
Manuel Bueno Martín
&
Salvador Toro Bueno

Professora cega ensina uma aluna a ler com os
dedos, 1926
Os termos défice visual, visão subnormal, baixa visão, visão residual e outros,
referem-se a uma redução da acuidade visual central ou a uma perda subtotal do campo
visual, devida a um processo patológico ocular ou cerebral (Faye, 1972).
Assim, a criança com défice visual é entendida como aquela que sofre de uma
alteração permanente nos olhos ou nas vias de condução do impulso visual. Isto causa
uma diminuição da capacidade de visão que constitui um obstáculo para o seu
desenvolvimento normal, necessitando por isso de uma atenção particular para as suas
necessidades especiais.
A OMS considera que existe deficiência visual quando a acuidade Visual de ambos os
olhos, com correcção, é igual a 0,3. A maioria dos países considera cegueira quando a
acuidade visual, com correcção, é igual ou inferior a 0,1, ou se existe uma redução
do campo visual inferior a dez graus. Abaixo deste nível, muitos «cegos» possuem
resíduos visuais que lhes permitem, por exemplo, ler e escrever, geralmente com tinta.
Para situar o leitor, estabeleceremos dentro da deficiência visual dois grandes
grupos, atendendo a definições funcionais. Um deles, aquele que engloba indivíduos com
deficiência visual, de visão subnormal, de baixa visão, com ambliopia (embora não na
sua definição oftalmológica), etc., compreende as pessoas que, apesar de uma redução
considerável da sua capacidade visual, possuem resíduos que possibilitam ler e escrever
com tinta, de forma habitual e, inclusive, obter êxito total em determinadas tarefas da
vida. O segundo, o que engloba os cegos ou invisuais, compreende as pessoas que não têm
nenhum resíduo visual ou que, tendo-o, apenas lhe possibilita orientar-se em direcção
à luz, perceber volumes, cores e ler grandes títulos, mas não permite o uso habitual da
leitura/escrita, mesmo a negro.
1. A VISÃO
O olho tem como função a visão. Podemos subdividir esta função em sentido da
forma, sentido cromático e sentido luminoso (Allen, 1979).
0 sentido da forma é a faculdade que o olho tem de perceber a figura e a forma
dos objectos. Conhece-se também pelo nome de acuidade visual. A maior acuidade visual é
conseguida numa parte da retina chamada mácula, quando se dirige o olhar directamente
para um objecto. É isto que constitui a visão central.
A visibilidade de um objecto é determinada pelo tamanho da imagem que chega à retina
e pela distância a que o objecto se situa. A combinação destes dois factores permite
calcular o ângulo visual mínimo ou, o que é o mesmo, permite calcular a imagem
retiniana mais pequena que pode ser vista; chegou-se à conclusão de que os objectos
cujas componentes formam um ângulo de 1' e os objectos completos que formam um ângulo de
5', podem ser identificados correctamente por um olho normal. Se o ângulo visual é menor
que 1', a sensação percebida de um determinado objecto é a de um ponto. Neste
princípio se baseia a construção dos livros e tabelas de letras ou sinais, optótipos
de Snellen e Jaeger, utilizados para determinação da acuidade visual - prova da função
macular -, tanto ao perto como ao longe.
A imagem formada na outra parte da retina dá lugar a uma imagem que não é clara mas
tem grande importância para a leitura, para ver objectos de grandes dimensões e para a
deslocação. É a visão periférica.
O espaço em que pode ser visto um objecto, enquanto o olhar permanece fixo num
determinado ponto, é o campo visual. A sua amplitude está em função do tamanho e cor
do objecto, da intensidade da iluminação, do contraste entre o objecto e o fundo, assim
como do estado de adaptação do olho à luminosidade do ambiente.
A amplitude do campo visual referida a um só olho abrange 90 ou mais graus para o lado
de fora; entre 45 e 60 para dentro, de 45 a 55 para cima e de 50 a 70 para baixo. A
redução normal do campo visual para cima e para dentro deve-se à interferência do
nariz e das pestanas e também a que as camadas sensíveis da retina não se estendam
tanto para o lado das têmporas como para o do nariz.
0 sentido cromático é a faculdade que o olho possui para distinguir as cores.
É atribuição dos cones, órgãos visuais terminais de que depende ainda a acuidade
visual.
Os cones concentram-se em maior número na mácula, que é, por isso, a zona da retina
com maior acuidade visual e maior poder discriminativo da cor. Os bastões, também
órgãos visuais terminais, estendem-se pelo resto da retina, e servem a visão quando a
iluminação é escassa.
0 campo visual é mais reduzido para as cores que para o branco. Para o azul o campo é
de menos dez graus do que para o branco; para o encarnado, dez graus menos do que para o
azul e, por último, para o verde, dez graus menos do que para o encarnado. Os limites
correspondem aos pontos em que as cores são reconhecidas. A extensão do campo para as
cores depende do tamanho, brilho e saturação do objecto e dos factores, já enumerados,
que afectam o campo visual para a forma.
0 sentido luminoso é a faculdade do olho para distinguir gradações na
intensidade da luz. Está determinado pela mínima quantidade de luz necessária para que
um objecto permaneça visível, ou pela mais pequena diferença de iluminação que se
possa verificar.
À acomodação da retina à intensidade da luz dá-se nome de adaptação. As
mudanças de intensidade de iluminação produzem primeiro uma redução da visão para
chegar, progressivamente, a uma adaptação à obscuridade ou à luz.
2 - O DÉFICE VISUAL - SUAS CAUSAS
Pelo que até aqui tratámos, podemos verificar que o funcionamento visual não depende
apenas da acuidade visual, capacidade que fica gravemente comprometida por afecções
oculares como o albinismo, a irite, cataratas, doenças degenerativas da mácula, miopia e
afecções da córnea, entre outras, mas que, para além disso, depende também da
amplitude do campo visual, da capacidade de adaptação à mesma e, sobretudo, do uso que
o indivíduo tenha feito da sua visão.
As anomalias do campo visual têm maior importância para a capacidade funcional do
indivíduo do que a própria acuidade visual, pois influem na locomoção, leitura e
possibilidade de utilizar imagens ampliadas. As reduções patológicas do campo visual
diminuem os limites indicados para o olho normal. Podem afectá-lo uniformemente em todas
as direcções - são as reduções concêntricas que, se forem muito acentuadas, poderão
inutilizar toda a visão periférica, como acontece nos casos de retinite pigmentosa e de
atrofia do nervo óptico, por exemplo. Também podem afectar parte da periferia como no
caso do glaucoma, sendo então, geralmente, mais acentuadas do lado nasal, ou afectar a
metade do campo visual como no caso das hemianopsias.
As reduções de tipo patológico podem também ter lugar no interior do campo visual.
Podem existir pontos do campo visual onde a visão está muito diminuída ou mesmo
abolida. Estes pontos são os escotomas que podem ser percebidos, ou não, pelo
indivíduo, como manchas negras, e podem chegar a abolir totalmente a percepção da luz
nesta zona (escotoma periférico), ou afectar a visão central se estiver situado no ponto
de fixação (escotoma central).
As afecções da mácula e das zonas centrais do campo visual repercutem-se na
percepção das cores, conforme os casos, de forma flutuante ou permanente, chegando o
indivíduo afectado ao reconhecimento defeituoso das cores. Isto depende não só da
própria lesão como também das condições exteriores como a luminosidade, o tamanho do
objecto e o contraste deste com o fundo.
A acromatopsia, a retinose pigmentar, a atrofia óptica, o descolamento de retina e a
degenerescência da mácula, entre outras, produzem alterações mais ou menos graves na
percepção das cores.
A sensibilidade da retina à intensidade da luz produz efeitos que podem parecer-nos
contraditórios. Há pessoas que se movimentam melhor em ambientes de baixa iluminação,
ficando ofuscados em ambientes de luz muito intensa. É por exemplo o caso das pessoas que
sofrem de acromatopsia, albinismo, irite ou catarata, anomalias que produzem adaptação
deficiente a ambientes de iluminação média-alta. Outros, em virtude da sua baixa
visão, necessitam ambientes bem iluminados, chegando a funcionar como cegos ao
entardecer, à noite e, inclusive, em dias nublados. São os indivíduos afectados, por
exemplo, por glaucoma, atrofia do nervo óptico e retinite pigmentosa, alterações que se
caracterizam por falta de adaptação a ambientes de iluminação média-baixa e,
sobretudo, à obscuridade.
As mudanças de luminosidade, quando são bruscas, exigem, para qualquer pessoa, um
período de adaptação. Este período acentua-se ao máximo no caso de indivíduos com
défice visual. Saber quanto tempo a pessoa afectada demora a adaptar-se à luz ou à
obscuridade, ao passar de um meio sombrio ou de iluminação média a um de alta
iluminação, ou vice-versa, é de especial importância quando se deseja que esta execute
uma actividade imediatamente depois da mudança de ambiente; quando se pede a uma criança
de baixa visão a resolução de tarefas escolares depois de uma mudança na luminosidade
ou depois de um ofuscamento por reflexo, o conhecimento deste aspecto revela-se
particularmente importante.
A mesma acuidade visual e a mesma anomalia visual em dois indivíduos diferentes não
implica que a forma de funcionamento seja a mesma. O uso que se fizer dos resíduos
visuais é determinante, sendo possível alcançar quotas mais altas de capacidade visual
a partir de programas sequenciados de experiências visuais, sobretudo em crianças. [...]
3 - ASPECTOS PSICOLÓGICOS
O défice visual traduz-se numa redução da quantidade de informação que o
indivíduo recebe do meio ambiente, restringindo a grande quantidade de dados que este
oferece e que são de tanta importância para a construção do conhecimento sobre o mundo
exterior. Consequentemente, o deficiente visual pode ter (dependendo da gravidade do
défice) um conhecimento restrito do que o rodeia.
0 défice visual não origina necessariamente problemas no desenvolvimento psicológico
ou, pelo menos, não é evidente que a deficiência visual grave associe obrigatoriamente
problemas psicológicos ou deficiências de desenvolvimento. Se é certo, como antes
referíamos, que as experiências do indivíduo estão diminuídas, não é menos verdade
que o organismo dispõe de outras vias de recolha de informação que podem suprir ou
complementar a via visual, com a adequada orientação e apoio, não objectivados para a
aproximação do indivíduo a um «padrão normal», mas considerando-o como mais um
indivíduo, que tem características e necessidades particulares.
Nas pessoas cegas pode aparecer uma série de comportamentos que poderíamos enquadrar
dentro de uma categoria de rasgos comportamentais próprios dos cegos. Isto não quer
contudo dizer que todos os cegos os apresentem, nem que todos os que os apresentam o
façam de uma maneira uniforme.
Não se pode falar de uma psicologia específica da cegueira (Rosel, 1979), pois não
existem traços psicológicos dos cegos que não possam acontecer da mesma forma nas
pessoas normovisuais. Por isto, é mais razoável referirmo-nos a estas questões em
termos de «tendências».
Observamos frequentemente que a criança cega permanece mais tempo do que a normovisual
em algumas das etapas de desenvolvimento, pois a ausência de visão pode actuar como
freio ao desenvolvimento, tornando mais lenta a passagem de uma etapa a outra.
«... a psicologia da cegueira assume que os cegos não constituem uma
população cujas características têm de ser descritas em contraste com a população
considerada normal. Antes pensamos que estes indivíduos dispõem de recursos físicos e
psicológicos basicamente similares aos normo-visuais, à excepção, evidentemente, da
visão» (Ochaita. E. e Rosa. A.: Revista Infancia y Aprendizaje,Madrid, n.º41).
Contudo, no momento de compreender o desenvolvimento evolutivo da criança invisual, é
preciso referir o desenvolvimento dos normovisuais. Faremos uma breve descrição das
particularidades do desenvolvimento psicológico das crianças invisuais desde o
nascimento ou desde tenra idade.
Durante a primeira infância o desenvolvimento cognitivo e psicomotor das crianças
cegas é bastante afectado. No período sensoriomotor, o défice visual levanta graves
problemas; o desenvolvimento nesta etapa baseia-se na inteligência prática, na
percepção de sensações recebidas do meio ambiente e sua interacção com este através
dos primeiros movimentos. Até aos quatro meses a falta de visão não é ainda um factor
determinante: o bebé segue um ritmo de desenvolvimento normal, exercitando os reflexos
próprios e inatos, com excepção da resposta reflexa a estímulos luminosos; adquire as
primeiras capacidades, centradas no domínio do próprio corpo, como a sucção e
apreensão dos objectos que estão em contacto com o seu corpo. No entanto, não
estabelece relações completas com o exterior.
A partir dos quatro meses, os bebés normovisuais começam a desenvolver, por um lado,
o hábito de pegar nos objectos que percebem através da visão e, por outro, a
permanência dos objectos, coisa que não se consegue até ao ano e meio ou dois anos,
assim como a coordenação oculo-manual. Nos bebés cegos o processo é diferente,
verificando-se um atraso considerável devido a que a coordenação audio-manual é mais
difícil e a sua aquisição é mais lenta. Da mesma forma, a um bebé cego será muito
mais difícil adquirir a noção de permanência do objecto. Para ele, um objecto deixa de
existir no momento em que perde o seu contacto ou deixa de ouvir o seu som.
No bebé cego, o comportamento normal de agarrar um objecto não se verifica antes dos
sete meses. Só a partir daí começa a procurar os objectos que antes teve na mão. Por
volta dos nove meses começa a utilizar algumas formas de procura desses objectos e, a
partir dos 12 meses, aproximadamente, procura objectos guiando-se pelo som que emitem
mesmo sem antes ter pegado neles.
Quanto à postura, os bebés cegos seguem as mesmas linhas de desenvolvimento motor dos
bebés normovisuais, mas têm mais dificuldade na mobilidade devido à ausência de
estímulos visuais vindos do exterior. 0 início do gatinhar situa-se por volta dos 12
meses e a marcha pelos 19. Uma vez adquiridos estes comportamentos, ser-lhe-á mais fácil
a relação com o meio e a aquisição de noções relacionadas com os objectos que o
rodeiam, através da experimentação.
Na etapa pré-operatória, a partir dos dois anos, a criança cega (se adquiriu
adequadamente a noção de permanência dos objectos) começa a ser capaz de fazer a
representação de coisas, embora longe do completo desenvolvimento do pensamento
representativo que chegará com a adolescência. Esta aquisição tão importante é
determinada, no caso das crianças cegas, pelo correcto desenvolvimento da linguagem como
mediador entre o objecto e a sua representação.
Como características especiais podemos referir que, embora os comportamentos posturais
sigam uma evolução semelhante à dos normovisuais, o início da marcha é retardado em
virtude da falta de estímulos do exterior. Da mesma forma também é retardada a
aquisição de permanência do objecto e a prática do jogo simbólico.
Geralmente, a inteligência representativa manifesta-se nas crianças através da
capacidade para imitar modelos, da exteriorização da imagem mental através do desenho,
da prática do jogo simbólico e da capacidade de comunicação através da linguagem como
conjunto de símbolos. No caso das crianças cegas, os três primeiros aspectos estão
sujeitos a grandes dificuldades ou atrasos; daí a nossa insistência na importância da
linguagem e, portanto, da necessidade de uma estimulação adequada.
Ao longo da etapa das operações concretas (seis a 11 anos) as crianças vão
adquirindo capacidade para organizar a realidade através de «actos interiorizados»,
imaginando-a de forma flexível, lógica e coordenada. As crianças cegas, em relação
às crianças normovisuais sofrem um atraso na aquisição da capacidade para perceber as
operações concretas; apresentam maior desfazamento em tarefas de tipo
figurativo-perceptivo que nas de carácter linguístico. A principal causa deste atraso é
a forma sensorial utilizada para recolha da informação: a percepção táctil e a
aptidão natural. Esta modalidade perceptiva não lhes permite atingir um nível
semelhante ao dos normovisuais até aos 11 ou 14 anos, em tarefas relacionadas com as
operações concretas.
4 - ACÇÃO EDUCATIVA, MATERIAIS, INSTRUMENTOS E TÉCNICAS
Os indivíduos, crianças neste caso, que sofrem de um ou vários dos problemas antes
citados, a maioria de origem congénita-hereditária, assim como de outros que não foram
mencionados pela sua menor incidência na população escolar, encontram dificuldades - no
melhor dos casos - na percepção de vários aspectos visuais: objectos situados em
ambientes mal iluminados, objectos ou materiais colocados sobre fundos de cor semelhante,
objectos e seres vivos em movimento, profundidade, formas compostas, representações de
objectos tridimensionais e formas desproporcionadas. Terão problemas de coordenação
visuomotora, percepção do contraste figura-fundo, constância da forma, da posição no
espaço e das relações espaciais.
As alterações da percepção constituem um handicap para a aprendizagem em
geral e para as aprendizagens escolares em particular. Se não atendermos a estes
problemas com uma acção educativa que vise as suas necessidades específicas - se
possível logo nos primeiros meses de vida - ficarão sujeitos a um atraso escolar
considerável.
Por diferentes razões que em seguida enunciaremos, concebemos a intervenção
educativa junto da criança com défice visual, seja ou não cega, dentro do âmbito da
escola regular.
Razões de tipo psicológico. O contacto directo com as múltiplas
situações sociais surgidas na escola, permitirá ao deficiente visual a aquisição da
independência pessoal e do trabalho, tanto a nível individual como colectivo, e uma
aprendizagem participada com os companheiros normovisuais, que lhe proporcionará um
desenvolvimento psico-afectivo coerente e sem roturas com a realidade que viverá em
adulto.
Razões de tipo socioambiental. A escolarização integrada cumpre uma
dupla função: preparar a criança com baixa visão para ocupar um lugar na sociedade e,
através dos colegas, professores e pais, servir de agente modificador de atitudes da
própria sociedade para com a criança com problemas visuais, adaptando-se, evidentemente,
às suas necessidades específicas.
Razões de tipo legislativo. A Constituição, a Lei de Integração
Social dos Deficientes, os decretos relativos à Educação Especial e outros garantem
suficientemente o direito das pessoas com qualquer tipo de deficiência de receber uma
educação regular e obriga a sociedade a proporcionar-lha.
Razões de tipo estatístico. Na escola regular, os deficientes visuais,
através de adaptações e recursos adequados, alcançam, na maioria, resultados
satisfatórios. 70 por cento destes alunos mantêm relações sociais positivas e 60 por
cento conseguem resultados académicos correspondentes aos níveis das classes que
frequentam. Consideramos pois, que o meio social imediato (família, bairro e escola) é o
mais idóneo para o desenvolvimento integral das crianças, sempre que leve em conta as
características de cada uma. Consequentemente, a educação do deficiente visual grave
pressupõe que se parta do conhecimento destas características para adaptar o meio às
mesmas e pôr em prática estratégias ou técnicas de intervenção coordenada entre
todos profissionais que participam da acção educativa.
A acção educativa dirigida a estas crianças deve contar com a aplicação de
estratégias ou técnicas específicas para a estimulação visual, orientação e
mobilidade, aquisição de capacidades para actividades da vida diária, para a leitura,
escrita e cálculo, com materiais específicos e adaptados, com a utilização de
auxiliares que permitam a ampliação da imagem visual e com um reforço em determinadas
áreas do currículo, quando for necessário. Tudo isto será sempre feito em condições
apropriadas de iluminação e, sobretudo, deverá contar com uma intervenção precoce
iniciada o mais cedo possível.
Não faremos distinção entre técnicas/estratégias a utilizar com crianças com
resíduos visuais úteis para a leitura/escrita a negro, das utilizadas para a educação
de cegos profundos.
4.1. Estimulação visual
A capacidade de utilizar a visão para retirar informação do que se vê (eficácia
visual) não é inata nem se desenvolve automaticamente nas pessoas de visão deficiente;
não é determinada apenas pela acuidade visual e não está relacionada necessariamente
com o grau ou classe do problema visual do indivíduo. Duas pessoas com o mesmo handicap
visual desenvolvem comportamentos visuais diferentes. Para o professor, a eficácia
visual tem especial interesse porque é educável.
Uma criança com visão normal adquire espontaneamente um desenvolvimento visual
eficaz, perfeitamente relacionado com o que percebe através dos outros sentidos; estas
percepções experimentadas associam-se e reforçam-se mutuamente. 0 desenvolvimento
visual está relacionado com a aprendizagem.
Uma criança com baixa visão, em consequência do seu problema visual, tem escassas ou
nenhumas oportunidades de recolher informação acidental através do sentido da visão;
por este motivo, provavelmente, perceberá apenas os objectos como uma massa indefinida,
um borrão, sem forma nem contorno específicos. É preciso ensinar-lhe o processo de
discriminação de formas, contornos de figuras e dos símbolos a que não prestou
atenção, por se tratar de um processo que corresponde a um modelo complexo de
aprendizagem que a criança não atingiu espontaneamente em consequência do seu
impedimento visual.
A criança de baixa visão pode «aprender a ver» a partir de tarefas visuais,
individualizadas, motivantes e sequenciadas segundo as seguintes etapas:
1.ª - Tomada de consciência do estímulo visual. Mediante a fixação
do olhar em objectos que chamem a sua atenção pelas cores brilhantes ou porque reflectem
facilmente a luz. Para isso, aproximaremos os objectos da criança até que esta possa
vê-los; apresentar-lhe-emos objectos em movimento a certa distância, fazendo-os entrar
no seu campo visual a partir de diferentes direcções.
2.ª - Preparação da forma. Mediante objectos que contrastam com o
fundo, começando pelo mais contrastante e no ambiente luminoso mais indicado para a
criança.
3.ª - Percepção da forma de objectos representados em desenhos e outros tipos
de esquemas visuais. Partindo do desenho de objectos de cores fortes e sólidas,
branco/preto e outras cores brilhantes que contrastem com a sombra, até chegar a desenhos
esquemáticos, de contornos e com muitos pormenores.
4.ª - Discriminação e reconhecimento de figuras em desenhos que indiquem
acção. Fixando a atenção nas diferenças existentes entre uma imagem e outra,
assinalando diferenças entre um objecto e uma pessoa, imitando movimentos de pessoas.
5.ª - Memória, complementação, unificação e organização visual. Capacidade
para conservar imagens visuais e organizá-las mentalmente de modo a poder retirá-las de
um todo. A criança pode adquirir esta capacidade relacionando pormenores e estruturas com
as imagens mentais que já possui. Este nível de funcionamento é de crucial importância
para as crianças deficientes visuais, que terão de reconhecer muitas coisas mesmo só
vendo parte delas.
Para que uma criança com baixa visão desenvolva a sua capacidade visual e adquira um
funcionamento eficiente é preciso, por um lado, coordenar programas específicos,
sequenciadamente, aplicados por especialistas e utilizar materiais próprios e técnicas
concretas; por outro lado, utilizar continuamente a visão em tarefas variadas e
condições ambientais, sob o controlo do professor da classe e do professor de apoio.
Os programas específicos de estimulação visual serão feitos pelo especialista,
pois, a maior parte das vezes, requer uma individualização muito cuidadosa, difícil de
se fazer em simultâneo com as actividades da aula. Não obstante, o professor deve tomar
parte activa, incentivando o aluno a usar constantemente a visão participando em tarefas
como as seguintes:
a) Seguir visualmente objectos em movimentos regulares e irregulares, primeiro sem
mexer a cabeça e depois rodando-a para acompanhar o objecto. Estas actividades servem
para treino do movimento dos olhos.
b) Recortar, passar a ferro, enfiar a agulha, abotoar e desabotoar, atar e desatar,
despejar líquidos e objectos pequenos de um recipiente para outro, bater, lançar e
colher objectos, corridas, saltos, etc., são actividades que desenvolvem a coordenação
visuomotora.
c) Discriminar objectos por categorias, seleccioná-los por identificação de
características, relatar o que viu ao «varrer» com o olhar um quadro ou em situações
reais em espaços interiores e exteriores. Estas actividades favorecem, entre outras
coisas, a percepção da figura/fundo.
d) Manipular objectos e materiais, construções livres, reconhecimento de objectos
tridimensionais em quadros, fazer comparações e encontrar diferenças entre formas
complexas, classificar segundo o tamanho, forma e cor, desenvolvem a avaliação da
constância perceptual.
e) Estabelecimento de relações corpo/objecto, direccionalidade, inversão e
rotação, distinção de posições num modelo dado, construções com objectos a partir
de modelos reais e figurados. Estes exercícios favorecem a percepção da posição de
objectos no espaço em relação ao indivíduo e dos objectos entre si.
f) Memorização de estímulos visuais. Série de exercícios, em progressão: figuras
isoladas, modelos complexos, sequências visuais e séries de acções.
g) Composição de estruturas em formas geométricas com modelo, sem modelo, com troca
de posição de uma figura e de várias figuras; repetir de memória. São actividades que
desenvolvem a elaboração mental das imagens visuais.
O professor deverá ter em conta as seguintes considerações:
1. Provocar a utilização da visão em todo o tipo de tarefas. A visão não se
gasta com o uso.
2. Evitar o fracasso, sobretudo no início das experiências visuais.
3. Explicar «com palavras» as tarefas a realizar.
4. Observar as reacções da criança.
4.2. - Iluminação
Qualquer ambiente que rodeie o deficiente visual deve proporcionar a máxima
visibilidade, sobretudo quando se tratar de trabalhos sobre pequenos pormenores. A
iluminação contribui para uma boa visibilidade como factor decisivo, de tal forma que
uma tarefa visual pode tornar-se simples ou complexa em função da iluminação ambiente.
Geralmente, uma iluminação forte está associada a uma boa visibilidade. Isto
acontece com as pessoas de visão normal ou nos casos, já mencionados, de atrofia óptica
ou de retinite pigmentosa, por exemplo. Contudo, a visibilidade nem sempre aumenta com
esse tipo de iluminação. Os casos de acromatopsia, aniridia ou cataratas, entre outros,
requerem uma iluminação média-baixa para obterem um bom funcionamento visual.
Quanto à iluminação, é conveniente considerar:
a) A necessidade de luminosidade varia caso a caso.
b) A luz a incidir directamente sobre os olhos provoca encandeamento, diminuindo a
percepção e aumentando o cansaço.
c) As mudanças bruscas de luminosidade perturbam a visibilidade, podendo reduzi-la
completamente durante um tempo que varia de indivíduo para indivíduo.
d) Quando isto acontece é preciso conceder à criança o tempo necessário para que se
produza acomodação ao novo ambiente luminoso.
e) Como regra geral recomenda-se um ambiente de iluminação difusa e uma luz forte
dirigida para o trabalho que se está a realizar, proveniente de cima e de trás para
evitar ofuscamento, através de um candeeiro de braço flexível.
4.3. - Os auxiliares ópticos
As lentes utilizadas para corrigir os défices de visão são meios ópticos que
compensam a acuidade visual diminuída, aumentando o tamanho da imagem retiniana, quer
telescopicamente, quer permitindo ao indivíduo aproximar os objectos dos olhos a uma
distância inferior à que lhe seria permitida pela sua própria capacidade de
acomodação (Faye, 1972). São utilizados sob a forma de óculos, lentes de contacto,
lentes telescópicas ou lupas. Devem ser sempre prescritos pelo oftalmologista.
Geralmente, é preciso ter presente que o emprego de lentes de aumento não permite
obter uma visão normal: reduz o campo visual, e a distância visual proporcionada não
tem relação com a distância real.
4.4. - As ampliações
As imagens visuais podem ser aumentadas por outros meios para além dos auxiliares
ópticos; isso pode ser feito manualmente ou através de sistemas projectivos
electrónicos.
a) A ampliação manuscrita. É um recurso muito utilizado
na escola tanto no quadro como no caderno do aluno. Deve cumprir os seguintes requisitos:
- Clareza e uniformidade de caracteres. As letras devem poder distinguir-se facilmente
umas das outras, sem que no entanto nenhuma se destaque das demais.
- Os espaços entre as palavras devem ser uniformes, para facilidade de leitura .
- Os elementos devem ser simples. Caracteres com arabescos provocam confusão.
- Os traços devem ter um tamanho adequado. Não devem ser finos a ponto de serem
dificilmente vistos pelo deficiente visual, nem tão grossos que ele possa percebê-los
como manchas no papel.
- Deve haver um contraste máximo entre o papel e a escrita. Papel branco não acetinado e
marcador negro quando não seja possível distinguir claramente a escrita a lápis ou
esferográfica. Favorece-se o contraste colocando um filtro amarelo por cima do papel
branco impresso a negro. Não são aconselháveis as tintas nem os papéis de cor, pois
podem não ser vistos pelo deficiente visual.
b) Os sistemas de ampliação projectivos e electrónicos. Os
mais facilmente utilizáveis na escola são:
- Projectores de diapositivos, de opacos e retroprojector. Proporcionam ampliações
consideráveis da imagem do objecto, embora a custo de uma menor resolução e de uma
perda de luz.
- Telelupa. É um instrumento constituído por um ecrã de televisão, uma câmara que
recolhe a informação impressa transferindo-a do ecrã, e de um sistema seleccionador de
lentes que proporciona diversos graus de ampliação. Possibilita ler o texto numa
posição mais cómoda.
- Fotocopiadora. Permite a ampliação de textos escritos para o tamanho desejado,
automaticamente ou por meio de sucessivas ampliações. A ampliação dos textos far-se-á
de acordo com a necessidade do aluno e dependerá do tamanho do original. Os livros em macrotipos obtidos por este sistema têm a
vantagem de permitir ao deficiente visual ler sem necessidade de usar continuamente a
lupa. Não obstante, apresentam inconvenientes. São discriminativos pela sua
apresentação diferente, são incómodos pelo seu tamanho e peso excessivos e são
deficitários em informação visual por não terem cor. A solução técnica
proporcionada pela fotocopiadora a cores encarece consideravelmente o produto e nem sem é
recomendável o seu uso. Nos casos de alterações do campo visual é francamente
desaconselhado.
4.5. - As representações em relevo
É preferível apresentar à criança objectos reais em vez das suas representações,
embora sejam muitas vezes empregadas como substitutos. As representações em relevo são
tão úteis para o cego como as representações gráficas podem ser para quem vê.
Utilizam-se como recurso no ensino da Geografia; para mapas e planos em relevo; na
Geometria, para as figuras e desenvolvimento de corpos, e em outras disciplinas que
precisem desenhos, esquemas, etc. São possíveis através da utilização de dois tipos
de aparelhos: o thermoform obtém cópias em plástico (a partir de uma matriz em
relevo), modelando-as pelo calor através do método de formação de vácuo; reproduz
igualmente textos em Braille. Também pelo calor, através do forno de Fuser, se consegue
representar um relevo gráfico, um desenho.
4.6. - Currículo escolar e deficiência visual
Os programas educativos para deficientes visuais, sejam ou não cegos, devem cobrir as
mesmas áreas e actividades contempladas nos programas regulares, embora considerando as
suas necessidades e o uso de recursos e materiais didácticos específicos. Quando for
necessário, terão lugar o reforço pedagógico e as técnicas de carácter específico.
A leitura / escrita.
A capacidade para ler e escrever é o resultado de um processo
complexo que requer um desenvolvimento adequado e a interacção de variáveis visuais,
auditivas, motoras, linguísticas, cognitivas e socio-emocionais. O défice de visão não
tem possibilidade de anular esta capacidade nem sequer para os que carecem totalmente
dela.
a) A leitura / escrita a negro
Muitos deficientes visuais podem aceder à leitura e à escrita a negro sem aparentes
dificuldades e sem usar material específico. Outros requerem alguns dos meios já
mencionados: iluminação adequada, auxiliares ópticos e ampliação da imagem do
objecto, além de outros que em seguida descreveremos.
- 0 tiposcópio. Consiste num cartão negro com uma fenda rectangular de um
tamanho que permita ver uma linha impressa. Colocado sobre um texto escrito, serve de guia
para a leitura, favorecendo ao mesmo tempo o contraste da linha visível.
- Os cadernos pautados (quadriculados, com linhas simples ou de duas linhas).
Permitem aos deficientes visuais, que não podem ver as linhas convencionais, fazer uma
escrita rectilínea e correcta.
- O suporte para livros e a mesa de trabalho regulável. Ambos permitem ao
deficiente visual colocar o material impresso a uma distância operacional para poder ser
visto sem pegar nele e sem se posicionar incorrectamente; evita assim deformações da
coluna e uma posição cansativa.
b) A leitura e escrita em relevo. 0 sistema Braille
Os deficientes visuais com muito poucos resíduos visuais, ou
nenhuns, devem ter acesso à leitura e escrita através de um sistema táctil que
requer um código, instrumentos apropriados e uma técnica específica.
Muitos sistemas foram ensaiados ao longo da história e foi adoptado, universalmente, o
sistema Braille. Este sistema baseia-se na combinação de seis pontos em relevo,
dispostos em células organizadas em unidades de dois pontos na horizontal e três na
vertical. Os pontos das filas verticais são numerados de um a três na fila da esquerda e
de quatro a seis na da direita. A descrição de qualquer sinal Braille realiza-se em
função dos pontos em relevo, segundo uma ordem rigorosa.
As 64 combinações possíveis que geram os seis pontos, incluindo a célula sem pontos
e a célula com os seis pontos (signo gerador), permitiram a Luís Braille, seu inventor,
representar letras, vogais acentuadas, sinais de pontuação, sinais próprios do sistema,
números, etc. Em Espanha, o Sistema Braille foi declarado método oficial de leitura e
escrita, para cegos, em 1918. Na escrita normal cada combinação pode ter vários
significados ou nenhum e, além disso, há transcrições diferentes de um país para
outro segundo as adaptações que tenham sido feitas do sistema. Os acordos de Montevideu
em 1987, vigentes desde o ano de 1988, unificaram os critérios de transcrição para a
língua hispânica.
Algumas combinações de pontos empregam-se para mudar o significado da combinação
que lhes sucede. São os prefixos. Não têm transcrição própria. Por exemplo, os dez
primeiros dígitos formam-se antepondo as combinações de pontos correspondentes às
letras a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, ao prefixo formado pela combinação dos pontos 3, 4,
5 e 6, significando os números 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 0, respectivamente. A
transcrição correspondente aos sinais matemáticos é feita através de uma ou mais
combinações de seis pontos.
A escrita de Braille faz-se sobre papel próprio para o efeito, grosso e macio, por
meio de uma perfuração feita sobre uma pauta, ou mecanicamente. Os instrumentos de
escrita mais usuais são:
- Punção. Estilete de ponta arredondada, para não rasgar o papel, que se
segura entre os dedos indicador, polegar e médio para fazer os pontos em relevo. Existem
vários modelos.
- Pauta. Guia formado por uma placa metálica ou de plástico, com sulcos
horizontais e paralelos onde se ajusta a ponta do estilete; um caixilho para segurar o
papel e uma ranhura para marcar os pontos das células que formarão cada sinal. A escrita
por este processo é feita no papel, do lado contrário àquele em que se faz a leitura.
Existem também vários modelos.
- Máquina de escrever Braille. O modelo Perkins é o mais conhecido. Com um
teclado de nove peças, permite simultaneamente a impressão de todos os pontos que
compõem um sinal Braille e também mudar de espaço, retroceder, mudar de linha.
Possibilita sobretudo uma maior rapidez de escrita, a leitura simultânea e a correcção
directa dos erros. Há outros instrumentos mais modernos de leitura e escrita Braille, mas
não estão ao alcance dos nossos alunos cegos.
Na pré-aprendizagem de Braille utilizam-se dois instrumentos para familiarização com
este tipo de escrita e com a iniciação à leitura e escrita através do sistema:
- A régua para escrita Braille. É um caixilho composto por dez células
perfuradas com os seis pontos Braille; tem um tamanho suficientemente grande para que a
criança pequena possa inserir nos orifícios cavilhas semelhantes aos pontos braille com
que compõe os sinais ou letras.
- 0 quadro para treino da escrita. Tem alguma semelhança com a régua, embora
seja formado por seis filas de encaixes. Permite reproduzir modelos de escrita amplos e
iniciar a leitura.
O cálculo.
As técnicas para aprendizagem do cálculo e do raciocínio matemático do deficiente
visual não diferem das utilizadas para os normovisuais. Apenas existem diferenças nos
instrumentos utilizados. Para além da máquina de escrever, utilizam-se os seguintes
instrumentos:
- A caixa aritmética. Consiste numa caixa de madeira do tamanho de uma folha de
livro. Numa das tampas existe uma rede sobre a qual se colocam as peças em forma de
prisma rectangular que têm numa das bases os números e sinais matemáticos, em relevo.
Na outra podem ter, também em relevo, os números árabes. A outra tampa divide-se em
compartimentos onde se guardam as peças, ordenadas. Este instrumento é útil para o
desenvolvimento do cálculo operatório.
- 0 cubaritmo. Compõe-se de uma rede com pontos em relevo nas duas faces. As
diferentes posições de cada uma proporciona os símbolos matemáticos mais usuais e os
números. Apresenta, sobre a caixa aritmética, a vantagem de poupar tempo e esforço ao
suprimir a classificação das peças.
- O ábaco. É um instrumento que permite, uma vez adquirida a técnica, calcular
com grande rapidez. É formado por uma régua longitudinal atravessada por hastes
perpendiculares onde estão enfiadas quatro contas de cor vermelha na parte inferior e uma
de cor preta no terço superior.
0 desenho linear e a geometria.
Para realizar medições em geral, os cegos podem empregar o transferidor, o compasso
a régua milimétrica e o metro, todos eles com indicações tácteis. O desenho linear em
relevo é possível graças à prancha de desenho positivo (prancha de borracha-virgem
sobre a qual se situa a lâmina de desenho positivo, folha de plástico especial) e às
rodas dentadas, ao compasso, ao estilete e ao transferidor como marcadores. Utiliza-se
também o tabuleiro de desenho negativo para desenhar com papel Braille; o desenho é
realizado em negativo e, ao virar o papel, aparece ao tacto na forma correcta, tal como
acontece com a escrita com pauta e régua. Outros conceitos geométricos, quando não se
trate de objectos reais, serão introduzidos empregando representações em relevo, o
geoplano, etc.
A Geografia e a História.
Os mapas, o globo terrestre e os planos em relevo permitem aos alunos cegos aceder ao
mesmo tipo de auxiliares que os normovisuais. As maquetas de gesso ou plástico
permitem-lhes o acesso aos diferentes estilos arquitectónicos para melhor compreensão da
História da Arte.
4.7. - 0 reforço pedagógico e a coordenação técnico-docente
As anomalias no sistema encarregado de elaborar a percepção visual, que tão
directamente influi na formação das capacidades necessárias às aprendizagens
escolares, podem comprometer o ritmo de aquisição da leitura, da escrita, da aritmética
e de outras matérias, nas crianças que as apresentam, de uma forma mais acentuada do que
no resto das crianças da sua idade, sobretudo se não contarem com as adaptações
adequadas às suas possibilidades.
Alguns alunos precisarão apenas de um ajuste do tempo ao seu ritmo de trabalho, mais
lento do que na criança de visão normal, para levarem a cabo os programas regulares.
Outros requerem, para além disso, uma planificação de actividades e de uma adaptação
do processo de avaliação. Há os que deverão seguir programas de desenvolvimento
individual segundo os quais serão avaliados.
Estas adaptações, assim como o reforço nas áreas deficitárias dos programas, quer
regulares ou de desenvolvimento, competem ao professor
do ensino regular, aos professores de apoio e aos especialistas dos serviços de apoio
externo às escolas, segundo circunstâncias e aspectos que devem ser determinados de
forma coordenada por este grupo de profissionais que intervêm na acção educativa junto
da criança com baixa visão. Esta coordenação deve basear-se na unificação de
critérios de actuação e na distribuição correcta das atribuições dos diferentes
profissionais.
4.8. - Intervenção precoce
Se retomarmos por um momento as características da cegueira, dar-nos-emos conta das
dificuldades com que se pode defrontar uma criança invisual durante os primeiros meses ou
anos de vida. 0 seu mundo circundante, a sua realidade, vêem-se reduzidas ao limitado
espaço que o seu corpo ocupa e as suas referências do exterior reduzem-se, nos primeiros
momentos, aos sons e aos contactos corporais (de carácter geral) com a mãe e com outras
pessoas encarregadas de cuidar dela.
Nestas circunstâncias, as relações afectivas e de apego do bebé com a mãe são de
grande importância. Por isso, a família e, sobretudo, a mãe, devem conhecer as
capacidades da criança, que aspectos fundamentais devem ser tidos em conta e como
estimular a aprendizagem e o desenvolvimento do seu filho.
Durante os primeiros anos de vida, o desenvolvimento motor tem, só por si, uma
importância primordial, pela sua relação com o psiquismo e pela sua influência no
desenvolvimento cognitivo. Na criança cega ou deficiente
visual grave, tal como acontece com a criança normovisual, o desenvolvimento psicomotor
faz-se de uma forma espontânea ao responder a estímulos exteriores. Como a criança cega
não usufrui da percepção que o mundo exterior lhe oferecerá através da visão, deve
ser estimulada a fim de evitar desfazamentos na sua evolução e favorecer o
desenvolvimento; procurar-se-á, no entanto, evitar uma superprotecção excessiva que
poderá resultar limitadora desse desenvolvimento.
0 desenvolvimento psicomotor segue uma trajectória céfalo-caudal, iniciando-se pelo
controlo da cabeça, principalmente como resposta a estímulos visuais. A mãe deve fazer
uma estimulação apropriada que incite a criança a conseguir este controlo, tentando
sempre associá-la aos hábitos diários, como por exemplo o banho. Os sorrisos e
expressões faciais do adulto, altamente gratificantes para o bebé normovisual, devem ser
substituídos por contactos faciais, ao mesmo tempo que se vai falando com ele, para que o
bebé se aperceba da cara de quem lhe fala.
Posteriormente, o bebé conseguirá sentar-se, o que lhe permitirá ter as mãos livres
para agarrar, explorar e investigar acerca dos objectos. 0 bebé cego tem de aprender a
manipular os objectos, mas, enquanto o normovisual se apoia no que vê para esta
aprendizagem, o bebé cego tem de aprender a usar as mãos e dedos para «ver» com eles.
Uma ajustada coordenação manual e a aprendizagem do agarrar e manipular objectos
adquirem-se sequenciando as tarefas prévias. A modo de exemplo, assinalamos algumas:
- Contacto mão/boca,
- mão/mão,
- pegar em objectos com a mão,
- atirar com objectos,
- mudar objectos de uma mão para outra,
- alcançar objectos,
- bater com os objectos na mesa,
- agarrar os objectos,
- bater com os objectos uns contra os outros,
- agarrar fazendo pinça,
- assinalar com objectos,
- colocar objectos uns dentro de outros,
- fazer construções com objectos.
Conseguidas as aptidões para se sentar, manipular e explorar objectos, o bebé estará
em condições de começar a rastejar e, posteriormente, a gatinhar. Deve-se estimular o
bebé para a aquisição destes comportamentos, tendo o cuidado de que não constituam um
fim em si, mas que sirvam de ponto de partida para novas tentativas e conhecimentos.
0 desenvolvimento da linguagem é outro aspecto fundamental. Neste sentido, as boas
relações afectivas da criança com as pessoas que a rodeiam e a adequada interacção
com a mãe dão lugar a que a linguagem siga um desenvolvimento análogo ao da criança
que vê. Da mesma maneira, o ajustado desenvolvimento da linguagem faz-se em paralelo com
a progressão das capacidades cognitivas (noções de permanência, conservação...);
daí a importância da atenção aos aspectos linguísticos e de comunicação desde tenra
idade. Torna-se necessário fomentar a sua curiosidade e motivação e estimular a
criança para que se aproxime ao mundo dos objectos, os manipule, explore e faça
experiências com eles.
Ao falar da comunicação e da sua problemática, é importante assinalar que esta se
refere tanto à criança como à mãe. Como a criança tem problemas na sua relação com
os objectos, não sentirá curiosidade por aqueles de que não se apercebe directamente
através do tacto; por isso, exigirá à mãe menos respostas do que, se fossem dadas,
seriam estimulantes para a criança. É preciso fazer um grande esforço para comunicar
com a criança e relacioná-la com o inundo dos objectos.
4.9. - Orientação e mobilidade
De todos os sentidos, é a visão que permite à criança conhecer e relacionar-se com
o meio que a rodeia. Não está claramente determinado se a visão provoca o movimento ou
se é o movimento que provoca e propicia a exploração e procura visual. Existe uma
multiplicidade de dados que nos permitem afirmar que o desenvolvimento motor e, mais
especificamente, o desenvolvi mento dos aspectos sensoriomotores, se produz mais rápida e
firmemente quando há uma coordenação precisa nas relações entre visão e movimento.
A visão é um sentido primordial. Oferece à criança a oportunidade de conhecer o
mundo circundante, proporciona grande variedade de experiências secundárias que se
integram na ideia que a criança tem do mundo, proporciona os dados de uma forma mais
exacta do que qualquer outro dos sentidos. Algumas características dos objectos (cor,
forma, relação espacial...) só podem ser percebidos através da visão, inclusive sem
intervenção do movimento. Além disso, através da visão, a criança adquire um
conceito instantâneo de totalidade: as imagens que se armazenam no cérebro formam um
sistema que se mantém mesmo quando os objectos desapareceram e, por último, permite à
criança aprender por imitação e aperfeiçoar (trocar, rectificar) movimentos de acordo
com o que vê.
Nas crianças com deficiência visual ou cegas, devido à estreita relação entre
movimento e aprendizagem, o movimento deve ser o principal apoio ou substituto da visão
para conseguirem o conhecimento do mundo que as rodeia. A forma como aprendem através dos
outros sentidos e do movimento é diferente da forma de aprendizagem das crianças sem
esse défice e dependerá muito das pessoas que com ela convivem (família, professores,
colegas...), já que são essas pessoas que a ensinarão a movimentar-se e lhe
facilitarão os meios e situações propiciadores do conhecimento e exploração.
Entre os objectivos da educação devemos destacar: capacitar as crianças para que
mantenham uma vida autónoma e independente que lhes permita uma adequada inter-relação
com o mundo que a rodeia. No caso dos indivíduos cegos ou deficientes visuais graves, o
desenvolvimento está muito determinado pela capacidade de deslocação autónoma.
É em casa que a criança começa a realizar as primeiras tentativas de mobilidade.
Estas adquirem um verdadeiro significado na escola, onde a criança é estimulada e motivada de forma a que os seus movimentos sejam dirigidos
para conseguir destrezas que lhe permitam estabelecer relações correctas com o seu meio envolvente.
Orientação
É a capacidade do indivíduo para conhecer o meio que o rodeia
e a sua relação espácio-temporal em relação ao mesmo.
Mobilidade
É a capacidade de deslocar-se de um lugar para outro com relativa facilidade, o que
implica interacção com o meio. A mobilidade refere-se a uma capacidade inata do
indivíduo, enquanto a orientação é algo que se aprende
(Crespo, 1980).
0 método de «Orientação e Mobilidade» foi desenvolvido por E. Hoover durante a
Segunda Guerra Mundial e sistematizado a partir de 1946, partindo de entrevistas e
observações de pessoas com boa capacidade de movimento.
Para se conseguir um desempenho correcto na orientação e mobilidade é necessário:
- capacidade física,
- detectar obstáculos existentes no solo (saliências ou buracos),
- detectar obstáculos existentes à altura da cabeça,
- desenvolver o sentido do obstáculo,
- capacidade espacial para formar mapas cognitivos,
- sentido comum e aproveitamento de indícios sensoriais para tomar decisões.
Para o treino da orientação e mobilidade concorrem muitos e variados exercícios
preparatórios que possibilitam ao indivíduo conseguir a capacidade e técnica
necessárias. Não se deve começar a ensinar apenas quando o indivíduo sente a
necessidade de se deslocar para atingir uma meta concreta; é um processo prolongado e
sequenciado que deve começar o mais cedo possível para conseguir aptidões que permitam
um desenvolvimento autónomo.
É na etapa pré-escolar que se começam a lançar as bases para que a criança cega
possa conseguir a sua independência motora. Nesta etapa devem-se fomentar dois aspectos
fundamentais: a actividade motora e a utilização eficaz e utilitária dos sentidos,
através de uma correcta organização de actividades encaminhadas nesse sentido.
Num programa educativo para crianças deficientes visuais é obrigatório contemplar a
orientação e mobilidade como elementos integrantes do currículo, no qual deverão
incluir-se conteúdos referentes, por um lado, a técnicas de exploração, deslocamento
livre no espaço escolar e em lugares fechados, itinerários simples e exercitação dos
sentidos e, por outro, referentes à discriminação e localização dos sons,
orientação auditiva, identificação táctil de marcas e sinais e diferenciação de
cheiros.
As técnicas de orientação e mobilidade mais utilizadas são as seguintes:
Guia normovisual
Técnica que permite ao aluno cego deslocar-se com ajuda de uma pessoa normovisual.
Para conseguir um desenvolvimento normal da marcha, o aluno deve manter-se atento aos
estímulos exteriores e ter absoluta confiança no guia.
Esta técnica tem uma série de requisitos entre os quais poderemos salientar: a forma
como o aluno se apoia no guia; caminhar por lugares planos; alternar o braço de apoio,
mudando de um para o outro braço do guia; subir e descer escadas; atravessar portas
(abrindo-as e fechando-as); sentar-se; sentar-se alinhadamente frente à mesa;
reconhecimento dos móveis; entrar e sair de automóveis.
Uso da bengala
A bengala para mobilidade é um instrumento que permite ao indivíduo uma deslocação
independente sem necessidade de guia. Possui características concretas quanto ao
comprimento, peso, solidez, rigidez e condução de vibrações. Através da bengala
pode-se, de forma segura, detectar e evitar obstáculos. São as seguintes as técnicas de
uso da bengala utilizadas com maior frequência:
- Técnica em diagonal: segura-se a bengala com o braço estendido, mantendo o
dedo indicador ao longo do punho desta. A extremidade inferior da bengala situa-se a 2 cm
do chão e o punho fica virado para a frente para proteger a mão. Esta técnica
utiliza-se em determinadas situações como, por exemplo, espaços interiores com que o
indivíduo está semi-familiarizado, à aproximação de portas que não se sabe se estão
abertas ou fechadas. Tem como desvantagens o não servir para detectar espaços vazios e
deixa sem protecção a parte superior do corpo.
- Técnica rítmica, também chamada técnica dos dois pontos, método do arco ou
método Hoover. Algumas das características desta técnica:
- Traçam-se com movimentos da bengala arcos simétricos para ambos os lados do corpo e
para a frente, de forma a que a bengala, ao baloiçar lateralmente, sobressaia cerca de
dois centímetros do plano dos ombros.
- A bengala deve formar um ângulo de 45 graus com o chão.
- 0 dedo indicador coloca-se ao longo do punho da bengala.
- A mão que segura a bengala deve ficar à frente do corpo, a meio.
- 0 movimento lateral deve fazer-se com o pulso, com o antebraço imóvel.
- A deslocação faz-se alternando os passos com os sucessivos toques da ponta da bengala
no chão, nos dois extremos do arco que descreve.
Outras técnicas, que não vamos explicitar, são as que utilizam o cão-guia ou
dispositivos electrónicos. Salientamos, por último, a importância de existir no
programa específico de educação da criança cega ou deficiente visual grave, a área
tão importante que é a Educação Física, pelo seu papel fundamental na superação das
dificuldades de movimento e deslocação inerentes à deficiência visual.
4.10. - Actividades de autonomia pessoal. Actividades da vida diária
0 objectivo principal da aquisição de capacidades básicas nas actividades da vida
quotidiana, enquadra-se dentro de um objectivo mais amplo: o direito de toda a pessoa para
escolher a sua própria forma de vida. A criança cega não desenvolve espontaneamente
estas aptidões e a destreza necessária; é preciso confrontá-la com situações
problemáticas.
Deve-se tentar que a criança consiga a máxima autonomia nas actividades a realizar em
casa, em tudo que se refere a higiene pessoal, outros cuidados consigo mesma e trabalhos
domésticos.
Estas actividades devem ser aprendidas gradualmente, de forma natural, no próprio
ambiente de casa, à medida que vão surgindo na vida quotidiana da família. Assim, a
criança irá manifestando as suas aptidões para se vestir, alimentar, lavar-se e manter
outros hábitos de higiene pessoal, etc.; da mesma forma procurar-se-á que a criança
colabore, na medida das suas possibilidades, noutras tarefas domésticas mais complexas
como fazer a cama, pôr e tirar a mesa, etc., sempre sob a supervisão dos adultos e de
forma lúdica.
5 - CASOS PRÁTICOS
Objectivo: Escolarização de uma criança cega no 1.º Ciclo do Ensino Básico,
numa escola regular.
Situação de referência: Trata-se de escolarizar numa escola regular, no
primeiro ano do 1.º Ciclo do Ensino Básico, uma criança invisual de seis anos de idade,
diagnosticada com fibroplasia retrolental poucos dias após o nascimento. Não tem
qualquer resíduo visual.
Período escolar: Iniciação da escolaridade
Características da escola: A escola situa-se num bairro de nível sociocultural
médio/baixo, numa cidade de província com uma população de 500.000 habitantes. Há 24
classes de Ensino Básico, duas de Ensino Pré-Primário e uma de apoio à integração.
Conta para além disso com outros serviços de apoio externos à escola: Equipa de
Psicologia e Orientação Escolar e Equipa de Apoio à Integração de Deficientes
Visuais.
Caracterização familiar: 0 núcleo familiar é composto pelo pai, mãe e dois
filhos de nove e seis anos. O pai exerce uma profissão liberal que permite à família
dispor de um nível socioeconómico que podemos classificar de médio/alto. No plano
afectivo, a relação entre todos os elementos da família é muito boa, estando os pais
sempre atentos às suas necessidades e evolução. A família foi-se adaptando ao problema
e actualmente a cegueira é aceite com naturalidade,
sendo o ambiente familiar favorável ao desenvolvimento da criança. Talvez em algumas
situações se note um excesso de protecção, o que é lógico e comum nas famílias
destas crianças. Em aspectos pontuais do desenvolvimento como o aparecimento dos
primeiros dentes, o gatinhar, o andar e o início da utilização da linguagem falada,
apresentou uma evolução normal.
Antecedentes escolares: Os pais detectaram o problema nos primeiros meses, ao
observar que não seguia objectos nem rostos, com o olhar. Recorreram a diferentes
especialistas cujo diagnóstico foi coincidente, com opinião da não possibilidade de
recuperação. Através da Equipa de Apoio à Integração de Deficientes Visuais tiveram
conhecimento da possibilidade de proporcionar à criança uma educação integrada. Num
primeiro momento esta foi feita numa creche e, posteriormente, num jardim de infância
não pertencente à escola onde agora inicia a sua escolarização. A integração foi
aceite sem quaisquer impedimentos por parte dos professores, embora a princípio se
mostrassem algo reticentes sobre as possibilidades dessa integração. A acção directa
desses professores junto da criança durante o período pré-escolar consolidou uma
relação e atitude favoráveis. A sua adaptação foi completamente positiva e frequentou
a escola com alegria e entusiasmo, sendo totalmente aceite pelos colegas. 0 processo de
socialização foi conseguido pela relação quotidiana do aluno com os colegas de classe,
através da sua participação em trabalhos colectivos (embora não tão activa como a da
criança normovisual) e, sobretudo, com a sua participação nos jogos, onde a criança
põe a prova as suas possibilidades de ser como os outros. Tudo isto foi conseguido
graças ao trabalho da professora do grupo, que fez a ponte entre o aluno cego e os
companheiros, ensinando-lhes, primeiro a procurar e compartilhar situações lúdicas para
todos desde os primeiros dias de escola; em segundo lugar, procurando que a criança
deficiente visual participasse em jogos em que a sua participação pudesse ser activa:
jogos em que pudesse obter êxito embora exigindo direcção e vigilância do adulto, em
determinados casos; por último, criando um clima de valorização dos seus trabalhos e
das técnicas específicas por ele utilizadas.
Os conteúdos específicos, por áreas, que foram trabalhados nesta etapa pré-escolar
a que nos vimos a referir, são os seguintes:
Psicomotricidade: conhecimento do próprio corpo, lateralidade, domínio
postural e equilíbrio, destreza manual, mobilidade, coordenação audiomanual.
Linguagem:
Expressão oral - vocabulário baseado nas suas próprias percepções, que lhe
permitiam utilizar uma linguagem significativa.
Expressão escrita - leitura /escrita Braille. A leitura Braille requer da criança
um processo de análise que terá de ser efectuada com os dedos indicadores, letra a
letra, já que não é possível captar com eles a totalidade de uma só vez. Juntamente
com a escrita, exige-lhe um treino que engloba as seguintes sequências:
1. Requisitos prévios ao ensino/aprendizagem do Braille. No caso das crianças
deficientes visuais têm especial importância os conceitos espaciais básicos, ou
conceitos de quantidade e a acuidade e eficiência sensorial.
2. Desenvolvimento de objectivos específicos que facilitam a aprendizagem da leitura e
escrita Braille: conhecimento da escrita formada por duas filas paralelas e verticais de
três elementos cada uma, localização espacial dos seis elementos e identificação de
cada elemento com a numeração própria dos pontos em Braille (do 1 ao 6). Os materiais
utilizados para isto são de diversas texturas e tamanhos, mas sempre de forma que possam
ser abarcados pelas mãos da criança.
3. Emprego de instrumentos específicos de pré-Braille: a régua amarela e o
quadro de pré-escrita braille.
4. Treino na utilização da máquina Braille: conhecimento do seu funcionamento,
exercícios de pré-escrita (linhas, sequências de pontos, seriações, combinações de
pontos...).
5. Emprego de técnicas e materiais específicos para a leitura e escrita.
- Conceitos lógico-matemáticos: posições espacio-temporais, tamanhos,
quantidades, semelhanças, diferenças, classificações, números, operações básicas.
- Educação sensorial: manipulação de vários materiais de diferentes texturas,
formas, tamanhos, pesos..., experimentação sensorial a partir das características dos
objectos.
- 0rientação, mobilidade e autonomia pessoal: conhecimento do meio escolar:
entrada, aula, casa de banho, espaços interiores, pátio de recreio; início das
técnicas básicas de deslocação no interior, mapas mentais; vestir-se e outros hábitos
de higiene pessoal;
A criança foi interiorizando estas situações e adquirindo faculdades que tornaram
possível passar a actividades de carácter mais complexo que lhe possibilitaram o acesso
ao 1.º ciclo.
Um factor importante na etapa pré-escolar foi a opinião dos adultos implicados, a sua
confiança nas possibilidades de adaptação da criança à escola regular e a capacidade
desta para oferecer respostas adequadas às suas necessidades. Continua a ser totalmente
importante manter este factor durante toda a etapa escolar agora iniciada.
Actuação no início da escolarização: No fim da pré-primária, o professor
especializado entrevista a equipa de integração da nova escola a fim de informar das
características, antecedentes escolares e passos necessários para a admissão. Ao
pensarmos ria integração de uma criança deficiente visual precisamos:
- Dar uma informação o mais completa possível a todos os profissionais implicados no
seu processo educativo (professor de ensino regular, professor de apoio, etc.) sobre as
consequências da cegueira no processo de desenvolvimento da criança, de forma a que
estes conheçam as possíveis reacções, o mecanismo de aprendizagem, os materiais e
técnicas a utilizar e a sua aplicação didáctica e a metodologia a empregar. O
objectivo desta informação será criar um clima positivo de acolhimento, para que estes
profissionais se transformem em agentes socializadores, facilitando a aceitação da
criança pelos colegas.
- Antes do começo das aulas, e porque a criança cega precisa fazer um reconhecimento
prévio do meio escolar, aprenderá a deslocar-se autonomamente pelos espaços que
habitualmente deverá percorrer dentro do recinto escolar, utilizando os seus
conhecimentos e recursos básicos em orientação e mobilidade e guiada pelo professor
especializado. Isto levá-la-á a adquirir segurança.
- Durante os primeiros dias é fundamental criar uma boa dinâmica de comunicação na
sala, informando os alunos das particularidades do companheiro, num diálogo em que todos
intervenham e propiciando a participação deste nos jogos e outras actividades como
elementos criadores de um ambiente favorecedor da adaptação à escola.
Coordenação da acção educativa: A educação de uma criança cega requer a
coordenação de todos os profissionais que nela intervêm. Compete ao professor da sala
desenvolver os conteúdos correspondentes ao programa e aplicá-los com todas as
crianças, incluindo o aluno invisual, através das adaptações metodológicas e
materiais que forem necessárias, recorrendo à colaboração do professor especialista.
A actuação do professor especialista na educação destas crianças consistirá no
ensino específico da leitura e escrita braille (sua aprendizagem e aperfeiçoamento);
técnicas de orientação e mobilidade; utilização de instrumentos específicos
(máquina, material de desenho, caixa aritmética, etc) e na elaboração e adaptação de
material e reforço pedagógico tanto nas técnicas instrumentais como noutros pontos do
currículo.
Nestes dois últimos aspectos considerados como competências do professor
especialista, o professor da classe deverá ter também uma participação activa. A
actuação de ambos os profissionais deverá ter lugar, preferencialmente, na própria
sala de aula.
ϟ
"Deficiente Visual e Acção Educativa" de
Manuel Bueno Martín e Salvador Toro Bueno integra a totalidade do texto contido nos pontos 1, 3,
4 e 5 e parte do ponto 2 do capítulo XIV da obra Necessidades Educativas Especiais
coordenada por Rafael Bautista. Foi traduzida do espanhol e adaptada por Ana Escoval - Ed.
Dinalivro, 1997
Δ
publicado
por
MJA
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