Revista "Die Gegenwart"

Blind Kristian Outside His House - Michael Ancher, 1864-1920
Já na Antiguidade as pessoas cegas usavam a bengala como auxiliar de orientação e
como apoio. Por isso ela em breve se tornou uma espécie de braço prolongado do
não-vidente. Quando o trânsito automóvel começou a constituir um perigo para este, a
bengala teve de se transformar num sinal: «Cuidado! Vem aí alguém que não te vê!»
E para que o cego pudesse ser notado a tempo, era preciso começar por tornar a bengala
mais visível: passou a ser branca. Quem teve essa ideia de longo alcance foi a condessa
Guilly Herbemont, que em 1931 perante entidades públicas em Paris presenteou pessoas
cegas com 100 bengalas brancas. A bengala branca transformou-se no distintivo dos cegos,
não tardando a assumir a função de sinal de trânsito protector para maior segurança
destes enquanto peões.
Do bastão à bengala comprida
O bastão não passou ainda totalmente de moda, uma vez que as pessoas idosas precisam
dele para se apoiarem enquanto caminham. Também a bengala branca curta ainda tem amigos
entre os cegos e os grandes deficientes visuais, mas em geral só se tira do bolso em
situações críticas ou como distintivo.
O verdadeiro auxiliar da mobilidade é a bengala branca comprida. O seu comprimento
depende da altura do utilizador: assente verticalmente no chão, deve dar-lhe
aproximadamente pelo esterno. Durante a marcha é segura inclinada para baixo à frente do
corpo, a fim de tactear o caminho. Movimentando-a como um pêndulo para a esquerda e para
a direita o seu utilizador dá sempre o passo seguinte com segurança.
No entanto, a marcha com este «detector de obstáculos» tem de ser bem aprendida e
treinada. Há quase 40 anos que os cegos e amblíopes podem frequentar aulas de
orientação e mobilidade, ministradas por técnicos de reabilitação com formação
específica.
Nem só a bengala facilita a mobilidade
O grau de autonomia que a pessoa cega ou amblíope precisa adquirir, bem como as suas
capacidades e aptidões pessoais, determinam o programa do curso. Assim, enquanto a um
sujeito basta orientar-se dentro da própria casa, outro tem de usar a bengala para ir às
compras ou para atravessar cruzamentos movimentados em grandes cidades. Em todos estes
casos é importante manusear a bengala de harmonia com a situação e com segurança. Se o
reabilitando não possuir conhecimentos prévios suficientes sobre a arquitectura da
cidade e a estrutura do trânsito, eles têm de lhe ser transmitidos, pois só assim
chegará a uma mobilidade confiante e eficiente com atitudes adequadas.
Para que este objectivo seja atingido, o ensino é sempre individual. Comporta em regra
cerca de 100 aulas. Factores como a idade, a experiência prévia, o tipo da deficiência
(cegueira congénita ou tardia, total ou baixa visão), a necessidade, a constituição
psíquica e física, a actividade profissional e muitos outros podem alterar o número de
aulas para mais ou para menos. A par das diversas técnicas de bengala são ensinados
requisitos básicos para a mobilidade, a saber: percepção do corpo, noção de tempo,
concepção espacial (elaboração de um «mapa mental»), bem como o relacionamento com
os demais transeuntes, designadamente como pedir informações.
Quando falta o sentido da visão, urge estimular de forma especial os outros sentidos,
pois mesmo sem a possibilidade de ver tem de ser percepcionado e correctamente
interpretado o maior número possível de informações do ambiente circundante a fim de,
a partir daí, ser estudado o modo como o cego ou deficiente visual deve agir enquanto
transeunte, de acordo com a situação.
Bengala e concentração
Ao atravessar uma rua, por exemplo, as pessoas cegas e de visão reduzida têm de se
concentrar imenso para poderem perceber e avaliar a situação do trânsito através dos
sons. Ruídos diversos vindos de várias direcções e transeuntes «silenciosos» como
ciclistas e «skaters» tornam-lhes ainda mais difícil adquirir a necessária segurança
para atravessar a faixa de rodagem. Muitos deficientes visuais assinalam esta fase da
espera puxando a bengala para si ou colocando-a direita à sua frente.
A introdução de semáforos sonoros veio facilitar muito a travessia das ruas: o cego
pode reconhecer com precisão e clareza quando está verde para peões. Na ausência
destes semáforos ele é forçado a deduzir essa informação com base no fluir do
trânsito. Mesmo quando guiado pelo seu cão tem de lhe dar sinal para atravessar, pois os
cães são cegos a cores e portanto não reconhecem o sinal verde.
Bengala com pilhas ou um auxiliar de quatro patas?
Existem diversas saídas para compensar os inconvenientes da bengala. O maior de todos
é que com ela o cego não se apercebe de obstáculos situados à altura da cabeça.
Existem diversos aparelhos electrónicos acessórios que detectam e indicam esse tipo de
obstáculos, quer emitindo sons, quer vibrando. Mas devem ser vistos sempre apenas como
complementos, e não como substitutos, da bengala. O mesmo não pode dizer-se, porém, do
auxiliar de quatro patas. Após uma aprendizagem minuciosa seguida de treino com os
futuros donos, os cães-guia para cegos levam-nos com segurança por entre o trânsito
citadino, contornando obstáculos, indicando-lhes a berma do passeio e facilitando-lhes a
travessia tantas vezes perigosa das ruas. Não é indispensável usarem também a bengala,
embora essa prática seja recomendável.
Bengala e leitura do jornal
A lei define como cego não só aquele que não vê
absolutamente nada, mas também toda a pessoa cuja acuidade visual no melhor
olho não vai além dos 2% ou cujo campo de visão está reduzido a 5 graus ou menos
(a chamada visão tubular). Considera-se de baixa visão toda a
pessoa que no melhor olho vê no máximo 0,05 - isto é 5%.
Pode perfeitamente acontecer que um indivíduo que tenha um campo de visão
pequeníssimo ou que sofra de cegueira nocturna seja incapaz de se orientar sozinho quando
anda na rua sem bengala, e contudo consiga ler letras grandes de jornal dentro do seu raio
de visão.
Ajudar ou não ajudar?
As pessoas cegas e de visão reduzida que viajam sem acompanhante desembaraçam-se
geralmente sozinhas. Em situações difíceis, porém, aceitarão de bom grado ofertas de
ajuda - por exemplo quando querem atravessar ruas, apanhar meios de transporte, em
estações dos caminhos de ferro ou em pavimentos onde decorrem obras.
A pergunta «Quer ajuda?» nunca é incorrecta. Pelo contrário, qualquer cego ou
amblíope ficará confuso e descontente se o atravessarem pegando-lhe pelo braço e
puxando-o, sem uma palavra. Conta-se que por causa deste procedimento já houve quem fosse
metido num eléctrico em que não queria viajar.
Efeméride
Em 15 de Outubro comemora-se em todo o mundo o dia da bengala
branca. Em 1964 Johnson, então presidente dos Estados Unidos, entregou bengalas brancas a
pessoas cegas. Foi o começo simbólico da aprendizagem sistemática de orientação e
mobilidade por parte destas pessoas.
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Suplemento da revista «Die Gegenwart» - nº 9 - 2001
Edição: Associação Alemã de Cegos e Amblíopes
Tradução NADV: Ana Maria Fontes
Δ
publicado
por
MJA
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