro, e que uma com visão reduzida aprenderá automaticamente a escrever
bem. Estão enganados. Qualquer que seja a condição da sua vista, todas as crianças
têm necessidade de praticar neste domínio.
1. Aprendizagem da escrita por crianças totalmente cegas
Não é necessário ensinar todas as letras do alfabeto a uma criança totalmente cega.
Bastará que ela aprenda, para começar, as letras que compõem o seu nome, a fim de poder
assiná-lo. Isto aplica-se, aliás, também aos cegos adultos. Não há razão para que um
cego seja obrigado a assinar com uma cruz ou apondo a sua impressão digital. Ter de agir
assim dá, aos outros e a si próprio, a impressão de ser um ignorante.
Se uma criança que já saiba assinar, mostrar desejo de aprender outras letras, há
que ensinar-lhas. Isso poderá talvez vir até a permitir-lhe escrever pequenas notas
destinadas a pessoas não cegas.
Não é fácil ensinar uma criança cega a escrever, pois a escrita faz apelo à vista.
Uma criança cega não está em condições de verificar os resultados do seu trabalho,
nem de avaliar os progressos efectuados. É preciso fornecer-lhe bastantes indicações
acerca das suas realizações. Prepare-se para um longo período de treino e paciência
até que a criança seja capaz escrever o seu nome. Comece por ensinar-lhe movimentos
amplos. Ela terá de aprender a segurar na caneta e desenvolver os músculos responsáveis
pelos movimentos finos dos dedos antes de começar a ensaiar o traçado das diferentes
letras.
EXERCÍCIOS:
1. Peça à criança para pegar em lápis de cor e tratar grandes círculos numa folha
de papel. Não se importe com o resultado da experiência. O exercício tem por finalidade
ensinar a criança a segurar num lápis com à vontade e começar a sentir os mecanismos
do movimento da mão. Neste exercício, poderá igualmente utilizar o quadro negro.
2. Numa página, disponha cinco ou seis pontos de Braille, e peça à criança que
trace linhas entre esses pontos. Isso ajudá-la-á a habituar-se a levar um lápis ou uma
caneta de um ponto a outro.
3. Numa folha de papel, trace linhas de Braille a formarem quadrados e peça à
criança para os colorir. Desenhe quadrados cada vez mais pequenos. Isso ajudará a
criança a trabalhar em espaços mais limitados. Colocando uma pequena moldura sob a
folha, dará à zona colorida um relevo que a criança poderá distinguir pelo tacto.
Desenhe outras formas simples, para além dos quadrados.
4. Trace duas linhas de Braille a toda a largura da página. Peça à criança que
desenhe círculos ou traços verticais entre as duas linhas, esforçando-se por não sair
delas. Aproxime progressivamente as duas linhas. Procure que a criança trabalhe sempre no
sentido da escrita. Se estiver a aprender letras do alfabeto latino, deverá,
consequentemente, desenhar da esquerda para a direita. Se estiver a aprender a escrever o
seu nome em Árabe, deverá treinar a escrita da direita para a esquerda.
5. Ensine à criança as letras que compõem o nome dela, pela ordem em que nele
figuram. Por exemplo, se o nome da criança for Paulo, ensine-lhe primeiro a escrever o
"P" maiúsculo. Uma vez que já saiba desenhar essa letra, passe ao
"a", e assim por diante. Ensine-lhe uma só letra de cada vez.
6. Cada letra do alfabeto pode apresentar uma grande diversidade de formas. Escolha a
mais simples. Pouco importa que as letras que ensina tenham a configuração de caracteres
de imprensa ou manuscritos. O que interessa é que a criança consiga escrevê-los e
lê-los com facilidade, e não que se atenha a um determinado tipo de escrita.
7. Ao ensinar a criança a desenhar uma letra, faça-a primeiro escrevê-la em grande,
indo depois reduzindo, a pouco e pouco, o seu tamanho, por forma a ir ocupando um espaço
menor. O mesmo se aplicará à assinatura da criança. No início, diga-lhe para escrever
o nome em caracteres grandes para aprender a movimentar a mão de moda a dar a forma
correcta às letras; depois, que vá reduzindo progressivamente o tamanho das mesmas.
8. Construa um "cartão de assinatura com janela" que irá ajudar a criança
a escrever dentro de um espaço restrito. Recorte um rectângulo no meio de um cartão.
Quando a criança tiver de assinar o seu nome, coloque esse cartão sobre a folha de
papel, de forma a que o espaço rectangular coincida com o sítio onde a assinatura
deverá figurar. A criança poderá então assinar, utilizando os bordos do rectângulo
como limites de referência.
Não se esqueça de que a criança não consegue ver o que escreveu. É a si que cabe
dar-lhe todas as informações necessárias. Assim sendo, não a deixe a trabalhar
sozinha. Deverá permanecer a seu lado para poder, de imediato, corrigi-la, felicitá-la e
encorajá-la.
2. A aprendizagem da escrita pelas crianças com visão reduzida
As crianças com visão reduzida não aprenderão a escrever só o seu nome. Elas
deverão aprender todas as letras do alfabeto, bem como os números, os sinais de
pontuação, etc. Deverão acompanhar as aulas de escrita das demais crianças da sua
turma (sem problemas de visão).
CONCRETAMENTE:
1. Dê à criança papel branco com linhas carregadas, ou acentue-lhe as linhas do
caderno de modo a que ela as distinga melhor.
2. Recomende-lhe que se sirva de uma caneta de feltro ou de tinta preta; o que lhe
permitirá escrever caracteres mais marcados do que com um lápis.
3. Verifique a iluminação, assegurando-se de que a visão da criança não está a
ser perturbada por reflexos ou por sombras.
4. Faça a criança escrever sobre uma ardósia branca com canetas de feltro que
assegurem um bom contraste. Procure, no entanto, evitar os reflexos.
5. Ensine a criança a traçar correctamente as letras. Muitas crianças com visão
reduzida aprenderam a escrever observando a forma das letras. Em seguida, treinaram o seu
traçado à sua maneira, executando, muitas vezes, movimentos incorrectos que as obrigam a
escrever com maior lentidão. Assegure-se que a criança executa os movimentos correctos.
Por exemplo, para escrever a letra "b", começa-se por desenhar um traço de
cima para baixo e, depois, um semicírculo no sentido contrário ao dos ponteiros do
relógio. Não se deve começar pelo semicírculo.
6. É frequente as crianças com visão reduzida serem pouco cuidadosas na
apresentação dos trabalhos que executam, tendo tendência para borrar o que escrevem.
Incite-as a manter os seus papéis bem arrumados e limpo o local onde trabalham. Poderá
ser-lhe de grande utilidade um arquivador, em que a criança possa guardar todas as suas
folhas.
7. DACTILOGRAFIA
Programa Suplementar n.º 7
[N.T. Em Portugal. o ensino da utilização da máquina de escrever foi (ou está a
ser) substituído pela utilização do computador. Este capítulo deve ser considerado a
luz do ano em que foi escrito e, essencialmente, à luz do seu objectivo
primordial que consistiu em ajudar a educação de deficientes visuais nos países em
desenvolvimento.]
Todas as crianças deficientes visuais deveriam aprender a escrever à máquina logo
que hajam adquirido uma boa coordenação dos dedos e força suficiente. É importante
para essas crianças, pois é uma maneira de comunicarem por escrito com pessoas não
cegas que não lêem o Braille. Se a criança utilizar uma máquina de escrever para fazer
os seus deveres escolares, as suas redacções, etc., o professor poderá facilmente
corrigir os seus trabalhos. Se a criança quiser escrever uma carta a um amigo não cego,
bastar-lhe-á utilizar uma máquina de escrever para que esse amigo possa ler a carta. Um
bom conhecimento de dactilografia poderá igualmente ajudar a criança a encontrar um bom
emprego um dia mais tarde. Bastantes cegos exercem, com sucesso, a profissão de
secretários, de telefonistas, de recepcionistas e de programadores, profissões que
exigem conhecimentos nessa área.
Para ensinar a criança a escrever à máquina, não necessita de ser um especialista
em dactilografia, mas é preciso, todavia, que saiba quais são as técnicas correctas.
Se, por exemplo, você só utiliza dois dedos quando dactilografa, mas sabe, apesar disso,
o que os outros oito dedos devem fazer, poderá ensinar a dactilografar. Se não souber
nada do assunto, compre ou peça emprestado um manual de dactilografia. Eles contêm todas
as indicações básicas de que necessita e numerosos exercícios.
O ensino da dactilografia a crianças deficientes visuais não é significativamente
diferente do seu ensino a crianças que vêem. As únicas excepções dizem respeito às
acções que, de uma maneira geral, exigem a intervenção da vista, como o verificar se o
papel está bem colocado, ou fazer correcções. Adaptações metodológicas serão,
nesses casos, necessárias. Eis alguns princípios a reter:
1. Explique à criança o funcionamento da máquina de escrever. Ela deve aprender para
que serve cada tecla e cada botão do teclado. Deverá igualmente aprender a limpar a
máquina, a substituir a fita, etc.
2. Ensine-a a manter uma boa postura enquanto dactilografa.
3. Impeça a criança com visão reduzida de olhar para os dedos. Ela deve aprender a
localizar cada tecla sem olhar. Todas as pessoas que aprendem a dactilografar devem
respeitar esta regra, se pretenderem vir a escrever depressa.
4. Assegure-se de que a criança coloca correctamente os dedos nas teclas do meio. Se
ela tiver dificuldade em encontrá-las, coloque marcas tácteis sobre as teclas
"F" e "J" - pontos de cola, ou pedacinhos de lixa.
5. Insista para que a criança utilize os dedos convenientes para dactilografar. A
tecla correspondente à letra "A" é sempre accionada com o dedo mínimo da mão
esquerda; nunca com outro.
6. Quando a criança já dactilografar melhor, ela própria se dará conta de nove de
cada dez erros que der. A fita de correcção é mais fácil de utilizar do que um
corrector líquido. A criança sente, pelo tacto, qual a face da fita da correcção que
deve colocar sobre o papel, porque cada um dos lados tem uma textura diferente.
7. Se não tiver uma máquina de escrever, peça uma emprestada. Muitas escolas têm
máquinas de escrever que poderão emprestar uma meia hora por dia.
8. Se não encontrar um manual de dactilografia, lembre-se de que as teclas do meio
são (da esquerda para a direita), Q, S, D e F para a mão esquerda, e J, K, L e M para a
mão direita. A cada dedo correspondem certas teclas. [Estas indicações
referem-se a máquinas de dactilografia com o teclado internacional.]
Dedo mínimo da mão esquerda (Q): teclas A e W
Dedo anelar da mão esquerda (S): teclas Z e X
Dedo médio da mão esquerda (D): teclas E e C
Indicador da mão esquerda (F): teclas B, V, G, R e T
Indicador da mão direita (J): teclas H, U, Y, N e ?
Dedo médio da mão direita (K): teclas I, e ,
Dedo anelar da mão direita (L): teclas O, /, e :
Mínimo da mão direita (M): teclas P, ; , + e =
Os polegares de ambas as mãos servem para accionar a barra dos espaços.
9. A criança pode certificar-se de que a folha está bem colocada na máquina,
começando por introduzi-la no rolo da máquina; depois, accionando a patilha que liberta
o papel, poderá alinhar, entre si, as margens superior e inferior da mesma. Quando os
dois lados estiverem paralelos, fixa a folha, baixando a patilha. Poderá então andar com
o rolo para trás até que a margem superior do papel esteja exactamente paralela à barra
de posicionamento.
8. ACTIVIDADES DA VIDA DIÁRIA
Programa Suplementar n.º 8
As actividades da vida diária compreendem os cuidados e higiene pessoais, os cuidados
domésticos e a cozinha. A maioria das crianças sem problemas de visão aprende a maior
parte dessas técnicas atra vês da observação das pessoas que as rodeiam, praticando-as
depois para ajudarem os pais. Ao verem alguém a varrer o chão, imitam-no As crianças
cegas não podem, naturalmente, observar esse tipo de coisas. Elas podem ouvir alguém a
varrer, e perceber, apenas através do barulho, o que essa pessoa está a fazer; mas isso
não lhes diz na da acerca de como ela o faz. É preciso mostrar-lhes como se faz,
ajudá-las e deixá-las experimentar e praticar até que saibam varrer convenientemente.
Não é uma coisa que se aprenda simplesmente de ouvido.
É frequente os educadores não ensinarem nada especificamente relacionado com a
temática das actividades da vida diária às crianças que frequentam estabelecimentos de
ensino regular, dado tal não constar dos programas escolares. A maior parte desses
conhecimentos é transmitida em casa e é aí que é preferível ensiná-los. Mas os
educadores não controlam se a criança é ou não verdadeiramente capaz de realizar
sozinha essas actividades. Perguntam-lhe, por exemplo, se ela é capaz de varrer. Se ela
responder: "Com certeza!", eles não procurarão certificar-se da veracidade da
resposta. É importante observar a maneira como a criança se desembaraça no cumprimento
das suas actividades. É que, apesar da criança se poder revelar capaz de cumprir a
tarefa, poderá acontecer que se chegue à conclusão de que existiria uma adaptação ou
uma técnica que lhe permitiria levá-la a cabo mais fácil e rapidamente.
Muitas vezes, as crianças cegas não têm de aprender técnicas especiais para as suas
actividades da vida diária. Elas podem fazer os mesmos gestos que as criança não cegas,
bastando, pois, ensinar-lhes como devem fazê-los. Assim, não há, por exemplo, qualquer
diferença entre a maneira como uma criança cega e uma não cega se lavam. Ambas têm de
utilizar água e sabão e proceder do mesmo modo.
Vezes há, no entanto, em que uma técnica especial pode ajudar uma criança cega a
levar mais facilmente a cabo certas actividades. Essas actividades apelam geralmente para
os outros sentidos: o tacto, a audição, o paladar e o olfacto. Para encher um copo com
água, uma criança não cega vai despejando água no copo até ver que o nível do
líquido já está próximo do bordo, ao passo que uma criança cega tem de se servir de
uma indicação táctil ou auditiva para saber quando parar. Quando uma criança não cega
pretende vestir a sua camisa amarela, basta-lhe abrir o armário e retirá-la, enquanto
que a criança cega tem de dispor de uma qualquer indicação o táctil que lhe permita
distinguir a camisa amarela da branca. Para sugestões relativas ao desempenho das
actividades da vida diária, consulte as referências no fim deste manual.
É importante que as crianças deficientes visuais dominem o maior número possível de
actividades da vida diária para não estarem dependentes de outrem. Se não forem
autónomas, ver-se-ão na necessidade de esperar por alguém que possa ajudá-las, o que
é um inconveniente, não só para a própria criança, mas também para todos os que com
ela convivem.
Ao ensinar essas actividades, não perca de vista os seguintes princípios:
1. Divida cada actividade em pequenas operações que a criança domine facilmente.
Comece por ensinar a primeira; depois, a segunda, etc. Certifique-se de que a criança
assimilou bem cada operação antes de passar à seguinte.
2. Seja realista, e assegure-se de que o seu ensino está de acordo com a idade da
criança. A maioria das crianças não cegas de cinco anos não cozinha. Não pretenda,
pois, que uma criança cega de cinco anos prepare as refeições familiares.
3. Trabalhe em estreita cooperação com a família da criança. É preciso que todos
saibam o que a criança pode fazer em casa para reforçar a sua aprendizagem. Se a ensinou
a escolher e limpar legumes, a mãe deverá fazer com que ela, em casa, também o faça.
4. As crianças adquirem essas aptidões através do treino e da prática, e não pela
frequência de cursos teóricos. Reserve bastante tempo a trabalhos práticos.
5. Reuna todos os equipamentos e utensílios necessários antes de iniciar a
actividade. Isso permitir-lhe-á ganhar tempo durante a lição.
6. Certifique-se de que a criança sabe onde se encontram esses utensílios e que
consegue encontrá-los facilmente.
7. Assegure-se de que a criança sabe utilizar correctamente cada um dos utensílios ou
aparelhos (faca, fogão, serra, lâmina de barbear, garfo), sem correr o risco de se
magoar.
8. Redija um plano de trabalho em que exponha o modo correcto de operar e enumere todas
as operações pela sua respectiva ordem de execução.
9. No fim de cada actividade, certifique-se de que a criança limpa e arruma todos os
materiais e utensílios nos seus devidos lugares, para que possam ser facilmente
encontrados quando voltarem a ser necessários.
Segue-se uma listagem parcial das actividades da vida diária que a criança deficiente
visual deve ser capaz de executar. Procure iniciar a criança nessas actividades de acordo
com a idade conveniente, trabalhando em estreita cooperação com a família para que esta
permita que ela as pratique em casa.
1. Cuidados pessoais:
vestuário
refeições
lavar os dentes
cuidar dos cabelos
maquilhagem
banho
"toilete" e utilização dos sanitários
identificação e gestão do dinheiro
menstruação
cuidar do vestuário e sua identificação
cuidar das unhas
cuidados de saúde
fazer a barba
medicamentos.
2. Cuidados domésticos
varrer e lavar o chão
limpar o pó
fazer a cama e tratar da roupa de cama
lavar os vidros das janelas
varrer e limpar o pátio
dar comida aos animais domésticos
tratar da limpeza da casa
lavar, secar, dobrar e passar a roupa a ferro
identificação da roupa
costura
engraxar o calçado
lavar e limpar a loiça
encher recipientes com água.
3. Cozinha
fazer as compras
lavar e escolher frutas e legumes
identificar alimentos frescos
acender o fogão ou fogareiro
cortar lenha
colocação de tachos, panelas e frigideiras num fogão aceso
utilização de aparelhos eléctricos
preparação de alimentos simples
determinar o estado de cozedura dos alimentos
manuseamento de facas
descascar frutas
identificar alimentos enlatados
temperar os alimentos
limpar (amanhar) peixes e mariscos.
CAPÍTULO 5
ADAPTAÇÃO DE MATERIAIS
As crianças com deficiência visual utilizam os seguintes tipos de materiais
(Lowenfeld):
1. Materiais que são utilizados na sua forma original (blocos, sementes, etc.)
2. Materiais que requerem alguma modificação ou adaptação (cartas de jogar, textos
em Braille, jogos, etc.)
3. Materiais que foram construídos especialmente para crianças cegas ou com visão
reduzida (mapas em grandes caracteres, livros em Braille, etc.)
4. Materiais que permitem experiências de substituição (Modelos de animais, aviões,
casas etc.)
5. Materiais que proporcionam experiências de substituição (modelos de animais,
aviões, casas, etc.)
Neste capítulo referimo-nos especialmente aos materiais referidos em 2. - materiais
que requerem modificação ou adaptação para uso de crianças com deficiência visual. A
maior parte das adaptações podem ser feitas pelo professor de apoio. Não precisam de
ser artistas para adaptar esse material, mas é essencial ser criativo. Devem também
colocar questões tais como: Como posso transcrever este texto ou este gráfico de modo a
que possa ser compreendido pela criança? Têm de apresentar os materiais em relevo para
uma criança cega e em caracteres ampliados para uma criança com visão reduzida. Antes
de iniciar a adaptação dos materiais devem certificar-se de que têm os equipamentos
necessários. Comecem por ter um estojo de instrumentos para adaptação de materiais e
desloquem-se com ele sempre que vão apoiar as crianças. Muitas vezes os materiais têm
de ser adaptados na presença das crianças e não podem fazer isso se não tiverem os
instrumentos convosco. Precisam de um recipiente para colocar os instrumentos. Uma pequena
mala de plástico com um fecho pode servir perfeitamente. Ponham os seguintes instrumentos
na caixa:
- Tesouras;
- Pequena régua;
- Régua e punção;
- Transferidor de plástico;
- Caneta de feltro preta;
- Fita auto-colante;
- Corda;
- Tecido com textura sensível;
- Cola;
- Fita-cola;
- Compasso (para fazer círculos);
- Clips;
- Lápis;
- Furador:
- Cordel.
Não se esqueçam de trazer sempre o vosso estojo, pois de outro modo arriscam-se a
perder tempo e a fazer perder tempo aos vosso alunos.
Ao adaptarem material, optem pela solução mais fácil. Podem levar quatro horas ou
quinze minutos a adaptar um texto. Se o texto for utilizado uma única vez, optem pela
solução dos quinze minutos. Se for um material que irá ser utilizado inúmeras vezes
pode ser necessário gastar um pouco mais de tempo com ele. Sempre que possível, adaptem
o material de forma a que ele possa ser usado tanto pelas crianças deficientes visuais
como pelas de visão normal. Se adaptarem um jogo e utilizarem letras ou números em
Braille, usem igualmente escrita a negro. Deste modo a criança cega poderá brincar com
os seus amigos com visão.
Quando adaptar materiais não pense que eles devem sempre ter o mesmo aspecto que os
exemplares impressos. O que interessa é que ensinem o mesmo conceito. Por exemplo, se
estiver a adaptar um exercício de matemática em que se pede à criança que conte
quantos patos estão em fila, não terá que cortar formas de patos e colocá-los numa
folha. Será mais fácil colar botões ou usar pontos de Braille. Aquele exercício tem
por objectivo ensinar a contar e não dar uma lição sobre patos. Não interessa se a
forma for relativa a patos, botões ou pontos de Braille. Figuras tácteis que são formas
de patos, árvores, cães ou gatos, podem ser agradáveis à vista mas não trazem grande
informação às crianças cegas.
Pensem no que vão fazer antes de adaptar determinado material. Coloquem a si
próprios as seguintes questões:
1. O que é que este material educativo pretende ensinar
2. Porque é que é difícil ao aluno utilizar o material na sua forma original?
3. Como é que o posso adaptar de modo que a criança o compreenda?
4. Tenho todos os instrumentos de que preciso?
EXEMPLO: Têm de adaptar uma ficha de exercícios em que há pontos numerados
para serem unidos entre si. A sua primeira reacção poderá ser a de pensar que esse
exercício não é importante para uma criança cega. Contudo, reflectindo um pouco mais,
dar-se-á conta de que se as demais crianças têm essa tarefa para fazer, não há razão
para o seu aluno ser dispensado. Levantam-se, então, quatro questões:
Questão 1: O que é que esta ficha pretende ensinar?
Trata-se de ensinar a criança a desenhar? Não, realmente não. Trata-se de saber se a
crianças conhece bem os números que aparecem na figura? Também não. Será que o
exercício habitua o aluno a fazer certos movimentos da mão, a segurar no lápis, a
traçar linhas? Sim.
Questão 2: Porque é que a criança não pode fazer este exercício na sua
forma original?
É fácil! Ela não vê nem os pontos nem os números que existem na figura.
Questão 3: Como é que eu posso adaptá-la?
Posso fazer uma folha de exercícios semelhante, empregando papel Braille, pontos Braille
e números em Braille. Posso mesmo colocar os pontos com a mesma disposição em que se
encontram sobre a folha impressa. A criança não saberá o que a imagem representa, mas
não é essa a finalidade da operação. Mas como irá a criança realizar o exercício?
É preciso pensar também nisso. Ela poderá servir-se de um lápis para traçar linhas
que unam cada ponto ao seguinte. A criança não verá o resultado mas, pelo menos, o
professor ficará a saber que ela conhece os números. E isso habituá-la-á também a
fazer certos movimentos da mão e a traçar linhas. Mas haverá outra maneira de proceder?
Há, sim. Eu posso fixar, com um pouco de fita-cola, a extremidade de um pedaço longo de
cordel ao primeiro ponto do desenho. A partir daí, a criança poderá, então, deslocar o
cordel até ao segundo ponto, e fixá-lo aí com fita-cola; e continuar por aí adiante
até chegar ao fim da figura.
Questão 4: Tenho todos os apetrechos de que necessito?
Preciso de qualquer coisa para fazer os pontos Braille. Tenho a minha pauta e o meu
punção justamente para isso. Preciso também de um lápis para marear no papel os
sítios onde vou colocar os pontos Braille. Por seu turno, o meu aluno vai precisar de
fita-cola e de cordel.
USE A SUA IMAGINAÇÃO
1. Faça desenhos em relevo utilizando linhas de Braille, fita-cola ou adesivo,
pedacinhos de lixa, tirinhas de folha de coqueiro, filas de pedrinhas coladas, cordel,
fio, agrafos, etc.
2. Faça um desenho de ângulos, em relevo, desenhando-os com o auxílio de um lápis e
colando tirinhas de folha de coqueiro sobre as linhas desenhadas.
3. A criança precisa de medir esses ângulos? Faça um transferidor em cartão e
coloque-lhe, a servir de escala, pontos Braille de 10 em 10 graus, ou compre um
transferidor de plástico com a escala em relevo - os números não serão em Braille, mas
poder-lhe-á colar pontos ou números em Braille de 45 em 45 graus.
4. Se tiver de ensinar conjuntos, subconjuntos, intersecções, etc., faça círculos
encurvando tirinhas de folha de coqueiro até lhes dar essa forma. Cole ou ate as
extremidades. Faça dois círculos desses para representar os conjuntos. Para ensinar as
intersecções sobreponha parcialmente os círculos.
5. Como adaptar um esquema? Reproduza em linhas de Braille o desenho de base e cole o
papel sobre um cartão. Muna-se de alfinetes, e espete-os nos pontos correspondentes às
intersecções de linhas no esquema impresso. Ligue os alfinetes entre si através de um
cordel para que a criança possa sentir as curvaturas que o esquema apresenta.
6. Uma folha de exercícios acerca de imagens simétricas ou invertidas, pode ser
simulada através da utilização de um ramo de coqueiro com o mesmo número de folhas de
ambos os lados. Retire três folhas do lado esquerdo, e diga à criança que faça o mesmo
do lado direito.
7. Precisa de uma régua com um metro? Corte um pau com um metro de comprimento, e
faça-lhe sulcos de centímetro a centímetro.
CAPÍTULO 6
AJUDA TÉCNICA E RELEVOS
Na qualidade de educador especializado, deverá indicar à escola ou ao seu superior
hierárquico o equipamento e os utensílios necessários, e assegurar-se de que esses
objectos são devidamente colocados à disposição da criança. Frequentemente, os
responsáveis pelos estabelecimentos de ensino desconhecem qual o tipo de equipamento
necessário e onde podem adquiri-lo. Faça uma lista dos objectos indispensáveis,
respectivos fornecedores e preços. Assim, terá essas informações sempre à mão quando
lhe perguntarem do que necessita.
Seja realista no que toca a seleccionar os artigos verdadeiramente indispensáveis.
Seria, naturalmente, muito agradável poder dispor de uma calculadora equipada com voz, ou
de uma máquina de escrever eléctrica, mas será que são realmente precisas? Não
haverá coisas mais úteis em que gastar o dinheiro disponível?
Em geral, sai mais económico fabricar uma coisa do que comprá-la já feita. Se não
puder fabricar o objecto que pretende, informe-se da possibilidade de poder adquiri-lo
localmente, antes de tratar de importá-lo. Todo o papel que possa encontrar no mercado
local e que possa servir como papel Braille será mais barato do que papel importado.
O equipamento e os utensílios de que irá necessitar dependerão do tipo de programa
educativo que ponha em prática, e do grau de visão dos seus alunos. Se é um educador
itinerante, terá de ter uma secretária ou uma bancada sua em cada escola que visita.
Para um aluno que lê livros impressos a negro não precisará de ter livros em Braille.
Por outro lado, os seus alunos deverão dispor de uma carteira e de um local onde
guardem os seus materiais e utensílios. Habitualmente, é a escola a fornecê-los. Não
se esqueça de que uma criança cega necessita de uma carteira mais espaçosa do que uma
criança que vê. Os livros em Braille, as máquinas Braille e os utensílios
indispensáveis ao uso do Braille ocupam bastante mais espaço do que os livros e os
papéis vulgares. As crianças com visão reduzida também necessitam de mais espaço para
os livros impressos com caracteres ampliados.
É muito importante dispor de um local para a arrumação do material. Uma máquina
Braille é cara, devendo ficar fechada à chave durante a noite. Os livros em Braille são
demasiado espessos para serem empilhados na prateleira que existe debaixo da maioria das
carteiras. A criança terá, pois, necessidade de um outro local onde possa arrumá-los.
Desde que tenha idade para isso, ela deverá verificar, no final de cada dia de aulas, se
todo o material está convenientemente arrumado. Para as crianças cegas haverá,
provavelmente, necessidade do material e utensílios seguintes:
- papel e máquina Braille;
- pauta e punção;
- livros em Braille;
- régua e transferidor em Braille;
- ábaco;
- cassetes;
- acesso a uma máquina de escrever e a um gravador:
- bengala.
As crianças com visão reduzida poderão necessitar de:
- canetas de feltro;
- papel de linhas espessas;
- lupas:
- estante (suporte para manter livros abertos em pé);
- acesso a uma máquina de escrever e a um gravador.
CAPÍTULO 7
APOIO PEDAGÓGICO
Se a criança demonstrar dificuldade em acompanhar determinada matéria, você será,
muito provavelmente, solicitado no sentido de lhe assegurar um apoio pedagógico ou de
encontrar alguém que o faça por si. Se a dificuldade manifestada se dever à
deficiência visual da criança, você será, porventura, a pessoa mais indicada para a
auxiliar. Se, no entanto, essa dificuldade se dever a outras causas, como, por exemplo, o
facto de a criança ser mais fraca nessa matéria específica, um dos seus condiscípulos
ou qualquer outra pessoa poder-lhe-á dar lições particulares. Certas crianças
necessitam de mais ajuda do que outras. Não sendo o apoio pedagógico regido por nenhuma
regra em particular, as sugestões que se seguem poderão, todavia, revelar-se de alguma
utilidade.
1. Antes de tentar ajudar a criança, certifique-se se conhece bem a matéria em
questão. Se pretender ensinar-lhe a divisão de fracções, verifique, antecipadamente,
os seus próprios conhecimentos a esse respeito.
2. Procure definir com exactidão os pontos em que reside a dificuldade manifestada. Se
o professor tiver assinalado dificuldades na leitura, determine a que nível, ou níveis,
se situam essas mesmas dificuldades: no Braille abreviado, na compreensão do texto, nas
palavras novas, na velocidade da leitura? Quando tiver identificado exactamente a
dificuldade, ser-lhe-á muito mais fácil ajudar a criança a ultrapassá-la.
3. Após ter circunscrito o problema, reflicta sobre os exercícios, as lições e os
auxiliares didácticos que poderão ser úteis. Se não estiver seguro quanto ao que
deverá ser feito, peça sugestões ao professor ou a um dos seus colegas.
4. Divida o conteúdo da aprendizagem em pequenas unidades. Certifique-se de que o
aluno assimilou bem uma unidade e treinou suficientemente a aplicação dos respectivos
conhecimentos, antes de passar à unidade seguinte.
5. Se for necessário um apoio pedagógico intensivo, leve a criança para uma sala ou
um gabinete onde possa ficar a sós com ela. Se não houver um local disponível, leve-a
para o exterior e instalem-se à sombra de uma árvore. Se ela necessitar apenas de um
pequeno apoio, permaneçam na sala de aulas. Assim, o professor poderá ver o que fazem e
como o fazem.
6. O objectivo do apoio pedagógico é proporcionar uma ajuda numa área ou matéria, a
fim de que a criança possa permanecer na classe regular. Procure recuperá-la ao nível
dos restantes colegas para que possa reintegrar-se na turma o mais depressa possível.
7. Se a criança não progride bem numa matéria por falta de livros didácticos
adaptados, não é de apoio pedagógico que ela precisa, mas sim de meios de aprendizagem.
Muito mais do que a dar-lhe um apoio constante, deverá, nesse caso, empregar o máximo
possível de tempo a elaborar os materiais didácticos ou a gravar os textos
indispensáveis à criança.
8. Se a criança tiver necessidade de um apoio pedagógico, não hesite em pedir
auxílio aos seus pais e família. Dever-lhes-á dar directrizes precisas, sendo de toda a
conveniência que eles se associem à educação da criança.
9. Seja realista quanto às suas expectativas. Se uma criança tem maus resultados em
Matemática porque não é muito dotada para essa disciplina, não espere que ela se venha
a tornar uma excelente aluna na mesma. Mas se ela tiver maus resultados em Matemática por
ser preguiçosa ou por falta de exercício, aí poderá esperar uma melhoria se lhe
multiplicar o número de exercícios e a fizer trabalhar mais.
10. Assegure um apoio pedagógico desde o momento em que a necessidade do mesmo se
faça sentir em alguma matéria. Não o remeta para mais tarde. Se uma criança tiver
acumulado dois anos de atraso na leitura, fazê-la recuperar levará muito tempo.
11. Se houver outras crianças com dificuldades nas mesmas matérias que o deficiente
visual, ausculte o professor quanto à possibilidade de você próprio ou alguma outra
pessoa poder fazê-los trabalhar em grupo. Dessa forma, todas as crianças com necessidade
de apoio pedagógico beneficiariam, e a criança deficiente aperceber-se-ia de não ser o
único aluno da turma a ter problemas nessa matéria.
12. Lembre-se de que não é obrigado a assegurar pessoalmente todo o apoio
pedagógico. Tente arranjar quem o auxilie. Peça a outros professores do estabelecimento
ou a outros alunos da turma que o ajudem.
CAPÍTULO 8
LIGAÇÃO CASA/ESCOLA
O educador especializado deve servir de elo de ligação entre a casa e a escola.
Cumpre-lhe manter os pais e a família ao corrente dos progressos escolares da criança.
Se ela faltar à escola devido a problemas em casa, deverá explicar ao professor o que se
passa. Deverá deslocar-se regularmente ao domicílio da criança. Os pais devem saber
como o seu filho progride na escola. É preciso explicar-lhes como podem ajudá-lo a
reforçar os seus conhecimentos e as capacidades que ele está a adquirir. Eles poderão
obter essas informações falando consigo. Se a criança estiver a aprender a servir-se de
uma bengala para se deslocar da escola para casa, e os pais não forem informados a esse
respeito, provavelmente não a deixarão treinar-se no seu uso.
A maioria dos professores tem 30a 40 alunos a seu cargo e não têm tempo de se
deslocar a suas casas. Quando efectuar essas visitas, tenha em atenção as seguintes
considerações:
1. Efectue visitas regulares. Não se desloque a casa do aluno só quando houver algum
problema. Se só o fizer quando a criança tiver contrariedades ou problemas, os pais
passarão a associar as suas visitas a más notícias e não ficarão muito contentes ao
vê-lo.
2. Informe os pais dos sucessos da criança. Sempre que ela fizer bem alguma coisa,
diga-lhes. Isso estimulará a sua confiança nela.
3. Lembre-se de que você não é nem psiquiatra nem conselheiro conjugal. Se houver
problemas no seio da família, não é a si que compete tentar resolvê-los. É bom que
esteja consciente desses problemas (na medida em que eles se podem repercutir na
criança), mas você não tem nem a formação nem os conhecimentos necessários para lhes
fazer face.
4. As conversas de ordem privada que escutar ou tiver no decurso das suas visitas
deverão permanecer confidenciais. Não deverá comentar com os seus amigos esse tipo de
conversas ou quaisquer informações a respeito da família da crianças
5. Avise a família da sua intenção de visitá-la, antes de o fazer. Mande um recado
pela criança, no sentido de saber se os pais dela estarão em casa em tal ou tal data e
hora. Isso evitar-lhe-á deslocar-se em vão, caso a mãe tenha saído para ir às compras
e o pai esteja no trabalho.
6. Não visite só um dos pais. Deverá encontrar-se com o pai, com a
mãe, e até com outros membros da família. Todos têm um lugar importante na vida da
criança e devem estar informados do seu bem-estar, dos seus progressos e do seu
desenvolvimento.
7. Não se esqueça de que a criança tem também os seus direitos.
Ninguém gosta de que falem de si nas suas costas. Esclareça a criança acerca do que
irá discutir com os pais dela. Melhor ainda, faça por que ela esteja presente durante as
suas visitas.
8. Pergunte aos pais se há alguma coisa que eles desejem que ensine à
criança. É natural que eles tenham uma ideia mais precisa dos domínios em ela necessita
de uma ajuda suplementar.
CAPÍTULO 9
COMO FACILITAR AS SUAS TAREFAS
Enquanto educador especializado, você tem inúmeras responsabilidades. Eis aqui dez
sugestões destinadas a facilitar-lhe as suas tarefas.
1. Comece desde já a reunir materiais
Quando se começa a construir um auxiliar didáctico, ou quando se tenta preparar um
exercício de educação sensorial, nada há de mais frustrante do que nos apercebermos de
que não dispomos dos materiais apropriados. Perdemos horas à procura de seis seixos, de
uma garrafa de plástico adequada, ou de cinco pedaços de tecidos de texturas diferentes.
Comece, desde já, a juntar objectos desse tipo. Não deite nada fora. Mais dia menos dia,
encontrará utilidade para tudo. E isto também se aplica a todo a material didáctico que
tenha fabricado e às ideias que tenha ensaiado. Se um determinado auxiliar táctil se
revelou útil, conserve-o para uma posterior reutilização. Se uma dada ideia funcionou,
anote-a por escrito para a não esquecer.
2. Planifique racionalmente as suas deslocações entre escolas
Se tiver de visitar crianças em duas escolas próximas uma da outra, tente fazê-lo no
mesmo dia. Isso fá-lo-á ganhar tempo e evitar-lhe-á voltar todos os dias à mesma zona.
3. Estabeleça uma boa comunicação:
A - Com o Director da escola. Previna-o da data da sua visita. Sempre que lá vá,
passe pelo seu gabinete, a fim de dar conhecimento da sua presença no estabelecimento de
ensino. Ele tem o direito e o dever de saber sempre quem se encontra no interior da sua
escola. Se levar consigo um convidado, um superior hierárquico ou um observador,
apresente-o ao Director antes de ir ver a criança.
B - Com os outros professores da escola. Desloque-se à escola à hora do intervalo para o
café, para o chá ou para o almoço, e fale com eles acerca do seu trabalho. Faça-lhes
perguntas a respeito das suas actividades escolares, das férias, etc.
Em que é que isso lhe poderá facilitar o seu trabalho? Porque, com isso, poderá
contar mais facilmente, em caso de necessidade, com a colaboração do Director e dos
demais professores, com quem estabeleceu boas relações. Se tiver de sair com uma
criança para uma lição de orientação e locomoção no exterior do estabelecimento, o
Director dará de melhor vontade o seu consentimento, uma vez que o conheça e tenha
confiança em si. Se pretender introduzir determinadas ideias, os outros professores
apresentarão uma maior disponibilidade para confrontarem as suas ideias com as deles
próprios, se já o conhecerem.
4. Saiba manter-se no seu lugar
Quando for visitar uma criança a uma sala de aulas, lembre-se de que é um convidado,
na sala e no resto do estabelecimento. Está lá para facultar uma ajuda suplementar à
criança e ao respectivo professor, mas não para supervisar o trabalho deste último. Se
ele se sentir ameaçado pela sua presença, nada deteriorará mais rapidamente as vossas
relações. Você não é nem um superior hierárquico dele, nem um espião a soldo do
Director da escola. Se desaprova a forma como um aula de noções de higiene é
ministrada, refira cortês e diplomaticamente outros métodos pedagógicos que tenha tido
ocasião de ver postos em prática; depois, não volte a tocar no assunto.
5. Não guarde os seus conhecimentos só para si
Quando lho perguntarem, explique o que está a fazer, a razão por que ensina isto ou
aquilo, ou porque é que utiliza este ou aquele auxílio, tanto mais facilmente elas o
auxiliarão quando disso necessitar. Dar-se-ão conta de que ensinar uma criança cega
não implica truques de magia e tornar-se-ão mais participativos.
6. Apele para as boas vontades
É preciso construir um auxiliar didáctico? Gravar um livro? Encontrar alguém que
leia em voz alta para a criança? Procure voluntários. Eles ajudá-lo-ão e fá-lo-ão
ganhar tempo. Terá de explicar-lhes exactamente o que pretende e como fazê-lo, mas isso
será largamente compensado pelo tempo que economizará depois. Não utilize essas boas
vontades só para fabricar auxiliares didácticos e livros. Se tiver uma criança que
esteja aprender a servir-se de uma bengala, e que precise de se treinar, arranje um
voluntário para trabalhar com ela. Se a criança tiver necessidade de exercícios
suplementares para contar e subtrair objectos, encontre alguém que lhe dedique um quarto
de hora por dia. Será preciso que lhes dê alguma formação, também nesses campos, para
que saibam exactamente o que podem ou não fazer, mas, tudo contabilizado, representará,
para si, um ganho de tempo.
7. Tome diariamente notas referentes a cada criança
Consagre uma secção do seu caderno de anotações a cada criança de que se ocupe. No
final de cada lição, anote por escrito:
(a) a data
(b) o que ensinou nessa aula
(c) os progressos ou os problemas
(d) as ideias e o material necessários para a lição seguinte.
Essas notas são para seu próprio uso; não precisa de redigir um longo relatório.
Restrinja-se às indicações que facilitem a organização do seu trabalho. Não lhe
tomará mais que três minutos e fá-lo-á ganhar bastante tempo pois não terá de se
perguntar o que é que ensinou na sessão anterior ou o que terá de levar consigo quando
for dar a próxima lição.
8. Prepare-se devidamente
Organize-se e prepare-se antes de ir visitar uma criança a uma escola. Em que é que
vai trabalhar hoje? Tem todo o material necessário'- Tem as lições de leitura que vai
transcrever para Braille? Perderá tempo, seu e da criança, se não for já com tudo
devidamente preparado. Também não será correcto face à criança. Se não conseguir
organizar-se e preparar-se antes de ir à escola, é preferível que não vá. Para a
criança, será mais proveitoso ficar na aula e seguir as actividades normais, do que
permanecer sentada a seu lado enquanto você tenta preparar a sua lição.
9. Mantenha-se em contacto com outros educadores especializados
Eles podem-lhe dar ideias e material. Se necessitar de uma obra que algum deles tenha
já transcrita para Braille, talvez possa pedir-lha emprestada. Dessa forma, ganhará
tempo e poupará trabalho.
10. Aproveite as suas deslocações para reflectir
Enquanto se desloca no seu carro, na sua bicicleta, ou a pé, para ir de uma escola a
outra, aproveite para reflectir na sua próxima lição. Reveja-a mentalmente a fim de
ficar perfeitamente preparado para leccioná-la. Pense no que irá necessitar na semana ou
no mês seguintes. Tome as suas notas do dia. Isso ajudá-lo-á a manter-se organizado.
NOTAS:
1. À data da realização desta obra, J. Kirk Horton exercia funções de
cooperação na área da educação de deficientes visuais na Indonésia e verifica-se que
está presente nesta obra a preocupação em encontrar respostas que sejam acessíveis a
países em desenvolvimento.
2. A edição é de 1988, devendo algumas ideias, nomeadamente as orientações sobre a
utilização de textos e livros ampliados (hoje generalizadamente substituídos pela
utilização de auxiliares ópticos) ser consideradas à luz das orientações dominantes
nessa altura.
3. A ausência de referências à utilização dos meios informáticos no ensino dos
alunos com deficiência visual - hoje considerada de enorme importância - deve ser
entendida à luz do tipo de países a que esta obra inicialmente se destinou, em que os
recursos informáticos eram reduzidos.
ϟ
Título original: Education of visually impaired Pupils in Ordinary School
Autor: J. KIRK HORTON
Colecção "Guides
for Special Education" - UNESCO, 1988
Tradução: Jorge Casimiro - Instituto de Inovação Vocacional - Ministério da
Educação, 2000
Δ
publicado
por
MJA
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