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 Sobre a Deficiência Visual

A Educação da Pessoa com Deficiência Visual

Tânia Trecino & Lurdes Caron

-excerto-

Blind Girl - Beatrice Offor - óleo sobre tela -1906/1917
Blind Girl - Beatrice Offor  (óleo sobre tela -1906/1917)

 

CARACTERIZAÇÃO DA DEFICIÊNCIA VISUAL

A definição dos conceitos na deficiência visual apresenta diferentes denominações, dessa forma percebemos as dificuldades de comunicação entre os profissionais, estudantes e os serviços de reabilitação da visão. A utilização de uma linguagem única permitiria a universalização do atendimento, nortearia os estudos e o levantamento de dados em variadas regiões do país.

A pessoa com deficiência visual é aquela que tem baixa visão ou é cega.

Segundo Bruno (2009) a partir da Avaliação Funcional da Visão do ponto de vista educacional, têm-se considerado deficiente visual:

Pessoas cegas, que apresentam “desde ausência total de visão até a perda da projeção de luz”, cujo processo de aprendizagem se fará por meio da integração dos sentidos: tátil- sinestésico- auditivo- olfativo-gustativo, utilizando o Sistema Braille como principal meio de leitura e escrita.
Pessoas com baixa visão, que apresentam “desde condições de indicar projeção de luz até o grau em que a redução da acuidade visual interfere ou limita seu desempenho”. O processo educativo se desenvolverá por meios visuais ainda que seja necessária a utilização de recursos específicos.

De acordo com o documento Programa de Capacitação de recursos Humanos do Ensino Fundamental: deficiência visual MEC/SEESP (2001), considera-se baixa visão ou visão subnormal a alteração da capacidade funcional da visão decorrente de inúmeros fatores isolados ou associados, tais como: baixa acuidade visual significativa, redução importante do campo visual, dificuldades de adaptação à luz e ao escuro e para a percepção de cores, alterações corticais e/ou de sensibilidade aos contrastes que interferem ou limitam o desempenho individual da pessoa.

Na abordagem educacional a verificação de que estudantes com o mesmo grau de acuidade apresentam diferentes níveis de desempenho visual, nos mostra que os estudos de Bruno (1999) enfatizassem a necessidade de uma avaliação funcional da visão, pela observação mais abrangente que contemplasse, além do funcionamento visual, os aspectos pedagógicos.

Nessa perspectiva a avaliação funcional da visão passou a configurar como o estudo do desempenho visual do estudante em todas as atividades diárias, para Bruno (idem) essa avaliação revela dados qualitativos de observação informal sobre:

◘ O nível de desenvolvimento visual do estudante;
◘ O uso funcional da visão residual para atividades educacionais, de vida diária, orientação e mobilidade;
◘ A necessidade de adaptação à luz e aos contrastes;
◘ A adaptação de recursos ópticos, não-ópticos e equipamentos de tecnologia.


É importante destacar que a Avaliação Funcional da Visão seja realizada o mais cedo possível para que a criança possa ter condições para o desenvolvimento humano e consequentemente um melhor desempenho visual.

Essa avaliação é feita pelo médico oftalmologista que orienta do ponto de vista clínico o professor especialista, na deficiência visual, que fará a avaliação no contexto educacional.

Da mesma forma, a relevância da avaliação é destacada pelo Programa de Capacitação de Professores na Deficiência Visual, do Ministério da Educação:

A avaliação funcional realizada pelo pedagogo especializado é de fundamental importância para o diagnóstico e conduta oftalmológica porque, além de conter dados de observação do desempenho visual da criança em termos práticos e qualitativos, informa o nível de desenvolvimento global e principalmente, como a criança utiliza a visão residual para integração com as pessoas e com o mundo que a cerca (BRUNO E MOTA, 2001, p.54).

Nesse sentido como apontado por Trecino (2017), avaliar estudantes com deficiência visual, principalmente aqueles que possuem baixa visão, é uma tarefa que exige competência técnica para compreender o processo de interação, comunicação, as habilidades, as competências, conhecer os pontos fortes, as dificuldades para aprendizagem e considerar as necessidades educacionais especiais desses estudantes.

RECONHECENDO A DEFICIÊNCIA VISUAL NA ESCOLA

Identificar os estudantes com deficiência visual nas escolas, nem sempre é uma tarefa fácil, principalmente na baixa visão, pois os próprios estudantes muitas vezes omitem informações para poderem ser “iguais” aos demais colegas, não que a diferença na acuidade visual possa lhe trazer incapacitações, mas no sentido de se sentirem aceitos. Sendo assim, cabe ao professor a sensibilidade e o olhar aguçado sobre seus alunos, para isso a formação continuada é de grande valia, pois oportuniza espaços de troca de experiências, de formação técnica para a utilização dos recursos ópticos e de construção de saberes inclusivos.

A cegueira é mais fácil de ser percebida em relação à baixa visão, e em geral é detectada mais cedo, esse diagnóstico, quanto mais precoce for, pode ser determinante no desenvolvimento global da criança. Ao começar na educação infantil, a observação é elemento importante para a identificação das dificuldades visuais. É no espaço da sala de aula que os professores podem observar sintomas, posturas, comportamentos e necessidades da criança, que podem ser indicativos de alguma deficiência na visão, sendo necessário o encaminhamento ao médico oftalmologista e ao AEE Atendimento Educacional Especializado.

Dentre os sinais os mais comuns apresentados pelos estudantes são: dores de cabeça, fechamento dos olhos para visualização, tonturas, sensibilidade à luz, franzimento da testa, piscar continuadamente, visão dupla e/ou embaçada, lacrimejamento, dor e lacrimejamento nos olhos.

Quanto ao comportamento do estudante com deficiência visual, podemos perceber que levanta várias vezes da cadeira, apresenta dificuldade para distinguir cores, inclinação do corpo sobre a mesa durante a leitura, aperta e esfrega os olhos, dificuldade para seguimento de objetos, desatenção, falta de interesse, inquietação, irritabilidade, dificuldades para ler e escrever, dificuldades para escrever dentro dos espaços da pauta do caderno, entre outros.

Esses sintomas e comportamentos podem ser mal interpretados pelos professores por desconhecimento sobre a deficiência visual, o estudante pode ser considerado como preguiçoso ou desinteressado quando de fato não consegue ter uma qualidade visual que possibilite realizar as atividades escolares.

Muitas vezes o estudante somente apresenta um erro de refração que pode ser corrigido facilmente com óculos prescritos pelo médico oftalmologista, no entanto o estudante com baixa visão precisará de outros recursos ópticos para a aprendizagem, pois o uso de óculos não corrigirão a dificuldade visual.

DESENVOLVIMENTO VISUAL E APRENDIZAGEM

A chegada de um estudante com deficiência visual na escola, pode ocasionar preocupações dos professores e gerar angústias nesses estudantes.

Acolhê-los com carinho e atenção, são os primeiros passos para o planejamento das atividades escolares. Para Gasparetto (2010, p. 347): A baixa visão gera preocupações e desafios aos educadores que buscam obter o melhor desempenho visual dos alunos com baixa visão por meio do suo de recursos de tecnologia assistiva, sejam eles ópticos, não ópticos e educacionais, de modo a melhorar o desempenho visual na escola e fora dela.

Nesse sentido, a baixa visão exige adaptações e recursos que auxiliem o estudante no processo do ensino e da aprendizagem ao mesmo tempo que estimulem o uso funcional do resíduo visual. Assim, na formação continuada os professores precisam conhecer todos os recursos que podem melhorar o desempenho de todos os estudantes, inclusos os com deficiência visual.

No decreto nº 5.296 de 2004, que estabelece as normas e critérios para a acessibilidades encontramos o termo “ajudas técnicas” designadas como: Produtos, instrumentos, equipamentos ou tecnologia adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade da pessoa portadora de deficiência com mobilidade reduzida, favorecendo a autonomia pessoal, total ou assistida.

Nesse grupo de ajudas técnicas estão os auxílios para a baixa visão, classificados como recursos ópticos e recursos não ópticos e eletrônicos.

RECURSOS ÓPTICOS

Auxílios ópticos para baixa visão: são os auxílios que, de acordo com suas características ópticas, promoverão o melhor desempenho visual da pessoa com baixa visão. São prescritos pelo especialista (médico oftalmologista) e possuem uma ou mais lentes, que se antepõe entre o olho e o objeto, para aumentar ou ajustar a imagem visual.

Muitos estudantes com baixa visão tem a prescrição de óculos para corrigir erros de refração que, apesar de não corrigirem a sua deficiência, melhoram o seu desempenho visual. Estimular que os estudantes usem os óculos prescritos é muito importante e procurar saber se é para perto, longe ou para ambos, a fim de adequar seu uso. Nas altas correções é importante que o estudante se posicione próximo ao quadro para facilitar a leitura e escrita.

As lupas são muito úteis para aumentar o tamanho do material de leitura, mapas, gráficos, imagens do livro didático, entre outros.

Mesmo sabendo das vantagens de utilizar os recursos ópticos, muitos estudantes sentem-se constrangidos em utilizá-los quando estão no ambiente escolar, o professor precisa encorajá-lo a ultrapassar esses sentimentos e ajudar na afirmação de sua identidade visual.

RECURSOS NÃO ÓPTICOS

Os recursos não ópticos são aqueles que melhoram a função visual sem o auxílio de lente. Funcionam facilitando a visão por meio de: Modificações ambientais, melhorando a função visual através do controle da iluminação e da reflexão da luz e do aumento do contraste; Ampliação de imagem por meio do uso de impressos ampliados por vídeo, projeção e dos computadores; Utilização de acessórios para melhorar o conforto físico e o desempenho das atividades diárias.

Iluminação:
A capacidade de enxergar depende do tamanho do objeto, da quantidade de luz ambiental e do contraste do objeto com o fundo. Para Romagnolli (2008), dois aspectos são importantes para uma boa visibilidade: diminuir o reflexo e aumentar o contraste. Para os estudantes com baixa visão o reflexo interfere no funcionamento visual e diminui a visibilidade, pois quando a luz atinge diretamente os olhos, geralmente, cria ofuscamento. A luz deve ser distribuída sobre as atividades, vinda de todos os ângulos, sem refletir diretamente no rosto do estudante. Se a iluminação da sala de aula não for suficiente, pode-se usar uma luminária portátil próxima à carteira do educando.

Contraste:
O uso de contraste adequado melhora a função visual. O quadro deve ser escuro o suficiente para permitir bom contraste com o giz ou caneta e estar sempre limpo. Conforme as orientações da SEED PR (2010), as pautas dos cadernos precisam ser escuras e ampliadas se necessário, podem ser riscadas manualmente com traços mais escuros. Também de acordo com a necessidade do estudante, as linhas podem ter um espaçamento maior.

Os materiais escolares devem ter bom contraste, recomenda-se utilizar tinta preta em papel branco: caneta de ponta porosa preta, régua coloridas ou com faixa preta e lápis nº6B, pois o grafite é mais mole e mais escuro. Para gráficos e cartazes, utilizar cores como amarelo em fundo preto, azul ou verde em fundo branco, cores escuras em fundo luminoso.

Ampliação:
Os livros didáticos das séries iniciais favorecem a leitura, pois apresentam tipos de letras maiores, no entanto caso seja necessário pode-se fazer a ampliação em fotocopiadora ou no computador, levando em conta o tipo e tamanho de letra, o espaçamento entre linhas, a cor e o brilho do papel.

RECURSOS ELECTRÓNICOS

Atualmente o computador tem sido uma ferramenta muito importante para a ampliação dos materiais escolares substituindo os sistemas de ampliação por vídeo.

Através de softwares com programas de acessibilidade, o estudante com baixa visão tem acesso à internet, podendo digitar trabalhos, fazerpesquisas e realizar as tarefas elaboradas pelos professores. O mouse óptico é um recurso que permite a leitura com ampliação ajustável sobre o material impresso (livros, revistas), contribuindo para o desenvolvimento da aprendizagem.

Além dos recursos descritos há a
necessidade de adaptações no currículo, adequações metodológicas e didáticas, portanto é necessária uma mudança no trabalho pedagógico, na busca de proporcionar o desenvolvimento da aprendizagem do estudante com deficiência visual.

De acordo com MEC/SEESP (2001),
adequações curriculares são um conjunto de ajustes que favorecem o acesso de todos os alunos à proposta curricular do Ensino regular. Na publicação “Saberes e práticas da Inclusão” do Ministério da Educação temos algumas orientações sobre as adequações no currículo: propiciar recursos físicos, ambientais e materiais ao aluno na unidade escolar de atendimento; possibilitar os melhores níveis de comunicação e interação com os profissionais e pessoas que convivem na comunidade escolar, reconhecendo e adotando sistemas adaptados de comunicação escrita: braile, tipos ampliados, computador; realizar ajustes que garantam a participação do aluno nas diferentes atividades escolares.

Muitos são os desafios no ensino e na aprendizagem do estudante com deficiência visual, garantir os recursos e adaptações necessárias para o desenvolvimento da aprendizagem é papel de todos: família, escola e sociedade.

Nesse contexto, a educação da pessoa com deficiência visual, vem sendo meu objeto de estudo, como forma de responder as demandas do efetivo exercício da docência e no acolhimento a diversidade, numa concepção de educação inclusiva que pressupõe uma nova maneira de olhar o outro, dentro de suas características e especificidades.

CONSIDERAÇÕES

Percebemos nesse estudo que a educação das pessoas com deficiência visual, foram ganhando destaque ao longo do tempo, no entanto muitos ainda são os desafios da inclusão nos espaços escolares e na sociedade. Isso perpassa pelo respeito, envolvimento, autonomia e responsabilidade pela diversidade humana.

Pesquisas que apresentem o desenvolvimento da aprendizagem desses estudantes são de grande importância para a educação inclusiva no contexto atual. Por isso, meu projeto de dissertação de mestrado acadêmico em educação, versará sobre essa temática.

Com a intenção de aprimorar a prática docente dos professores que tem como função proporcionar um ensino de qualidade que objetive o desenvolvimento das habilidades cognitivas, sociais e afetivas dos estudantes com deficiência visual no espaço escolar.

FIM


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excerto de:
A Educação da Pessoa com Deficiência Visual
autoras:
TRECINO, Tânia Mara. (Universidade do Planalto Catarinense – UNIPLAC, taniatrecino@yahoo.com.br)
CARON, Lurdes. (Universidade do Planalto Catarinense – UNIPLAC, prof.lurdescaron@ uniplaclages.edu.br)
in CINTEDES: Colóquio Internacional de Educação Especial e Inclusão Escolar
25 a 27 Junho de 2019
Centro de Cultura e Eventos da UFSC
 

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2.Mai.2024
Maria José Alegre