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A Toupeira e o Filho - gravura de Charles H. Bennett,
1857
A toupeira – que é um animal cego – disse à sua mãe:
- “Vejo”.
E ela, pondo-o à prova, deu-lhe um
grão de incenso e perguntou-lhe o que era.
A toupeira disse que era uma pequena
pedra e a mãe disse:
- “Ó filho, não só estás privado de
vista, como também perdeste o olfacto.”
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MORAL DA HISTÓRIA:
Da mesma forma, alguns
fanfarrões proclamam tanto trabalhos impossíveis, que acabam
desmascarados através das coisas mais triviais.
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A Imagética animal na sabedoria popular
por Nelson H.S. Ferreira
[....]
A imagética animal popular, originária da tradicional metáfora ou alegoria – tão
caras à literatura universal –, ascende a um período pré-histórico, que terá
tido por
motivação o sistema cognitivo que acima referimos. A propósito, é nossa intenção
notar que alguns animais têm características físicas e comportamentais passíveis
de
serem convertidas em signos linguísticos. E esses signos enraizavam-se de tal
forma na cultura, que a simples evocação da imagem do animal implicava e implica
o entendimento espontâneo dessas características. Portanto, a metáfora assumiu
um papel de relevo inquestionável na comunicação linguística abstracta. De
resto, esta é, por excelência, a forma de comunicação usada nas relações
humanas. Fazemos esta afirmação, tendo presentes a expressão plástica, literária
ou o desenvolvimento de monólogos e diálogos complexos, que não têm como objecto
a transmissão de informação objectiva e de prática do quotidiano. [....]
Este contacto com a natureza e a sapiência que o senso-comum transporta criam
espaço para o ensinamento da tradição popular, promotora da sabedoria e do
conhecimento
concreto, sem que este derive exactamente da experiência.
Isto é, a tradição ensina a experiência de uma cultura e não
directamente do indivíduo. Nesse sentido, poderemos julgar
a alegoria animal e a sua origem no contacto com o mundo
natural como o resultado de uma tradição que preserva o
empirismo original nos saberes de uma determinada cultura. [....]
Sendo o saber do senso-comum um dado adquirido, há
que transformá-lo num ensinamento. Aí a fábula desempenha
um papel preponderante, pois consegue promover a junção
da moralidade útil ao indivíduo com o conhecimento
tradicional – no caso concreto da fábula esópica: a lição com
a alegoria animal.
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A Toupeira
fábula de Esopo
in Aesopica: a fábula esópica e a tradição fabular grega
Estudo, tradução do grego e notas: Nelson Henrique da Silva Ferreira
Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra
(2014)
fonte:
https://digitalis-dsp.uc.pt/
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