

Lição de
leitura táctil dada em casa por uma professora cega,
Fotografia de 1926
A Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência de 2006, da qual o
Brasil é signatário, entende que “Pessoas com deficiência são aquelas que
têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, os quais, em interação com as diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições
com as demais pessoas” (BRASÍLIA, 2011: 26). Portanto, a deficiência é
produção do encontro entre uma pessoa e as barreiras que ela encontra no
contexto social em que está inserida.
A partir dessa definição, no âmbito da
inclusão escolar, deslocamos o foco individualizado que hoje recai sobre o
aluno para focarmos nas relações que se estabelecem dentro da escola e as
barreiras que elas produzem.
Partindo desse deslocamento, entendemos que é preciso repensar os termos
que utilizamos para nos referir aos alunos que estão encontrando, dentro da
escola, barreiras no seu processo de escolarização. O termo oficial hoje
utilizado no Brasil é “alunos com necessidades educativas especiais” e no
cotidiano da escola encontramos, com frequência, o termo “aluno de
inclusão”. Ambos os termos produzem efeitos que corroboram para um
entendimento da deficiência de forma individualizada e estanque. O
primeiro entende que é o aluno que tem necessidades educativas especiais,
e coloca em cena a palavra “especial” que é excludente, pois coloca os
alunos fora do coletivo, pois são especiais; especiais passa a ser tomado
como diferente, “de fora”, que precisa de estratégias específicas. Ao mesmo
tempo, implica que os outros alunos não são especiais, ou seja, não são
diferentes e não necessitam de estratégias diferenciadas e um olhar atento
para seu processo de aprendizagem. Por fim, essa categoria nos parece
rígida. Quando um aluno tem necessidades educativas especiais, ele as terá
sempre, em qualquer contexto e independente dos encontros que se
efetivem no seu ambiente escolar. O segundo termo, “aluno de inclusão”,
também incorre na questão do engessamento do aluno em uma categoria
onde ele não tem espaço para se movimentar.
A professora Cynthia Freller ¹ , em seu artigo “É possível ensinar
educadores a incluir?”, utiliza o termo “aluno em situação de inclusão” para
falar daquilo que compete ao profissional que atua com esses alunos:
movimentar uma situação que o aluno está vivendo. Essa outra forma de se
referir aos alunos produz movimento: o aluno não é de inclusão para
sempre, ele está em uma situação que demanda trabalho para se modificar;
ele é de inclusão naquele contexto, naquela situação, a partir do encontro
que está tendo com o outro. Inclusão passa a ser um lugar por onde os
alunos passam, é um estado. O aluno pode ser de inclusão na aula de
matemática, mas não na aula de ciências já que na aula de ciências foi
produzida a proposta acessível para ele e na de matemática não. Ele pode
ser de inclusão e deixar de ser e voltar a ser e deixar de ser novamente.
Possibilita o movimento. Em segundo lugar, ele abre mão do especial onde
só alguns são de inclusão e podem ter um apoio diferenciado. A partir desse
termo entendemos que qualquer aluno pode estar sendo de inclusão, ou
seja, pode estar passando por uma situação, encontrando uma barreira que
precisa de trabalho para se modificar e por isso ocupa o lugar de inclusão.
As escolas têm tomado como principal ferramenta de inclusão a presença de
um mediador escolar acompanhando os alunos em situação de inclusão. No
Rio de Janeiro, o mediador é contratado pelas escolas ou pelas famílias com
crianças / adolescentes considerados alunos em situação de inclusão para
acompanhá-los no cotidiano escolar. Em sua maioria, essa contratação era
feita a partir de uma demanda da escola. O mediador pode atuar dentro da
sala de aula, no recreio, no lanche e em outros espaços, dependendo da
demanda que se faz com relação às dificuldades do aluno. Esse trabalho
precisa ser construído em parceria com a escola, principalmente com os
professores, de forma que se configure uma intervenção conjunta em prol de
uma vivência escolar de qualidade para o aluno acompanhado.
Não existe um único formato de mediação ou um manual que se possa
seguir com todos os alunos. Cada mediação se organiza localmente, no
encontro com a escola, com o aluno e sua família. Olhamos para o mediar
como uma ação complexa, inspirados por Bruno Latour, que diz o seguinte:
“um mediador, apesar de sua aparência simples, pode se revelar complexo e
arrastar-nos em muitas direções que modificarão os relatos contraditórios
atribuídos a seu papel” (LATOUR, 2012: 65).
Então, partindo dessa definição de aluno em situação de inclusão, e tomando
como disparador a prática de mediação escolar ² , a partir de quais critérios,
conhecimentos, vamos partir no momento de eleger e criar as intervenções
com esses alunos? Circulando pelas diferentes escolas, assistimos a
predominância de atuações que têm como direcionamento os diagnósticos,
síndromes e/ou transtornos atribuídos aos alunos. Nossa aposta é seguir na
contramão dessa direção medicalizante ³ de fazer inclusão. Assim,
oferecemos algumas pistas para seguirmos em outras direções no esforço de
incluir ⁴ .
Primeira direção: diferença
Em curso sobre inclusão e mediação ⁵ , oferecido por nós em 2015, fizemos
duas perguntas aos alunos: Para você, o que é inclusão? Quem é o público
alvo da inclusão? Entre as muitas respostas, as palavras aceitar, acolher e
respeitar apareceram diversas vezes para se referir à questão da diferença
na escola. Nos chamou atenção as frases compostas por essas palavras e
seus efeitos na nossa posição em relação às diferenças. Precisamos cuidar
das palavras, uma vez que elas têm força e marcam a nossa experiência com
as pessoas.
Consideramos essas palavras perigosas. Perigosas pois vêm envolvidas por
um manto de solidariedade, compreensão, inclusão. Porém, se olharmos
mais a fundo para as frases que se constituem por essas palavras, teremos:
“inclusão é aceitar a diferença do aluno”, “eu aceito a diferença do outro”,
“na inclusão, precisamos respeitar as diferenças do aluno”, “inclusão é
respeitar as diferenças”, ou “eu acolho ele mesmo sendo diferente”. Pois
bem, só podemos lançar mão dessas frases uma vez que nos colocamos em
uma relação distanciada desse outro: “eu aceito o problema do outro já que
eu não tenho problemas”, ou “na inclusão, precisamos respeitar as
diferenças do aluno, pois não somos diferentes”. Muitas vezes sem perceber,
estabelecemos relações com o outro, e nesse caso com o aluno em situação
de inclusão, na qual o diferente é ele e, portanto, é ele que precisa se
modificar, se adaptar; é ele que foge a uma suposta forma de ser da qual
nós, os que não são diferentes, fazemos parte.
Em um artigo no jornal El País, Eliane Brum coloca em xeque essa forma de
se pensar em relação ao outro,
A pessoa que se arrisca à experiência não é aquela que “tolera” o outro, que
tem uma deficiência, como se fosse magnânima porque tolera, como se fosse
uma enorme concessão que se expressa pela condescendência. Como
acontece com tantos ao considerar que já é uma grande coisa cumprimentar
com um sorriso a pessoa com deficiência que trabalha na mesma sala por
determinação legal. Ou quando reclamam que o “deficiente” não é
simpático, já que deveria estar eternamente agradecido e subserviente
porque lhe concederam um lugar, ainda que num canto. Quem faz o mundo
dar um passo à frente são aqueles que percebem que a experiência de viver
se amplia ao conviver com as diferenças. Que veem diversidade e riqueza
onde outros veem inferioridade e fracasso. (BRUM, 2016)
Só nos valemos dessas frases porque ainda prevalece a ideia de que temos
escolha frente à diferença, ou seja, podemos decidir não aceitá-la, não
respeitá-la, e etc. E não temos essa opção. A diferença é inerente à vida, é
condição da vida. Logo, não nos cabe aceitar ou respeitar, ela está em nós e
é prerrogativa da existência.
Macedo (2011) nos convoca a conviver com as diferenças a partir de uma
lógica da relação, na qual se relacionar significa reunir coisas que não
valham por si só, só existem em relação. Ou seja, é a relação com o outro
que as define: “Portanto, na relação, quem nos define são também os outros
com quem nos relacionamos, pois somos definidos por esse jogo de posições
que nos situa uns em relação aos outros, de diversos modos.” (MACEDO,
2011: 03). Nessa lógica as diferenças dizem respeito a todos, nos definem e
nos modificam.
Manuela, mediadora escolar ⁶
Hoje Manuela nos contou que a escola está exigindo que o aluno que ela
acompanha tenha um laudo médico para que seja autorizado o uso de provas
orais como forma de avaliação. Ela acha que não faz sentido precisar de
laudo já que todos os profissionais da escola reconhecem a dificuldade do
menino com a escrita e a leitura, e tem receio do que esse rótulo pode
produzir no trabalho com o menino. Por outro lado, ele se beneficiaria muito
se puder ter avaliações e atividades diferenciadas na escola. Seu
aprendizado está sendo prejudicado pelas limitações das intervenções que
podem ser feitas. Não queremos defender o diagnóstico, mas também não
podemos abrir mão de modificar alguns funcionamentos da escola para que
o aluno possa aprender. (Caderno de campo, 2013)
A prática de mediação na qual apostamos não tem como alvo os diagnósticos
que marcam a maior parte dos alunos que acompanhamos. Não é a partir
das descrições sobre o autismo ou a síndrome de down que planejamos
nossas intervenções com os alunos que acompanhamos. Assim como não nos
pautamos em uma noção fechada de normalidade na escola, diante da qual
teríamos como objetivo adaptar o aluno em situação de inclusão, e que está
contida nos laudos que colocam o aluno do lado “errado” do funcionamento
escolar.
Entretanto, não utilizar laudos e diagnósticos como norteadores do nosso
trabalho não significa que não sejam atravessamentos relevantes com os
quais temos que lidar. Com alguns alunos acompanhados, o diagnóstico se
tornou um aliado para conseguirmos que a escola autorizasse determinadas
modificações no currículo, nas formas de ensinar, funcionar e avaliar. Foi o
caso do trabalho de mediação da Manuela. O aluno não sabia escrever, mas
entendia os conteúdos da matéria e sabia responder oralmente às questões.
Assim solicitou-se a avaliação por meio de prova oral. A permissão para se
modificar a forma de avaliação desse aluno foi atrelada à existência de um
laudo diagnóstico justificando essa necessidade. Diante dessa determinação,
foi necessário nos aliarmos ao diagnóstico para avançarmos nas
modificações necessárias que garantissem que o aluno estaria sendo
avaliado dentro das suas possibilidades, reduzindo, assim, as barreiras que
estavam sendo impostas ao seu aprendizado.
Não podemos travar todas as batalhas ao mesmo tempo, precisamos
escolher as mais urgentes, as que dariam, naquele momento, mais frutos e
beneficiariam o aluno. Santos (2001) nos diz da necessidade de
constituirmos uma experiência corporal sensível que, além de agir, seja
também capaz de sentir. Para a mediação é importante criamos esse corpo,
capaz não só de esbravejar demandas à escola e requerer que tudo se
modifique no mesmo instante, mas de se utilizar da sensibilidade no
encontro com o outro e com as barreiras que se apresentam cotidianamente.
Contudo, a aliança com o laudo diagnóstico se deu apenas no âmbito das
nossas relações com a escola e nas resoluções burocráticas da instituição. O
novo diagnóstico do aluno não se tornou uma diretriz de trabalho do
mediador que o acompanhava. No cotidiano com o aluno, as intervenções
pensadas se mantiveram guiadas pelas dificuldades que aquele aluno nos
apresentava e pelas composições que íamos fazendo com ele.
Segunda direção: dificuldades e habilidades
É esperado que os alunos dentro da categoria de inclusão tenham um laudo
médico que justifique esse lugar na escola. Carlos e Antonio tinham em
comum o fato de não possuírem diagnósticos fechados, e nos colocaram a
pensar que nem todo aluno sem diagnóstico não é um aluno em situação de
inclusão e, nesse caso, nem todo aluno que possui diagnóstico é um aluno
em situação de inclusão.
Seria o diagnóstico critério para um aluno estar em situação de inclusão?
Seria o laudo médico, ou diagnóstico, o conjunto de informações que nos
ajudaria a construir um processo consistente de inclusão para os alunos que
acompanhávamos? Concordamos com Senra (2008) quando ele diz que
se de fato nos propomos a construir uma educação para todos a partir da
perspectiva de cada um, (…) da expressão do sujeito como ponto de partida
(…), vamos considerar que de nada nos serve priorizar o diagnóstico médico.
(SENRA et al, 2008: 38)
Se não iríamos priorizar o diagnóstico médico, quais critérios iríamos
eleger?
Antonio, aluno em situação de inclusão
Fui chamada para trabalhar com Antonio porque ele tinha dificuldades nos
exercícios de sala, não acompanhava os conteúdos da turma. A escola
também me apontou que o aluno por vezes atrapalhava a aula batucando ou
provocando os colegas, parecia que ele não se conectava com as aulas.
Outro ponto forte para a entrada da mediação era a dificuldade de Antonio
em fazer amizades, no manejo das relações sociais na escola. Era uma
grande preocupação que foi endereçada a mim. Com essas informações
sobre o menino, iniciei a mediação. (Memórias, 2010)
Em algumas situações, as escolas demandam para a família um laudo
diagnóstico para que o aluno possa efetivamente entrar no grupo dos alunos
em situação de inclusão e ter um mediador. Em outras situações, a escola
decide classificar o aluno como em situação de inclusão e pedir a mediação
escolar, e ao longo do processo insiste junto à família pelo laudo a fim de ter
um documento que justifique as medidas diferenciadas utilizadas com o
aluno. Esse laudo ora vem com um diagnóstico fechado, ora apenas com a
indicação de que são necessárias medidas especificas para o aprendizado
daquele aluno.
Dessa forma, o que há de comum entre os alunos em situação de inclusão
não é a presença de laudos ou diagnósticos, e sim barreiras no processo de
aprendizado na escola. Essas barreiras produzem dificuldades. Esse foi o
processo que se deu com Antonio. No caso dele, o laudo não se fez
necessário, a escola compreendia que ele estava com dificuldades que
demandavam estratégias de inclusão, entre elas o mediador escolar. O que a
escola ofereceu de informações sobre o aluno não foi um diagnóstico, e sim
os pontos que vinham desafiando o seu processo de escolarização.
Entretanto, a descrição do aluno só comportou as dificuldades dele, e nada
foi contado de suas habilidades ou seus interesses. Essa parte foi Antônio
mesmo quem contou.
Então, os alunos em situação de inclusão são alunos que apresentam alguma
dificuldade no decorrer do seu processo de escolarização que extrapola o
que seria passível de ser resolvido utilizando os recursos já existentes na
escola. Tem sido para essas situações que o mediador escolar está sendo
convocado.
Carlos, aluno em situação de inclusão
Carlos é um adolescente que está no fundamental II. Ele é muito organizado
e responsável com seu material. Realiza todas as tarefas com muito
empenho. Ele tem dificuldade na compreensão dos conteúdos previstos pela
escola, principalmente os que demandam pensamento abstrato, e nas
relações com os colegas. Carlos não acompanha os conteúdos previstos na
ementa de cada ano para cada disciplina, e por isso não consegue realizar
todos os exercícios propostos pelos professores. Carlos gosta muito de
futebol, sabe tudo sobre o assunto, e tem dificuldades de mudar de tema
buscando sempre introduzir o assunto nas conversas. Nas relações com os
colegas, reclama muito das provocações que os meninos fazem com ele e
tem dificuldade de entrar nas conversas, entender os assuntos. Já com os
professores e os adultos em geral faz vínculo com facilidade, buscando essa
parceria em muitos momentos. Respeita as regras colocadas pela escola com
facilidade. Carlos sempre nos mostrou grande desejo por aprender e
participar das atividades, o que facilita a implementação das diferentes
estratégias. (Caderno de campo, 2015)
Deslocando o entendimento das situações de inclusão do diagnóstico para as
dificuldades, a preocupação da mediação passa a ser em mapear as
dificuldades que cada aluno nos comunica e o contexto em que elas estão
inseridas. E junto com isso, quais as habilidades que eles apresentam e que
os auxilia na escola.
A descrição de Carlos, portanto, busca entender o aluno a partir de suas
dificuldades e capacidades sem precisar da preocupação com um
diagnóstico que ele poderia receber. Dessa forma, construímos as
intervenções pautadas nessas dificuldades que estavam ocorrendo no
encontro entre o aluno e as demandas da escola, utilizando também as suas
capacidades.
Basta que deixemos inscreverem-se as especificidades, mesmo que essas
sejam necessidades próprias e diferentes das necessidades dos demais
alunos no domínio das aprendizagens curriculares correspondentes à sua
idade. Diante dessa singularidade que aí se afirma, consideremos a
necessidade e a viabilidade de recursos pedagógicos e metodologias
educacionais específicas (…). (SENRA et al, 2008: 38)
A mediação com Carlos foi facilitada pelo fato de ele ser muito organizado
com seus materiais e mostrar sempre vontade de realizar as tarefas, além da curiosidade para aprender. Por exemplo, foi proposto que Carlos realizasse
seus exercícios em sala de aula junto com a turma sem precisar da presença
do mediador ao seu lado, ou mesmo na sala de aula. Isso só foi possível
porque podia-se contar com a vontade dele em fazer as suas tarefas. E foi o
apego às regras que fez possível a ideia de oferecer ao menino um gabarito
de suas apostilas para que ele pudesse corrigir o que tinha feito e depois
tirar suas dúvidas com o professor e com o mediador. Os profissionais que
atuavam com ele sabiam que ele não iria copiar o gabarito. Os exercícios
dele eram adaptados com base nessa dificuldade de compreender
enunciados abstratos, ou seja, fazia-se com que eles fossem mais concretos.
Como sinaliza Albano (2015), o exercício de criar intervenções a partir da
vivência com os outros afirma a inclusão como
política da diferença (…) coexistência de singularidades, como a construção
de um campo comum, que se compartilha com os outros, à sua maneira, com
sua própria expressividade. É ser com os outros e não como os outros . (ALBANO, 2015: 44)
Portanto, o planejamento da mediação se dá utilizando as dificuldades e as
capacidades que nos são comunicadas pelos alunos nos momentos em que
estamos juntos.
Terceira direção: diversidade, diferenças, dificuldades e o intercâmbio de
estratégias
Partimos do pressuposto de que a diferença está na essência da
humanidade, na gênese do processo de humanização. É ela que permite a
diferenciação entre as experiências e a constituição da subjetividade. Afinal,
a condição que nos iguala enquanto sujeitos humanos é o fato de sermos
diferentes. O que nos iguala é a diferença. Considerar cada indivíduo
permite-nos descobrir, junto com ele, suas capacidades, suas
potencialidades de sujeito singular e diferente. (SENRA et al, 2008: 42)
A inclusão escolar pressupõe a diferença como parte integrante do cotidiano
das salas de aula e dos corredores da escola. A entrada dos alunos em
situação de inclusão nas escolas regulares escancara a heterogeneidade
como prerrogativa do ser humano, e abre espaço para que possamos pensar
uma educação que leve em consideração as diferenças de cada um de seus
alunos.
No tempo atual, a efetividade da inclusão como política das escolas permite
que os alunos com diferenças muito marcadas, que antes ficavam fora,
estejam dentro. Essa ação permite, aos que habitam a escola, perceber e se
relacionar com os alunos em situação de inclusão e alarga o espaço no qual
conseguimos perceber as diferenças de todos os alunos, e mesmo as nossas.
Dessa forma, a diferença passa a ser palavra chave nos corredores da
escola. Parece estar na moda usar a expressão “somos todos diferentes”,
ouvimos isso nas escolas, nos espaços de formação, lemos em artigos. Sim,
vamos afirmar que somos todos diferentes e, portanto, somos iguais
justamente porque somos diferentes. Como coloca Santos,
É preciso afirmar que nas novas lutas se procura o equilíbrio forte, tenso,
dinâmico, entre o princípio da igualdade, o princípio da liberdade e o
princípio da diferença, e que apesar de vivermos em sociedades muito
desiguais, a igualdade não nos basta, queremos ser iguais e queremos ser
diferentes. (SANTOS, 2001: 22)
No entanto, não podemos usar essa frase para apaziguar as tensões e
colocar todas as diferenças no mesmo patamar. Hoje, algumas diferenças
não impedem que o aluno consiga aprender e experimentar a escola a partir
do formato já dado. Outras diferenças sim. Elas, em muitos momentos,
impedem o aluno de se movimentar, de aprender, de se desenvolver. Para a
escola, elas representam desafios e colocam em evidência que a forma
hegemônica de ensinar não dá conta da diversidade de formas de aprender.
Dessa maneira, o encontro entre algumas diferenças e o funcionamento
atual da escola produz dificuldades; ou melhor, o funcionamento atual da
escola quando encontra com as diferenças de alguns alunos produz
dificuldades.
Portanto, o que vamos percebendo é que precisamos inverter a lógica de que
são os alunos que vão entrar nas salas de aula e precisam funcionar dentro
das propostas feitas para um coletivo que teoricamente é igual. Os alunos
necessitam de estratégias diferenciadas. A realidade vem nos mostrando
que a diversidade é característica central nas salas de aula e que uma única
proposta de atividade, uma única forma de apresentar certo conteúdo ou
avaliar todos os alunos tem se mostrado cada vez menos eficaz (CAST,
2011). Esses alunos nos obrigam a pensar em outras formas de apresentar
os mesmos conteúdos, repensar as regras, o tempo, o currículo, pois, como
nos diz Macedo (2011), esses alunos “utilizam recursos diferentes dos
normalmente conhecidos ou utilizados” para aprender.
Vamos utilizar a ideia de Beyer (2006) de que os alunos em situação de
inclusão são esses que se veem impedidos de aprender quando em contato
com os funcionamentos da escola. O trabalho da mediação irá incidir,
justamente, sobre essas dificuldades oriundas desse encontro entre a forma
de ensinar e funcionar da escola e o aluno em situação de inclusão. E tem
como objetivo colocar em cena um fazer diversificado na escola.
Carlos
Quando comecei a mediar Carlos entendi que ele estava tendo dificuldades
semelhantes às de Antonio quando se relacionava com os exercícios
propostos pela escola. Ambos tinham dificuldades na compreensão de
enunciados abstratos, com metáforas, com muitos comandos juntos e
atividades muito longas. As fichas, livros e avaliações que a escola estava
oferecendo para eles provocava essas dificuldades, e eles não conseguiam
fazer. Carlos, muitas vezes, respondia qualquer coisa apenas para preencher
o espaço vazio na folha. Antonio costumava deixar em branco. (Memórias,
2012)
Ao longo do tempo, fomos descobrindo que dois alunos com o mesmo
diagnóstico nos apresentavam dificuldades muito distintas e, por isso,
éramos convocados a pensar em estratégias diferentes em cada situação.
Por outro lado, dois alunos com diagnósticos diferentes podiam ter as
mesmas dificuldades. E ainda mais, alguns alunos que não tinham
diagnósticos também tinham dificuldades semelhantes a alunos com
diagnósticos bem definidos.
Foi o que percebemos quando aproximamos a mediação de Carlos e a de
Antonio. Com este último, os materiais eram adaptados simplificando os
enunciados, fazendo relação com questões concretas do seu cotidiano,
usando imagens para auxiliar o entendimento de textos e perguntas, e
diminuindo a quantidade de exercícios por atividade. Essas estratégias
funcionaram para melhorar sua relação com os exercícios. Ele passou a
conseguir fazê-los com mais propriedade e menos medo de errar. Na
mediação de Carlos foi possível utilizar essas mesmas estratégias de
adaptação de material. Inclusive puderam ser usadas como modelo algumas
fichas preparadas para Antonio e que precisaram apenas de alguns retoques
para aproximá-las da realidade de Carlos, e assim serem usadas com ele.
O medo de errar atravessava a relação de aprendizado dos dois meninos,
porém produzia reações diferentes em cada um – Antonio deixava em branco
e Carlos escrevia qualquer coisa na folha de exercícios e não queria corrigir
–, talvez fossem fruto de questões semelhantes: um material que não estava
acessível para eles, um material muito difícil, por vezes incompreensível, o
que resultava em erros frequentes. David Rodrigues, em uma palestra no
TED ⁷ , coloca que a “igualdade de oportunidades não é do lado do que se
dá, mas é do lado de que se recebe”. Assim tratar os meninos com igualdade
não era oferecer material semelhante ao da turma. Ao contrário, era
oferecer materiais com os quais eles pudessem efetivamente trabalhar e
aprender. Diferente dos materiais, aprender sim era uma aposta semelhante
à da turma.
Ofertar para todos os alunos o mesmo material e as mesmas estratégias de
trabalho não significa tratá-los com igualdade, pois sabemos que cada um
deles tem condições diferentes para recebê-los. Em várias situações, se
apresenta como estratégia disponibilizar materiais diferentes de acordo com
as capacidades que cada aluno possui para lidar com eles. Parece-me que o
fato de não terem sido levadas em consideração as dificuldades e
capacidades de Antonio e Carlos na confecção de seus materiais pode ter
provocado, nos dois, uma sensação de fracasso e o medo de errar. Essa
combinação, aos poucos, foi diminuindo o vínculo deles com o aprendizado
em si. Oferecer um material pensado para eles, que correspondia às suas
dificuldades, habilidades e interesses, foi a principal estratégia de trabalho
da mediação.
Para romper a generalização presente em uma certa relação professoraluno,
ou especialista-paciente (…) precisamos buscar os funcionamentos
singulares: O que ele sabe? O que faz? O que não faz? (…) Mas
consideremos a limitação das perguntas acima, pois qualquer uma delas
pode incorrer em uma nova generalização. Pretender quebrar a produção de
uma generalização para fazer advir um funcionamento singular não depende
de boas perguntas, mas sim de uma atitude de criação de formas de fazer
aparecer esses funcionamentos singulares. (MACHADO, 2010, s/p)
Dessa forma, o que percebemos é que, quando optamos por compreender os
alunos em suas dificuldades e habilidades, as estratégias e materiais
construídos para um aluno servem para outro que esteja apresentando a
mesma dificuldade. Além disso, abrimos espaço para que as estratégias e
ferramentas criadas inicialmente para o aluno em situação de inclusão
possam ser utilizadas com alunos fora dessa categoria e, aos poucos, incluir
as apostas de diversificação no cotidiano de todos os alunos.
Quarta direção: fazer igual e fazer diferente
Quando precisamos buscar ir além das limitações? E quando temos que
afirmar e compor com a limitação como o que nos constitui? Ou, quando
precisamos afirmar que o aluno pode fazer igual a todos os outros e quando
ele pode fazer diferente? Nas palavras de Boaventura, “lutar pela diferença
quando a igualdade aniquila e lutar pela igualdade quando a diferença
insulta”. (Apud CONTI, 2015: 76).
Antonio
Propus que ele fizesse fotos do making-of das aulas de dança como forma de
participação – assim ele fica no grupo e na sala, e presta atenção na dança
produzindo algum trabalho. No entanto, a resposta é que o aluno pode sim
fazer o que propus, mas que isso não poderá contar como o trabalho dele.
Porque a escola acha que o caminho proposto o retira do grupo. O aluno
teria que participar das atividades junto com o grupo da dança. Enfim, não
está havendo muito espaço para ele fazer diferente. Ele vai tirar as fotos e
depois vejo como isso vai ficar.” (Caderno de campo, 2011)
Foi proposto à escola que fosse realizado com Antonio um trabalho
diferenciado da turma nas aulas de dança. No primeiro momento, a
mediação apenas acompanhou o aluno nas aulas para entender onde
estavam as suas dificuldades. Logo se percebeu que era uma aula que
demandava muita exposição, dançar na frente da turma era se expor demais
para aquele menino; ele mesmo pôde dizer, em algumas ocasiões, que ficava
com vergonha, e por isso não queria fazer. Diante dessa descoberta foram
pensadas alternativas para que ele pudesse fazer parte daquela aula dentro
das possibilidades dele. Antonio gostava de tirar fotos, e a máquina o
escondia o suficiente para não ficar com vergonha. Fazendo o making-of ele
estava no grupo, acompanhando o que seus colegas estavam realizando e
ainda lhe permitia ficar fora do foco de luz.
A proposta de diferenciação leva em consideração as possibilidades do aluno
e a tentativa é de que ele se mantenha no coletivo. Portanto, “resta-nos
interrogar-nos acerca da forma pela qual poderíamos transitar entre o
domínio do singular e o domínio do ‘para-todos’” (SENRA et al, 2008: 36).
Assim, fazer diferente não significa ficar de fora, excluído do grupo. A
inclusão diz respeito justamente a possibilitar que todos os alunos estejam
juntos aprendendo e compartilhando experiências. Uma exposição dos
momentos de ensaio da turma poderia ser compartilhada com todos, ao
mesmo tempo que o Antonio conheceria bem os movimentos da turma, já
que os estaria registrando. A produção e as aprendizagens de ambos, de
Antonio e da turma, são partilhadas.
Theo, mediador escolar
Theo me trouxe um problema com relação à prova do livro de língua
portuguesa. A prova do livro foi dividida em duas partes, a turma iria fazer
em dias diferentes. No primeiro dia, o menino fez prova com a turma, a dele
adaptada. No segundo dia, ele não fez, não tinha prova para ele. O aluno
ficou excluído dessa atividade, fez um trabalhinho para passar o tempo. Para
a escola não havia necessidade dele fazer duas provas, alegava que ele iria
ficar cansado, podia ficar fazendo outra coisa nesse momento, separado da
turma. Mas ele é aluno da turma, porque não iria fazer igual à turma?
(Caderno de campo, 2015)
Em outros momentos, fazer inclusão trata-se de manter os procedimentos de
rotina e modificar a forma de fazê-los. O menino tinha todas as condições de
fazer as provas assim como seus colegas de turma. Como aluno daquela
sala, fazia sentido que ele pudesse realizar as mesmas atividades. Assim, se
a turma toda estava fazendo prova porque ele não estaria também? Era um
aluno que tinha condições de seguir o funcionamento da turma, com
adaptações de conteúdos e formatação. Suas provas precisavam ser
menores, pois ele levava mais tempo para realizá-las; precisavam utilizar
uma linguagem mais concreta e imagens para auxiliar no entendimento dos
enunciados; seus conteúdos eram um pouco diferentes da turma, então sua
prova também era diferente da prova da turma. Com essas modificações ele
podia participar dos momentos de avaliação como qualquer aluno da sala, e
dessa forma se sentir pertencendo àquele grupo. Não fazia sentido retirá-lo
de sala, ou colocá-lo para fazer uma atividade distinta. Essa estratégia
poderia ser utilizada com outros alunos que não conseguiam, por exemplo,
fazer muitas provas, ficavam cansados, ansiosos ou qualquer outra
dificuldade. Não era o caso desse aluno.
Podemos utilizar a seguinte pergunta: “quando fazer igual e quando fazer
diferente?” para balizar nossas ações, pois passamos a compreender que só
devemos intervir junto ao aluno quando entendermos que ele não tem
condições de realizar a atividade, ou o procedimento, de forma semelhante
aos seus colegas. Nessas situações precisávamos ponderar se o melhor
caminho é modificar o procedimento, a regra ou atividade, ou mantê-los
iguais e criar ferramentas com o aluno para que ele possa realizá-las.
o caminho para se chegar até a educação de qualidade para todos será
alcançado graças à experiência de cada um, experiência de expressão,
inscrição e laço com uma coletividade que seja suscetível a ela. É só
experimentando que se pode efetuar a singularidade e sua verificação.
(SENRA et al, 2008: 37)
Enquanto mediadores corremos o risco de cair na armadilha do “dar conta
de tudo” – dar conta das demandas da escola, dos pais, dos terapeutas. Na
escola isso se atualiza quando passamos a ficar ao lado do aluno em todos os
momentos, quando fazemos de tudo para que nada dê errado, que o aluno
faça tudo que é pedido. Sem ponderar se naquela situação ele precisa
mesmo de nós, se ele precisa de adaptações, ou se ele pode fazer igual aos
demais alunos. Temos que ver ao longo do processo o que precisa ser
modificado e o que manter da mesma forma que o proposto para os demais
alunos. Passamos então a partir do pressuposto de que a priori o aluno
mediado podia fazer tudo igual aos seus colegas, e a diferenciação viria do
nosso encontro com ele.
Quinta direção (e última): mediar na escola
Só existe hoje a necessidade de afirmarmos a inclusão porque ela não existe.
Nossas escolas ainda não são inclusivas. Quando alunos em situação de
inclusão começam o ocupar o espaço escolar sem que este se transforme
para recebê-los, estamos lidando com experiências de integração. Nesse
modelo, a diferença é considerada anormalidade. No modelo inclusivo, a
diferença é a normalidade.
Dessa forma, não se trata de colocar o aluno com dificuldades nas escolas e
turmas regulares e “nós” (os que supostamente não tem dificuldades)
continuarmos “normais”. A educação inclusiva não significa:
colocar os cegos e mutilados dentro da classe e nós continuarmos normais
(…). Incluir significa abrir-se para o que o outro é e para o que eu sou ou
não sou em relação ao outro. Por isso a educação inclusiva supõe, sobretudo,
uma mudança em nós, em nosso trabalho, das estratégias que utilizamos,
dos objetos e do modo como organizamos o espaço e tempo na sala de aula.
Temos que rever as estratégias de ensinar matemática e língua portuguesa.
Temos que rever a grade curricular, os critérios de promoção e de
avaliação.” (MACEDO, 2011: 03)
Na inclusão não cabe mudar o outro, e sim se disponibilizar para produzir
uma mudança em nós. No encontro com o diferente de nós produzimos uma
mudança que cria um modo de fazer comum. As alterações necessárias para
inclusão serão fruto do esforço de todos os atores que ocupam o espaço
escolar, visando modificar suas engrenagens, um tanto enferrujadas, para
criar um espaço onde caiba qualquer pessoa.
O aluno em situação de inclusão, diz Beyer (2006), tem características
singulares que, no contexto escolar onde estão inseridas, tornam suas
aprendizagens mais difíceis, com maiores desafios. Dessa forma, ao invés de
marcá-los como alunos deficientes, vamos afirmar que são crianças e
adolescentes com condições de aprendizagem diversas. E assim deixamos
claro que são alunos com total possibilidade de aprender, e por isso é dever
da escola criar condições de ensiná-los.
Optar por seguir, na escola, outra direção, afastando-se do diagnóstico como
norteador do nosso trabalho não significa, como nos lembra Moysés (2011),
negar que existam alunos em sofrimento, com dificuldades no processo de
aprender ou de se relacionar, mas nos convoca a pensar em como acolhemos
e intervimos junto a eles. No caminho da medicalização, problemas coletivos
e desafios institucionais são individualizados no corpo do aluno. Ele se torna
o responsável pelos seus próprios fracassos e, portanto, é ele que deve ser
acompanhado e adaptado até se aproximar ao máximo dos ditos normais.
Assim, não se trata de fingir que o diagnóstico não existe, mas de afirmar
uma prática de mediação que não tem nele o caminho privilegiado de
trabalho. Ou seja, que não define suas intervenções de acordo com a
deficiência ou o transtorno atribuído ao aluno acompanhado. O que
interessa na mediação é acompanhar as singularidades de cada aluno a fim
de criar estratégias únicas COM ⁸ ele – “(…) um dispositivo de intervenção
que se faz com o outro na medida em que é construído em articulação com
aquilo que interessa ao outro” (MORAES, 2010: 30). Estratégias e
instrumentos que só são possíveis nesse encontro. Para mediar é de suma
importância conhecer cada aluno com que se está trabalhando e se deixar
conhecer por ele. Assim como o aluno, cada profissional que atua como
mediador tem suas singularidades. O encontro entre os dois é que produz o
trabalho. Um trabalho único, situado naquele contexto e naquele momento.
Apostamos no mediar “como uma força que pode desnaturalizar certas
concepções hegemônicas e criar um vínculo, um laço possível ali onde
parecia que as coisas estavam dadas, paradas e cristalizadas.” (CONTI,
2015: 6).
A mediação oferece outras narrativas sobre o aluno em situação de inclusão
que priorizam a dimensão das potencialidades e capacidades, ao mesmo
tempo em que identifica as dificuldades como apenas mais um elemento que
os constitui. E, a partir dessa perspectiva, nos possibilita o reconhecimento
das nossas próprias diferenças, dificuldades e capacidades, assim como a
ampliação das nossas capacidades de diálogo, flexibilização e criação.
Produz relações mais éticas. A escola se torna um espaço que melhor atende
a cada um dos seus alunos em suas formas diversificadas de aprender, pois
amplia a sua capacidade e disponibilidade de produzir estratégias
diferenciadas que resultam em formas diversificadas de ensinar e de
aprender.
Mediação é encontro; mediação é ampliação de conhecimento; mediação é ir
ao encontro do repertório cultural e dos interesses do outro; mediação é
conectar conteúdos e interesses; mediação é ir além dos conteúdos;
mediação é aproximar, refletir experiências e compartilhar; mediação é
diálogo, conversação; mediação é provocação; mediação é atitude do
professor. Assim mediação (…) é estar entre muitos. (CELESTE, 2012: 544)
É essa contaminação do “estar entre muitos” que buscamos produzir na
ação de mediar na escola; disseminar indagações, tensionamentos, apostas,
desejos, de forma que cada vez mais pessoas possam fazer parte desse
coletivo que hoje luta por uma escola inclusiva.
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NOTAS
-
1 Cynthia Freller é professora do Instituto de Psicologia da Universidade de
São Paulo. No artigo, “É possível ensinar educadores a incluir?” na Revista
Estilos da Clínica (USP), ela apresenta o termo “aluno em situação de
inclusão” na seguinte passagem: “(…) utilizamos o termo aluno em situação
de inclusão, apontando para o trabalho que nos cabe (…): movimentar a
situação dos alunos excluídos. Os alunos não são de inclusão
indefinidamente, (…), mas estão em uma situação que demanda trabalho
para se modificar, um lugar de passagem” (FRELLER, 2006: 329).
-
2 Essa discussão se faz a partir da minha experiência como mediadora
escolar entre 2010 e 2014 e na coordenação do projeto Encontro de
Mediação e Inclusão, criado em 2012 em parceria com a pedagoga e
psicopedagoga Sheina Tabak; entre outras atividades, o EMI oferece
espaços de formação e estudos sobre inclusão escolar e mediação para
educadores que atuam junto à questão da inclusão escolar – mediadores ou
profissionais ocupando essa função com outros nomes (auxiliar de ensino,
professor integrador, professor especialista, estagiário) – e professores em
geral. O EMI surgiu como uma forma de desenrolar questionamentos sobre
a inclusão de forma coletiva. Nos interessa produzir um espaço que agregue
diferentes profissionais que tenham o desejo de discutir as questões do
campo da inclusão escolar, bem como construir estratégias e ferramentas
para efetivar situações inclusivas na escola abarcando todos aqueles que
participam do cenário da inclusão escolar.
-
3 Medicalização da vida é um “(…) processo que transforma, artificialmente,
questões não médicas em problemas médicos. (…) Questões coletivas são
tomadas como individuais; problemas sociais e políticos são tornados
biológicos. (…) a pessoa e sua família são responsabilizadas pelos
problemas, enquanto governos, autoridades e profissionais são eximidos de
suas responsabilidades.” (Fórum Sobre Medicalização da Educação e da
Sociedade. Versão eletrônica disponível em: < http://medicalizacao.org.br/
>. Acesso em: 24/09/2017.
-
4 A inclusão é uma forma de pensar as relações entre as pessoas dentro e
fora das instituições. Para que as escolas sejam inclusivas, elas precisam
modificar seu funcionamento a fim de atender a cada um dos seus alunos –
independentemente de suas dificuldades, origem socioeconômica ou
cultural. Como nos sinaliza Machado (2004), “a inclusão não se dá incluindo
os corpos das crianças nas classes regulares. A inclusão se dá quando se
devolve ao coletivo aquilo que foi individualizado no corpo do sujeito”
(MACHADO, 2004: 2).
-
5 Aberto a qualquer pessoa interessada no tema, mas voltado especialmente
para profissionais da escola, o curso intitulado “Mediação e Inclusão:
possibilidades de inserção da escola e no mercado de trabalho” foi lecionado
por Débora Mascarenhas, Sheina Tabak e eu, com a coordenação da
professora Cristina Carvalho.
-
6 As histórias aqui narradas, em forma de “caderno de campo” ou
“memórias”, foram colhidas na minha experiência como mediadora no
acompanhamento de dois alunos em situação de inclusão, e nas supervisões
coletivas e individuais que fiz como coordenadora do projeto EMI.
-
7 Versão eletrônica disponível em: < https://www.youtube.com/watch?
v=0kDL5kxDg_A>. Acesso em: 24/09/2017.
-
8 Essa expressão “COM” vem da expressão “Pesquisar
"COM” cunhada por
Moraes (2010) para definir uma forma de fazer pesquisa, bem como uma
forma de intervir no contexto em que estamos inseridos – “A expressão
‘PesquisaCOM’ tem a dimensão de um verbo mais do que de um substantivo.
(…) O pesquisar com o outro implica uma concepção de pesquisa que é
engajada, situada. Pesquisar é engajar-se no jogo da política ontológica. Que
realidades produzimos com nossas pesquisas?” (MORAES, 2010: 41).
Nira Kaufman
| Psicóloga, graduada na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mestre em
Psicologia pela Universidade Federal Fluminense e Especialista em
Educação Especial / inclusiva, pela AVM Faculdade Integrada; membro do
Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade e coordenadora do
projeto Encontro de Mediação e Inclusão (EMI); atua como psicóloga clínica
e orientadora educacional.
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in Deficiência em questão: para uma crise da normalidade
organização Marcia Moraes … [et al.].
1. ed. - Rio de Janeiro
© NAU Editora, 2017.
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