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 SOBRE A DEFICIÊNCIA VISUAL

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Desenvolvimento Visual da Criança com Déficit Visual Cortical

Jucimar Sidney


 

 Índice
1. DÉFICIT VISUAL CORTICAL E APRENDIZAGEM
2. COMO SE INICIA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM VISUAL?
3. SUGESTÕES DE ACTIVIDADES PARA ESTIMULAÇÃO VISUAL
4. DESENVOLVENDO A FUNÇÃO VISO-MOTORA - ESTUDO DE CASO
5.
DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES/FUNÇÕES PERCEPTIVO-VISUAIS

 

1. DÉFICIT VISUAL CORTICAL E APRENDIZAGEM

Os atendimentos que tenho realizado com crianças com déficits corticais, as quais me exigem maior estudo, além de pesquisas, critérios durante os atendimentos e avaliações constantes, tem contribuído muito para uma melhor compreensão da aprendizagem propriamente dita.

Sabe-se que, no nascimento, o cérebro é o órgão mais imaturo de todos. Continua seu crescimento e desenvolvimento durante os primeiros anos de vida. Nas crianças com desenvolvimento normal seu tamanho se duplica no primeiro ano de vida (Kotulak, 1886). Sabemos agora que o desenvolvimento do cérebro ocorre como resultado da edificação de milhares de conexões neurológicas entre as células e o cérebro. Através de práticas é que se fortalecem as conexões, ou seja, cada repetição de cada experiência proporcionará os caminhos neurológicos relacionados com a execução de determinadas actividades. Por exemplo, quando um bebê junta as mãos na metade de seu corpo, depois de haver praticado esta acção cem vezes, um cruzamento neurológico está em seu lugar. Estes cruzamentos fazem as coisas mais fáceis e mais eficientes (Greenough, 1985).

Grande parte do cérebro é destinada, desde o nascimento, ao processamento visual, talvez, devido à visão, ser o primeiro canal sensorial que a criança emprega intencionalmente para acessar informações do mundo que a cerca. Conforme BARRAGA (1978), a aprendizagem visual depende não apenas do olho, mas também da capacidade do cérebro de realizar a funções, portanto, a capacidade de funcionamento visual da criança depende fundamentalmente do seu desenvolvimento. Suas experiências visuais primárias possuem um papel fundamental, de forma particular, independente de qual possa ser a qualidade desta visão. Quanto mais a criança olha, especialmente em pequena distância, mais ela estimula os canais perceptivos para o cérebro. Conforme o cérebro recebe mais e mais informações, há uma eventual acumulação de variedades de imagens visuais.

Pouco a pouco, as partes do córtex, disponíveis para processar os dados visuais, começam a ser usadas para autuar outro tipo de dados sensoriais se a qualidade destes dados é significativamente melhor. A única maneira de este processo ser desenvolvido como é devido é proporcionado durante a infância com experiências sensoriais em todos os canais, inclusive o visual (Kolb, 1998).

Segundo Piaget (1986), grande parte do desenvolvimento humano ocorre nos primeiros anos de vida através da coordenação das ações sensório-motoras. É preciso que toda criança, principalmente durante o período de evolução visual, seja estimulada de forma a desenvolver todas as suas capacidades e habilidades funcionais. A qualidade da intervenção que proporcionamos é que irá determinar se as crianças com estes desafios têm experiências sensoriais apropriadas para o crescimento cognitivo ou não. No entanto, se estas experiências não se proporcionam da maneira correcta, podem ser prejudiciais. Eis, então, a necessidade de estudos e pesquisas, além da intervenção de uma equipe multidisciplinar durante este processo.

Além destes cuidados, devemos também levar em conta todas as áreas de desenvolvimento infantil. O factor emocional e sócio-emocional tem destaque durante este processo de aprendizagem, pois, os conflitos podem inibir a memória e o stress prolongado pode quebrar os caminhos neurológicos até mesmo em algumas partes do cérebro. Também, quando as interações com outros meios de tais atendimentos sensoriais se associam as exigências, os níveis de stress incluídos são maiores.

O único jeito de proporcionar atendimentos de qualidade sem causar stress, é escolher actividades que acreditamos irão gerar prazer na criança, além de passar-lhe segurança e, para aquelas que geram um determinado conflito, devemos dar-lhes sinais de que poderemos parar ou continuar o atendimento. Podemos fazer, observando o que faz a criança ou mesmo ajudá-la no exercício de determinadas actividades dando-lhes dicas e/ou mostrando-lhes caminhos para efectivá-las, seguindo seu ritmo e nível de intensidade. Uma óptima dica é, após recuperar a autoconfiança, parar por alguns instantes e esperar para ver se a criança iniciará ou concluirá uma resposta e convidá-la a um novo comportamento (van Dijk, 2000).

Criar uma “rotina” é uma óptima estratégia educativa. Através da rotina é possível estruturar experiências de aprendizagem sem stress.

O professor que trabalha com crianças com necessidades educativas especiais visuais no período preparatório deve estar atento para o fato de que a construção do sistema sensório-perceptivo e de representação simbólica da criança com baixa visão se organiza por um caminho diferente daquele da criança vidente. Sua interacção ativa e significante com o mundo concreto é representada por diferentes construções: manipulação, exploração e discriminação referentes às características, função, conceito ou representação, noção de causalidade e permanência de objectos. Por isso suas produções simbólicas e figurativas são incomparáveis.

A utilização de outros canais sensitivos é de grande importância durante este processo inicial. A utilização de recursos é fundamental para sua aprendizagem. É necessário que a criança manipule o objecto e o profissional deve, inicialmente, ajudá-la a identificar características similares e/ou que diferem de outros objectos do conhecimento e reconhecimento da criança. Aos poucos, com a apresentação de novos recursos a criança poderá contribuir mais com suas respostas (estas são de grande importância para um melhor direcionamento do profissional na realização de novas actividades).

O professor deve organizar situações concretas que estimulem e possibilitem a aquisição de novos conhecimentos, estando sempre pronto a responder as questões levantadas pelo aluno e, ao mesmo tempo, favorecer que ele descubra as respostas e crie questões novas a resolver.

O profissional deve procurar identificar o momento de fornecer o período de independência para a criança, afinal, se o profissional lhe der todas as informações acerca dos objectos como é que aquela criança poderá aprender algo se o cérebro de alguém está fazendo todo o plano de acção por ela?

A investigação sobre o potencial cerebral relacionado com atendimentos indica que há várias fases em cada atendimento e a actividade elétrica do cérebro pode medir-se durante cada fase. Deverão ser levados em conta, além da conscientização destas, o compromisso do profissional que irá trabalhar com uma criança deficiente visual, prioritariamente, crianças cegas e/ou com deficiências múltiplas. Ainda mais, deverá este profissional ter conhecimento tanto das bases e etapas de desenvolvimento infantil de crianças ditas normais, como também da área de saúde, especificamente, diagnósticos, prognósticos, adaptação de recursos ópticos (caso necessário) e embasamentos com referência a sua condição de aprendizagem.

Assim, uma criança com baixa visão, necessita de uma aprendizagem sistemática, dada por um professor especializado e precisa ser ensinada a usar os seus resíduos visuais para promover uma aprendizagem regular e intensiva e poder usar eficientemente as suas ajudas ópticas.

“Como é próprio dos indivíduos procurarem satisfazer seus impulsos, desejos e tendências, é da responsabilidade do professor oferecer ao aluno, ambiente adequado ao desenvolvimento de sua actividade natural, canalizando e guiando este impulso: o desejo de comunicação, o desejo da realização (fazer coisas), o desejo de investigação (curiosidade), o desejo de construção e produção.” (RUSSO, 2001, p. 29)

Podemos dizer, honestamente, que com a aplicação correcta destes princípios teremos sempre bons resultados. São necessárias informações e capacitação para proporcionar este tipo de programação. Nenhum sistema senso-neural é idêntico a outro. As experiências e os comportamentos de cada criança são diferentes. Tudo deve ser levado em conta durante a programação de actividades para aquisição de novos elementos cognitivos, sociais, de comportamento, sensoriais e motores. Geralmente, para que isto dê resultado, é necessário o trabalho conjunto de uma equipe.

Minha experiência nesta área confirma ainda mais minha crença de que, com uma atenção apropriada é possível realizar um bom trabalho e fornecer a estas crianças uma aprendizagem senso-motor satisfatória. Toda criança pode ser um aprendiz activo com a possibilidade de alcançar todo seu potencial, sem importar a idade, capacidade ou complexidade de sua deficiência.

A criança com baixa visão, sem dúvida alguma, goza desta mesma capacidade, quer seja na construção de novos conhecimentos, a partir da interacção com o meio ambiente, da relação com as pessoas, objectos e acontecimentos.

 

2. COMO SE INICIA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM VISUAL?

A visão é um fenômeno hermético e que inclui quatro etapas bem distintas: percepção, transformação, transmissão e interpretação.

A diversidade de patologias que provocam déficit visual e suas incidências num processo tão complexo como é o da visão trazem como conseqüência um comportamento visual muito heterogêneo, com exceção das perdas visuais de origem cerebral, pois, estas possuem características totalmente diferenciadas de todas as demais. Evidentemente, as diferenças individuais fazem com que cada pessoa se adapte de forma totalmente diferente segundo seu nível cognitivo, idade, personalidade, meio social e familiar, etc.

Segundo Moore (1997), o Déficit Visual Cortical é uma perda visual bilateral com respostas pupilares normais (as quais são produzidas no tronco cerebral) e sem anormalidades óbvias nos olhos. Constata-se que os componentes anteriores do sistema visual estão intactos, mas os componentes posteriores encontram-se comprometidos, assim, dependentes da área do cérebro afetada terão características muito diferenciadas.

“A deficiência visual cortical (DVC) é considerada uma alteração no cérebro, envolvendo a córtex visual em decorrência de acentuada prematuridade, ou situações críticas de sobrevivência, por isso, essas crianças apresentam, com freqüência, múltiplas deficiências e, até há bem pouco tempo, eram consideradas cegas.” (BRUNO, 2005, p.11)

De modo geral, apresentam grandes dificuldades para o controle de sua motilidade ocular, para realizar fixações continuadas (em muitos casos se dá a coincidência de diferentes patologias na mesma pessoa: assim, por exemplo, o nistagmus aparece associado a um bom número de patologias congênitas) e podem não apresentar nenhuma capacidade de acomodação (focalizar a diferentes distancias), etc.

Para Bruno (2005), as funções óculo-motoras, capacidade de fixar, focalizar, seguir os objectos no espaço e a coordenação olho-mão interfere no desenvolvimento e resolução visual e, para Lindestedt (1986), sem estas funções estas crianças não desenvolveriam uma capacidade de acomodação apropriada.

“A acomodação foi concebida por Lindestedt (1986) como o processo de formação de imagem clara na retina. Segundo a autora, a acomodação interferiria na resolução visual para actividades de perto; uma disfunção acomodativa resultaria em imagem nebulosa, stress físico, mental, fadiga e irritação.” (BRUNO, 2005, p.9)

Se o sistema visual estiver danificado e o prejuízo estiver nas partes do cérebro onde se processa a imagem, a estimulação visual é necessária. O cérebro necessita de 'experiências de visão’ para que possa organizar novas funções visuais (Ayres, 1995).

“A capacidade de ver e interpretar as imagens visuais depende fundamentalmente da função cerebral de receber, codificar, selecionar, armazenar e associar essas imagens a outras experiências anteriores.” (MEC, 2001: 29)

No campo da interpretação da informação, evidentemente relacionada com a situação a nível neurológico, a existência de um déficit sensorial da visão constitui por si só um obstáculo à aprendizagem. O desenvolvimento do pensamento e do raciocínio está conectado às experiências sociais a que as crianças estão expostas, cujos factores biológicos são determinantes apenas no início da vida. (Vygotsky, 1989)

“A carência de visão ou visão deficiente provoca problemas como a limitação de oportunidades de interacção ou experimentação do meio. Estes podem afectar o desenvolvimento evolutivo das crianças que os padecem provocando retardos e dificuldades sobre alguns aspectos das áreas cognitivo-perceptiva, motriz e expressivo-afetiva.” (RODRIGUEZ, 2005:01)

De acordo com FAYE, “a visão residual deve ser usada ao máximo de sua capacidade”; desde o ponto de vista perceptivo e de aprendizagem significa que quanto mais utilizar a visão, mais eficácia visual se obtém. Portanto, a visão é uma função aprendida, e sua qualidade pode melhorar com treinamento durante um período de tempo adequado.

Como relata FERREIRO: “A distância da informação que separa um grupo social de outro não pode ser atribuída a factores puramente cognitivos. Esta distância diminui quando o que está em jogo é o raciocínio da criança, aumenta quando se necessita contar com informações precisas do meio. (FERREIRO, 1995, p. 59)
Assim, a capacidade de funcionamento visual da criança depende fundamentalmente de seu desenvolvimento. Sua memória visual ainda encontra-se em amadurecimento. Quanto mais a criança é estimulada a olhar, principalmente em pequena distância, mais estimula os canais perceptivos para o cérebro que recebe mais e mais informações, proporcionando uma eventual acumulação de variedades de imagens.

Tanto a memória que se forma como a idéia que ganha corpo, se constituem por acção de uma função cognitiva presente tanto nos níveis superiores como inferiores, designando um ‘pensamento visual’.

O cérebro deve direccionar sua própria recuperação através da adaptação à estimulação e fornecimento de mais estímulos para si próprio. Ninguém pode fazer isso por ele. Piaget, citado por Ayres (1995), enfatizou que o estímulo e a resposta eram circulares, em um ambiente onde existem muitos estímulos, o indivíduo responde freqüentemente e de mais diferentes maneiras, e cria uma quantidade e variedade maior de estimulação para si mesmo.

“Jan, Groenveld e Wong (1988) observaram o efeito crowding nas crianças com DVC, isto é, falta de habilidade de seleção da imagem, eles demonstravam dificuldade para observar objectos ou figuras colocadas próximas ou juntas, mas podiam identificar mais rapidamente se estivessem destacadas e mais separadas no espaço. Elas podiam alcançar objectos focados para seus olhos e fazendo isto, eliminariam informações não essenciais, porque poderiam examinar apenas o objecto que entrava no seu campo visual.” (BRUNO, 2005, p.12)

Uma estimulação adequada, experiências anteriores, motivação do ver, cultivo da atenção, as necessidades que lhe vão surgir e a aprendizagem fará com que as capacidades visuais inatas se realizem e se reparem. Cada criança possui um caminho preferencial para essa aquisição. A partir daí, devemos ter este caminho e direcionamento perceptivo sempre em mente, objetivando cada vez mais a motivação e simplificação da compreensão ou o aprendizado destas crianças.

Rodrigues (2004: 05): “Segundo Manuel Bueno (1999) ‘para conseguir um adequado desenvolvimento da criança com baixa visão, é necessário que se lhes facilite o acesso à maior quantidade de informação procedente do meio através de uma adequada estimulação visual já que o déficit visual provocará limitadas oportunidades para acumular informações do meio.”

Os estímulos visuais, a princípio, precisam ser simples e isolados, devendo gradativamente atingir estímulos mais complexos. Devendo-se ter o cuidado de trabalhar uma função de cada vez. É preciso ter cuidado com os excessos.


Contraste

Necessitam de alto-contrastes principalmente preto no branco e branco no preto, diversificando as texturas (alto-relevo, médio-relevo, baixo-relevo, e aos poucos, sem nenhum relevo) para trabalhar as funções visuais-cognitivas, visomotoras e coordenação motora.

“o contraste pode ser potencializado por meio de lentes e filtros: além de lentes para melhorar a imagem, são recomendados filtros para diminuir o ofuscamento, o brilho e aumentar o contraste, melhorando a nitidez da imagem.” (HADDAD, SAMPAIO e KARA, 2001, p.20).


Tempo

O tempo de aprendizagem de uma criança com baixa visão varia de acordo com as condições e estímulos que serão oferecidos a ela. A velocidade e a precisão de respostas dependem do registo da imagem no léxico visual pela freqüência com que a criança já foi exposta e por tê-la acoplado ao seu sentido e da capacidade de raciocínio inferencial (dedutível) que possui permitindo-lhe antecipar itens ainda não visto. “As crianças com deficiência visual cortical necessitam de mais tempo, aproximadamente o dobro das crianças com apenas baixa visão.” (BRUNO, 2005, p. 5/6)

“Para Yakalov, o desenvolvimento das funções perceptivas superiores pode ocorrer até os dezasseis anos. Acreditamos que o desenvolvimento não é só biologicamente determinado, mas socialmente facilitado. E que o mundo não é visto simplesmente em cor e forma, mas sentido pela vivência e elaborado pelo significado.” (MEC, 2001: 52)

O processo é aparentemente lento, principalmente nos primeiros estágios, mas, à medida que há amadurecimento das funções e ampliação das capacidades a evolução estará mais perceptível. A família é muito importante para o desenvolvimento das potencialidades da criança, pois, é o apoio familiar que irá favorecer a concepção de uma rotina visual, reforçando actividades e condutas realizadas nos atendimentos.
Desde muito cedo entendemos que a nossa vida é um eterno processo de aprendizagem. A aprendizagem, o trabalho que envolve actividades tanto do domínio da memória como da idéia, é de fato uma das condições que favorecem investir no raciocínio. Ver é, sem dúvida, um dos seus factores principais. Recoletar memórias, desenvolver idéias, resolver problemas são capacidades próprias do intelecto.

 

3. SUGESTÕES DE ACTIVIDADES PARA ESTIMULAÇÃO VISUAL

MATERIAL:
1. Sala de aula / Sala de atendimento / ambiente iluminado
2. Luzes (natural e artificial)
3. Recursos em branco e preto e/ou contrastantes

OBJECTIVO:
Com a realização desta actividade a criança será capaz de perceber, tomar consciência e buscar a fonte luminosa e/ou contraste.

ACTIVIDADE 1 – COM LUZ SOLAR OU LUZ AMBIENTE
Utilizam-se contrastes entre obscuridade e claridade:
a) Fechar e abrir a janela, fazendo com que a criança perceba que a luz do sol lhe chega até os olhos;
b) Com ajuda do espelho, fazer com que a luz solar se reflita no rosto da criança;

ACTIVIDADE 2 – COM LUZ ARTIFICIAL DA LANTERNA
a) Fazer jogos de luzes, focando o rosto da criança com movimentos horizontais e verticais (lentamente, partindo sempre do centro para fora), motivando a busca, ou no nível ocular ou manipulativo (se sua motricidade o permite).
b) Para motivá-la a permanecer olhando para a luz da lanterna, você poderá acrescentar focos intermitentes (apagando e acendendo a lanterna com pequenos intervalos) utilizando filtros (pode ser papel acetato ou celofane colorido) ou lâmpadas coloridas.
c) Utilizar a luz natural ou artificial através de objectos brilhantes: colocar os objectos brilhantes na entrada da luz solar, girando-os para que possam refletir mais a luz e favorecer uma melhor visualização para a criança.

ACTIVIDADE 3 - OBJECTOS DE CORES INTENSAS E CONTRASTANTES
Apresentar os objectos aproximando-os dos olhos da criança, estimulando-a a pegar e manuseá-lo, para que, posteriormente, a criança seja capaz de captar a presença de um objecto, reconhecê-lo e/ou identificá-lo (mesmo que parcialmente).

Observação:

  1. A tonalidade cromática do objecto deverá contrastar com o fundo ambiental ou se o objecto tiver mais de uma cor, sua combinação precisa ser diferenciada.

  2. Manter repetidos contactos visuais com os estímulos apresentados, tanto em forma estática como em movimento, respeitando o campo visual da criança e a distância a qual possa perceber o objecto.

  3. Nos casos onde exista maior visão em um olho, apresentaremos os estímulos no campo visual dominante.

  4. Realizar seguimento do objecto em movimento horizontal, vertical, diagonal e circular (sempre iniciando com pequenas pausas na parte central).

  5. Localizar o objecto, assinalar ou indicar de onde está ou pegá-lo é fundamental para organização cognitiva da criança.

  6. Discriminar entre dois ou mais objectos facilita associar, pode optar e fazer demandas, naquelas crianças com graves dificuldades na expressão verbal.

 

4. DESENVOLVENDO A FUNÇÃO VISO-MOTORA DA CRIANÇA COM DÉFICIT CORTICAL – ESTUDO DE CASO

Foram adaptadas diferentes formas de tipógrafos para trabalhar a coordenação motora, visando desenvolver o processo de escrita, alcance do estágio ideal, facilitando assim, a aquisição futura de uma melhor habilidade para a leitura. A criança poderá utilizar esse recurso, o tipógrafo, também como auxílio para o alinhamento e distribuição das letras e frases durante o processo de escrita, além de oferecer melhor dimensão do espaço a ser utilizado e a relação deste com o tamanho da palavra. Além de que, durante este processo de aquisição da escrita podemos encontrar uma relação deste com a teoria da psicogênese de Piaget e Emília Ferreiro.

É oportuno que a escrita se desenvolva bem antes da aquisição das habilidades e/ou capacidades visuais para o processo de leitura.


Estudo de caso

Ainda, no final do ano de 2007, BS oralizava e escrevia com auxílio do tipógrafo as letras do alfabeto (letras de imprensa), palavras e pequenas frases, mas, no entanto, ainda não havia alcançado uma capacidade visual para leitura.

Este ano, em 2008, em parceria com os pais, BS está matriculada numa escola regular de ensino e esta tem acompanhado de forma prazerosa tal experiência. Com esta parceria, visamos minimizar a tensão obtida durante quase dois anos, com relação “braille” e “negro”, e dar-lhe oportunidade de conviver com outras crianças, numa nova rotina de trabalho, pretendendo com isso, além de seu desenvolvimento cognitivo a evolução de sua condição visual-cognitiva.

Assim sendo, com o apoio da mãe e da escola, tem sido possível até hoje, desenvolver suas habilidades socializando e integrando a BS ao mundo panorâmico.

É extraordinária a mudança advinda de seu ingresso numa escola “comum” em que convive com crianças ditas “normais”. Seu material escolar está sendo adaptado durante todo o processo. Os pais compraram os livros comuns para facilitar o acompanhamento com o professor de estimulação visual e a terapeuta ocupacional, para que possam trabalhar com antecipação habilidades necessárias para execução de algumas actividades. A escola tem demonstrado aceitação e interesse no trato com a criança, a família e os profissionais.

BS não demonstra aparentemente nenhum tido de dificuldades em seu processo de aprendizagem, entretanto, é possível perceber que a BS apresenta atraso com relação aos processos de leitura e escrita (maior dificuldade com a leitura). Tais dificuldades, de forma alguma, prejudicarão seu desenvolvimento educacional, pois, é possível, através de adaptações e das orientações dadas ao professor de sala comum promover o acesso à aprendizagem e aquisição de conhecimentos através de conteúdos abordados em sala de aula.

A aprendizagem e assimilação do conteúdo podem atingir-se através de conteúdos oralizadas e/ou actividades adaptadas, afinal, o objetivo principal da escola é o conhecimento e aprendizagem dos conteúdos. A leitura e a escrita seriam apenas recursos para esta aquisição. No entanto, não é possível que a BS utilize a leitura para aquisição do teor escolar. A família, os profissionais e colegas de sala servirão de intercâmbio entre o conteúdo a ser lido e a criança.

 

5. DESENVOLVIMENTO DE CAPACIDADES/FUNÇÕES PERCEPTIVO-VISUAIS

A estimulação perceptivo-visual é um instrumento fundamental para o desenvolvimento das capacidades perceptivo-visuais de todo ser humano e, principalmente às crianças portadoras de baixa-visão. Tal estimulação corresponde a um conjunto de situações pedagógicas que visam à aquisição de habilidades e melhoria das capacidades perceptivo-visuais.

A aplicação das técnicas de estimulação visual varia de acordo com as possibilidades visuais apresentadas pela criança, ou seja, dependentes das capacidades/funções perceptivo-visuais pré-existentes, bem como, das que se pretendem trabalhar. São estas:
 

PERCEPÇÃO VISUAL: Capacidade de interpretar o que é visto (desde a percepção da luz acesa da lanterna). É o processo pelo qual as informações recebidas pelo olho são transmitidas ao cérebro onde ocorre relacionamento com as experiências passadas. Tal habilidade requer maturação, ou seja, factores neuromotores e psicológicos, e experiência. Ex: perceber (a existência, mudança, movimento, etc.) mesmo sem identificar e/ou interpretar especificidades.

EFICIÊNCIA VISUAL: Domínio do mecanismo ótico – envolve velocidade e capacidade de filtração. Tal habilidade é dependente do uso máximo de visão residual.

EXPERIÊNCIA VISUAL: Compreende acuidade visual, reconhecimento e arquivamento da imagem, associação com experiências passadas e símbolo e formação de conceitos. Ex: a utilização da condição visual para sua vida, como, utilizá-la para se locomover, encontrar objectos de interesse, identificar tamanhos, formas, cores, larguras... visualmente, etc. Enfim, realizar actividades visuais significativas assimilando o experimento, bem como, realizando o registro em sua memória para uso indeterminado.

PERCEPÇÃO DE LUZ: Capacidade de indicar diferença entre claro e escuro (luminosidade), mesmo sem identificar de onde vem esta luz.

PROJEÇÃO DE LUZ: Capacidade de indicar a origem do foco da luz. (neste caso, observam-se também diferenças na focalização da luz em distâncias variadas, ou seja, a aquisição requer projecção de luz a maior distância, compara a análise anterior).

FIXAÇÃO: Refere-se ao ato de focar os olhos sobre um objecto ou estímulo visual sobre o papel. Neste caso também é possível identificar a distância melhor para focalização, e, mediante esta realizar um melhor trabalho na aquisição das habilidades.

OCLUSÃO VISUAL: Capacidade de perceber uma figura completa quando somente uma porção é visível.

PISTA VISUAL: Qualquer tipo de informação visual usada por uma pessoa para orienta-se e mover-se no espaço, além de desempenhar qualquer tarefa ou função, ou localizar um lugar ou objecto desejado.

SÍMBOLOS: Termo usado para se referir a letras e palavras que apareçam isoladamente (ou com outras), e, que podem ou não, estar associadas com objectos concretos ou gravuras.

VISÃO BINOCULAR: Uso simultâneo de ambos os olhos na focalização de um mesmo objecto e fundir as duas imagens para uma interpretação correta.

CAMPO VISUAL: Toda a área do espaço físico visível quando o corpo, a cabeça e os olhos estão imóveis, frente ao estímulo observado.

SEGUIMENTO VISUAL: Seguir com os olhos (visualmente) objectos em movimento (de cima para baixo, vice-versa, de um lado para o outro, na diagonal, etc.).

ACOMODAÇÃO: São ajustes que o olho realiza para ver a diferentes distâncias, executado pela mudança de forma do cristalino através da acção do músculo ciliar na focalização de uma imagem clara na retina.

ACUIDADE VISUAL: Refere-se a uma medida da capacidade de distinguir claramente os mínimos detalhes.

FUNCIONAMENTO VISUAL: Significa interpretar e compreender significativamente o que se vê.

FIGURAS: Refere-se aos contornos de objectos e formas geométricas e lineares com ou sem detalhes.

ATENÇÃO VISUAL: Olhar prolongadamente objectos ou figuras. As crianças com déficits corticais apresentam maior dificuldade para aquisição desta habilidade.

BRILHO (OFUSCAMENTO): Qualidade de brilho relativo da luz que cause desconforto no olho ou que interfere com a visibilidade e desempenho visual.

CONTRASTE: A diferença relativa entre o claro e escuro nas coisas (objectos) observadas.

PERCEPÇÃO DE PROFUNDIDADE: A capacidade para perceber a distância relativa de objectos e sua relação espacial com outros.

DIFERENCIAÇÃO DE FIGURA-FUNDO: Capacidade para perceber a distância relativa de objectos e sua relação espacial com outros.

DIFERENCIAÇÃO DE FIGURA-FUNDO: Capacidade para discriminar objectos visíveis, separando-os do fundo.

VISÃO PERIFÉRICA: Percepção de objectos, movimento, ou cor, fora da linha central da visão.

FOTOFOBIA: Anormalidade sensitiva, desconforto pela luz.

MAGNIFICAÇÃO: Um aumento no tamanho de um objecto ou símbolo percebido.

NISTAGMO: Movimento involuntário do globo ocular sintomático de disfunção neurológica. Pode ser vertical, lateral, rotatório ou misto, e intermitente.

INFORMAÇÃO VISUAL: Conhecimento do ambiente e das coisas adquirido através do sentido visual.

VISÃO RESIDUAL: Qualquer visão remanescente útil presente ou que possa ser desenvolvida apesar de imperfeição severa em qualquer das estruturas ou tecidos dos olhos, ou em alguma parte do sistema visual.

SISTEMA VISUAL: Todas as partes componentes do olho, nervo óptico, cérebro e associação de estágios que influenciam olhar e ver.

EXPLORAÇÃO VISUAL: Cuidada inspeção de objectos visíveis ou de ambiente circundante. Geralmente as crianças de baixa visão necessitam tocar e manipular o objecto, pois, carecem de visualizá-los em diferentes níveis e posições para uma melhor visualização e exploração visuais.


Estas capacidades/funções perceptivo-visuais somente podem ser desenvolvidas mediante análise e utilização de modificações nas condições ambientais:

  1. Controle da iluminação: aumentando-se a iluminação ambiental com focos luminosos para objectos, folhas de trabalho, textos, etc...

  2. Transmissão da luz: com auxílio de lentes absortivas e filtros que diminuem o ofuscamento e aumentam o contraste.

  3. Controle de reflexão, com tiposcópios, visores, oclusores laterais e lentes polarizadas.

  4. Acessórios: caneta de ponta porosa preta, lápis de escrever 6B, papel com pautas pretas, figuras sem muitos detalhes e com traçado escurecido e nítido (pré-escolar), suporte para leitura e partituras musicais.

  5. Aumento de contraste: usando-se cores bem contrastantes (preto/branco, preto/amarelo, branco/vermelho, etc.) em materiais como:
    folhas de papel em geral, canetas porosas, quadro branco/caneta preta, quadro-de-giz (preto)/giz branco, cores escuras em fundo brilhante (papel laminado) e/ou vice-versa.

  6. Ampliação: desenhos, figuras, exercícios, livros, jogos, etc.


Assim, com as adaptações ambientais necessárias é possível realizar um trabalho promissor durante os atendimentos de estimulação visual, concomitantemente com a utilização de seu resíduo visual para maturação da capacidade visual em seu ambiente (casa, escola, ou qualquer lugar onde possa ser realizada adaptação e que seja do convívio da criança).

 

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7.Jun.2010
publicado por MJA