quadrado
|
fração | subtração
“Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”.
SARAMAGO,
Livro dos Conselhos.
in Ensaio sobre a Cegueira, 1995
INTRODUÇÃO
Ao longo das últimas décadas a discussão sobre a educação inclusiva
vem se intensificando mundialmente e representa para a pauta educacional de
nosso continente um grande desafio. No cenário brasileiro, o tema ganha
centralidade a partir da promulgação da LDB 9394/96 que estabelece a
educação especial como “modalidade de educação escolar”
(BRASIL/SEESP/MEC, 1996).
Ainda que a Constituição Brasileira de 1988 já
estabelecesse que o atendimento educacional especializado às pessoas com
deficiência devesse ser preferencialmente feito na rede regular de ensino, isso
não estava assegurado, principalmente porque as instituições especializadas
não contavam com uma forma organizacional e estrutural semelhante às das
escolas regulares.
A partir de uma Educação Inclusiva responsável acontecerão
transformações sociais de enorme magnitude, pois o processo educativo incide
não somente na escola, mas nas experiências de aprendizagem cotidianas,
estabelecendo vínculos entre os conteúdos escolares e o desenvolvimento
social das pessoas. Neste sentido, o conceito de Educação Especial proposto
pela LDB 9394/96 como uma modalidade de educação escolar, reafirma a
escola como local privilegiado de aprender.
Assim, um dos grandes méritos que a atual Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional traz nesse aspecto é a evidência da fragilidade da
formação de professores para assumirem tal tarefa. Tal situação soma-se às
dificuldades que os educadores de forma geral, têm de aceitar, por diferentes
motivos, a matrícula, a permanência e o bom desempenho de alunos com
necessidades educacionais especiais nas escolas.
Em nosso caso especificamente, existem ainda muitas controvérsias
quanto à lógica de implantação da Educação Inclusiva nas escolas, talvez em
parte por ser nossa sociedade composta de uma diversidade social
contraditória que tem evidenciado desinformação, preconceitos e a produção
de novos tipos de exclusão.
Ao pensarmos uma proposta consistente de Educação Inclusiva,
compreendemos que esta requer decisões políticas claras e incidência de
muitos atores com seus particulares pontos de vista. O que constitui um ponto
de partida para tratar de aproximar educação, democracia e escola, implica,
sobretudo, formação para a tolerância, o respeito à diversidade, à diferença, ao
pensamento crítico, à capacidade de escutar e chegar a consensos.
Neste sentido, tendo como substrato a concepção de educação inclusiva
descrita acima, propusemos como Plano de Intervenção do PDE (Programa de
Desenvolvimento Educacional) a utilização do Soroban e do Material Dourado
nas atividades de 5.ª e 6.ª séries para todos os alunos da classe, desafiando de
certa forma, a prática de utilização desses instrumentos metodológicos que, via
de regra, são utilizados nas escolas especiais e Centros de Atendimento
Educacional aos Deficientes Visuais (CAEDVs).
Desta forma, entendendo que o uso desses recursos metodológicos
com alunos cegos permitem que estes acompanhem o ritmo das atividades de
Matemática desenvolvidas em classes comuns ou em situações do cotidiano e
simultaneamente, possibilitem o desenvolvimento de raciocínio lógico,
coordenação motora e agilidade, capacitando-os para participação e
aprendizagem da Matemática. Sendo a hipótese inicial para o Projeto de
Intervenção: por que não utilizá-los com alunos videntes?
Assim, feito esse preâmbulo e guiando-me pela hipótese acima referida,
passo a descrever a trajetória da pesquisa: a elaboração do Plano de
Trabalho, a produção do Material Didático, o Projeto de Intervenção na Escola,
e cujo registro dos resultados, se configura no presente trabalho.
AS SETAS DO CAMINHO...
-
(...) é preciso fazer um primeiro aviso: da impossibilidade
de engendrar caminhos ‘em abstrato’. Portanto, a
pesquisa nasce sempre de uma preocupação com alguma
questão, ela provém, quase sempre, de uma insatisfação
com resposta que já temos, com explicações das quais
passamos a duvidar, com desconfortos mais ou menos
profundos em relação a crenças que, em algum momento,
julgamos inabaláveis. Ela se constituiu na inquietação (grifos da autora - Maria Isabel Edelweis BUJES. Descaminhos, 2007, p.17).
O excerto acima expressa as primeiras expectativas que tinha em
relação ao Programa do Desenvolvimento Educacional (PDE). Supondo que
uma das maiores dificuldades do trabalho era romper com o já pensado e que
entre manter-me nadando no lago sereno das certezas ou mergulhar num mar
revolto de indagações, fazia-se necessário a escolha e aceitar seus desafios
subjacentes, assumir esse risco, foi a primeira tarefa a realizar.
Neste sentido, sabendo que a incursão em uma proposta de pesquisa
traria dificuldades teóricas e metodológicas, o primeiro desafio a aceitar era o
de que se não ganhasse o Programa e a Escola pesquisada, ganharia eu,
porque mesmo na condição de pesquisador de poucas viagens, uma certeza já
tinha. Estamos falando aqui do trabalho do pesquisador, como aquele
que transforma, em primeiro lugar, a si mesmo: aquele que,
como o filósofo, é chamado a ultrapassar não só o senso
comum, ordinário ou acadêmico, mas ultrapassar a si mesmo,
a seu próprio pensamento. (FISCHER, 2007, p. 49
O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) foi desenvolvido
por meio de Plano de Trabalho, no qual foram incorporadas as atividades
básicas próprias do Programa, as quais abrangem os Seminários
Centralizados, os Encontros Regionalizados do PDE, Encontros de Orientação,
Encontros de Área e as Atividades de Formação e Integração em Rede. Por
sua vez, as atividades específicas do Professor PDE foram constituídas pela
elaboração e execução do Plano de Trabalho, sob orientação das
Universidades, com participação dos professores da Rede (Grupo de Trabalho
em Rede), orientação aos Grupos dos Trabalhos em Rede e elaboração de
material didático condizente com o objeto de estudo definido no Plano.
Dessa forma, como professor PDE apresentamos no espaço/tempo
destinado aos Encontros de Orientação (março/junho) um pré-projeto intitulado
O Aluno cego e o professor de Matemática na educação inclusiva,
contendo a problematização, fundamentação teórica, produção de um material
didático (OAC) e a Proposta de Implementação no ambiente educativo.
I - Material Didático
Produzimos, com o devido acompanhamento da orientadora, professora
Miriam Adalgisa Bedim Godoy e a colaboração dos Grupos de Trabalho em
Rede um objeto de Aprendizagem Colaborativa (OAC) denominado “Olhares
sobre o olhar pedagógico”.
As transformações constantes no mundo globalizado e a rapidez com
que tudo acontece, faz surgir novas necessidades a cada momento, exigindo
uma educação libertadora, inclusiva e que acompanhe esse movimento. Esta
situação faz com que os educadores articulem processos que levem os
indivíduos a um conhecimento dinâmico para atender às necessidades da
realidade e quebrar as resistências a inovações. A tentativa de discutir esta
problemática e propor alternativas em torno de criar possibilidades para que o
aluno cego participe ativamente das atividades propostas pelo professor de
Matemática e sua aprendizagem no ensino regular, são fundamentalmente as
lógicas justificantes do OAC.
Considerando então a Educação Inclusiva como um novo paradigma
que desafia o cotidiano escolar brasileiro e mais do que isso, desafia nossa
forma pessoal, individual de pensar a diversidade humana e para a qual
estamos bem longe de respostas definitivas, proponho inicialmente que nós
educadores, nos perguntemos sobre como efetivamente inverter a direção do
olhar para a Educação Inclusiva. Que olhar temos “sobre” a inclusão escolar? E
no caso específico da deficiência visual, que olhar temos pelos alunos cegos e
de baixa visão, para os alunos cegos e de baixa visão, para além da cegueira
física? O que nos permitirá como educadores demorar nosso olhar para eles, e
não sobre eles? Que lentes, nós educadores, precisamos ter para enxergamos
para além do que vemos? Será necessário aumentar, diminuir o grau, buscar
outras formas e cores?
Com o intuito de responder estas indagações iniciais, transitamos por
diferentes caminhos, buscando respaldo teórico-metodológico na prática
profissional. Este OAC apresenta sugestões de Recursos Didáticos, sítios
como:
Fundação Dorina Nowill: A Fundação Dorina Nowill, criada há 61 anos, pela professora
Dorina de Gouvêa Nowill, é hoje um centro de referência quando se trata de
inclusão social de deficientes visuais, sejam eles crianças, jovens ou adultos. Programas de avaliação e diagnóstico, clínica de baixa visão e educação
especial são alguns dos serviços prestados pela Fundação que atua, ainda, na
produção de livros em Braille, falados e digitais. (Disponível em: www.fundacaodorina.org.br)
Portal do Mec: Neste site o professor pode acessar o link Educação Especial. Traz
informações a respeito da deficiência visual e diversos artigos com propostas
de superação das dificuldades encontradas na inclusão desses alunos no
Ensino Regular. (Disponível em: http://portaldomec/educação)
SOS Matemática: Os professores de Matemática terão acesso a curiosidades
matemáticas, desafios, exercícios, “tira dúvidas”, conteúdos, testes e
adivinhações. Este site ainda conta com um Fórum de discussão, onde os
professores podem trocar idéias sobre assuntos matemáticos. (Disponível em: http://www.sosmatematica.com/)
Além dos sítios, neste trabalho, discutimos a possibilidade em se
trabalhar filmes, como por exemplo: A primeira vista; A cor do paraíso; Gênio
indomável; Janela da alma; Infinity: um amor sem limites. Acreditamos que por
meio de filmes despertem nos alunos a sensibilidade e a possibilidade de
conviver com as diferenças no coletivo do ambiente educativo.
Ademais fazemos um recorte de livros literários, teóricos e didáticos
sobre o tema, tais como: Ensaio sobre a cegueira de José Saramago; O diabo
dos números de Hans Magnus Enzensberger; Explorando o ensino da
matemática do Ministério da Educação – Secretaria de Educação Básica.
Neste OAC realizamos um levantamento sobre instrumentos
metodológicos que auxiliam o professor no ensino da Matemática para o aluno
cego. Descobrimos uma pesquisa no Paraná denominada de Multiplano (Fonte: http://www.sac.org.br/DN00033.htm).
Este invento facilita o estudo de Matemática pelos cegos. A Matemática
não é algo inacessível para as pessoas sem visão. A invenção do Multiplano
permite que os deficientes visuais aprendam de gráfico à geometria espacial e
cálculos avançados. O benefício representa melhoria não só na aprendizagem,
mas também na perspectiva de vida de pessoas que nunca viram um número
ou uma figura espacial. O invento foi batizado, em 2000, de Geoplano, mas
logo se adaptou para estudos de terceira dimensão e passou a ser chamado
de Multiplano. Segundo o inventor e professor do Curso de Ciências da
Computação da União Pan-Americana de Ensino (UNIPAN) de Cascavel -
Paraná, Rubens Ferronato, a iniciativa surgiu, em menos de dois dias, para
ajudar um aluno cego em dificuldade no curso. De acordo com o professor
Rubens, tateando é possível aprender e construir, com o Multiplano, gráficos,
geometria plana e espacial, matriz, determinante, sistema linear, equações,
estatística, operações, cálculos avançados, limites de uma função, derivadas,
etc. Na opinião do diretor da Sociedade de Assistência aos cegos, Waldo
Pessoa, essa é a maior invenção que já houve desde o Braile, que é usado
como base. Para ele, o que mais impressiona é que pessoas com deficiência
visual e videntes podem interagir. É um auxílio também para quem tem
dificuldade de aprender matemática, independente de ser cego.
O professor de Matemática, ao receber um aluno cego, tem a
responsabilidade de integrá-lo com os demais alunos da classe e atendê-lo
conforme suas necessidades específicas para que tenha acesso ao conteúdo
desenvolvido em sala de aula. Sugerimos, como norma, os seguintes
procedimentos:
-
dar ênfase à expressão verbal, verbalizando sempre que possível o que
esteja sendo representado no quadro para que o aluno cego consiga
acompanhar o andamento da aula;
-
verificar se o aluno acompanhou a problematização e efetuou seu próprio
raciocínio;
-
oportunizar tempo suficiente para o aluno levantar dúvidas, hipóteses de
resolução do problema, demonstração do raciocínio elaborado e execução das
atividades propostas;
-
tomar cuidado para não isentar o aluno das tarefas escolares, seja em classe
ou em casa;
-
recorrer ao professor especializado, no sentido de valer-se dos recursos
necessários em tempo, a fim de evitar lacunas no processo de aprendizagem
da Matemática.
No ensino da Matemática tradicional os alunos acabam dominando os
conceitos a partir da repetição de atividades. A utilização do material dourado
proporciona um aprendizado onde as relações numéricas abstratas passam a
ter uma imagem concreta, facilitando a compreensão, desenvolvendo o
raciocínio. Nesse espaço, sugerimos várias atividades utilizando o material
dourado para que o professor de Matemática possa trabalhar em sala.
Ao longo das atividades o professor deve avaliar a participação dos
alunos na execução do projeto, valorizando o trabalho coletivo e propondo
estratégias de superação das dificuldades individuais. De grande importância
para a aprendizagem da pessoa cega no ambiente escolar, são as atitudes que
ela encontra na classe, entre as quais, as atitudes que assumem em relação a
si próprias e o clima geral de aceitação que se desenvolve. Nesse aspecto, o
professor desempenha um importante papel para o sucesso do aluno cego na
inclusão escolar.
II – Proposta de implementação
A proposta de implementação constante no Plano foi efetivada no
primeiro semestre de 2008 no Colégio Estadual Manoel Antonio Gomes, em
Reserva. Esta surgiu diante das dificuldades que encontrei em trabalhar com
uma aluna cega matriculada na primeira série do Ensino Médio. Pude
perceber, como diretor do Colégio Estadual Manoel Antonio Gomes, as
dificuldades que o aluno cego encontra ao ingressar na escola regular. Pois
muitos professores são, ainda, resistentes em aceitarem a inclusão e em
perceberem que esse aluno tem direito à escolarização e a uma educação
igualitária. Com o passar do tempo, verificamos que a aluna apresentava
grande defasagem na aprendizagem e que, se continuasse ali, a exclusão
persistiria, mesmo estando na escola. Portanto, a encaminhamos para
Telêmaco Borba, com o objetivo de se fazer um diagnóstico com professores
especializados, e com isso, intervir no processo escolar. Infelizmente, ela
perdeu o ano letivo. Em 2006, agora professor de Matemática da 1.ª série do
Ensino Médio, recebi a jovem como aluna, uma pessoa alegre, cheia de
sonhos e com grandes vícios na convivência professor x aluno, pois estava
acostumada a ter um tratamento diferenciado, porém tinha muita força de
vontade em acertar, em estudar. Tive o privilégio de participar de um curso
sobre o Braille onde fui sensibilizado para abraçar essa causa e a convivência
com a aluna melhorou consideravelmente. Nessa época, pude diagnosticar as
lacunas na aprendizagem da aluna cega, ela dominava o Braille com perfeição,
porém, tinha grandes dificuldades na leitura e escrita. Envolvemos os outros
professores no sentido de trabalhar não somente a oralidade, como também a
execução de textos em Braille com o objetivo de efetivar a aprendizagem
também na escrita. Ela concluiu o Ensino Médio, conseguiu avanços
significativos, entretanto, longe ainda do mínimo desejável para uma aluna com o sonho de ser psicóloga. Com o surgimento do PDE, o foco do projeto foi de
trabalhar propostas pedagógicas inclusivas no ambiente escolar.
Para entendermos como se efetiva o Ensino da Matemática para alunos
cegos, iniciamos a pesquisa entrevistando dois alunos cegos que estudaram
em escolas públicas no município de Reserva. Como a pesquisa se inscreve
nas análises e discussões sobre a formação de professores de Matemática,
nessa perspectiva, refletimos como foram trabalhados os conceitos
matemáticos no Ensino Fundamental e qual a visão dos alunos em relação a
aceitação da comunidade escolar diante da educação inclusiva.
O sistema de ensino atual tem um currículo de conteúdos
programáticos rígidos, de acordo com o desenvolvimento cognitivo e
faixas etárias. Para os alunos diferenciados - não estamos falando em
deficiências - a escola não oferece abertura para uma programação
específica. Existe grande possibilidade de o aluno, que entra no
sistema escolar formal e estruturado, sem estar preparado, não se
sentir à vontade, seguro, nem protegido, sofrendo muitas vezes,
discriminações. (FABRICIO; SOUZA, 2004, p.8).
Faz-se necessário conhecer as necessidades educacionais especiais,
com o objetivo de clarificar que as dificuldades encontradas por esses alunos,
são maiores que as do restante da turma. Marchesi & Martin (1995, p. 11)
afirmam que os alunos com necessidades educacionais especiais apresentam
algum problema de aprendizagem ao longo de sua escolarização, que exige
uma atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os
necessários para os colegas de sua idade, e as ações desencadeadas para o
enfrentamento dessas dificuldades devem constar nas estratégias da escola,
na busca da efetivação da aprendizagem. Figueiredo (2002, p. 69) infere que “é
preciso reconhecer o valor das diferenças como elemento de crescimento dos
sujeitos e dos grupos sociais”, e é no ambiente escolar que as respostas
educacionais requeridas pelos alunos na interação do processo de ensino e
aprendizagem são elucidadas.
O processo de assimilação dos conceitos matemáticos e a sua
aplicabilidade com alunos deficientes visuais não é uma tarefa fácil, visto que
eles precisam estar em contato direto com o que está sendo ensinado. Como o
deficiente visual não pode visualizar o que é mostrado em figuras, filmes,
gráficos virtuais, devem ser trabalhados os outros sentidos (tato e audição)
para que eles consigam interagir com esses materiais e relacioná-los com a
prática dos conteúdos ministrados pelo professor de Matemática. O professor,
por sua vez, deve ter uma estrutura pedagógica e competências específicas
para intervir na aprendizagem. Para que a inclusão escolar seja real o
professor da classe regular deve estar sensibilizado e capacitado (tanto em
nível psicológico quanto intelectual) para mudar sua forma de ensinar e adaptar
o que vai ensinar para atender às necessidades de todos os alunos, inclusive
de alguns que tenham maiores dificuldades.
Segundo BRASIL (2005), cabe:
a) Ao professor regente de classe:
-
Procurar obter todas as informações sobre como o aluno percebe o
meio, elabora suas percepções, pensa e age;
-
ensinar, acompanhar e verificar a aprendizagem, deixando ao
professor especializado as tarefas que dependam de conhecimento
específico ou do uso de recursos especiais;
-
verbalizar, na medida do possível, situações que dependem
exclusivamente do uso da visão;
-
procurar não isentar o aluno da execução das tarefas escolares,
-
fazer as verificações de aprendizagem do aluno com deficiência visual
no mesmo momento em que as realiza com os demais alunos;
-
utilizar, quando possível, materiais que atendam tanto ao aluno com
deficiência visual quanto aos de visão normal.
b) Ao professor especializado :
-
Complementar as informações das aulas de Matemática, fixando os
símbolos, formas de registro em braille, utilizando recursos apropriados;
-
colaborar na seleção, adaptação ou elaboração de material didático;
-
conhecer a técnica de cálculos no soroban.
Tanto o professor regente de classe quanto o professor especializado
poderão utilizar-se de materiais como: soroban, metro rígido em madeira com
marcações em relevo, fita métrica adaptada, figuras geométrica de diversos
tamanhos, cubos de madeira, material dourado, prancha com tela para
desenho e gráficos em relevo, cubarítmo, multiplano, entre outros.
O aluno que se sente excluído necessita ser visto de acordo com as
possibilidades individuais inerentes ao ser humano, e precisa de uma equipe
que o auxilie no enfrentamento de suas angústias e socialização. A escola
assume um importante papel que é atender às exigências de uma sociedade
democrática, onde todos os envolvidos tenham acesso à informação, ao
conhecimento e aos meios necessários para a formação de sua plena cidadania.
Sabemos que a Educação Matemática não é algo estático, onde o saber acontece apenas na decoreba, na repetição e reprodução de conceitos.
Ao contrário, a aprendizagem se efetiva a partir da contínua renovação e transformação ininterrupta de seus processos, de seus conteúdos e de seus significados. Nessa perspectiva, Lombardi (2003, 65), afirma que:
Os conteúdos devem ser significativos e representar alguma coisa
para o aluno, e este deve ter algum sentido em aprendê-los, e o
professor estar atento. O fundamental em seu trabalho está em
ajudar o aluno a compreender, a interpretar a expressar suas idéias
matemáticas presentes no seu cotidiano, não o condicionando a
adquirir conceitos matemáticos como algo pronto e acabado. Cabe,
portanto, ao professor, dar esse significado ao aluno, definindo o que
é essencial à aprendizagem e o que é secundário ou acessório.
Neste novo paradigma curricular a ênfase e a responsabilidade pela
aprendizagem são deslocadas do aluno e dirigidas para os procedimentos de
ensino. Ou seja, não é o aluno que tem que se adaptar, geralmente sem
condições para tal, sua forma de aprender ao ritmo da aula, mas ao contrário, o
ritmo e dinâmica da aula é que devem ser adaptados para permitir a
participação e a aprendizagem de todos os alunos. As aulas têm que adquirir
uma dinâmica aberta, possibilitando atividades diversificadas, que incentivem a
participação e colaboração de todos. Na escola inclusiva, a cooperação e não
a competição é o instrumento utilizado para incentivar a aprendizagem. Cada
aluno deve receber as condições para conhecer o seu próprio processo de
aprendizagem, suas características e necessidades. Ter conhecimento de seus
limites e, como meta, a superação dos mesmos.
Com o objetivo de conscientizar o coletivo da escola da importância da
inclusão no ambiente educativo, apresentamos o projeto para todos os
segmentos da escola.
Os professores que participaram das atividades relacionadas com o
projeto afirmaram que não tiveram em sua formação temas relacionados com
a educação inclusiva e que também não se sentem preparados para trabalhar
com a diversidade no ambiente educativo. Os professores de Matemática
acharam viável a aplicação do Soroban e do Material dourado nas atividades
de Matemática no Ensino Fundamental . Essas atividades serão incorporadas
no Plano de Trabalho Docente e farão parte da Proposta Curricular do Colégio.
Embora, como já anunciado, a motivação para a realização da
pesquisa tenha sido as dificuldades com alunos cegos, optou-se por realizá-la
com alunos videntes. Isso deu em razão de, neste momento, a escola não
possuir aluno cego matriculado. Conhecedor das dificuldades em ensinar o
aluno cego, buscou-se mobilizar os professores de Matemática a utilizarem o
Material Dourado e o Soroban como recursos metodológicos. Acreditamos que
estes recursos intervêm de forma positiva nos modos de elaboração coletiva da
aprendizagem e de possibilidade de concentração em alunos de 5.ª e 6 .ª séries.
Desenvolvemos atividades teóricas e práticas envolvendo o Soroban e o
Material Dourado sempre relacionando os conteúdos com o cotidiano de
alunos cegos. Citamos alguns exemplos de atividades elaboradas pelos professores do CAP – Centro de Apoio Pedagógico de Francisco Beltrão em 2007:
1) Soroban – 5 .ª série
Registro dos números:
Os números podem ser registrados à esquerda e à direita do sorobã.
a) À direita:
• Números até 3 algarismos serão registrados somente na 1.ª classe,
contando-se os eixos da direita para a esquerda, a partir da ponta direita
do sorobã.
Ex.: n.º 1
Ex.: n.º 71
Ex.: n.º 409
Conforme o número for aumentando, mais ordens vão sendo usadas.
Ex.: n.º 1.348
Ex.: n.º 903.671
b) À esquerda:
• Números com até 3 algarismos ocupam somente a 7.ª classe, contando-se os eixos da direita para a esquerda, a partir do último ponto.
Ex.: n.º 1
Ex.: n.º 73
Ex.: n.º 604
• Números de 4 até 6 algarismos, recua-se para a 6 classe, contando-se
os eixos, da direita para a esquerda, a partir do penúltimo ponto.
Ex.: n.º 1.407
Ex.:
n.º 903.671
2) Material Dourado – 6 .ª série
Como ensinar com praticidade os conceitos de centena, dezena e
unidade bem como as operações no conjunto dos números inteiros?
Para que todos os alunos tenham acesso ao Material Dourado,
inicialmente o professor deve adaptar o Material Dourado utilizando o papel
cartão ou similares:
Utilizamos o papel cartão normal para representar os números positivos:
Para representarmos os números negativos, utilizamos o papel cartão de
outra cor e com uma outra textura (com glíter, por exemplo):
Com este material, os alunos videntes e os alunos cegos poderão
identificar e representar os números positivos e negativos.
Exemplos:
1) Representar o número 124.
2) Representar o número –200:
Atividades
Após a confecção do material Dourado, propor as seguintes atividades:
1 Jogo do nunca dez com material dourado
Modo de jogar
-
O grupo decide quem inicia o jogo;
-
cada aluno, na sua vez de jogar, lança o(s) dado(s) e retira a quantidade de
cubinhos ou quadradinhos conforme a quantidade que saiu no dado;
-
quando o jogador conseguir mais do que dez cubinhos ou quadradinhos, deve
trocá-los por uma barra ou tira;
-
quando o jogador conseguir dez tiras, deve trocá-las por uma placa;
-
vence o jogador que primeiro conseguir dez placas ou um número de placas,
antecipadamente, combinado;
-
como variação, pode-se combinar um tempo determinado para jogar.
Nesta variação ganha o jogador que tiver obtido maior número de barras ou tiras e cubinhos ou quadradinhos.
2 Escreva um outro número, vamos dizer, 112, e peça a eles que:
a. usem as peças (quadradinhos, barras e quadrados maiores) do material para
descobrir de quantas maneiras diferentes eles podem representar esse
número;
b. digam em qual representação foi utilizado o maior número de peças e
c. em qual representação foi utilizado o menor número de peças.
3 Sabendo que juntas, uma unidade positiva e uma unidade negativa se
anulam, utilize o material dourado para resolver as operações:
a) +12+7–5–4
b) –120 +65
c) –13–8
d) –18:3
e) 3x(-12)
• Sugere-se que as propostas sejam atividades relacionadas com o
cotidiano dos alunos que envolvam as operações com os números
positivos e negativos.
• Ao longo das atividades, o professor deve avaliar a participação dos
alunos na execução das atividades, valorizando o trabalho coletivo e
propondo estratégias de superação das dificuldades individuais.
Considerações finais
No trabalho realizado no Colégio Estadual Manoel Antonio Gomes
notou-se primeiramente que a inclusão de alunos com necessidades
educativas especiais, particularmente os alunos cegos nas classes de ensino
regular, apresenta muitas dificuldades para a sua efetivação. Uma delas é a
falta de cursos de formação inicial e de formação continuada que contemplem
um ensino centrado na diversidade, nas diferentes realidades dos educandos,
focando uma ação pedagógica coletiva que contribua para o sucesso de todos.
Outro limite é a formação específica do ensino da Matemática, Lombardi (2003)
explicita que não basta apenas apontar dificuldades e entraves como falta de
recursos financeiros, material didático impróprio, sobrecarga de trabalho dos
professores, entre outras, mas sim, indigitar propostas que viabilizem a
construção do conhecimento matemático.
A utilização do Soroban e do Material Dourado, além de tornar as aulas
divertidas ainda contribuiu de forma significativa na aprendizagem dos
educandos. Vale ressaltar que as atividades em grupo propostas com essas
ferramentas pedagógicas valorizaram a participação, o respeito pela opinião
dos colegas, os limites de cada aluno desde a construção do material até a sua
utilização nas aulas de Matemática e principalmente a concentração dos alunos
na resolução dos exercícios elaborados pelo professor.
No ensino da Matemática o aluno deve ser capaz de interpretar e intervir
no mundo em que vive e para que isso ocorra, o professor deve repensar
continuamente sua maneira de conceber o porquê de se ensinar Matemática e o porquê de os alunos aprenderem Matemática. O aluno, conhecendo a
aplicabilidade dos conceitos assimilados em sala, terá condições de entender o
mundo e propor mudanças na realidade em que está inserido.
Por fim, queremos ao término das atividades do PDE, estimular os
professores a utilizarem o Soroban e o Material Dourado como ferramentas
metodológicas para a disciplina de Matemática, no Ensino Fundamental, não
apenas aos alunos cegos e sim para todos os alunos da classe, propiciando,
dessa forma a integração e socialização dos alunos cegos no contexto escolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
-
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988.
-
BRASIL. Diretrizes Nacionais para a educação Presidência da República. Lei 9394,
de 20 de dezembro de 1996: estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília: MEC, 1996.
-
BRASIL – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO – Secretaria de Educação
Especial – Dificuldades de Comunicação e sinalização – Deficiência Visual. Brasília, 2003.
-
BRASIL – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO – Secretaria de Educação
Especial – Saberes e Práticas da Inclusão. Brasília, 2005.
-
COSTA, M; V. (ORG. e COORD.) Caminhos Investigativos II: outros modos
de pensar e fazer pesquisa em educação. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Lamparina
Editora, 2007.
-
FIGUEIREDO, R. Políticas de inclusão: escola-gestão da aprendizagem na
diversidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
-
FABRICIO, N. M. C.; SOUZA, V. C. B. A inclusão escolar e a realidade educacional. Revista Gestão em Rede, número 55, Curitiba, 2004.
-
FISCHER, R.M.B. Verdades em suspenso: Foucault e os perigos a enfrentar In: COSTA, M.V. (org.) Caminhos Investigativos II : outros modos de
pensar e fazer pesquisa em educação. 2.ed.Rio de Janeiro, Lamparina
Editora, 2007,
-
LOMBARDI, J. C. Temas de Pesquisa em Educação. São Paulo: Autores
Associados, 2003.
-
MARCHESI, Á. & MARTIN, E. Desenvolvimento psicológico e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
-
SARAMAGO, J. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Companhia das Letras,
1995.
ϟ
O ALUNO CEGO, A ESCOLA E O ENSINO DA MATEMÁTICA: PREPARANDO CAMINHOS PARA A INCLUSÃO COM RESPONSABILIDADE
Paulo César Campos [Professor PDE -Pós -Graduado em Matemática pela UEPG (UE Ponta Grossa) &
Miriam Adalgisa Bedim Godoy [Professora Orientadora -Mestre em Educação pela UEM (UE
Maringá) Secretaria de Estado da Educação – SEED
Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2008
18.Set.2012
publicado
por
MJA
|