Homem cego sentado em interior - Van Gogh (lápis)
1) Prefácio – Palavras em movimento
O som do motor ao girar das chaves anuncia uma nova corrida:
pé no acelerador, mão na marcha, carro na pista. Nosso motorista é
Candeia 1, que passa as horas do dia atrás do volante, levando
todo tipo de gente pelas ruas da cidade. Todos na praça o
conhecem, famoso por suas piadas e sambas de final de semana. Seu
corpo, já de idade, não é mais tão fiel à cadência da música, mas
ainda arrisca bordejos pelo salão. Lembra de quando serviu ao
exército, época em que marchava, pulava e rastejava. “Bons tempos
aqueles” 2, lembrava Candeia. Hoje, sente as dores que insistem em
acompanhar o avançar da idade, deixando apenas às boas lembranças
a destreza do corpo juvenil.
Quilômetros rodados, sobe rua, desce ladeira, cuidado com a
lombada, sinal fechado, hora de parar. Um passageiro faz sinal.
Pelo caminho, Candeia conversa para passar o tempo. Há quem diga
que um dia ele acabará se perdendo por causa das longas histórias.
Grande engano! O balançar do ônibus faz seu corpo se engajar no
movimento das ruas, indicando que a curva mais acentuada é a da
padaria do Seu João e que a lombada fica à beira da grande
avenida. Já não se sabe se o carro movimenta o corpo ou se o corpo
movimenta o carro.
A narrativa que apresentamos neste artigo é fruto do Projeto
de Pesquisa e Extensão Perceber sem Ver 3, cujo objetivo é seguir
as pistas dos arranjos singulares atravessados pelo ficar cego.
Abordamos a cegueira não como um conceito extraído da medicina ou
referenciado à noção de déficit ou incapacidade. Procuramos
acompanhá-la na história de cada sujeito, nos diferentes modos de
ordenamento 4, muitas vezes fluidos, outras vezes enrijecidos, que
aparecem quando seguimos as narrativas de quem passa por essa
experiência. Esse formato de apresentação do trabalho procurou
também aí sua inspiração: a produção de conhecimento na pesquisa
se faz a partir de um processo local, situado, que consiste em
seguir as narrativas daqueles que perderam a visão (Law e Mol,
1995, Law, 1999). Neste enfoque, afirmamos que, nas práticas
cotidianas singulares, as concepções de cegueira são feitas,
refeitas, reordenadas (Martins, 2006a). Isso não significa ignorar
o fato da ausência ou diminuição da função visual, mas sim
entender que as práticas cotidianas fazem existir diversas
concepções de cegueira, o que nos permite seguir as invenções e
criações do estar cego, longe de qualquer viés essencialista,
fatalista.
Percebemos, ao longo dos anos de pesquisa, que a deficiência
visual não é homogênea, nem em seus graus, nem na forma como é
vivenciada. Acompanhamos histórias em que a cegueira esteve
firmemente atrelada a uma ideia incapacitante, outras em que
representou a possibilidade de vida e ainda as que passaram de uma
condição para a outra. Começamos então a percorrer as múltiplas
falas produzidas sobre a cegueira, e uma delas estará atravessando
o presente trabalho. Importante lembrar que a narrativa tem o foco
em um personagem, mas que a composição da escrita, das
intervenções, das mudanças de lugar e das reverberações dependem e
são sempre parte de uma rede que não tem centro nem oferece lugar
privilegiado a nenhum de seus atores. Quando usamos a noção de
rede, referimo-nos a uma composição formada por séries de
elementos animados e inanimados, conectados e agenciados. Ela se
define pelas conexões que estabelece. As entidades que a compõem,
sejam naturais ou sociais, podem, a qualquer momento, redefinir
sua identidade e suas mútuas relações, trazendo novos elementos e
organizações (Latour, 1994; Moraes, 2004). Nosso trabalho discorre
sobre as muitas conexões que marcam o processo do cegar tal como
narrado através de Candeia.
Também importa aqui dedicar uma breve apresentação àquele
que inaugura esse artigo.
Candeia tem setenta e cinco anos, dos
quais trinta e seis passou percorrendo as ruas da cidade do Rio de
Janeiro como motorista de ônibus. Há cerca de três anos perdeu a
visão completamente e, há pouco mais de um, participa do trabalho
que realizamos no Instituto Benjamin Constant (IBC) 5. Neste
período, estivemos acompanhando sua história e as composições que
pôde criar a partir dos encontros conosco, com os outros
participantes e com as intervenções do trabalho. Faremos um
recorte, traduzido nas narrativas, onde iremos percorrer algumas
pistas que ele trazia sobre a formulação de novos arranjos em sua
vida.
O ato de compor indica formar algo a partir de outros
elementos, criar, arranjar. Não podemos deixar de falar sobre a
importância do corpo nesse processo. Ele é a via primeira de
contato com o mundo, qualquer que seja a qualidade desse vínculo.
Somos também compostos por essa materialidade que talvez tenha
ficado esquecida ou considerada menor pela afirmação cartesiana.
Na tradição fundada a partir do pensamento cartesiano, o corpo
ocupa o lugar de um puro mecanismo, isento de intenções e desejos
(Chauí, 1998). Para qualquer que seja nossa intervenção no mundo,
dependemos de aparatos materiais, seja o próprio corpo, seja o
outro, sejam instrumentos diversos. A materialidade não é tomada
aqui no sentido de um objeto passivo e completamente estranho; ela
importa na medida em que é relacional (Law e Mol, 1995). São os
atores humanos e não humanos compondo a rede.
A história de Candeia não seria diferente. O ônibus foi um
dos aparatos que tanta vivacidade trazia a seu cotidiano. Por
tanto tempo esteve acomodado na poltrona do motorista que ambos já
compunham uma mesma força na condução do veículo. Como nos disse
Serres (2004), o corpo se constrói no e a partir do encontro – o
encontro com o carro, com as ruas, com as pessoas. É no espaço do
entre que acontece um encontro, não sendo possível definir o que é
um e o que é outro. Nesta perspectiva, o corpo é compreendido como
efeito, e não como essência ou substância. Assim, o corpo e o meio
estabelecem uma relação de co-variação. O corpo 6 se transforma na
medida em que é afetado pelo mundo e, reciprocamente, afeta e
transforma seu entorno (Latour, 1999).
2) Sofá – estagnação do verbo
Após o longo dia de trabalho, a noite cai e traz consigo a
hora do samba de roda. Embalado pelo som de pandeiros e tamborins,
Candeia ocupa todo o salão rodopiando sua companheira Amélia.
Quando tocou a última nota de Ainda é cedo, de Cartola, uma
escuridão tomou conta do salão. “Foi no último gole da cerveja.
Tomei o último gole e tudo ficou escuro, depois voltou. Mal sabia
que aquele era o início da minha cegueira”. Com o passar do tempo,
a luz não voltou, mas o samba continuou. Candeia deixou de dançar.
Seu corpo parou. O que era apenas um repouso do cansaço do
dia vira agora um modo de vida, um modo que se confunde com a
imobilidade do sofá. Candeia não quer se levantar de lá, tem medo,
está triste. Para ele, a surpreendente cegueira começa a se tornar
sinônimo de imobilidade: se não pode dirigir, também não pode se
mover. A cegueira é recebida na sala de casa, enraizando seu corpo
no sofá e imprimindo-lhe suas marcas. A falta de movimento faz com
que suas pernas, já envelhecidas e cansadas, fiquem sem força e
equilíbrio. Um círculo vicioso se instala: quanto menos Candeia se
movimenta, menor é sua capacidade de se mover. Não quer mais
levantar, tem dificuldades de achar o caminho do banheiro e da
cozinha, tem vontade de esbravejar, de reclamar, de acusar. Mas
com quem? Quem seria o culpado de sua cegueira? “Candeia não sai
do sofá, fica o dia inteiro lá parado, não levanta para nada, me
pede tudo, até um copo de água!”, reclama sua esposa Amélia."
Através de nossas investigações, compreendemos que a ligação
entre cegueira e deficiência é uma produção histórica engendrada
por discursos e práticas (Martins, 2006a, Belarmino, 2004).
Atualmente, a concepção da deficiência como um desvio ou um
déficit incapacitante se atualiza em muitos momentos da vida
cotidiana e se configura como uma grande barreira na vida daqueles
que se tornam cegos e de seus familiares. O território construído
em torno da cegueira foi sendo produzido como se o fato de se
tornar cego fosse, por si só, incapacitante. Candeia, ao se
deparar com a recente cegueira, remonta em seu corpo a ligação
entre cegueira e deficiência tão difundida historicamente.
Fundamentado em uma leitura foucaultiana acerca da loucura,
Martins (2006a, 2006b, 2006c) afirma que, na modernidade
iluminista, as configurações de saber acerca da cegueira estão
calcadas na concepção de deficiência visual, isto é, na concepção
de que a ausência de uma função sensorial é um desvio, uma
patologia em relação a uma norma corporal. Assim, o autor salienta
que a marginalização da cegueira na modernidade vai ser investida
por uma certa forma de poder que se funda “nos efeitos positivos
que engendra, na sua capacidade de emanar saberes e fazer
proliferar discursos, produzindo realidade” (Martins, 2006a, p.
79). São os discursos da biomedicina que se apropriam da cegueira
fazendo existir uma concepção de cegueira como desvio, tragédia e
infortúnio frente a uma normalidade corporal almejada. Tal
concepção de cegueira marca o pensamento ocidental moderno e,
segundo Martins (2006a, 2006b), torna-se hegemônica. Nesta
concepção, a prática e o discurso médicos sobrecodificam a
cegueira, obliterando as reflexividades e normatividades das
pessoas com deficiência visual.
Desafiando esta concepção hegemônica de cegueira, o século
XX vê surgir uma série de movimentos sociais de pessoas com
deficiências que lutam para afirmar que a deficiência é um efeito
de condições sociais excludentes. Em outras palavras, na
perspectiva de tais movimentos sociais, a ausência de uma função
sensorial como a visão não é, em si, patológica ou anormal; a
deficiência é um sentimento que decorre de condições sociais
incapacitantes porque inacessíveis. Em inglês, as palavras
impairment e disability 7 demarcam esta distinção.
Impairment
indica a ausência de parte ou totalidade de um membro, ou a
existência de um membro, órgão ou mecanismo corporal defeituoso.
Já disability indica desvantagem ou restrição da atividade causada
por uma organização social excludente, não acessível. Disability é
um efeito da opressão social (Martins, 2006a).
Os anos pós-guerra são marcados por esta outra concepção de
deficiência. A questão que se faz pertinente é a de reabilitar,
inserir socialmente as pessoas com deficiência. O que está em jogo
neste cenário é que a noção de deficiência passa a estar
articulada não a uma falta corporal, biológica, mas a um processo
de exclusão social que deve ser revertido. Tal movimento coloca em
cena outros atores e a deficiência passa a ser tematizada como uma
questão de direitos humanos, de acesso à informação, ao trabalho,
à educação plena.
Merece destaque que, quando apresentamos tais concepções de
deficiência, não pretendemos sublinhar uma evolução de uma
concepção a outra, mas sim indicar que a noção de deficiência é
construída em certos arranjos político-sociais. E mais, importa
salientar que estas concepções de deficiência e de cegueira,
convivem, se entrelaçam, se articulam, sem que uma supere a outra.
O que se pode notar neste cenário é que as concepções de
cegueira articulam-se entre aquelas biologizantes, e que portanto
naturalizam e despolitizam a questão da deficiência, e aquelas que
investem na concepção de cegueira e de deficiência como efeito de
um contexto social opressor e marginalizante.
3) Sumário – cada coisa em seu lugar
Em sua casa, a rotina se modifica. Amélia já não tem tempo
para trabalhar ou se cuidar – agora, é os olhos do marido.
"Eu me
sinto uma pessoa inútil, porque praticamente em casa não tem como
fazer nada. O que um cego vai fazer? Nada!", Candeia diz. A casa e
a esposa ficam a serviço das ordens e necessidades de Candeia. Com
o passar do tempo, Candeia vai descobrindo a necessidade de manter
tudo em seu lugar. Amélia sempre gostou da casa a seu modo e, a
cada arrumação, uma nova discussão se arma. Candeia explica que os objetos deveriam ficar sempre no mesmo lugar: se havia deixado o
chinelo embaixo da cama, era ali que ele deveria estar.
Amélia assim o fez. A casa não poderia ser mexida,
refletindo o corpo imóvel de Candeia, que não ia mais as manhãs à
padaria comprar o pão e o jornal, nem tinha mais contato com os
seus amigos da praça. O sofá tornou-se o assento de seu ônibus e a
televisão, o seu veículo de acesso ao mundo. Seus movimentos se
restringiam apenas ao alcançar das mãos. "Meu cotidiano em casa é:
ver televisão, almoçar, jantar, às vezes aparece um amigo para
conversar." Seus pés, antes ágeis nos pedais, hoje andam em falso,
tateando o chão com cuidado e medo por não saber onde dará o
próximo passo. "Quando eu ando pela minha casa vou arrastando o pé
para ver se não tem nada no caminho, se não fizer isso posso me
machucar ou machucar o meu gato, que volta e meia leva um pisão no
rabo."
Como dito anteriormente, uma vez que a cegueira foi
apropriada pelo idioma da biomedicina, ela passou a ser articulada
como déficit, falta, desvio por relação a uma norma corporal
almejada.
Este tipo de entendimento acerca da deficiência visual marca
muitas das experiências das pessoas com deficiência visual. No
entanto, Martins (2006a) salienta que as experiências vividas
pelas pessoas acometidas pela cegueira apontam para múltiplos
modos de existir sem ver, longe da concepção de deficiência como
déficit. Tal registro diz respeito às invenções e possibilidades
criadas e vividas por essas pessoas.
Assim, como dissemos no item anterior, as concepções de
cegueira oscilam entre aquelas que são biologizantes e que fazem
da falta da visão um desvio, uma falha; e aquelas que definem a
deficiência como fruto de um contexto social opressor e
excludente.
Nosso trabalho de pesquisa situa-se entre tais concepções.
Isso porque, ainda que considerando a relevância dos movimentos
sociais no campo da deficiência, parece-nos que estes movimentos
buscam definir a deficiência por uma identidade não mais natural,
mas, antes, social. Assim, seguindo Law (1999) afirmamos que,
tanto numa quanto noutra perspectiva, o que está em jogo é a
construção de uma concepção identitária da deficiência, seja ela
social ou natural. Martins (2006a) elabora a mesma análise quando
afirma que tanto em um cenário quanto no outro as reflexividades,
as narrativas das pessoas com deficiência estão ausentes,
esquecidas, relegadas ao segundo plano. É por este motivo que tal
autor convoca as ciências humanas e sociais a retomarem este tema
investindo nas narrativas das pessoas com deficiência visual,
porque é através destas narrativas que são desafiadas as
concepções hegemônicas de cegueira. Isto é, para o autor, importa
seguir os processos de transformação que uma pessoa passa quando
acometida pela cegueira. Estes processos indicam uma construção
que se faz no corpo, encarnada, vivida, encenada no cotidiano,
palco onde são reinventadas as concepções de cegueira longe
daquelas de déficit, falta; mas também longe da homogenização que
demarca a deficiência como um efeito do contexto social.
4) Encontrando novos personagens – outros diálogos
A notícia de sua cegueira percorreu a cidade. Rapidamente
chegou aos lugares que costumava frequentar – no ponto final do
ônibus, na roda de samba, faziam falta suas piadas e seus passos
no salão. Passou a receber telefonemas e visitas que duravam
horas. Numa dessas, um amigo, também motorista, contou que outro
dia levou um passageiro cego a uma instituição que atendia quem
tinha perdido a visão. Curioso, fez várias perguntas ao
passageiro, que lhe deixou seu contato caso quisesse saber algo
mais.
Candeia não deu ouvidos. O que faria neste lugar, já que não
voltaria a enxergar? Amélia e seu amigo insistiram tanto que ele
aceitou ir. Passados os exames, Candeia se matriculou na
reabilitação 8 do IBC. Lá, passou a participar de diversas aulas –
artesanato, sensibilização do tato, Braille, Orientação e
mobilidade. Um novo mundo de possibilidades começa a se desvelar
para Candeia. Seu corpo, antes articulado com o sofá de sua casa e
sua esposa, agora passa a ensaiar novas conexões.
Já apresentamos algumas palavras sobre o modo como abordamos
o corpo neste trabalho e agora iremos aprofundar um pouco mais a
questão. Entendemos o corpo como resultante de uma produção, como
fruto da conexão de diversas redes múltiplas e heterogêneas. Isso
quer dizer que o tomamos como um efeito, e não como algo
pré-estabelecido. Segundo Latour (1999), o corpo não é um objeto
isolado; por isso, ter um corpo é aprender a ser afetado,
efetuado, deslocado. Para este autor, ter um corpo é ser
constantemente posto em movimento por meio de conexões com
elementos os mais díspares e heterogêneos. Desta forma, o corpo
não está dado e, portanto, não possuímos um corpo, no sentido de
um objeto isolado que se confunde com o corpo anatômico; o que
está em jogo é que, na medida em que somos afetados pelo mundo,
nós adquirimos um corpo. Para Latour (1999), adquirir um corpo é
um empreendimento progressivo que produz, ao mesmo tempo, o mundo
sensorial e o mundo sensível. Em outras palavras, o autor
compreende o corpo como uma superfície cognitiva, que se produz a
partir dos encontros com o mundo: quanto mais conexões este corpo
fizer, mais real ele será e mais realidade produzirá. Portanto,
entendemos, neste trabalho, que é a partir do corpo que habitamos
um mundo e que criamos este mesmo mundo, ou seja, que produzimos
modos de vida.
O corpo assume variações enquanto modos de existência, ele
produz a diferença. O corpo é, então, definido a partir da
capacidade de afetar e ser afetado pelo mundo e de transformar-se
neste processo. Conforme Latour (1999) dizemos que o corpo é:
"...uma interface que se torna mais e mais descritível quando
aprende a ser afetada por mais elementos. O corpo é então não uma
residência provisória de algo superior – uma alma imortal, o
universal ou o pensamento – mas o que deixa uma trajetória
dinâmica pela qual nós aprendemos a registrar e a nos tornar
sensíveis para aquilo de que o mundo é feito. Tal é a grande
virtude desta definição: não há sentido em definir o corpo
diretamente, mas apenas tornando o corpo sensível ao que estes
outros elementos são. Ao focar o corpo, estamos imediatamente – ou
melhor, mediatamente – dirigidos para aquilo que sensibilizou o
corpo." (Latour, 1999, p. 1)
Seguindo as pistas de Latour, Serres diz que o sentido
“primeiro”, que nos permite nos reconhecer como um corpo, é o
tato, tomando-o no sentido de interface, de contato, ou seja,
aquilo que nos liga ao mundo. Antes que possamos ver ou ouvir,
sentimos o contato, o qual nos ajuda a perceber nosso contorno
corporal ao mesmo tempo em que nos lança ao mundo, que nos serve
de meio para nos relacionarmos com as coisas. Em consonância com
Latour, Serres indica que todos os nossos sentidos são posteriores
ao tato. Ele nos diz: “O tato parece predominar, reunir o sentido
comum, soma dos cinco sentidos” (Serres, 2001, p. 11).
Em sua obra, Serres (2001) utiliza a metáfora da tapeçaria
tanto para refletir sobre os sentidos e o corpo quanto para falar
do modo como apresentamos nossas reflexões sobre o assunto. A
tapeçaria se apresenta como textura, como forma de apresentação
dos sentidos ao tato. Ao tocarmos a tapeçaria, nossa pele é
conectada a ela de uma maneira própria. O corpo que consegue
sentir a suavidade da textura já é um corpo produzido pela
tapeçaria. Dito de outro modo, o toque da tapeçaria modifica o
corpo que a toca, produz nele a suavidade. Este, por sua vez,
modifica o modo como a tapeçaria é percebida. Os sentidos não se
distinguem do que sentem. No mar de sensações, apresentado nas
tapeçarias, encontramos sempre a textura dos tapetes, o
entrelaçamento de seus fios e os nós de suas conexões.
"Generalizando esta hipótese, diríamos que o tecido, o têxtil, o
estofo dão excelentes modelos de conhecimento, excelentes objetos
quase abstratos, primeiras variedades: o mundo é um amontoado de
panos." (Serres, 2001, p. 79).
Assim, parece-nos possível afirmar que, para Serres (2001,
1993) e para Latour (1994, 1999), a cognição não é o atributo de
um sujeito dado, mas sim o efeito das afetações entre corpo e
mundo. Conhecemos a partir de nossos engajamentos práticos, de
nossos contatos com o mundo. Para Serres (2001, 2004), ainda,
fazer um corpo é deixar-se tatuar pelo mundo, é constituir-se a
partir de suas mediações e afecções. O corpo se constitui como
relação, como conexão. Assim, nossos contatos com o mundo são
estabelecidos a partir de uma superfície tênue: nossa pele. São
estes contatos que fabricam o corpo e, ao mesmo tempo, a cognição.
"Atônito, o público não sabe mais se deve calar-se ou rir. De fato
a roupa do rei anuncia o inverso do que ele pretende. Composição
descombinada, feita de pedaços, de trapos de todos os tamanhos,
mil formas e cores variadas, de idades diversas, de proveniências
diferentes, mal alinhavados, justapostos sem harmonia, sem nenhuma
atenção a combinações, remendados segundo as circunstâncias, à
medida das necessidades, dos acidentes e das contingências, será
que mostra uma espécie de mapa-mundi, o mapa das viagens do
artista, como uma mala constelada de marcas? O lá fora, então,
nunca é como aqui. Nenhuma peça se parece com qualquer outra,
nenhuma província poderia jamais ser comparada com qualquer outra,
e todas as culturas diferem." (Serres, 1993 p. 2)
Desse modo, através da narrativa que colhemos com Candeia,
vamos seguindo os modos pelos quais seu corpo afeta e é afetado
pelo mundo a sua volta: corpo-samba, corpo-sofá, corpo-Braille,
corpo-experimentações... Múltiplos ordenamentos da cegueira,
múltiplas formas de afetar e ser afetado, Candeia reinventa a
cegueira em seu cotidiano: da imobilidade do sofá às novas
articulações com elementos díspares e heterogêneos.
5) Primeiro capítulo – inaugurando linhas no diário da oficina
Candeia encontrou dificuldades em certas atividades. Não se
interessou pelas aulas de Braille, se sentia velho para aprender
algo que acreditava não lhe ter grande serventia. As aulas de
orientação e mobilidade se configuravam como um grande desafio,
pois esbarravam em uma das suas maiores dificuldades em relação à
sua recente cegueira, já que, para ele, a falta de visão se
articulava com a impossibilidade de se mover. Um colega insistia,
dizia que, se ele não se exercitasse, aquela aula de nada
adiantaria “Candeia precisa de um trabalho prévio, deste jeito não
é possível aprender a se locomover com a bengala, ele mal tem
equilíbrio para andar sem a bengala, imagina com? Não tem
força nas pernas e o pior, não se levanta do sofá de sua casa para
nada, se ele continuar assim não dá, já falei para ele... ele
precisa se mexer, senão, quando ele quiser se mexer, não vai dar
mais!!!”
Do samba de roda, Candeia agora estava em uma roda de gente
na Oficina de Experimentação Corporal. Entramos em contato com
Candeia logo no início das Oficinas de Experimentação Corporal no
setor de reabilitação, em março de 2008. Neste momento, mais
atores começam a participar da rede que compõe a sua vida e sua
cegueira, pois se incluíam agora, o IBC, o sair de casa, o ônibus
que teria que tomar, as pessoas que passou a conhecer, as oficinas
que começou a frequentar, entre outros. A ligação entre seu corpo
e o sofá de sua casa, neste momento, começa a se enfraquecer.
Como neste período Candeia estava com muita dificuldade de
andar, grande falta de equilíbrio e dores por todo corpo, foi
indicado para participar da Oficina de Experimentação Corporal. Na
primeira Oficina, percebemos sua enorme dificuldade de se
locomover; além disso, precisava de ajuda para se sentar e
levantar do chão e não conseguia sentar em roda sem que tivesse a
parede para lhe apoiar as costas. Em nossa primeira conversa,
Candeia nos fala: “O que eu procuro no IBC é andar melhor, minhas
pernas estão fracas e desequilibro muito, mal consigo andar dentro
de casa.” Com esta fala, percebemos que, de alguma forma, algo
diferente da conexão entre cegueira e imobilidade se processava em
sua vida: Candeia queria andar.
Em nossa pesquisa, criamos algumas estratégias para a
colheita 9 das narrativas pessoais das pessoas cegas. Além de
entrevistas semiestruturadas com os reabilitandos e seus
acompanhantes, inauguramos, há três anos, as Oficinas de
Experimentação Corporal, espaço criado para acompanhar os modos
pelos quais as pessoas vivenciam a falta de visão e reordenam suas
experiências corporais. Oferecidas duas vezes por semana a dois
grupos de pessoas cegas e com baixa visão, participantes do
programa de reabilitação oferecido pelo IBC, estas oficinas têm a
finalidade de promover, de modo lúdico, experimentações corporais
e sensoriais com pessoas que perderam a visão recentemente ou
estão em vias de perdê-la. Tais experimentações têm o objetivo de
promover, de algum modo, experiências que coloquem em questão os
padrões corporais estabelecidos ou que, de alguma forma,
possibilitem a criação de novos territórios corporais que incluam
a falta de visão.
Nas Oficinas, nosso objetivo é criar dispositivos de
intervenção que mobilizem e modifiquem o corpo, fazendo-o diferir,
derivar, ampliando, dessa forma, as possibilidades de conhecimento
de si, do outro e do espaço. Não abordamos, como dissemos em outro
item, o corpo como objeto natural e mecânico, mas antes como algo
que é construído, feito a partir das conexões e dos encontros com
o mundo. Quando falamos em construção, apontamos para o processo
através do qual o corpo é feito, processo que envolve um
engajamento prático, efetivo com o mundo, e que mobiliza elementos
heterogêneos.
Assim, nas Oficinas de Experimentação Corporal, lidamos com
corpos que foram acometidos com a perda de um sentido, corpos que
se modificaram e que passam por um processo de variação, de
transformação, que consiste em aprender, ou antes, reaprender a
ser afetado, movido e efetuado pelo mundo. Estas variações do
corpo são, para nós, ocasião de invenção de novos caminhos para o
perceber. Desse processo resulta uma experiência perceptiva
inteiramente original e singular.
Em nosso trabalho de campo, registramos os dados através de
notas tomadas em diários de campo. Estes diários são
digitalizados, lidos e discutidos por toda a equipe da pesquisa.
Nele encontramos registros de tais processos de variação e de
transformação que envolvem o tornar-se cego. São registros
diversos que, se de um lado apontam para o sentimento de perda que
o ser acometido pela cegueira envolve, de outro, indicam a
invenção de novos modos de estar no mundo. Candeia e os outros
participantes da Oficina inauguram linhas no diário de campo com
as possibilidades de reinventar a cegueira.
6) Neologismos – invenções da escrita
Nas Oficinas seguintes decidimos começar por um trabalho com
os pés, já que estes são um dos responsáveis pelo equilíbrio e
pelo andar. Não só Candeia falava dos desequilíbrios dos passos,
mas também outros participantes apontavam para a mesma questão.
Quando lhes pedimos que massageassem os próprios pés, Candeia nos
disse: “Faz duas semanas que eu não toco o meu pé”. As Oficinas
foram seguindo e Candeia estava diferente, ficava à vontade,
conversava com todos, percebia e experimentava seu corpo.
Em um dos encontros, trabalhamos com vários tipos de
elásticos. Pedimos para que eles experimentassem em seus corpos a
propriedade do esticar do elástico. Candeia nos disse: “Gostei do
trabalho com o elástico, ele movimentou muito nossos corpos”.
Parecia que algo diferente estava se processando em sua vida,
estava com gosto por se movimentar. Em outra Oficina, chegou
contando que no dia anterior havia saído com seu neto para
caminhar. Candeia parecia estar fazendo novas redes e
reconstruindo um corpo. Certa vez nos disse: “Quando a gente fica
cego, a gente vira criança novamente, tem que aprender tudo de
novo. Quando a gente vê, a gente sabe uma teoria; quando ficamos
cegos, é preciso aprender outra teoria”. Percebíamos que novas
“teorias” estavam em pleno processo de fabricação, teorias criadas
a partir de um processo intenso de produção, onde Candeia podia
experimentar suas possibilidades, fazer novas conexões e
rearranjos das redes que teciam a sua vida. Com o passar do tempo,
percebíamos Candeia mais seguro e com vontade de descobrir as
potencialidades de seu corpo.
Em uma outra ocasião, realizamos um trabalho com os apoios
(partes do corpo que lhe sustentam e que tocam o chão). Fizemos
vários tipos de experimentações, que incluíam a percepção dos
apoios necessários para levantar e descer ao chão, para caminhar;
experimentamos vários caminhos possíveis para fazer esse
movimento. Neste mesmo dia, Candeia constatou: “Tenho o joelho
fraco de tanto jogar futebol. Para eu subir do chão, preciso
apoiar minhas mãos – elas sim me dão firmeza para levantar”.
Candeia estava criando novas possibilidades de movimento, novas
possibilidades para si, novas possibilidades para seu corpo.
Por meio de atividades que envolvem a experimentação de
materiais, consciência corporal, noções de espaço, dança,
equilíbrio, atenção, contato, dramatizações e sensibilização, o
grupo participante da Oficina é levado a experimentar e se deparar
com seus corpos e com a possibilidade de recriá-los, de reinventar
a si mesmos, assim como as suas experiências acerca da cegueira,
possibilitando, desta forma, a criação de outras conexões a partir
destas experimentações. Podemos definir nossa Oficina como um
espaço performativo no qual a cegueira é colocada em cena de
múltiplos e heterogêneos modos. Neste processo, a própria cegueira
também tem a oportunidade de ser recriada, afirmando, deste modo,
seu caráter de produção. Além disso, as experimentações também
estão voltadas para recolher e captar as invenções e estratégias
já criadas pelos participantes para lidar com sua cegueira, e
então abrimos um espaço para que estas invenções sejam tematizadas
e partilhadas. Neste momento, nossa pesquisa se afina com Spink
(2003), quando ele nos fala do conceito de co-construção na
pesquisa. Para o autor, o pesquisador e pesquisado passam por um
processo de transformação recíproca, de tal modo que as questões
da pesquisa são negociadas com o grupo, são ali modificadas,
transformadas.
Nosso objetivo é seguir os modos pelos quais a cegueira
existe, os modos pelos quais ela vai se constituindo através de
arranjos bastante heterogêneos que articulam humanos a não
humanos, materialidades a socialidades (Law & Mol, 1995). São
estes elementos que fazem existir as cegueiras.
Candeia, certa vez, nos chamou a atenção: “Olha como eu
estou descendo a escada. Agora desço sozinho”. O descer a escada
sozinho se amplifica e contagia outros espaços fora da Oficina de
Experimentação Corporal, como quando ele nos conta que levou o
neto para passear na pracinha ou quando dançou com a esposa em uma
festa. São movimentos simples e singulares que mostram a
desestabilização de um discurso único de cegueira. Nosso objetivo
está em acompanhar esse processo, ampliando a rede de conexões que
interferem nas ações cotidianas de viver sem a visão, de andar com
ou sem a bengala, de criar estratégias as mais diversas para
atravessar a rua, de articular-se a dispositivos os mais variados,
relógios, regletes, sons, odores, softwares, temperaturas e tantos
outros.
O que chama atenção nas narrativas das pessoas com
deficiência visual, colhidas durante as Oficinas e em entrevistas,
é o fato de que elas apontam para múltiplos modos de ser da
cegueira, e o que move esta pesquisa é a afirmação da potência
inventiva de tal multiplicidade.
7) Contação de histórias – descobrindo outro jeito de contar
No final do ano de 2008, quando fazíamos um balanço das
atividades daquele ano e nos despedíamos para as férias de
janeiro, Candeia fala: “Se paramos de nos movimentar, começamos a
enferrujar (...) Hoje em dia estou fazendo mais coisas, me sinto
mais leve, tô com vontade até de jogar futebol.” E prosseguiu: “Eu
trabalhava com o público. Não tenho visão, mas tenho orientação.
Pelo andar do ônibus, pelas curvas que ele faz, sei onde estou. É
um fenômeno. A nossa mente é que nos carrega. Não fiquei rico na
minha situação financeira, mas fiquei na minha saúde. Tenho minha
mulher, meus filhos, então estou bem. Fiquei muito surpreso com um
amigo que me ajudou”. Com estas falas, Candeia nos dizia acerca de
como vinha reconstruindo as conexões entre seu corpo, a recente
cegueira e a mobilidade. Apontava-nos outras possibilidades de
conexão da sua vida com, por exemplo, a saúde, com a sua
capacidade de orientação e as novas descobertas acerca de seu
corpo e de como poderia se locomover. Sua cegueira, agora, passara
a ter outras conexões que não só com a imobilidade e o sofá de sua
casa.
É interessante sublinhar que, para Candeia, a orientação
espacial, antes totalmente pautada na visão, passa a estar
atrelada a outras formas de organização dos sentidos e da
experiência corporal. Destacamos ainda que a sua fala aponta para
a mente como um fenômeno encarnado, atrelado ao andar do ônibus,
às curvas. Dito com outras palavras, para ele, ser guiado pela
mente significa ser afetado pelo mundo – as curvas, o andar do
ônibus, uma vez conectados às experiências corporais, engendram
modos até então inéditos de conhecer o caminho percorrido. Podemos
aqui também mencionar as materialidades das quais todos nós
dependemos; corpo como suporte primeiro dessa materialidade; corpo
como via fundamental de intervenção e afetação do e no mundo.
Quando iniciamos as Oficinas de Experimentação Corporal no
setor de reabilitação do IBC, encontramos modos diversos de
experimentar os corpos acometidos pela cegueira. Em muitas destas
experiências, era possível seguir as marcas de uma concepção de
cegueira como falta e incapacidade. As atividades oferecidas na
Oficina de Experimentação Corporal envolveram uma experimentação
do próprio corpo, dos seus limites, das suas potências. Propusemos
atividades lúdicas que articulavam sons diversos, texturas e
outros materiais heterogêneos. Levamos a cabo aquilo que Serres
propõe quando afirma que “o corpo em movimento federa os sentidos
e os unifica nele” (Serres, 2004, p. 16).
As experimentações corporais permitem que estas pessoas
experimentem de outro modo os seus corpos e o mundo a sua volta,
da mesma forma que faz, nas palavras de Serres, o montanhês:
escalando uma rocha, contempla e acaricia com suas fortes mãos
todo o universo que se encontra ao seu alcance. É no contato com a
montanha, com suas sinuosidades, seus enigmas, que o mundo se faz
presente a ele. Trata-se de uma experiência encarnada, articulada
ao tato, ao contato, mais do que a uma visão de sobrevoo.
Apostamos na potência deste tipo de experiência quando propomos às
pessoas com deficiência visual recém adquirida que experimentem
ludicamente os seus sentidos.
Como já dito acima, as narrativas dessas pessoas assumem a
potência de desafiar o discurso hegemônico da cegueira porque
abrem caminhos para muitas outras formas de existir sem a visão.
Martins (2006a) sublinha que, desde o século XVIII, a cegueira é,
de um lado, identificada à ideia de tragédia e, de outro lado, a
uma capacidade superior de visão, como se o cego pudesse ver sem
os olhos, ver para além das aparências. Nestes dois extremos estão
o “ceguinho, coitadinho” ou o cego que enxerga além, que detém um
saber maior. De uma forma ou de outra, o que está em questão é um
lugar hierarquizado e, por isso, excludente.
O que nos interessa, então, não é falar sobre a deficiência
visual, mas produzir conhecimento com aqueles que passam pela
experiência de perder a visão, engajando-nos numa prática que se
dá com o outro e não sobre o outro (Moraes, 2007, 2006). Quando
falamos da deficiência visual, buscamos um referencial singular,
que admite tantas outras formas de existir da cegueira.
Notas:
-
1 Os nomes utilizados neste trabalho são fictícios a fim de
preservar o anonimato das pessoas que foram acompanhadas neste
processo de pesquisa.
-
2 Todas as falas colocadas entre aspas neste artigo são
referentes a notas dos diários de campo de 2008, Projeto Perceber
sem Ver, a partir das Oficinas de Experimentação Corporal, da qual
falaremos mais adiante.
-
3 Agradecemos à Faperj, ao Cnpq e à Pró-Reitoria de
Extensão da Universidade Federal Fluminense pelo apoio recebido
para a realização desta pesquisa/extensão.
-
4 Modos de ordenamento é um conceito proposto por Law
(1994, p. 95) para indicar o processo social como um verbo, mais
do que como um substantivo. Isto é, o social é um processo
contínuo, precário, marcado por sua heterogeneidade e
multiplicidade. Este conceito implica a aposta de um deslocamento
de uma concepção de social como algo dado, estabilizado para a
afirmação de um contínuo processo precário de fabricação e
construção de ordenamentos.
-
5 Centro de referência nacional no campo da deficiência
visual, situado na cidade do Rio de Janeiro. Para conhecer mais
sobre o IBC, consulte o site http://www.ibc.gov.br/
-
6 Para uma concepção de corpo que segue esta mesma direção,
cf. o capítulo de Laura Pozzana, inserido nesta coletânea.
-
7 Não encontramos, em português, palavras que possam
traduzir claramente estes dois termos. Por isso, optamos por
mantê-los em inglês.
-
8 Este setor atende pessoas que adquiriram a cegueira na
idade adulta e que buscam (re)aprender modos de viver sem a visão,
seja através do uso da bengala, da leitura e da escrita através do
sistema Braille, e atividades da vida diária, seja através de uma
série de oficinas de artes.
-
9 Utilizamos a expressão “colheita de narrativas” em lugar
do tradicional “coleta de dados” para fazer menção ao modo como
lidamos com as informações do campo. O termo colheita parece-nos
mais adequado à metodologia que utilizamos porque a conotação do
termo envolve um processo de semear, de preparar o solo antes de
recolher dele os frutos. É precisamente este o viés que utilizamos
em nossa metodologia, isto é, as narrativas que colhemos são
frutos de um modo de pesquisar que envolve o outro, um pesquisar
que se faz a partir de um engajamento prático com o outro, num
processo de transformação recíproca. Neste sentido, como o leitor
verá mais adiante, as intervenções que propomos são partilhadas e
negociadas com o grupo de pessoas com deficiência visual.
Salientamos que este modo de entender as relações com o campo de
pesquisa está presente em Spink 2003; Law e Mol, 1995.
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perpetuadas. 2006c. Disponível em
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SPINK, P. Pesquisa de campo em psicologia social: uma perspectiva
pós-construcionista. Revista Psicologia e Sociedade, 15 (2),
jul/dez 2003.
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Composições do não ver: contando histórias
Camila Araújo Alves, Carolina Cardoso Manso, Josselem Conti de
Souza Oliveira, Julia Guimarães Neves, Liz Eliodoraz, Luciana de
Oliveira Pires Franco, Thadeu Gonçalves, Vandré Vittorino,
Marcia Moraes
in Exercícios de Ver e Não Ver
Organizadoras: Marcia Moraes e Virgínia Kastrup
NAU Editora, 2010
16.Dez.2014
publicado
por
MJA
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