![]() |
notícias | olhos e visão | textos didácticos | cegueira e literatura | cinema e cegueira | arte e cegueira | legislação | contactos |
Educação de Alunos Deficientes Visuais em Escolas Regulares
J. Kirk Horton
CAPÍTULO 1 Há dois tipos principais de programas educativos para crianças deficientes visuais (crianças cegas, cuja visão é nula, e crianças deficientes visuais com uma visão utilizável reduzida): 1. Programas de escolas especiais; 1. Programas de escolas especiais As escolas especiais são estabelecimentos em que todos os alunos são deficientes visuais. Trata-se muitas vezes de internatos onde as crianças vivem e estudam durante o ano escolar, indo a casa aos fins-de-semana e/ou nas férias. A primeira escola desse tipo abriu em França em 1785. E eis que agora, passadas mais de duas centenas de anos, as escolas especiais constituem o corpo principal do sistema educativo das crianças deficientes visuais. 2. Programas de educação Integrada No quadro dos programas de educação integrada, os deficientes visuais frequentam uma escola regular na zona onde vivem. São geralmente alunos externos e frequentam os mesmos estabelecimentos de ensino que os seus irmãos, irmãs e amigos que vêem. Seguem os mesmos cursos que eles, ministrados pelos mesmos docentes, nas mesmas salas de aula, mas beneficiando de uma ajuda complementar ou de um apoio pedagógico dado por um professor especializado no trabalho com cegos. Lançado em 1900 nos Estados Unidos, esse sistema difundiu-se rapidamente por todo o território norte-americano, bem como nos outros países, a partir da segunda metade dos anos 60. QUAL O MELHOR SISTEMA? Desde que o primeiro programa de educação integrada foi lançado em 1900, nunca mais deixou de ser levantada a questão de se saber qual o melhor sistema para educar as crianças cegas e com visão reduzida. Os especialistas em cegueira há muito que estudam e discutem esta questão que, no entanto, não obteve ainda uma resposta absoluta. Ambos os sistemas têm certas vantagens e inconvenientes. Há excelentes escolas especiais para deficientes visuais. Outros estabelecimentos do género não passam, contudo, de lares onde os deficientes visuais são depositados sem que lhes seja dispensado um ensino adequado. O mesmo se poderá dizer relativamente aos programas de educação integrada. Alguns deles funcionam muito bem, assegurando um ensino de primeira ordem. Outros deixam muito a desejar, e as crianças cegas ou com visão reduzida, relegadas para o fundo da sala de aula, são simplesmente ignoradas. É, pois, mais importante conhecer as vantagens e os inconvenientes destes dois sistemas do que saber qual deles é o melhor. VANTAGENS DAS ESCOLAS ESPECIAIS 1 - Os docentes das escolas especiais recebem ou uma formação
especial, ou uma formação contínua em educação de crianças cegas ou com visão
reduzida. Assim, as crianças estão constantemente em contacto com um ensino capaz de
lhes facultar a ajuda específica de que necessitam. O mesmo não sucede necessariamente
nos programas de educação integrada. O professor pode ser qualificado para o ensino de
crianças com visão normal e não para o de deficientes visuais. As crianças cegas ou
com visão reduzida que necessitam de sessões especiais de formação arriscam-se a
verem-se obrigadas a aguardar a presença do professor especial no estabelecimento.
1. Nestes programas, os alunos necessitados de uma atenção
particular vivem nas suas casas e frequentam os cursos das escolas regulares situadas nas
proximidades dos seus domicílios. Não são separados dos seus pais, irmãos e irmãs,
continuando a viver no seio das suas famílias. Em oposição, nas escolas especiais, as
crianças são geralmente afastadas da família para passarem a viver no próprio
estabelecimento de ensino, acontecendo, frequentemente, não estarem com os seus
familiares mais do que uma ou duas vezes por ano. As suas relações com pais, irmãos e
irmãs são, pois, muito reduzidas. 3. Nos programas integrados, as crianças cegas ou com visão reduzida são misturadas com as demais crianças que não sofrem de qualquer deficiência visual, com as quais têm a possibilidade de brincar e aprender diariamente. Essa interacção ajuda-os a melhor compreenderem-se mutuamente. Nos internatos especiais, pelo contrário, os deficientes visuais não têm oportunidade de conviver com outras crianças sem deficiência visual. Os seus colegas de turma e de escola são, muitas vezes, todos cegos ou com visão reduzida. Chegados ao fim da escolaridade, correm o risco de não possuírem nem as aptidões, nem a experiência, nem a confiança necessárias para viverem e trabalharem num mundo de pessoas com visão normal. 4. As crianças têm, frequentemente, dificuldade em pôr em prática, em casa e nas suas vizinhanças, os conhecimentos que adquiriram num estabelecimento especial. Mesmo que tenham aprendido a utilizar uma bengala para se deslocarem até à escola sem a ajuda de terceiros, eles não serão necessariamente capazes de utilizá-la noutros percursos, porque conhecem mal o local ou porque os pais não os autorizam a deslocarem-se sós, sob o pretexto de ser demasiado perigoso. Este problema coloca-se com menor acuidade nos programas integrados, pois as crianças recebem a sua formação próximo de suas casas. Não têm que operar essa transferência de conhecimentos. Além do mais, os pais assistem de perto ao treino dos seus filhos, praticado sob a orientação de um educador especializado, podendo, dessa forma, apreciar melhor o que eles são ou não capazes de fazer por si sós. Passámos em revista algumas das vantagens e dos inconvenientes das escolas especiais e dos programas de educação integrada. É importante que os docentes os conheçam, porque terão de fazer um esforço particular para ultrapassarem as insuficiências do sistema em que trabalhem. Se, por exemplo, exercerem numa escola especial, é necessário que saibam que as crianças cegas e com visão reduzida experimentam uma dificuldade considerável no relacionamento com as crianças que vêem. É necessário um esforço no sentido de minimizar esses inconvenientes das escolas especiais, encontrando os meios de proporcionar às crianças ocasiões de convívio com crianças sem problemas de visão. Se, pelo contrário, se situarem no quadro de um programa integrado, é necessário que estejam dispostos a encontrar o tempo indispensável, antes ou depois das aulas, na escola ou em casa da criança, para lhe transmitir os ensinamentos de que ela tem necessidade e que não fazem parte dos programas escolares. Quaisquer que sejam essas vantagens e esses inconvenientes, é preciso que se saiba que nenhum dos dois sistemas assegura uma melhor educação do que o outro. Desde que funcionem em boas condições, ambos proporcionam uma educação válida. A qualidade dessa educação é mais função da formação dos docentes e dos administradores, dos materiais e livros disponíveis, etc., do que do quadro - escola especial ou programa integrado - em que se inscreve. O tipo de programa escolar que convém a uma criança cega ou com visão reduzida depende de diversos factores. Em primeiro lugar, que tipo de programa é oferecido? Se não houver nenhum programa de educação integrada a funcionar na zona de residência da criança, ela deverá ir para uma escola especial. Em segundo lugar, que tipo de programa é o mais adaptado às necessidades da criança? Determinadas considerações, por exemplo acerca da pobreza da família que a impede de alimentar devidamente a criança, podem tornar preferível colocá-la numa escola especial. Pode também acontecer que a cegueira não seja o único problema da criança e que, por isso, se lhe torne difícil frequentar a escola regular. Uma escola especial será, então, mais propícia à sua aprendizagem. Por outro lado, a escola especial poderá ficar numa grande cidade, a 500 Km da residência da criança, e os pais não quererem mandá-la para tão longe. Nesse caso, é sem dúvida preferível optar pelo sistema de educação integrada. Qualquer que seja o tipo de programa inicialmente escolhido, a criança não deverá, por esse facto, ser forçada a manter-se nesse sistema durante a duração total da sua escolaridade. Alguns alunos poderão necessitar de uma ajuda especial importante durante os primeiros dois ou três anos de escolaridade e, depois, de um apoio já mais reduzido. Será, então, talvez preferível que comecem por frequentar uma escola especial, regressando depois a casa a fim de seguirem programas integrados. O inverso poderá também ser verdadeiro. A escolha do tipo de programa educativo mais conveniente para uma criança poderá variar em função da evolução das suas necessidades. Há diversos tipos de programas de educação integrada. De entre eles, há três mais comuns nos países onde o sistema funciona. Sala de apoio Uma sala de apoio é uma sala com uma vocação bem definida dentro da escola regular. É lá que trabalha, a tempo inteiro, um educador ou professor especializado chamado professor de apoio. Esta sala de apoio está equipada com o material e apetrechos necessários para dar resposta às necessidades da criança. O deficiente visual é integrado na classe regular, mas pode recorrer à sala de apoio sempre que necessite de uma ajuda particular do educador especializado. A existência de uma sala de apoio só se justifica se na escola houver pelo menos quatro crianças cegas ou com visão reduzida. Caso contrário, seria um desperdício de dinheiro e do tempo do educador ou professor especializado. O facto de a palavra SALA aparecer na expressão SALA DE APOIO, não significa que se trate sempre de um local propriamente dito. Com efeito, conforme o estabelecimento disponha ou não do espaço necessário, o "local" em questão poderá reduzir-se a um simples canto da secretária do professor, a um espaço reservado no gabinete do director da escola ou ao fundo de uma sala de aula. Já vimos "salas de apoio" a funcionarem em átrios de escolas. De facto, a "sala de apoio" é, antes do mais, uma ÁREA, um ESPAÇO. Programa itinerante Nesta modalidade, o técnico (educador ou professor) especializado em vez de passar todo o seu tempo num dado estabelecimento, desloca-se regularmente a diferentes escolas em que se encontrem crianças cegas ou com visão reduzida. A frequência dessas visitas dependerá das necessidades das próprias crianças, podendo variar de uma a cinco por semana. O modo de transporte utilizado pelo técnico é função do que existe na zona em que exerce a sua actividade. Alguns têm viatura própria: outros deslocam-se a pé; outros ainda vão de um estabelecimento ao outro de autocarro, de mota, de bicicleta, a cavalo, de riquexó, de barco, ou até mesmo de avioneta. O tempo consagrado a essas deslocações varia consideravelmente com as distancias e o transporte utilizado. Conselheiro pedagógico Trata-se de uma variante da fórmula do técnico itinerante. O conselheiro pedagógico desloca-se de escola em escola mas de um modo bastante irregular. Ele passa a maior parte do tempo que consagra a cada visita na companhia do professor, e não em contacto directo com o aluno. Este programa adapta-se bem a crianças que necessitam apenas de um apoio mínimo. Estes três tipos de programa são os mais difundidos, mas também se encontra com alguma frequência a fórmula da classe especial dentro da escola regular. Trata-se de uma turma especial da escola regular, reservada aos alunos cegos ou com visão reduzida que seguem a sua escolaridade sem serem integrados nas turmas normais. É como que uma escola especial a funcionar dentro de um estabelecimento regular. Também se encontram, por vezes, internatos situados na proximidade de uma escola regular. A criança segue a sua escolaridade nessa escola mas, ao fim da tarde, em vez de regressar a casa, ingressa no internato. O tipo de programa integrado aplicado depende de dois factores: 1. O grupo de alunos (número de alunos residentes numa determinada zona); 2. As necessidades dos alunos. 1. Organização do grupo: Quando haja um número considerável de alunos residentes numa mesma zona, na proximidade de um mesmo estabelecimento, poderá ser criada uma sala de apoio. Mas é mais frequente as crianças serem distribuídas por uma determinada área ou região, longe umas das outras ou da escola. Um programa itinerante é, então, preferível. Estar-se-ia a fazer um mau uso do tempo e das competências dos técnicos se se pusesse em prática um programa de sala especial num estabelecimento com apenas um ou dois deficientes visuais, porque o educador especializado não teria trabalho que justificasse a sua presença. Quando se tenta fazê-lo, acontece frequentemente que os docentes das classes regulares, constatando que o educador especializado tem apenas um ou dois alunos a seu cargo, enquanto eles têm 30 ou 40, começam a sentir-se lesados, levando a que, para ocupar o professor especial, as crianças deficientes visuais passem cada vez mais tempo na sala especial e menos na classe normal. Pouco a pouco, o programa integrado transforma-se assim numa classe segregada. 2. Necessidades: Certas crianças tem mais necessidade do que outras da assistência de um educador especializado. Esta constatação ajuda também a definir o tipo de programa integrado a por em prática. Desde que uma criança consiga acompanhar o ritmo de aprendizagem dos seus colegas de turma, necessitando apenas de alguns livros com determinadas particularidades, não é necessário que o educador especializado siga a criança com grande regularidade. Será porventura suficiente que a criança, o respectivo professor e o educador especializado se reunam uma ou duas vezes por trimestre. Em tais casos, a solução do conselheiro pedagógico é a mais apropriada. Se a criança necessitar de uma ajuda mais importante da parte do educador especializado, será preferível o programa itinerante. Por vezes, o educador especializado está simultaneamente envolvido nos três tipos de programas. Pode passar quatro dias numa sala especial e o quinto noutras escolas, para aí contactar com outras crianças. Poderá também visitar, uma vez de dois em dois meses, crianças que não necessitem de um apoio regular. Dessa forma, o seu trabalho articular-se-á simultaneamente com os três tipos de programas integrados. O tipo de programa pode variar de um ano lectivo para outro. Num determinado ano, quatro crianças podem, por exemplo, residir nas proximidades da mesma escola, justificando-se desse modo a existência de uma sala de apoio. No ano seguinte, porém, uma das crianças termina a sua escolaridade, uma segunda muda-se para outra cidade, e os pais da terceira decidem transferi-la para um internato. Resta apenas a quarta. É possível continuar a assegurar a esta criança os apoios necessários mantendo a sala de apoio, mas será melhor passar a um regime de programa itinerante. Pode também acontecer que a partir desse segundo ano, as quatro crianças estejam em condições de acompanhar uma classe regular com um apoio mais reduzido do educador especializado. As necessidades das crianças alteraram-se. Apesar de continuar a haver quatro crianças deficientes visuais na mesma escola, uma sala de apoio torna-se desnecessária. Um programa itinerante será o que melhor convirá a estas crianças. CAPÍTULO 2 Nos programas integrados, o professor do ensino regular e o educador especializado têm, cada um, responsabilidades específicas. É importante que elas sejam claramente definidas. RESPONSABILIDADES DO PROFESSOR DO ENSINO REGULAR: 1. O professor do ensino regular é o responsável principal pela
educação dos deficientes visuais que lhe estão confiados. Cabe-lhe a tarefa de ensinar
todas as crianças da classe, incluindo as cegas e as de visão reduzida. O educador
especializado dispensa um apoio que permita que as aulas do professor do ensino regular
possam ser seguidas pelos deficientes visuais. RESPONSABILIDADES DO PROFESSOR DE ENSINO ESPECIAL: 1. Seria difícil falar de ensino integrado numa situação em que uma criança fosse colocada numa classe regular mas sem usufruir de qualquer tipo de apoio. O educador especializado tem por missão proporcionar os apoios necessários para que a criança cega possa ter sucesso escolar numa classe regular. Todas as responsabilidades do educador especializado se encontram, de algum modo, ligadas ao apoio directo que ele deverá dispensar à criança, ao respectivo professor ou família. É bom não esquecer que não cabe ao educador especializado a responsabilidade do ensino da criança cega. É ao professor do ensino regular que compete fazê-lo. Ao educador especializado cabem, entre outras, as seguintes responsabilidades: 1. Dar apoio ao professor do ensino regular, respondendo às suas dúvidas sobre a
cegueira, bem como contribuir para que os outros alunos se sintam à vontade com a
criança cega. Poderá também assistir a aulas do professor regular, a fim de fazer
eventuais sugestões ou demonstrar modos de procedimento que possam conduzir a melhores
resultados no ensino da criança. As atribuições do educador especializado não são nem simples nem fáceis. Para levá-las a bom termo, são necessários empenhamento e trabalho assíduo. Em mútua colaboração, o professor do ensino regular e o educador especializado podem assegurar uma escolaridade estimulante, não apenas às crianças cegas mas a toda a classe no seu conjunto. Nos capítulos que se seguem, o leitor irá encontrar sugestões mais detalhadas sobre a forma como poderá, enquanto educador especializado de um programa integrado, assumir as suas responsabilidades e ajudar o professor do ensino regular a assumir as dele próprio. CAPÍTULO 3 Admitamos que o professor do ensino regular tem, pela primeira vez, um deficiente visual na sua classe. Provavelmente, muitas serão as questões que se lhe irão pôr e muitas as apreensões que, naturalmente, o assaltarão. O educador especializado deverá dar resposta a essas interrogações e procurar ajudá-lo, a ele e aos restantes alunos da turma, a sentirem-se à vontade com a criança cega ou com visão reduzida. Eis algumas das questões que o professor do ensino regular poderá colocar: 1. O deficiente visual é diferente das outras crianças? 2. Devo utilizar palavras como "ver" e "olhar"? Será que
inspiram aos deficientes visuais algum tipo de pena? 3. Como é que a criança se irá deslocar até à escola e movimentar-se dentro da
sala de aula sem se magoar? 4. Como irá a criança aprender a ler e a escrever? 5. Como é que eu vou poder ensinar os alunos a ter e controlar os trabalhos que
façam em casa, sem saber Braille? 6. Como saberá a criança que é a ela que me dirijo? 7. Como é que a criança vai ler o que eu escrever no quadro? 8. Uma criança pode ficar cega pelo simples facto de brincar com outra que o seja,
ou de se sentar junto dela na sala de aula? 9. É verdade que as crianças cegas possuem um sexto sentido, ou que os sentidos
que lhes restam, a audição, o olfacto, o paladar e o tacto, são mais desenvolvidos
nelas do que nas outras crianças? 10. Como ocupar a criança deficiente visual durante o recreio? Não será mais
seguro mantê-la na sala de aula? 11. Como submeter uma criança deficiente visual a testes de avaliação e exames? 12. Devo adoptar regras de disciplina especiais ou estabelecer um sistema de
classificação particular para a criança? 13. Que faz o educador especializado? Qual a frequência das suas deslocações à
minha escola? 14. Onde devo sentar um aluno que tenha uma visão residual? Que devo fazer se ele
coloca o livro muito próximo dos olhos? Será que, com isso, ele corre o risco de perder
a pouca visão que ainda lhe resta? Não seria preferível que ele poupasse a vista,
preservando-a para quando necessite de ver realmente qualquer coisa? A presença de uma criança cega numa classe poderá constituir uma experiência enriquecedora para todos. A criança aprende bastante em contacto com o professor e os colegas, mas a inversa é igualmente verdadeira: professor e colegas descobrem que a cegueira não é motivo para receios, e que fortes laços de amizade se podem estabelecer entre deficientes visuais e outras pessoas. CAPÍTULO 4 Cabe aos educadores especializados dotar a criança das aptidões suplementares de que ela careça pelo facto de ser deficiente visual. Os professores do ensino regular não têm formação para fazê-lo. Essas aptidões específicas, ainda que não fazendo parte do programa escolar ordinário, deverão, todavia, ser ensinadas e treinadas. Elas constam sobretudo do seguinte: 1. Educação sensorial Cada um destes domínios será aqui abordado, e dadas sugestões para o seu ensino.
Ainda que o aluno não seja classificado quanto à aquisição dessas aptidões, é
importante que elas lhe sejam transmitidas para que receba uma educação completa. O
educador especializado terá de dispor do tempo que for necessário. Para algumas delas,
como as actividades da vida diária, é talvez preferível praticá-las na própria casa
da criança, antes ou depois das aulas. Outras, como a orientação e locomoção, têm de
ser transmitidas no exterior. A totalidade dessa formação não poderá ser levada a cabo
no quadro escolar. 1. Educação Sensorial A educação sensorial consiste no desenvolvimento dos outros sentidos da criança. Um deficiente visual não dispõe automaticamente de uma maior acuidade dos sentidos do tacto, da audição, do olfacto ou do paladar. Ele terá de aprender a utilizá-los da melhor forma possível. Esta secção do manual tratará sucessivamente de: A - A audição A AUDIÇÃO A audição é muito importante para um deficiente visual. Através do ouvido ele recebe inúmeras informações. Ele segue, assim, facilmente as actividades da classe, as explicações dos professores e as trocas de impressões entre os colegas. A audição é igualmente indispensável a uma boa orientação e à locomoção. A criança deve ser capaz não só de ouvir e de seguir o que se diz, mas também de fazer uma selecção do que ouve, captar as ideias principais, ignorar os barulhos importunos, identificar uma actividade e localizar um objecto ou unia pessoa, a partir dos sons que lhe chegam. Algumas dessas capacidades, como a de distinguir os pontos essenciais de uma história que se lê, não se adquirem facilmente. Exigem tempo e prática. A sua aprendizagem deve começar o mais cedo possível, logo desde que a criança é ainda bebé. A criança deverá conseguir: - ter consciência dos sons (Oiço qualquer coisa!); EXERCÍCIOS: 1. Atire uma bola ao chão e pergunte à criança quantas vezes a
ouve saltar. Este exercício ajudá-la-á a distinguir e localizar os sons. NOTAS DESTINADAS AOS EDUCADORES 1. O tipo de actividade, o seu grau de complexidade e o modo de ensiná-la dependerão
da idade da criança. B - O TACTO É através do sentido do tacto que a criança deficiente visual adquire um conhecimento concreto e preciso do mundo que a cerca. Só o tacto e a exploração táctil estão em condições de fornecer informações exactas acerca da forma de um objecto, das suas dimensões, do seu peso, da sua dureza, das características da sua superfície e da sua temperatura. Uma criança a quem tenham descrito um cão mas a quem nunca tenha sido dada a oportunidade de tocar num, não saberá com exactidão que aspecto tem esse animal. Em contrapartida, se à descrição verbal se juntar uma experiência táctil, ele apresentar-se-lhe-á de uma forma mais realista. A criança saberá onde se encontram a cabeça e a cauda do animal, tomará consciência do seu tamanho e da sua forma, familiarizar-se-á com o toque do seu pêlo. Quantas mais vezes ela mexa em cães, tanto mais precisa será a ideia que deles fará. Descobrirá não apenas em quê todos os cães se assemelham, mas também em que se que diferem. A criança deverá iniciar a exploração táctil do mundo que a rodeia logo desde bebé. É preciso que os pais a incentivem a tocar diferentes objectos situados em diversos lugares da casa. Facultando à criança informações concretas acerca do ambiente em que vive, essa exploração precoce começará a ensiná-la a servir-se das mãos, a apalpar objectos, a aumentar a destreza dos dedos e a adquirir noções tão fundamentais como a dimensão e o peso. As crianças que não forem estimuladas a servir-se das mãos correm o risco de sentirem dificuldade em: 1. Apanhar e segurar objectos. A criança terá tendência para utilizar a palma
da mão, em vez de agarrar os objectos com os dedos. Só a prática lhe permitirá aprender a utilizar convenientemente o seu sentido do tacto. Os exercícios que se seguirão contribuirão para lhe desenvolver a coordenação manual, a mobilidade dos dedos, a capacidade de discriminação táctil e a motricidade fina (utilização de pequenos músculos como os dos dedos; o domínio desses músculos é indispensável em certas actividades como, por exemplo, para escrever Braille fazendo uso de uma pauta e um punção). Estes exercícios ajudá-lo-ão a incutir na criança noções tais como as de: - grande e pequeno; Muitas destas actividades são igualmente importantes para preparar a criança para a leitura do Braille. EXERCÍCIOS: 1. Peça à criança que efectue diversas operações
seleccionadas de entre as seguintes: Estas actividades podem ser praticadas quer em casa, quer na escola. A maior parte delas requer apenas material simples, fácil de encontrar e pouco dispendioso. De facto, o melhor material é o que é proporcionado pelo próprio meio natural, e não o que se vende nas lojas especializadas. Ao mesmo tempo que contribuem para o desenvolvimento do sentido do tacto, estes exercícios podem também inscrever-se no quadro dos lazeres, da iniciação às actividades da vida diária e do artesanato. 2. Peça à criança que identifique e seleccione diferentes objectos (seixos, folhas, pauzinhos, grãos, moedas, etc.) segundo os seguintes critérios: (a) Objecto. Separar em dois montinhos os amendoins e os grãos de café. A criança poderá também ordenar esses objectos por tamanhos, pesos, etc. 3. Elabore "cartas tácteis" recortando pedaços de papel ou de cartão com a forma de cartas de jogar vulgares. Forme pares colando sobre duas cartas um objecto idêntico: círculos de tecido, triângulos de lixa, botões do mesmo tamanho e forma, fósforos dispostos com a mesma orientação, pedaços de cordel do mesmo comprimento, clips do mesmo tamanho, etc. Socorra-se de lixa, pontos Braille, cordel, cartão, etc., para produzir diferentes formas (triângulos, quadrados, círculos). Certifique-se de que os pares de cartas representam objectos, texturas e formas idênticos. Essas cartas poderão: (a) servir para jogar a jogos como o da bisca; (b) ser escolhidas e agrupadas por pares; (c) servir para transmitir noções tais como: áspero e liso, grande e pequeno, etc. 4. Coloque três objectos sobre a mesa. Peça à criança que os apalpe e identifique. Retire um dos objectos. Em seguida, volte a pedir à criança que apalpe os dois restantes e diga qual é que falta. Vá aumentando progressivamente o número de objectos. 5. Construa um "painel de sementes" colando num cartão sementes de diferentes formas e tamanhos. Peça à criança para designar ou contar todas as sementes do mesmo tipo (arredondadas, alongadas, lisas, etc.). Poder-se-á também construir um "painel de texturas" recorrendo a pedaços de tecido, de papel, etc., com diversas texturas. A criança deverá dizer qual é o pedaço tecido ou de papel mais rugoso, qual é o mais liso, qual o maior, etc. 6. Faça pequenos buracos num pedaço de madeira. Peça à criança que introduza fósforos (aos quais, como medida de segurança, deverá cortar previamente a cabeça) nesses buracos. Primeiro, em todos eles; depois, em buracos alternados, e assim sucessivamente. Ou ainda, poderá pregar filas de pregos numa madeira e pedir à criança que coloque um elástico em torno de uma série de três pregos alinhados em diagonal; de dois pregos na vertical, etc. 7. Os jogos com cubos constituem um exercício excelente para a criança, pois contribuem para o desenvolvimento da sua capacidade de manusear objectos. Os cubos podem ser empilhados, empurrados ou puxados, encaixados uns nos outros e utilizados para fazer construções (casinhas, estradas, etc.). Fabrique cubos em madeira, ou utilize caixas de fósforos ou de cigarros vazias. Coloque-lhes dentro pedrinhas e feche-as muito bem: farão barulho quando agitadas. 8. Ao construir puzzles destinados a crianças deficientes visuais, atenha-se a formas e modelos simples. Os puzzles poderão ser recortados em madeira ou cartão. 9. Recorte pedaços de cartão de diferentes formas e tamanhos. Disponha-os por uma determinada ordem. Em seguida, peça à criança que tacteie e reproduza o modelo. A dificuldade do modelo deverá estar de acordo com a habilidade da criança. Poder-se-á efectuar o mesmo exercício enfiando objectos num fio. Enfie dois botões, uma pérola e dois clips: peça depois à criança que reproduza o modelo. 10. Construa "cartões de coser" fazendo furos numa folha de cartão ou cartolina grossa. Utilize um pauzinho ou uma hastezinha de bambu como se fosse uma agulha. Ate um fio ao pauzinho ou abra uma fenda no bambu através da qual fará passar uma ponta do fio; a outra ponta será atada a um dos furos do cartão. A criança poderá "coser" fazendo passar a "agulha" através dos furos abertos no cartão. Este exercício serve não só para ensinar a criança a servir-se dos dedos e a utilizar as duas mãos em simultâneo, mas também para lhe ensinar os pontos de costura elementares. 11. Introduza diferentes objectos num saco, e peça à criança: (a) que reconheça pelo tacto todos os objectos nele contidos; (b) depois de lhe ter dado um objecto a apalpar, que encontre no saco um objecto semelhante; (c) que encontre no saco todos os objectos de que nos servimos para comer, para vestir, etc. NOTA: Inúmeros exercícios podem ajudar a criança a desenvolver o seu sentido do tacto. A maior parte deles requer objectos muito simples. Comece desde já a recolher esses objectos e a pô-los de parte para tê-los à mão quando forem necessários. Coloque uma caixa grande no seu quarto. Quando achar um pedaço de tecido velho, em vez de o deitar fora, meta-o na sua caixa! Se encontrar no chão uma garrafa de plástico, apanhe-a, leve-a para casa, lave-a e meta-a na sua caixa! Se achar um botão no chão, leve-o para casa e meta-o na sua caixa! Peça aos seus familiares e amigos que procedam do mesmo modo. Em breve terá toda uma colecção de objectos que poderão servir para as actividades atrás descritas. C - O OLFACTO E O PALADAR Considera-se, por vezes, que o olfacto e o paladar são sentidos pouco importantes. É certo que a criança deficiente visual se serve deles menos do que se serve da audição e do tacto, mas eles podem fornecer-lhe informações úteis sobre o que as cerca. O cheiro pode ajudá-la a orientar-se quando se desloca, e o paladar é precioso para a cozinha. No que se refere aos cheiros, a criança deve adquirir as seguintes faculdades: 1. Estar consciente dos cheiros. (Cheira-me a qualquer coisa!); No que se refere ao paladar, a criança deve: 1. Ser sensível às diferenças de paladar. (Este alimento é ácido, é doce,
está condimentado, está estragado, etc.) EXERCÍCIOS: 1. Reuna objectos e alimentos usuais e peça à criança que os identifique só pelo cheiro: cola; perfume; laranjas; petróleo; sabão; cerveja; caixa de conserva; peixe; cebolas; flor; fumados. Peça à criança que identifique os alimentos a seguir indicados, só pelo respectivo sabor: sal; pimenta; açúcar; limão; manga; caril. 2. Ensine a criança a determinar o estado dos alimentos através do seu cheiro. Por exemplo, distinguir entre: leite fresco e azedo; carne, frutos e legumes frescos e estragados; água limpa e suja; peixes e crustáceos frescos e deteriorados. Isso poderá evitar que a criança seja vítima de intoxicações alimentares devidas à ingestão de alimentos deteriorados. 3. Ensine a criança a reconhecer o cheiro das flores e árvores mais comuns. Esses cheiros poderão servir-lhe de referências nas suas deslocações. 4. Peça à criança que identifique um odor e avance em direcção a ele. Isso ajudá-la-á a determinar a proveniência dos cheiros. 5. Explique à criança. que determinadas divisões da casa, determinadas lojas e determinados lugares (casas de banho, lixeiras, padarias, etc.) exalam, por vezes, um cheiro característico. Isso ajudá-la-á a encontrá-los. 6. Incentive a criança a ajudar a mãe na preparação das refeições familiares, a fim de que aprenda a reconhecer o cheiro e o paladar de diferentes alimentos, crus e cozinhados. D - A VISÃO RESIDUAL Entende-se por visão residual os vestígios de visão que subsistem no indivíduo. É da maior importância que a criança aprenda a utilizá-la; poderá ser para ela o mais importante dos sentidos. Muita gente crê que, existindo uma visão residual, será preferível não a utilizar, pois isso deteriorará ainda mais a vista. É falso. Se a criança possui uma visão residual, é vivamente recomendável que a estimulemos a servir-se dela na medida do possível. Mesmo que a sua vista não possa ser melhorada, a criança pode aprender a explorar mais eficazmente o potencial que lhe resta de visão à distância e de visão próxima. 1. Visão à distância Certas crianças com uma visão residual têm dificuldade em se deslocar por não saberem utilizá-la. São capazes de ver, mas não sabem interpretar o que vêem. Não sabem observar, por assim dizer. EXERCÍCIOS: 1. Ensine a criança a adquirir uma visão selectiva, ou seja, a distinguir um objecto particular de entre muitos outros: (a) Coloque alguns copos de plástico em cima da mesa e peça à criança para
contá-los. Faça a criança recuar progressivamente até que os copos preencham
perfeitamente o seu campo de visão. Ponha outros objectos na mesa - tigelas e livros, por
exemplo -, e volte a pedir à criança que conte apenas os copos; 2. Ensine a criança a adquirir uma capacidade de exploração sistemática, ou seja, a observar sucessivamente tudo o que a rodeia: (a) Trace linhas verticais num quadro negro. Apegue vários segmentos de cada linha.
Peça à criança para se colocar diante do quadro e contar o número de interrupções
nas linhas. Procure que a criança observe bem toda a extensão do quadro, de um extremo
ao outro. Vá acrescentando, progressivamente, outras linhas interrompidas em diversos
outros pontos; 3. Ensine a criança a seguir objectos em movimento: (a) Peça à criança que corra conduzindo com os pés uma bola de cores vivas; 4. Ensine à criança a localização habitual de certos objectos: (a) Os painéis e placas de sinalização encontram-se geralmente colocados a uma
altura que ultrapassa a estatura de um homem; 2. Visão próxima A leitura e a escrita apelam para a visão próxima. Muitos "deficientes visuais" têm uma visão residual suficiente para lerem textos impressos em caracteres normais ou em caracteres ampliados. Muitas vezes, são obrigados a aprender Braille pela simples razão de frequentarem uma escola para cegos. É um erro. Se uma criança é capaz de ler caracteres de imprensa, dever-se-á dar-lhe livros comuns, e não livros em Braille. CONCRETAMENTE: 1. Dê à criança desenhos para colorir. Se ela não distinguir os contornos,
sublinhe-os a negro com uma caneta de feltro. Primeira etapa: Distinguir e reconhecer formas geométricas; umas pintadas de negro, outras não. Sobre rectângulos de cartão branco (ou de outra cor clara), desenhe quadrados, triângulos, círculos, rectângulos e losangos. Cada forma do mesmo tamanho deverá ser representada em quatro cartões (quatro círculos grandes, quatro círculos médios, quatro círculos pequenos, e assim por diante). Em dois cartões, pinte a forma de negro. Obterá assim dois círculos grandes negros, dois círculos grandes brancos, dois círculos médios negros, dois círculos médios brancos, etc. Peça à criança para: (a) identificar as formas (aqui é um losango, um quadrado, etc.); Segunda etapa: Distinguir e reconhecer desenhos de objectos totalmente pintados de preto; apenas limitados aos seus contornos; representados pelos contornos e alguns detalhes. Desenhe alguns objectos (taças, árvores, maçãs, flores, etc.) sobre cartões brancos. Cada objecto, por exemplo uma taça, será representado em seis cartões: em dois deles, pintado de preto; noutros dois, figurarão apenas os seus contornos; e com detalhes nos restantes dois (por exemplo, uma árvore com folhas). Obterá assim duas árvores pintadas de preto, duas árvores apenas delineadas nos seus contornos e duas árvores com folhas. A criança deverá identificar e agrupar os cartões. Terceira etapa: Distinguir e reconhecer: (a) Um objecto isolado entre grupos de objectos. Numa folha de papel, desenhe cinco
objectos alinhados (um cão, uma maçã, uma casa, um copo, etc.). Peça à criança para
indicar um dos objectos na folha. (Onde está a casa?) Quarta etapa: Reconhecer as palavras e as imagens. Desenhe uma maçã num cartão. Num outro, escreve a palavra "maçã". Peça à criança que junte os dois cartões. 11. Desenhe imagens a ponteado. Junto de cada ponto, escreva um número, e peça à
criança que complete os desenhos unindo os pontos 1 e 2, 2 e 3, etc. 2. ORIENTAÇÃO E LOCOMOÇÃO O ensino da orientação e locomoção não se limita ao das técnicas de utilização de guias, à aquisição das noções e capacidades que deverão anteceder o uso de uma bengala, ou à técnica da sua utilização propriamente dita. É necessário, além disso, desenvolver a mobilidade do corpo, consolidar a educação sensorial e estimular o desenvolvimentos de determinados conceitos. No que se refere ao modo correcto de ensinar as técnicas da utilização de guias, de criar os conhecimentos e as aptidões preliminares ao uso de uma bengala, e a técnica da sua respectiva utilização. A presente secção tratará das seguintes questões: A - Mobilidade do corpo. B - Educação sensorial: C - Desenvolvimento de conceitos: Algumas destas questões foram já tratadas neste manual, na secção consagrada à educação sensorial. Aqui elas serão apenas sucintamente abordadas nos aspectos em que tenham repercussões na orientação e locomoção. A - MOBILIDADE DO CORPO Sem uma adequada formação especial nesse sentido, a criança cega arrisca-se a não possuir um conhecimento correcto da mobilidade do seu próprio corpo e a ter movimentos desajeitados. Quando começar a andar, a criança poderá ter dificuldade em equilibrar-se, ou tender a manter uma postura muito rígida da parte superior do corpo. Poderá, porventura, não saber dobrar-se, ou ter tendência a caminhar com os pés muito afastados. Ao correr, poderá mexer rapidamente as pernas sem, com isso, avançar na mesma velocidade. Pecamos frequentemente por não ensinar a mobilidade. Pais e professores pensam que todas as crianças aprendem espontaneamente a correr, saltar e pular. Não se dão conta de que essas "competências" têm de ser adquiridas. As crianças que vêem fazem essa aprendizagem por imitação dos seus colegas. Correr não é objecto de um ensino formal; aprende-se pela observação e pela prática. Uma criança cega não poderá proceder assim. Ela ouvirá falar na palavra correr numa conversa qualquer, e dar-se-á conta de que se trata do movimento que o corpo faz ao "andar depressa", mas isso não lhe diz como mexer o corpo para correr. Pode ser necessário mostrar-lhe como movimentar as pernas, os braços, etc. Para esse efeito, o pai ou a mãe podem correr lentamente, ou sem sair do mesmo lugar, convidando a criança a tocá-lo(a), a fim de tomar uma consciência mais directa dos movimentos do corpo. Poderá também fazer mexer o corpo da própria criança para lhe mostrar os diferentes movimentos inerentes à corrida. Pode ser necessário ensinar as aptidões motoras e os movimentos que enumeraremos a seguir, dando à criança bastante tempo para aprendê-los e praticá-los: correr; saltar; saltar ao pé-coxinho; saltitar; marcar passo; rodar; saltar para a frente; fazer equilíbrio; voltar-se; tomar várias posturas EXERCÍCIOS: 1. Ensine a criança a andar como certos animais. Isso ajudá-la-á a descobrir diferentes maneiras de se deslocar. (a) Andar como o caranguejo. Sentar-se no chão. Apoiar-se nas mãos e nos pés,
e deslocar-se para a frente, para trás e para os lados. Não deixar cair o corpo,
esforçando-se sempre por mantê-lo afastado do chão. Para dar um carácter mais lúdico a este exercício, substitua os nomes destes animais pelo de outros que sejam familiares à criança. Peça-lhe que lhes imite as "vozes" enquanto anda. Poder-se-á igualmente ensinar-lhe diferentes modos de andar de seres humanos. Como anda um adulto? E uma senhora gorda? E um velho? Todos eles têm modos diferentes de caminhar. Podeis mostrá-lo à criança manipulando-lhe o corpo e os membros de forma a que ela se aperceba dos movimentos a efectuar. 2. Ensine à criança alguns dos movimentos que se seguem. Eles também contribuirão para familiarizá-la com os diferentes movimentos que pode ela executar. (a) O pião. Na posição de pé, saltar dando meia-volta no ar, de forma a
ficar voltado na direcção oposta à inicial. 3. Tome as providências necessárias para que a criança faça todas as manhãs
consigo os seguintes exercícios: Ao mesmo tempo que lhe ensinam movimentos, estes exercícios fortalecem fisicamente a criança. Em geral, estas crianças passam muito tempo sentadas, pouco se mexendo, o que não é saudável para elas. 4. Faça a criança saltar num só pé enquanto conta o número de saltos que vai dando. Se ela tiver dificuldade em manter o equilíbrio, dê-lhe as mãos, ou deixe-a apoiar-se na borda de uma mesa, de uma carteira, ou numa parede. 5. Faça a criança caminhar sobre uma trave de madeira deitada no chão (poder-se-á também usar uma vara grossa e comprida de bambu). Ao tentar fazê-lo, a criança melhorará o seu equilíbrio. Diga à criança que, procurando manter-se sempre em cima da tábua, tente andar lateralmente, para a frente e para trás. Se a vara de bambu rolar, mantenha-a no lugar fixando-lhe as extremidades com estacas, e certifique-se de que já não apresenta nenhum perigo. 6. Melhore a postura da criança pedindo-lhe que caminhe com um livro ou um cesto à cabeça. Muitas crianças cegas pendem a cabeça para a frente porque não mantêm o pescoço direito. Isso não é bom, nem para a postura, nem para os músculos das costas. Incentive a criança a manter-se sempre direita. 7. Corra com a criança, segurando, cada um, numa ponta de um lenço, ou de qualquer outro pedaço de pano. Corra ao lado da criança ou um pouco adiante, mas nunca atrás dela. Não puxe a criança; deixe-a correr ao seu ritmo. Verá que o pano, ou lenço, lhe será útil para guiar a criança durante a corrida. 8. Os jogos com corda são excelentes para a mobilidade e a coordenação das diferentes partes do corpo. Ensine a criança a saltar à corda. Não é fácil e exigirá tempo, treino e paciência, mas é um óptimo exercício, pouco dispendioso e bastante recomendável como actividade física. 9. Segure uma vara numa posição paralela ao solo. Peça à criança que veja a altura a que a mesma se encontra do chão e depois lhe passe por baixo sem lhe tocar. Vá aproximando progressivamente a vara do chão. 10. Os jogos com bola são também muito bons para desenvolver a mobilidade e, em particular, conforme os jogos, a coordenação dos pés e mãos. 11. É muito importante ensinar as crianças a voltarem-se correctamente. Elas têm que aprender "a sentir" em que consistem os quartos de volta, as meias voltas e as voltas completas, efectuados com precisão. (a) Mostre à criança como se voltar com precisão movendo os pés. B - EDUCAÇÃO SENSORIAL Já foram aqui descritos exercícios especiais de educação sensorial. Poderá reler essas sugestões. Em todo o caso, a questão da utilização de cada um dos sentidos para a orientação e locomoção não foi esgotada. 1. A audição A audição é o único sentido de "longo alcance" de que a criança cega dispõe. Podemos ouvir à distância, mas não podemos tactear e sentir senão as coisas que se encontram próximo de nós. A audição tem, pois, um papel particular a desempenhar no que respeita a ajudar a criança a deslocar-se em segurança e a não se perder. O ruído de um automóvel a passar na estrada indica-lhe não só que é perigoso atravessar nesse momento, como também a localização, direcção e sentido da estrada em relação a si própria. Se a criança ouvir um carro a dar uma curva ou a passar por barreiras sonoras, passará a saber onde está a curva, ou onde estão as barreira sonoras, relativamente a ela. Isso poderá ajudá-la a não se perder. Mas também pressupõe que ela é capaz de distinguir o barulho de um carro a dar uma curva, a afrouxar, etc. Ela tem também de ser capaz de discernir de onde provém o som. É por tudo isto que os exercícios sobre a localização dos sons que aqui foram descritos antes é tão importante. É preciso que conheça uma aptidão auditiva especial chamada visão facial. É provável que já a tenha experimentado. Numa noite muito escura, regressa a casa por um caminho ladeado de árvores ou arbustos. De quando em quando pára, porque "sabe" que há um ramo à sua frente. Pode não o ver mas, de algum modo, "sente" a sua presença. Estende então a mão, encontra o ramo, passa-lhe por baixo e prossegue o seu caminho. Isso não tem nada de mágico. A investigação mostrou que esta "visão facial" está associada à audição. O que se passa na situação anteriormente descrita é que chega até si um certo de eco, talvez do barulho dos seus próprios passos repercutido no ramo. É um efeito do tipo do que guia os morcegos nos seus voos nocturnos. Certas crianças cegas têm esta aptidão consideravelmente desenvolvida. Ao percorrerem determinado caminho podem ser capazes de contar o número de árvores por que vão passando, sem lhes tocarem. Podem, inclusivé, dirigir-se directamente para uma parede ou um muro, e parar antes de ir contra ele. 2. O tacto Uma criança cega utiliza o seu tacto para: (a) identificar obstáculos físicos (árvores, cercas, etc.); Quando passear com uma criança cega, lembre-se de lhe pedir para identificar o tipo de superfície que pisa, e para assinalar todas as alterações que essa superfície registe (textura, nível). Faça-a tocar e explorar os obstáculos físicos a fim de que possa reencontrá-los e identificá-los mais tarde, quando sozinha. De nada serve dizer-lhe "à tua direita, está uma cerejeira", sem a incitar a tocá-la e a gravar no seu espírito um certo número de dados (localização da árvore em relação a outros objectos interessantes que se encontrem nas imediações, caminho seguido para chegar até ela, impressão provocada pela árvore ao tocar-lhe). 3. O olfacto O olfacto faculta à criança informações úteis. Cada tipo de loja tem o seu odor. A padaria, a farmácia, o lugar de frutas e hortaliças, e a estação de serviço podem ser facilmente identificados pelo seu cheiro característico, o que poderá constituir uma indicação preciosa para a sua orientação (nomeadamente, para quando a criança pretenda deslocar-se a algum desses locais). O perfume das flores e das árvores pode, por vezes, sentir-se a uma distância considerável, fornecendo também à criança uma indicação acerca do local em que se encontra. Ainda graças ao seu olfacto, ela poderá evitar pisar imundícies que se encontrem no seu caminho. Incentive-a a identificar todos os cheiros que sinta e a encontrar a respectiva origem, indo tocar nas flores, entrando na padaria, etc. C - DESENVOLVIMENTO DE CONCEITOS Grande número de cegos tem dificuldade em apreender os conceitos de posição, de localização e de direcção. Se pedir a um deles para se inclinar, para colocar o livro no centro da carteira, ou para se voltar para a direita, não é certo que ele saiba do que é que lhe está a falar. Se lhe ensinar que um triângulo rectângulo isósceles tem três lados, um ângulo de 90º e outros dois de 45º cada, ele não saberá do que é que lhe está a falar se não compreender o significado das expressões triângulo, lado, ângulo, 90º e 45º. Isso pode resultar de um insuficiente desenvolvimento de conceitos. O que é um conceito? É uma representação, uma imagem ou uma ideia do que deveria ser uma qualquer coisa (Hill). Um conceito é formado a partir de um agrupar de objectos, de acontecimentos ou de experiências, em função do que há neles de comum. Toda a gente elabora conceitos. Se eu pronunciar a palavra "cão", o leitor formará uma imagem mental de um cão, apesar de os cães não serem todos idênticos. De facto, há uma imensidade de raças de cães. Mas todas elas tem certas características em comum que fazem dos seus exemplares "cães". Pelo facto de termos visto cães muito diferentes, brincado com eles, havê-lo ouvido ladrar, havê-los acariciado e termos visto imagens de cães, nós formámos uma ideia das características comuns que constituem um cão. Assim, quando vemos na rua um animal com quatro patas, nós estamos aptos a dizer se se trata ou não de um cão. Os nossos conceitos não se limitam a objectos concretos como cães, gatos, automóveis, etc. Eles estendem-se também a ideias abstractas como o amor, a honra e a beleza. Como são elaborados os conceitos? O processo envolve duas fases (Hill). Primeiro, retiramos informação do meio que nos rodeia. Recolhemos dados de toda a ordem e procuramos agrupá-los. Aprendemos, antes do mais, que uma determinada coisa existe e que ela difere (Ias outras. Em seguida, damo-lhe um nome. Temos, a partir daí, uma ideia "da coisa" no seu conjunto. À medida que acumulamos informação, vamo-nos familiarizando com os seus elementos e detalhes. Passamos, então, à etapa da generalização. Isolando certas constantes da coisa identificada, procuramos ver a que outras elas se podem aplicar, ou que outras coisas têm analogias com ela. Elaborámos, assim, um conceito. Assim exposto, poderá parecer complicado, mas, na verdade, todos nós estamos constantemente a elaborar conceitos. E sem que disso tenhamos consciência! É graças à vista que colhemos a maior parte da informação que chega do meio que nos cerca. Através dos nossos olhos conseguimos abarcar os objectos no seu conjunto. Os cegos não dispõem dessa faculdade. Quando apalpam um objecto, eles tacteiam sucessivamente os seus diferentes elementos para depois os agruparem mentalmente uma ideia da aparência global do objecto. Certos objectos não podem ser agarrados e explorados pelo tacto, ou porque são demasiado grandes, ou demasiado pequenos. ou demasiado frágeis. Tomemos, como exemplo, o conceito de casa. Uma casa é demasiado grande para que a criança possa tactear a totalidade dos seus diferentes elementos. Poderá servir-se de uma maqueta para obter bastantes informações acerca das suas formas: mas isso não lhe dará indicação das suas verdadeiras dimensões. Além disso, uma só maqueta nada lhe pode ensinar acerca de diferentes tipos de casas. Para que a criança elabore plenamente o conceito de casa, é preciso que possa examinar muitas maquetas diferentes e explorar, pelo tacto, uma casa verdadeira. Ela pode discernir a porta da entrada nas maquetas, mas e preciso que ela possa também tocar a das casas verdadeiras. Muitas crianças cegas, de tanto ouvirem falar as pessoas que vêem, são capazes de dar uma excelente descrição verbal das coisas, sem que delas tenham uma verdadeira compreensão. Limitaram-se a reter o que ouviram. É indispensável transmitir os conceitos a uma criança cega. Para isso: (a) Defina qual o conceito que pretende transmitir, e restrinja-se a ele. Não tente
ensinar seis ou oito ao mesmo tempo. 1. Conceitos corporais Os conceitos corporais (por vezes designados por "esquema corporal") representam o conhecimento das partes do corpo, suas funções e seus movimentos. Em muitas crianças cegas, eles são bastante rudimentares. Não compreendem totalmente as diversas maneiras como se podem mover as diferentes partes do corpo. Os seus movimentos são muito desajeitados porque não conceptualizaram suficientemente os seus corpos. Uma criança deve conhecer bem todas as partes do seu corpo. A começar pelas seguintes: cabeça, cabelos, dedos, olhos, pescoço, ancas, orelhas, ombros, pernas, nariz, peito, joelhos, boca, estômago, pés, dentes, costas, calcanhares, língua, braços, dedos dos pés, rosto, mão, punho, sobrancelhas, nádegas, tornozelo, queixo, maxilares, lábios. Com o tempo, é preciso familiarizar a criança com todas as partes do corpo de que se fala correntemente (inclusivé nas suas designações populares ou em gíria, como "cachimónia", "cachola", "carola" ou "caixa dos pirolitos", em vez de "cabeça". Quando a criança crescer, esta lista será aumentada, passando a incluir os órgãos sexuais masculinos e femininos e os órgãos internos. A criança deve saber: (a) A localização de cada parte do corpo. (Onde estão
os dedos dos pés?) A criança tem igualmente necessidade de conhecer as regiões ou zonas do corpo, tais como a parte da frente, a parte de trás, o lado, a parte superior e a parte inferior. EXERCÍCIOS: 1. Jogue com a criança a jogos como "O Tomás mandou". Após cada ordem,
pergunte à criança o que está ela a fazer. Isso torná-la-á ainda mais participante e
reforça verbalmente o conceito. O educador: "O Tomás mandou: Toca no teu joelho. Em
que é que tu tocas?" A criança: "Eu toco no meu joelho." Varie as ordens: 2. Cante cantilenas infantis e vá batendo as palmas no fim de cada estrofe. Depois, substitua as palmas por outros movimentos: piscar os olhos, tocar na cabeça, puxar a orelha, etc. 3. Ensine-lhe canções de roda como "Doidas andam as galinhas": "Doidas, doidas, doidas Acompanhe a cantiga com diferentes gestos. Podem cantar outras cantigas em que as palavras digam respeito a partes do corpo em que têm de tocar ou de mexer. 2. Conceitos espaciais Os conceitos espaciais respeitam fundamentalmente às noções de à frente, atrás, no topo, na base, em cima, em baixo, no interior, no exterior, etc. São conceitos importantes, e a criança tem de compreender-lhes o sentido numa larga gama de situações. Poderá também ensinar-lhe variantes ou variações desses conceitos, tais como: - à frente: diante de, em frente de, defronte, para a frente, em frente (direcção); É também preciso ensinar outros conceitos espaciais, tais como: perto de, próximo de, ao lado de, direita, esquerda, de lado, ao longo de, distante, longe, ao longe, próximo, vizinho, aqui, ali, contra, no sentido dos ponteiros do relógio (sentido directo), no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio (sentido retrógrado), oposto, do outro lado, paralelo, perpendicular, em volta, em direcção a, ao contrário, intermédio, entre, no meio, centro, diagonal, horizontal e vertical. Alguns destes conceitos são extremamente difíceis e, por vezes, imprecisos (por exemplo, um objecto pode "estar ao contrário" de várias maneiras). Logo que os ensine, aplique-os: 1. À própria criança; EXERCÍCIOS: 1. Aplicação à criança Dê ordens à criança; faça-a repeti-las e executá-las. O educador: Toca na planta do teu pé. Que vais fazer? Outras ordens possíveis: Deita-te. Rebola-te no chão. Levanta-te. Põe as mãos diante do corpo. Balança o teu braço no sentido dos ponteiros de um relógio. Mete o teu indicador na boca. Coloca a tua mão esquerda junto à orelha e a tua mão direita na diagonal do teu corpo. Note que todas estas instruções se relacionam com o corpo da criança. 2. Posição da criança em relação a objectos Transmita os mesmos conceitos espaciais, mas relacionando agora a posição da criança com a de um objecto (caixa, carteira, bola). Dê ordens à criança; faça-a repeti-las e executá-las. O educador: Põe as mãos debaixo da carteira. Que vais fazer? Outras ordens possíveis: Move o teu pé em direcção à parede. Põe a caixa em cima da cabeça. Mete-te debaixo da mesa. Põe a tua mão em diagonal sobre a carteira. Note que todas estas instruções fazem intervir uma parte do corpo da criança e um objecto. 3. Posição relativa de dois objectos Transmita a posição relativa de dois objectos. O educador: Põe o livro em cima da carteira. Que vais fazer? Outras ordens possíveis: Põe a cadeira ao pé da parede. Põe a cadeira do outro lado da sala, em frente da porta. Põe o teu prato no meio da mesa. Note que todas estas instruções fazem intervir conceitos de relação espacial entre dois objectos. Aqui não intervém o corpo da criança. 3. Os conceitos de esquerda e direita A criança deve ser iniciada nestes conceitos quando ainda pequena, devendo os mesmos ser constantemente reforçados. Procure utilizar as palavras "direita" e "esquerda" sempre que possível, de modo a que a criança tome contacto com elas nas mais variadas situações. CONCRETAMENTE: 1. Se uma criança tem dificuldade em distinguir a esquerda da direita, ate-lhe um cordel ou uma fita em redor do pulso esquerdo. Ao dar-lhe as ordens ou instruções, utilize ambas as palavras: esquerda e fita. "Levanta a mão esquerda - a que tem a fita." Suprima progressivamente a palavra "fita", servindo-se unicamente de "esquerda". "Levanta a mão esquerda." Quando a criança já souber qual é a sua mão esquerda, retire-lhe a fita. 2. Sempre que tiver de referir-se a ambas as palavras, esquerda e direita, comece sempre por "esquerda". Isso ajudará a construir os conceitos de sentido utilizados na leitura e na escrita. 3. Não se esqueça de ensinar as noções de esquerda e direita em contextos que tenham a ver com: (a) partes do corpo (orelha esquerda, orelha direita), 4. Faça sentir à criança que, à semelhança do que se passa com ela e com outros objectos, também as outras pessoas têm um lado esquerdo e um lado direito. Note que, para as outras pessoas, eles não dependem da posição da criança em relação e elas. A sua mão esquerda é sempre a sua mão esquerda, seja qual for o lado para que a criança se encontre voltada. Trata-se de um conceito que pode ser difícil de assimilar pela criança. De facto, é um conceito que também coloca problemas a inúmeros adultos que vêem normalmente. Assim, quando se encontrar de frente para alguém, não se esqueça de que o lado esquerdo dessa pessoa não está do mesmo lado que o seu. Se pretender que ela se volte para a janela que está à sua esquerda, terá de dizer-lhe: "Volte-se à direita." A isso chama-se "direccionalidade". Para ensiná-la, comece por proceder do seguinte modo: (a) Coloque-se ao lado da criança, atrás ou à frente dela, olhando na mesma direcção. Peça-lhe que localize e toque em partes do seu corpo (na sua orelha esquerda, na sua perna direita) ou que lhe passe objectos (Põe a bola na minha mão esquerda. Coloca o lado esquerdo do livro junto da minha orelha direita.). (b) Coloque-se de frente para a criança e peça-lhe que localize diferentes partes do seu corpo. Será agora mais difícil, dado que o seu lado esquerdo se encontrará em frente ao lado direito da criança. 4. Pontos cardeais Os pontos cardeais - Norte, Sul, Este e Oeste - são muito importantes pois são sempre constantes. São independentes da posição em que se encontre a criança. O Norte é sempre o Norte; ao passo que o lado esquerdo da mesa valia com a posição em que se encontra a criança. A imutabilidade dos pontos cardeais ajuda as crianças a orientarem-se nas suas deslocações. É-lhes mais fácil lembrarem-se de uma série de instruções baseadas nos pontos cardeais do que de uma série de instruções baseadas nas noções de esquerda e direita. É-lhes igualmente mais fácil, quando se baseiam nos pontos cardeais, retomar essas instruções começando pela última, de modo a voltarem ao ponto de partida e estabelecerem itinerários alternativos a seguir em caso de necessidade. EXERCÍCIOS: 1. Quando começar a ensinar os pontos cardeais, faça-o usando como referência um mostrador de relógio. O 12 corresponde ao Norte, o 3 ao Este, etc. Isso ajudará a criança a dar-se conta da posição relativa das quatro direcções. 2. Nessa fase, procure que a criança se volte sempre para Norte. Ensine-lhe as outras direcções relativamente a esse ponto cardeal (o Sul é atrás, o Este fica à direita e o Oeste à esquerda): (a) Diga à criança para se voltar para os diferentes pontos cardeais, seguindo as
suas indicações. Utilize os termos "esquerda" e "direita"
conjuntamente com os nomes dos pontos cardeais. Faça a criança regressar sempre à
posição inicial (voltada para o Norte) antes de lhe dar uma nova ordem. Se a criança tiver dificuldade em se voltar numa dada direcção, faça-a apontar nessa direcção antes de se voltar. Talvez ela tenha mais dificuldade em se virar exactamente 90º e 180º do que em indicar os pontos cardeais. 3. Coloque a criança de frente para o Norte e diga-lhe em que direcção ela se encontra voltada. Coloque-se diante dela, atrás dela e ao seu lado, e batam as mãos: (a) Pergunte à criança em que direcção você se encontra em relação a ela. Ela
responde: "Estás a Norte (a Sul, etc.) de mim." 4. Mostre à criança diversos locais da escola ou de casa dela, e situe-os em
relação a este ou aquele ponto cardeal: 5. Peça à criança que descreva o caminho que percorre para se deslocar de casa até à escola, utilizando os pontos cardeais em vez das noções de direita e esquerda. 6. Quando estiverem a treinar a orientação e a locomoção, empregue os pontos cardeais em lugar das noções de esquerda e direita. 7. Enquanto a criança aprende os pontos cardeais, vá-lhe fazendo bastantes perguntas
a fim de reforçar a aquisição dos conceitos: 8. Fabrique uma bússola para a criança, em papel com as letras em Braille. De cada vez que se voltar, a criança deverá igualmente voltar a bússola de maneira a que ela aponte na direcção que fica na sua frente. 5. Conceitos relacionados com aspectos da vida quotidiana É preciso que uma criança aprenda os conceitos básicos relacionados com a sua vida quotidiana. Eles ajudá-la-ão a familiarizar-se com o modo como se articula o espaço que a circunda. Ser-lhe-á assim mais fácil não se perder e planificar os seus itinerários. Um grande número desses conceitos, como os de rua e de quarteirão, não evocam configurações sempre idênticas. Há inúmeras variantes, mas a criança tem de assimilar os conceitos de base antes de poder apreender essas variantes. Um quarteirão, por exemplo, é fundamentalmente composto por quatro lados e tem a forma de um rectângulo, mas não é sempre esse o caso; há alguns com três ou cinco lados. Para que a criança se aperceba dessas variações é preciso, em primeiro lugar, que ela tenha assimilado a forma de base. A mesma coisa se passa com outros conceitos relacionados com aspectos da vida quotidiana. Nem todas as ruas são direitas. Nem todos os cruzamentos têm quatro ângulos. Mas antes que a criança comece a apreender as variantes (ruas que encurvam, entroncamentos, etc.) é necessário que lhe tenham transmitido os conceitos de base. CONCRETAMENTE: 1 . Comece por ensinar à criança os conceitos mais fundamentais: (a) o passeio ladeia a calçada; Transmita esses conceitos utilizando maquetas e esquemas; depois, conduza a criança aos próprios locais para reforçá-los através da experiência concreta. Diga à criança para caminhar e tocar no passeio. Peça-lhe que dê uma volta ao quarteirão e que conte quantos lados tem o mesmo. Diga-lhe que fique de um lado da rua enquanto você vai para o outro. Fale-lhe de lá, para que ela se dê conta da largura da rua. 2. Inicie a criança em conceitos mais elaborados, utilizando os pontos cardeais: (a) As ruas são orientadas segundo a direcção Este-Oeste ou Norte-Sul, mas não
segundo Este-Norte. 3. Uma vez que a criança tenha compreendido os conceitos fundamentais relacionados com aspectos da vida quotidiana, poderá começar a iniciá-lo nas respectivas variantes: (a) Nem todas as ruas são orientada exactamente segundo a direcção Norte-Sul. Transmita estes conceitos utilizando igualmente maquetas e esquemas: deslocando-se depois com a criança aos próprios locais. 3. O ÁBACO O ábaco, criado na Ásia, é uma calculadora manual. Só recentemente ele foi adoptado pelos cegos. Com o treino, é possível utilizá-lo para efectuar adições, subtracções, multiplicações, divisões, cálculo decimal e operações envolvendo percentagens e fracções, bem como obter raízes quadradas. Existe uma belíssima obra em inglês para o ensino das diferentes utilizações do ábaco: THE ABACUS MADE EASY, de Mae E. Davidow, 1978. Este livro é editado pela American Printing House for the Blind. Nele se explica cada etapa das diferentes operações e é fácil de seguir. Muitas são as razões que poderão incitá-lo a ensinar as crianças deficientes visuais a servirem-se do ábaco. O emprego deste instrumento pode, com efeito, facilitar a aprendizagem: 1 . reforçando os conceitos matemáticos; Ao ensinar a utilizar o ábaco, é preciso não esquecer: 1. Familiarizar o aluno com esse instrumento antes de começar a ensiná-lo a resolver
problemas de matemática. Mande-o contar-lhe as bolas e exercitar-se no seu manuseamento. NOTA: Mesmo se o ábaco não for o auxiliar principal de que a criança se sirva em Matemática, a sua utilização poderá, de qualquer modo, ser-lhe ensinada. Constitui um excelente meio de apreender e assimilar os conceitos matemáticos. 4. LEITURA E ESCRITA DO BRAILLE Esta secção abordará as seguintes questões: A - O desenvolvimento do sentido do tacto antes da aprendizagem do Braille. B - Exercícios preparatórios da aprendizagem do Braille. C - A mecânica da leitura do Braille. D - O alfabeto Braille: E - A leitura do Braille: F - O Braille abreviado G - A pauta e o punção
A - O DESENVOLVIMENTO DO SENTIDO DO TACTO Antes de começar a aprender a ler e a escrever em Braille, a criança tem de apurar a sua percepção táctil e de se habituar a utilizar os dedos com destreza. Se ele não souber servir-se muito bem das mão, há que treiná-la antes de iniciá-la no alfabeto Braille. Recorra aos exercícios sugeridos quando tratámos do sentido do tacto na secção dedicada à educação sensorial. Lembre-se que o desenvolvimento do tacto exige tempo e exercícios variados. Importa também, nesta fase, que a criança comece a tomar consciência da linguagem escrita (Olson). As crianças que vêem tomam consciência dela muito cedo. Elas vêem os pais a ler o jornal. Vêem símbolos escritos quando passeiam, quando brincam. Ainda que não saibam o que as letras significam, começam a compreender que elas existem e que os objectos têm um nome que pode ser escrito. A criança deficiente visual não possui esse trunfo. Para despoletar essa tomada de consciência, será útil colar etiquetas em Braille sobre diversos objectos. Cole nas costas de uma cadeira uma etiqueta em Braille onde esteja escrita a palavra "cadeira". Faça o mesmo com a cama da criança, a escova de dentes, a porta da casa, etc. Os pais deverão indicar-lhe onde se encontra a etiqueta e insistir para que a toque. A criança não será capaz de lê-la, mas começará a aperceber-se de que o Braille existe e que pode ser utilizado para escrever o nome dos objectos. Será igualmente útil que transcreva para Braille um livro de histórias para a criança. Escreva os caracteres Braille por cima das letras a negro. Assim, a criança poderá seguir, linha por linha, a história que o pai ou a mãe lhe vai lendo. Ao princípio, será porventura necessário que o adulto coloque as mãos da criança sobre o Braille e as faça deslizar ao longo das linhas à medida que vai lendo o texto. Essas duas actividades ajudarão a criança a familiarizar-se com o Braille e contribuirão para que tome consciência da existência de uma linguagem escrita. B - EXERCÍCIOS PREPARATÓRIOS DA APRENDIZAGEM DO BRAILLE Uma vez que a criança tenha desenvolvido a sua capacidade de discriminação táctil e a destreza dos dedos, faça-a executar diversos exercícios antes de a iniciar no Braille. Dessa forma, a criança treinar-se-á a: 1. deslocar as mãos da esquerda para a direita Estes exercícios são muito úteis e podem anteceder a aprendizagem do Braille, quer tratando-se de crianças, quer de adultos. Eles ajudam a fazer uso das mãos e estimulam a sensibilidade táctil necessária à apalpação dos pontos, sem exigirem que se saiba que letras eles representam. Acontece muitas vezes que, sem estes exercícios, a pessoa que aprende a ler Braille nunca consegue mover correctamente as mãos, o que é importante para aumentar a rapidez da leitura. Ela passa o tempo a tentar identificar os pontos inscritos em cada rectângulo e não tem a possibilidade de adquirir um bom movimento das mãos. Pode-se realizar estes exercícios antes de aprender o alfabeto Braille, e depois, como "aquecimento" antes de cada lição de leitura. As folhas de exercícios são fáceis de produzir. Se os pontos se esbaterem, faça-as de novo. Isso levar-lhe-á escassos minutos. Procure evitar dar erros. O exercício tornar-se-á mais difícil para a criança se ela tiver de distinguir os pontos das marcas da borracha. Os pontos deverão estar limpos e nitidamente marcados. Lembre-se ainda de que estes exercícios não se destinam a ensinar o alfabeto Braille, pelo que deverá abster-se de referir o nome das letras. Exercício A - Seguir as linhas em Braille: Exercício B - Seguir a linha em Braille e indicar as descontinuidades: Exercício C - Seguir a linha em Braille e indicar qual o ponto mal colocado: Exercício D - Seguir a linha em
Braille e identificar a forma mal colocada: Exercício E - Seguir a linha em Braille e contar os pontos: Exercício F - Seguir a linha em Braille e dizer quantos rectângulos contêm pontos: Exercício G - Seguir a linha em Braille e contar todas as formas semelhantes à
primeira, ou encontrar a forma que é (ou não é) semelhante à primeira: Exercício H - Seguir a linha em Braille e indicar se os pontos se encontram dispostos
vertical ou horizontalmente: C - A MECÂNICA DA LEITURA DO BRAILLE Ao começar a aprender Braille, uma criança deverá adquirir os seguintes hábitos (Orson): 1. Manter uma boa postura CONCRETAMENTE: 1. Certifique-se de que a criança esta sentada com as costas bem direitas e de que o
texto em Braille está a uma altura cómoda. Se a carteira for demasiado alta, a criança
ver-se-á obrigada a erguer-se para manusear o livro, o que a fatigará. D - O ALFABETO BRAILLE 1. O ensino oral do alfabeto A criança deve aprender o alfabeto oralmente, antes de começar a aprender as letras em Braille. Utilize canções e jogos baseados no alfabeto. À medida que aprende o alfabeto, a criança deve aprender também o som das letras. Deve aprender que "A" se pronuncia "a", que "V" se pronuncia "vê", etc. Esse é um aspecto particularmente importante: (a) dar-lhe-á conhecimentos fundamentais que serão utilizados na leitura; EXERCÍCIOS: 1. Faça com a criança o seguinte jogo: Dê-lhe uma palavra e pergunte-lhe por que som e por que letra ela começa. O educador: "Por que letra começa a palavra sabão?" Dê um objecto à criança e pergunte-lhe por que letra começa. 2. Repita o exercício anterior, mas perguntando à criança qual é a última letra da palavra. O educador: "Por que letra termina a palavra funil?" 3. Dê uma letra à criança, e peça-lhe que lhe diga cinco palavras começadas por essa letra: B = bola, barco, botão, bombom, batata. 4. Dê à criança três palavras, duas das quais comecem pelo mesmo som e a terceira
por um som diferente. Peça-lhe que identifique a palavra diferente: Aumente, progressivamente, o número de palavras. Faça o mesmo exercício mas com os
sons finais. NOTA: Todos estes exercícios podem ser executados seja em que língua for. Não necessita de empregar o Português. Dê à criança palavras na sua própria língua; invente-as. 5. Jogue ao alfabeto. O educador: "Eu vou ao mercado comprar um..." (um produto cujo nome comece
pela letra A, como "alperce"). 2. o ensino do alfabeto escrito Há duas maneiras de ensinar o alfabeto Braille: 1 . Ensine as letras seguindo a sua ordem alfabética - A, B, C, ... até Z, e depois
as letras afectadas de sinais diacríticos - à, á,... Se um destes dois métodos não der bons resultados, experimente o outro. Tenha o cuidado de: (a) não avançar demasiado depressa ou ensinar demasiadas letras ao mesmo tempo - caso
contrário, a criança confundi-las-á; Escolha palavras que a criança conheça e utilize. Deverá ensiná-la a soletrá-las. É possível que nem sempre ela consiga fazê-lo correctamente, mas isso pouco importa. O objectivo é fazer com que a criança se vá, pouco a pouco, habituando a escrever coisas e não apenas letras. EXERCÍCIOS: 1. Prepare cartas sobre as quais irá escrever letras em Braille. Destaque o canto
superior esquerdo da carta, ou inscreva uma linha de caracteres Braille por baixo das
letras, para a criança saber a posição em que deve utilizá-las. Caso contrário, não
se poderá distinguir certas letras como o F e o D, ou o H e o J. Escreva ainda na carta a
respectiva letra a negro, para verificar mais rapidamente se a criança leu correctamente
a letra em Braille. E - A LEITURA DO BRAILLE A criança deverá ser iniciada na leitura desde o momento em que começa a aprender a escrever o alfabeto Braille. O ensino da leitura do Braille visa desenvolver as mesmas capacidades que a leitura de textos impressos. É ao professor que compete o ensino da leitura, mas você poderá também contribuir de vários modos. CONCRETAMENTE: 1. Escreva letras a negro por cima das letras em Braille, para permitir a quem o esteja a ensinar ir seguindo o aluno à medida que ele lê. 2. Certifique-se de que a criança vai utilizar o mesmo livro que os seus colegas de turma. 3. Verifique se o livro se encontra adaptado à experiência e à cultura da criança. Se o livro falar de uma ida ao mercado, trate de saber se a criança já teve oportunidade de fazê-lo. Se não, leve-a a um mercado, para que ela descubra do que se trata, quais os seus cheiros característicos, etc. 4. Se utilizar um livro suplementar para dar lições particulares à criança,
certifique-se de que o mesmo se encontra adaptado à experiência dela. Se o livro falar
de elefantes e camelos, que a criança nunca viu nem tocou, tem três possibilidades: 5. Se não houver nenhum livro a ser utilizado na classe, deverá escrever um. É assim
que muitos professores ensinam a leitura aos seus alunos. Organiza-se uma actividade para
a turma: um passeio, por exemplo. Depois, os alunos descrevem-no por escrito. Se o
professor utiliza este método, providencie para que a narração ou o relatório que a
turma elaborou por escrito acerca da saída efectuada lhe seja entregue, e transcreva-a
para Braille logo que possível. Certifique-se, entretanto, de que a descrição: 1. O método global aplicado às palavras conhecidas À medida que as crianças aprendem a ler, devem exercitar-se no reconhecimento global das palavras fundamentais sem terem de decifrá-las letra por letra. O mesmo se deverá passar com as crianças que lêem Braille. Logo que tocam um certo grupo de letras (pontos), elas reconhecem a palavra sem identificarem cada letra. Quando as crianças não são capazes de aplicar este método, e lêem as letras uma por uma, fá-lo-ão muito lentamente e terão dificuldade em ler. Quando acabam de decifrar uma palavra, já terão esquecido a anterior. CONCRETAMENTE: 1. Esforce-se no sentido de que certas palavras sejam frequentemente repetidas. Elas
podem ser utilizadas nas lições de leitura, de ortografia e de escrita. 2. As palavras novas A criança deve habituar-se a descobrir por si própria as palavras que não conhece. Um dos meios de o conseguir é pronunciá-las. É muito importante empregar este método porque ele ajuda a criança a reconhecer palavras novas por si mesma, o que lhe permitirá melhorar a sua capacidade de escrita. A criança deve começar a aprender a pronúncia das palavras desde os primeiros estádios de aprendizagem preparatórios da leitura. Deverá aprender os sons fundamentais das letras ao mesmo tempo que aprende o alfabeto. Logo que conheça os sons das letras do alfabeto, inicie-a nos sons correspondentes à associação de duas letras, como "nh", "lh" "gr", "fr"; depois, de três letras, como "pra", "gru", "dis", etc. Repare que muitos destes sons correspondentes a duas ou três letras, se escrevem em Braille por meio de um símbolo de abreviatura ortográfica. O momento próprio para começar a ensinar-lhe esses símbolos dependerá da idade da criança e do seu nível de capacidade de leitura. Recorra aos exercícios anteriormente sugeridos para o ensino oral das letras do alfabeto e respectivos sons. CONCRETAMENTE: 1. Dê à criança uma lista de palavras novas e peça-lhe que as pronuncie. Ajude-a, escrevendo as palavras com um intervalo a separar cada sílaba. Em certas línguas, as letras podem ter sons diferentes conforme a palavra em que se encontrem. Em Português, a letra A não se pronuncia da mesma maneira em "taco" e em "lupa". Outras línguas há, no entanto, em que as letras têm sempre o mesmo som. Em Indonésio, por exemplo, o A pronuncia-se sempre aberto como em "taco". 2. Dê à criança três ou quatro sons e peça-lhe para combiná-los de forma a compor uma palavra. 3. Dê à criança uma palavra e peça-lhe para encontrar uma outra que rime com ela. 4. Sempre que, no decurso de uma leitura, a criança encontre uma palavra que não conheça, ajude-a a pronunciá-la em vez de lhe dizer o que é. 3. O contexto O contexto geral de uma mensagem pode permitir subentender certas palavras que o compõem. Procure habituar a criança a fazê-lo, pedindo-lhe que execute os exercícios que sugerimos a seguir. EXERCÍCIOS: 1. Após a criança ter lido uma história, apague algumas das principais palavras que nela intervinham. Peça-lhe que releia a história tentando repor as palavras que lhe faltam. 2. Escreva frases omitindo uma palavra. Assegure-se de que o resto da frase ajuda a
descobrir a palavra que falta. Peça à criança para encontrar essa palavra relendo a
mensagem para reflectir no seu conteúdo. 3. Quando, no decurso de uma leitura, a criança encontrar uma palavra que não conhece, diga-lhe que passe adiante e leia o resto da frase. Ele poderá tentar descobrir a palavra através do contexto. F - O BRAILLE ABREVIADO O Braille abreviado deve ser ensinado tão cedo quanto possível. Ele ajudará a criança a melhorar a sua apetência para a leitura e a ler mais depressa. Aprender a escrever e a ler uma palavra apresentada sob uma forma não abreviada, memorizá-la globalmente, e depois aprender a lê-la e a escrevê-la sob uma nova forma, desorientará a criança. Ela é forçada a aprender uma coisa que depois terá de "desaprender" para aprender uma outra de novo. Ensine-lhe logo à primeira o que ela deve saber, e evitar-lhe-á este tipo de complicações. E isto é tão válido para o Inglês como para o Árabe, o Francês ou o Alemão. Se a língua comportar uma ortografia abreviada, utilize-a. Para inúmeros educadores, começar por aprender o Braille abreviado terá repercussões negativas na ortografia. É, em parte, verdade; mas isso não significa que seja necessário evitar o abreviado. Simplesmente, deverá ensinar a ortografia correcta das palavras abreviadas, nas lições de ortografia. Muitos símbolos não sofrem qualquer alteração (o "tb" de também, por exemplo). Poderá ensinar os símbolos representativos das palavras inteiras, durante as lições de ortografia. Certos educadores dizem que o Braille abreviado é demasiado difícil para as crianças mais pequenas. Eles pensam, com razão, que há demasiadas coisas para aprender. Mas esquecem-se de que muitos dos símbolos não figuram nos livros de leitura elementares, cujo vocabulário é limitado. Não encontraremos termos como "personalidade" ou "presentemente" nos primeiros livros de leitura. Não terá, pois, necessidade de ensinar as formas abreviadas correspondentes a palavras que só muito mais tarde aparecerão nos livros da criança. Deverá ensinar apenas os símbolos usados nos livros em que a criança aprende a ler no momento. Alguns educadores não gostam de ensinar o Braille abreviado porque não o dominam suficientemente bem e têm consciência disso. Isso não é um modo correcto de tratar a criança. O educador deveria consagrar mais do seu tempo a rever o Braille abreviado, ou escrever os símbolos numa folha de papel para consultá-los em caso de dúvida. Ensine o Braille abreviado logo desde o início. Faça uma lista dos símbolos que a criança aprendeu. Se ela encontrar um que não conheça, reporte-se a essa lista. Se ela simplesmente o tiver esquecido, reveja-o com ela. Se nunca o tiver aprendido, ensine-lho. Não é justo permitir que uma criança se debata com uma coisa que não lhe foi ensinada. Se ela não aprendeu um símbolo, diga-lhe o que ele significa, e peça-lhe que continue a ler a história. G - A PAUTA E O PUNÇÃO Por muito desembaraçada que seja a criança a escrever na máquina Braille, ela deverá aprender a servir-se da pauta e do punção. Na maior parte dos casos, a máquina que utiliza durante a sua escolaridade não lhe pertence. Pertence à escola, e nela ficará depois da criança dela sair. Uma máquina de escrever Braille é cara, e o seu custo ultrapassa as possibilidades financeiras da maioria das famílias. Se a criança tiver acesso a uma máquina Braille durante o seu período de escolaridade, perfeito! Mas isso não significa que não deva aprender a utilizar também a pauta e o punção. 5. LIVROS GRAVADOS Podemos aumentar o número de conhecimentos à disposição da criança deficiente visual, gravando livros em cassetes audio. Os livros gravados apresentam diversas vantagens: 1. A gravação de livros não exige nenhuma formação especial. Os livros gravados têm também dois inconvenientes: 1. Não ajudam a aprender a ler. Por consequência, todos os manuais escolares básicos deverão ser transcritos, seja para Braille, seja para caracteres ampliados. Os livros gravados podem servir como leituras suplementares". Regras a observar na gravação de um livro: 1. Existem vários tipos de gravadores e de fitas magnéticas. O tipo de aparelho mais corrente é o leitor e gravador de cassetes. É o que normalmente se utilizará para gravar livros, preferencialmente em relação aos modelos de bobina: 2. Escolha uma sala calma para efectuar as gravações. Feche as portas e as janelas para evitar qualquer ruído de fundo: 3. Leia-o ou, pelo menos, dê "uma vista de olhos" pelo livro antes de começar a gravá-lo. Isso familiarizá-lo-á com o respectivo conteúdo e adverti-lo-á quanto à presença de palavras difíceis; 4. Comece cada cassete pelas seguintes indicações: (a) título do livro; 5. Se lhe acontecer tossir ou necessitar de aclarar a voz durante a gravação de um livro, apague a correspondente zona da fita e volte a gravar a passagem. Esses ruídos não deverão figurar na gravação porque distraem consideravelmente o ouvinte. 6. Leia a uma velocidade normal e no tom habitual da leitura. Não tente "representar" a história, empregando diferentes vozes para diferentes personagens. Não junte ao texto efeitos dramáticos, como suspiros, gritos ou outras manifestações de emoção. Só um actor experiente se consegue sair bem desse tipo de exercício. 7. Não se dirija à criança num tom condescendente e evite "falar à bebé" quando ler histórias para crianças. Não introduza frases do género: "Agora, senta-te e abre bem os ouvidos porque te vou ler uma história..." 8. Soletre todos os nomes próprios difíceis (que designem lugares ou pessoas) quando os ler pela primeira vez. 9. Sempre que encontre no texto uma imagem ou um esquema útil à compreensão do livro, explique-o por palavras. Prepare antecipadamente, por escrito, essa explicação a fim de tê-la preparada no momento da gravação. Se a imagem tiver apenas intuitos decorativos, não comportando qualquer informação adicional relevante, ignore-a. 10. Não altere uma única palavra do livro! Leia-o exactamente tal como ele está escrito. Se o texto contiver palavrões que se recuse a ler, peça a uma outra pessoa que grave o livro. Não efectue nenhuma gravação com omissões. Também não introduza modificações no enredo da história. Mesmo que tenha um fim triste, isso não lhe dá o direito de transformá-lo num fim feliz. Lembre-se de que você não é o autor, nem o editor da publicação, nem censor. O seu papel consiste apenas em reproduzir fielmente o texto, aquando da gravação do livro. 11. Não junte efeitos sonoros ao texto. Eles distraem consideravelmente o ouvinte. Os efeitos sonoros resultam bem num programa radiofónico; não num livro gravado. 12. Uma fita magnética nunca deve terminar a meio de uma frase ou de um parágrafo. 13. Quando finalizar a gravação, coloque em cada cassete uma etiqueta indicando, em Braille e a negro: número da cassete/número total de cassetes gravadas com a obra em causa. Essas indicações permitirão a si e ao ouvinte verificarem se têm toda a sequência das cassetes do livro. 14. Não se esqueça de voltar atrás, para indicar no início da fita - nos tais 15 segundos reservados para o efeito - os números das páginas gravadas na cassete. 15. Certifique-se de que a criança sabe trabalhar com o gravador. 16. Peça a outras pessoas que gravem livros por si. Assim, poupará tempo. Assegure-se de que esses colaboradores compreenderam e observaram as regras aqui expostas. 6. A ESCRITA A NEGRO A maioria dos educadores de crianças cegas negligencia esta importante dimensão da formação. Eles crêem que uma criança totalmente cega não tem necessidade de aprender a escrever a negro, e que uma com visão reduzida aprenderá automaticamente a escrever bem. Estão enganados. Qualquer que seja a condição da sua vista, todas as crianças têm necessidade de praticar neste domínio. 1. Aprendizagem da escrita por crianças totalmente cegas Não é necessário ensinar todas as letras do alfabeto a uma criança totalmente cega. Bastará que ela aprenda, para começar, as letras que compõem o seu nome, a fim de poder assiná-lo. Isto aplica-se, aliás, também aos cegos adultos. Não há razão para que um cego seja obrigado a assinar com uma cruz ou apondo a sua impressão digital. Ter de agir assim dá, aos outros e a si próprio, a impressão de ser um ignorante. Se uma criança que já saiba assinar, mostrar desejo de aprender outras letras, há que ensinar-lhas. Isso poderá talvez vir até a permitir-lhe escrever pequenas notas destinadas a pessoas não cegas. Não é fácil ensinar uma criança cega a escrever, pois a escrita faz apelo à vista. Uma criança cega não está em condições de verificar os resultados do seu trabalho, nem de avaliar os progressos efectuados. É preciso fornecer-lhe bastantes indicações acerca das suas realizações. Prepare-se para um longo período de treino e paciência até que a criança seja capaz escrever o seu nome. Comece por ensinar-lhe movimentos amplos. Ela terá de aprender a segurar na caneta e desenvolver os músculos responsáveis pelos movimentos finos dos dedos antes de começar a ensaiar o traçado das diferentes letras. EXERCÍCIOS: 1. Peça à criança para pegar em lápis de cor e tratar grandes círculos numa folha de papel. Não se importe com o resultado da experiência. O exercício tem por finalidade ensinar a criança a segurar num lápis com à vontade e começar a sentir os mecanismos do movimento da mão. Neste exercício, poderá igualmente utilizar o quadro negro. 2. Numa página, disponha cinco ou seis pontos de Braille, e peça à criança que trace linhas entre esses pontos. Isso ajudá-la-á a habituar-se a levar um lápis ou uma caneta de um ponto a outro. 3. Numa folha de papel, trace linhas de Braille a formarem quadrados e peça à criança para os colorir. Desenhe quadrados cada vez mais pequenos. Isso ajudará a criança a trabalhar em espaços mais limitados. Colocando uma pequena moldura sob a folha, dará à zona colorida um relevo que a criança poderá distinguir pelo tacto. Desenhe outras formas simples, para além dos quadrados. 4. Trace duas linhas de Braille a toda a largura da página. Peça à criança que desenhe círculos ou traços verticais entre as duas linhas, esforçando-se por não sair delas. Aproxime progressivamente as duas linhas. Procure que a criança trabalhe sempre no sentido da escrita. Se estiver a aprender letras do alfabeto latino, deverá, consequentemente, desenhar da esquerda para a direita. Se estiver a aprender a escrever o seu nome em Árabe, deverá treinar a escrita da direita para a esquerda. 5. Ensine à criança as letras que compõem o nome dela, pela ordem em que nele figuram. Por exemplo, se o nome da criança for Paulo, ensine-lhe primeiro a escrever o "P" maiúsculo. Uma vez que já saiba desenhar essa letra, passe ao "a", e assim por diante. Ensine-lhe uma só letra de cada vez. 6. Cada letra do alfabeto pode apresentar uma grande diversidade de formas. Escolha a mais simples. Pouco importa que as letras que ensina tenham a configuração de caracteres de imprensa ou manuscritos. O que interessa é que a criança consiga escrevê-los e lê-los com facilidade, e não que se atenha a um determinado tipo de escrita. 7. Ao ensinar a criança a desenhar uma letra, faça-a primeiro escrevê-la em grande, indo depois reduzindo, a pouco e pouco, o seu tamanho, por forma a ir ocupando um espaço menor. O mesmo se aplicará à assinatura da criança. No início, diga-lhe para escrever o nome em caracteres grandes para aprender a movimentar a mão de moda a dar a forma correcta às letras; depois, que vá reduzindo progressivamente o tamanho das mesmas. 8. Construa um "cartão de assinatura com janela" que irá ajudar a criança a escrever dentro de um espaço restrito. Recorte um rectângulo no meio de um cartão. Quando a criança tiver de assinar o seu nome, coloque esse cartão sobre a folha de papel, de forma a que o espaço rectangular coincida com o sítio onde a assinatura deverá figurar. A criança poderá então assinar, utilizando os bordos do rectângulo como limites de referência. Não se esqueça de que a criança não consegue ver o que escreveu. É a si que cabe dar-lhe todas as informações necessárias. Assim sendo, não a deixe a trabalhar sozinha. Deverá permanecer a seu lado para poder, de imediato, corrigi-la, felicitá-la e encorajá-la. 2. A aprendizagem da escrita pelas crianças com visão reduzida As crianças com visão reduzida não aprenderão a escrever só o seu nome. Elas deverão aprender todas as letras do alfabeto, bem como os números, os sinais de pontuação, etc. Deverão acompanhar as aulas de escrita das demais crianças da sua turma (sem problemas de visão). CONCRETAMENTE: 1. Dê à criança papel branco com linhas carregadas, ou acentue-lhe as linhas do caderno de modo a que ela as distinga melhor. 2. Recomende-lhe que se sirva de uma caneta de feltro ou de tinta preta; o que lhe permitirá escrever caracteres mais marcados do que com um lápis. 3. Verifique a iluminação, assegurando-se de que a visão da criança não está a ser perturbada por reflexos ou por sombras. 4. Faça a criança escrever sobre uma ardósia branca com canetas de feltro que assegurem um bom contraste. Procure, no entanto, evitar os reflexos. 5. Ensine a criança a traçar correctamente as letras. Muitas crianças com visão reduzida aprenderam a escrever observando a forma das letras. Em seguida, treinaram o seu traçado à sua maneira, executando, muitas vezes, movimentos incorrectos que as obrigam a escrever com maior lentidão. Assegure-se que a criança executa os movimentos correctos. Por exemplo, para escrever a letra "b", começa-se por desenhar um traço de cima para baixo e, depois, um semicírculo no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. Não se deve começar pelo semicírculo. 6. É frequente as crianças com visão reduzida serem pouco cuidadosas na apresentação dos trabalhos que executam, tendo tendência para borrar o que escrevem. Incite-as a manter os seus papéis bem arrumados e limpo o local onde trabalham. Poderá ser-lhe de grande utilidade um arquivador, em que a criança possa guardar todas as suas folhas. 7. DACTILOGRAFIA [N.T. Em Portugal. o ensino da utilização da máquina de escrever foi (ou está a ser) substituído pela utilização do computador. Este capítulo deve ser considerado a luz do ano em que foi escrito e, essencialmente, à luz do seu objectivo primordial que consistiu em ajudar a educação de deficientes visuais nos países em desenvolvimento.] Todas as crianças deficientes visuais deveriam aprender a escrever à máquina logo que hajam adquirido uma boa coordenação dos dedos e força suficiente. É importante para essas crianças, pois é uma maneira de comunicarem por escrito com pessoas não cegas que não lêem o Braille. Se a criança utilizar uma máquina de escrever para fazer os seus deveres escolares, as suas redacções, etc., o professor poderá facilmente corrigir os seus trabalhos. Se a criança quiser escrever uma carta a um amigo não cego, bastar-lhe-á utilizar uma máquina de escrever para que esse amigo possa ler a carta. Um bom conhecimento de dactilografia poderá igualmente ajudar a criança a encontrar um bom emprego um dia mais tarde. Bastantes cegos exercem, com sucesso, a profissão de secretários, de telefonistas, de recepcionistas e de programadores, profissões que exigem conhecimentos nessa área. Para ensinar a criança a escrever à máquina, não necessita de ser um especialista em dactilografia, mas é preciso, todavia, que saiba quais são as técnicas correctas. Se, por exemplo, você só utiliza dois dedos quando dactilografa, mas sabe, apesar disso, o que os outros oito dedos devem fazer, poderá ensinar a dactilografar. Se não souber nada do assunto, compre ou peça emprestado um manual de dactilografia. Eles contêm todas as indicações básicas de que necessita e numerosos exercícios. O ensino da dactilografia a crianças deficientes visuais não é significativamente diferente do seu ensino a crianças que vêem. As únicas excepções dizem respeito às acções que, de uma maneira geral, exigem a intervenção da vista, como o verificar se o papel está bem colocado, ou fazer correcções. Adaptações metodológicas serão, nesses casos, necessárias. Eis alguns princípios a reter: 1. Explique à criança o funcionamento da máquina de escrever. Ela deve aprender para que serve cada tecla e cada botão do teclado. Deverá igualmente aprender a limpar a máquina, a substituir a fita, etc. 2. Ensine-a a manter uma boa postura enquanto dactilografa. 3. Impeça a criança com visão reduzida de olhar para os dedos. Ela deve aprender a localizar cada tecla sem olhar. Todas as pessoas que aprendem a dactilografar devem respeitar esta regra, se pretenderem vir a escrever depressa. 4. Assegure-se de que a criança coloca correctamente os dedos nas teclas do meio. Se ela tiver dificuldade em encontrá-las, coloque marcas tácteis sobre as teclas "F" e "J" - pontos de cola, ou pedacinhos de lixa. 5. Insista para que a criança utilize os dedos convenientes para dactilografar. A tecla correspondente à letra "A" é sempre accionada com o dedo mínimo da mão esquerda; nunca com outro. 6. Quando a criança já dactilografar melhor, ela própria se dará conta de nove de cada dez erros que der. A fita de correcção é mais fácil de utilizar do que um corrector líquido. A criança sente, pelo tacto, qual a face da fita da correcção que deve colocar sobre o papel, porque cada um dos lados tem uma textura diferente. 7. Se não tiver uma máquina de escrever, peça uma emprestada. Muitas escolas têm máquinas de escrever que poderão emprestar uma meia hora por dia. 8. Se não encontrar um manual de dactilografia, lembre-se de que as teclas do meio são (da esquerda para a direita), Q, S, D e F para a mão esquerda, e J, K, L e M para a mão direita. A cada dedo correspondem certas teclas. [Estas indicações referem-se a máquinas de dactilografia com o teclado internacional.] Dedo mínimo da mão esquerda (Q): teclas A e W 9. A criança pode certificar-se de que a folha está bem colocada na máquina, começando por introduzi-la no rolo da máquina; depois, accionando a patilha que liberta o papel, poderá alinhar, entre si, as margens superior e inferior da mesma. Quando os dois lados estiverem paralelos, fixa a folha, baixando a patilha. Poderá então andar com o rolo para trás até que a margem superior do papel esteja exactamente paralela à barra de posicionamento. 8. ACTIVIDADES DA VIDA DIÁRIA As actividades da vida diária compreendem os cuidados e higiene pessoais, os cuidados domésticos e a cozinha. A maioria das crianças sem problemas de visão aprende a maior parte dessas técnicas atra vês da observação das pessoas que as rodeiam, praticando-as depois para ajudarem os pais. Ao verem alguém a varrer o chão, imitam-no As crianças cegas não podem, naturalmente, observar esse tipo de coisas. Elas podem ouvir alguém a varrer, e perceber, apenas através do barulho, o que essa pessoa está a fazer; mas isso não lhes diz na da acerca de como ela o faz. É preciso mostrar-lhes como se faz, ajudá-las e deixá-las experimentar e praticar até que saibam varrer convenientemente. Não é uma coisa que se aprenda simplesmente de ouvido. É frequente os educadores não ensinarem nada especificamente relacionado com a temática das actividades da vida diária às crianças que frequentam estabelecimentos de ensino regular, dado tal não constar dos programas escolares. A maior parte desses conhecimentos é transmitida em casa e é aí que é preferível ensiná-los. Mas os educadores não controlam se a criança é ou não verdadeiramente capaz de realizar sozinha essas actividades. Perguntam-lhe, por exemplo, se ela é capaz de varrer. Se ela responder: "Com certeza!", eles não procurarão certificar-se da veracidade da resposta. É importante observar a maneira como a criança se desembaraça no cumprimento das suas actividades. É que, apesar da criança se poder revelar capaz de cumprir a tarefa, poderá acontecer que se chegue à conclusão de que existiria uma adaptação ou uma técnica que lhe permitiria levá-la a cabo mais fácil e rapidamente. Muitas vezes, as crianças cegas não têm de aprender técnicas especiais para as suas actividades da vida diária. Elas podem fazer os mesmos gestos que as criança não cegas, bastando, pois, ensinar-lhes como devem fazê-los. Assim, não há, por exemplo, qualquer diferença entre a maneira como uma criança cega e uma não cega se lavam. Ambas têm de utilizar água e sabão e proceder do mesmo modo. Vezes há, no entanto, em que uma técnica especial pode ajudar uma criança cega a levar mais facilmente a cabo certas actividades. Essas actividades apelam geralmente para os outros sentidos: o tacto, a audição, o paladar e o olfacto. Para encher um copo com água, uma criança não cega vai despejando água no copo até ver que o nível do líquido já está próximo do bordo, ao passo que uma criança cega tem de se servir de uma indicação táctil ou auditiva para saber quando parar. Quando uma criança não cega pretende vestir a sua camisa amarela, basta-lhe abrir o armário e retirá-la, enquanto que a criança cega tem de dispor de uma qualquer indicação o táctil que lhe permita distinguir a camisa amarela da branca. Para sugestões relativas ao desempenho das actividades da vida diária, consulte as referências no fim deste manual. É importante que as crianças deficientes visuais dominem o maior número possível de actividades da vida diária para não estarem dependentes de outrem. Se não forem autónomas, ver-se-ão na necessidade de esperar por alguém que possa ajudá-las, o que é um inconveniente, não só para a própria criança, mas também para todos os que com ela convivem. Ao ensinar essas actividades, não perca de vista os seguintes princípios: 1. Divida cada actividade em pequenas operações que a criança domine facilmente. Comece por ensinar a primeira; depois, a segunda, etc. Certifique-se de que a criança assimilou bem cada operação antes de passar à seguinte. 2. Seja realista, e assegure-se de que o seu ensino está de acordo com a idade da criança. A maioria das crianças não cegas de cinco anos não cozinha. Não pretenda, pois, que uma criança cega de cinco anos prepare as refeições familiares. 3. Trabalhe em estreita cooperação com a família da criança. É preciso que todos saibam o que a criança pode fazer em casa para reforçar a sua aprendizagem. Se a ensinou a escolher e limpar legumes, a mãe deverá fazer com que ela, em casa, também o faça. 4. As crianças adquirem essas aptidões através do treino e da prática, e não pela frequência de cursos teóricos. Reserve bastante tempo a trabalhos práticos. 5. Reuna todos os equipamentos e utensílios necessários antes de iniciar a actividade. Isso permitir-lhe-á ganhar tempo durante a lição. 6. Certifique-se de que a criança sabe onde se encontram esses utensílios e que consegue encontrá-los facilmente. 7. Assegure-se de que a criança sabe utilizar correctamente cada um dos utensílios ou aparelhos (faca, fogão, serra, lâmina de barbear, garfo), sem correr o risco de se magoar. 8. Redija um plano de trabalho em que exponha o modo correcto de operar e enumere todas as operações pela sua respectiva ordem de execução. 9. No fim de cada actividade, certifique-se de que a criança limpa e arruma todos os materiais e utensílios nos seus devidos lugares, para que possam ser facilmente encontrados quando voltarem a ser necessários. Segue-se uma listagem parcial das actividades da vida diária que a criança deficiente visual deve ser capaz de executar. Procure iniciar a criança nessas actividades de acordo com a idade conveniente, trabalhando em estreita cooperação com a família para que esta permita que ela as pratique em casa.
vestuário 2. Cuidados domésticos varrer e lavar o chão 3. Cozinha fazer as compras CAPÍTULO 5 As crianças com deficiência visual utilizam os seguintes tipos de materiais (Lowenfeld): 1. Materiais que são utilizados na sua forma original (blocos, sementes, etc.) 2. Materiais que requerem alguma modificação ou adaptação (cartas de jogar, textos em Braille, jogos, etc.) 3. Materiais que foram construídos especialmente para crianças cegas ou com visão reduzida (mapas em grandes caracteres, livros em Braille, etc.) 4. Materiais que permitem experiências de substituição (Modelos de animais, aviões, casas etc.) 5. Materiais que proporcionam experiências de substituição (modelos de animais, aviões, casas, etc.) Neste capítulo referimo-nos especialmente aos materiais referidos em 2. - materiais que requerem modificação ou adaptação para uso de crianças com deficiência visual. A maior parte das adaptações podem ser feitas pelo professor de apoio. Não precisam de ser artistas para adaptar esse material, mas é essencial ser criativo. Devem também colocar questões tais como: Como posso transcrever este texto ou este gráfico de modo a que possa ser compreendido pela criança? Têm de apresentar os materiais em relevo para uma criança cega e em caracteres ampliados para uma criança com visão reduzida. Antes de iniciar a adaptação dos materiais devem certificar-se de que têm os equipamentos necessários. Comecem por ter um estojo de instrumentos para adaptação de materiais e desloquem-se com ele sempre que vão apoiar as crianças. Muitas vezes os materiais têm de ser adaptados na presença das crianças e não podem fazer isso se não tiverem os instrumentos convosco. Precisam de um recipiente para colocar os instrumentos. Uma pequena mala de plástico com um fecho pode servir perfeitamente. Ponham os seguintes instrumentos na caixa: - Tesouras; Não se esqueçam de trazer sempre o vosso estojo, pois de outro modo arriscam-se a perder tempo e a fazer perder tempo aos vosso alunos. Ao adaptarem material, optem pela solução mais fácil. Podem levar quatro horas ou quinze minutos a adaptar um texto. Se o texto for utilizado uma única vez, optem pela solução dos quinze minutos. Se for um material que irá ser utilizado inúmeras vezes pode ser necessário gastar um pouco mais de tempo com ele. Sempre que possível, adaptem o material de forma a que ele possa ser usado tanto pelas crianças deficientes visuais como pelas de visão normal. Se adaptarem um jogo e utilizarem letras ou números em Braille, usem igualmente escrita a negro. Deste modo a criança cega poderá brincar com os seus amigos com visão. Quando adaptar materiais não pense que eles devem sempre ter o mesmo aspecto que os exemplares impressos. O que interessa é que ensinem o mesmo conceito. Por exemplo, se estiver a adaptar um exercício de matemática em que se pede à criança que conte quantos patos estão em fila, não terá que cortar formas de patos e colocá-los numa folha. Será mais fácil colar botões ou usar pontos de Braille. Aquele exercício tem por objectivo ensinar a contar e não dar uma lição sobre patos. Não interessa se a forma for relativa a patos, botões ou pontos de Braille. Figuras tácteis que são formas de patos, árvores, cães ou gatos, podem ser agradáveis à vista mas não trazem grande informação às crianças cegas. Pensem no que vão fazer antes de adaptar determinado material. Coloquem a si próprios as seguintes questões: 1. O que é que este material educativo pretende ensinar EXEMPLO: Têm de adaptar uma ficha de exercícios em que há pontos numerados para serem unidos entre si. A sua primeira reacção poderá ser a de pensar que esse exercício não é importante para uma criança cega. Contudo, reflectindo um pouco mais, dar-se-á conta de que se as demais crianças têm essa tarefa para fazer, não há razão para o seu aluno ser dispensado. Levantam-se, então, quatro questões: Questão 1: O que é que esta ficha pretende ensinar? Questão 2: Porque é que a criança não pode fazer este exercício na sua
forma original? Questão 3: Como é que eu posso adaptá-la? Questão 4: Tenho todos os apetrechos de que necessito? USE A SUA IMAGINAÇÃO 1. Faça desenhos em relevo utilizando linhas de Braille, fita-cola ou adesivo, pedacinhos de lixa, tirinhas de folha de coqueiro, filas de pedrinhas coladas, cordel, fio, agrafos, etc. 2. Faça um desenho de ângulos, em relevo, desenhando-os com o auxílio de um lápis e colando tirinhas de folha de coqueiro sobre as linhas desenhadas. 3. A criança precisa de medir esses ângulos? Faça um transferidor em cartão e coloque-lhe, a servir de escala, pontos Braille de 10 em 10 graus, ou compre um transferidor de plástico com a escala em relevo - os números não serão em Braille, mas poder-lhe-á colar pontos ou números em Braille de 45 em 45 graus. 4. Se tiver de ensinar conjuntos, subconjuntos, intersecções, etc., faça círculos encurvando tirinhas de folha de coqueiro até lhes dar essa forma. Cole ou ate as extremidades. Faça dois círculos desses para representar os conjuntos. Para ensinar as intersecções sobreponha parcialmente os círculos. 5. Como adaptar um esquema? Reproduza em linhas de Braille o desenho de base e cole o papel sobre um cartão. Muna-se de alfinetes, e espete-os nos pontos correspondentes às intersecções de linhas no esquema impresso. Ligue os alfinetes entre si através de um cordel para que a criança possa sentir as curvaturas que o esquema apresenta. 6. Uma folha de exercícios acerca de imagens simétricas ou invertidas, pode ser simulada através da utilização de um ramo de coqueiro com o mesmo número de folhas de ambos os lados. Retire três folhas do lado esquerdo, e diga à criança que faça o mesmo do lado direito. 7. Precisa de uma régua com um metro? Corte um pau com um metro de comprimento, e faça-lhe sulcos de centímetro a centímetro. CAPÍTULO 6 Na qualidade de educador especializado, deverá indicar à escola ou ao seu superior hierárquico o equipamento e os utensílios necessários, e assegurar-se de que esses objectos são devidamente colocados à disposição da criança. Frequentemente, os responsáveis pelos estabelecimentos de ensino desconhecem qual o tipo de equipamento necessário e onde podem adquiri-lo. Faça uma lista dos objectos indispensáveis, respectivos fornecedores e preços. Assim, terá essas informações sempre à mão quando lhe perguntarem do que necessita. Seja realista no que toca a seleccionar os artigos verdadeiramente indispensáveis. Seria, naturalmente, muito agradável poder dispor de uma calculadora equipada com voz, ou de uma máquina de escrever eléctrica, mas será que são realmente precisas? Não haverá coisas mais úteis em que gastar o dinheiro disponível? Em geral, sai mais económico fabricar uma coisa do que comprá-la já feita. Se não puder fabricar o objecto que pretende, informe-se da possibilidade de poder adquiri-lo localmente, antes de tratar de importá-lo. Todo o papel que possa encontrar no mercado local e que possa servir como papel Braille será mais barato do que papel importado. O equipamento e os utensílios de que irá necessitar dependerão do tipo de programa educativo que ponha em prática, e do grau de visão dos seus alunos. Se é um educador itinerante, terá de ter uma secretária ou uma bancada sua em cada escola que visita. Para um aluno que lê livros impressos a negro não precisará de ter livros em Braille. Por outro lado, os seus alunos deverão dispor de uma carteira e de um local onde guardem os seus materiais e utensílios. Habitualmente, é a escola a fornecê-los. Não se esqueça de que uma criança cega necessita de uma carteira mais espaçosa do que uma criança que vê. Os livros em Braille, as máquinas Braille e os utensílios indispensáveis ao uso do Braille ocupam bastante mais espaço do que os livros e os papéis vulgares. As crianças com visão reduzida também necessitam de mais espaço para os livros impressos com caracteres ampliados. É muito importante dispor de um local para a arrumação do material. Uma máquina Braille é cara, devendo ficar fechada à chave durante a noite. Os livros em Braille são demasiado espessos para serem empilhados na prateleira que existe debaixo da maioria das carteiras. A criança terá, pois, necessidade de um outro local onde possa arrumá-los. Desde que tenha idade para isso, ela deverá verificar, no final de cada dia de aulas, se todo o material está convenientemente arrumado. Para as crianças cegas haverá, provavelmente, necessidade do material e utensílios seguintes: - papel e máquina Braille; As crianças com visão reduzida poderão necessitar de: - canetas de feltro; CAPÍTULO 7 Se a criança demonstrar dificuldade em acompanhar determinada matéria, você será, muito provavelmente, solicitado no sentido de lhe assegurar um apoio pedagógico ou de encontrar alguém que o faça por si. Se a dificuldade manifestada se dever à deficiência visual da criança, você será, porventura, a pessoa mais indicada para a auxiliar. Se, no entanto, essa dificuldade se dever a outras causas, como, por exemplo, o facto de a criança ser mais fraca nessa matéria específica, um dos seus condiscípulos ou qualquer outra pessoa poder-lhe-á dar lições particulares. Certas crianças necessitam de mais ajuda do que outras. Não sendo o apoio pedagógico regido por nenhuma regra em particular, as sugestões que se seguem poderão, todavia, revelar-se de alguma utilidade. 1. Antes de tentar ajudar a criança, certifique-se se conhece bem a matéria em questão. Se pretender ensinar-lhe a divisão de fracções, verifique, antecipadamente, os seus próprios conhecimentos a esse respeito. 2. Procure definir com exactidão os pontos em que reside a dificuldade manifestada. Se o professor tiver assinalado dificuldades na leitura, determine a que nível, ou níveis, se situam essas mesmas dificuldades: no Braille abreviado, na compreensão do texto, nas palavras novas, na velocidade da leitura? Quando tiver identificado exactamente a dificuldade, ser-lhe-á muito mais fácil ajudar a criança a ultrapassá-la. 3. Após ter circunscrito o problema, reflicta sobre os exercícios, as lições e os auxiliares didácticos que poderão ser úteis. Se não estiver seguro quanto ao que deverá ser feito, peça sugestões ao professor ou a um dos seus colegas. 4. Divida o conteúdo da aprendizagem em pequenas unidades. Certifique-se de que o aluno assimilou bem uma unidade e treinou suficientemente a aplicação dos respectivos conhecimentos, antes de passar à unidade seguinte. 5. Se for necessário um apoio pedagógico intensivo, leve a criança para uma sala ou um gabinete onde possa ficar a sós com ela. Se não houver um local disponível, leve-a para o exterior e instalem-se à sombra de uma árvore. Se ela necessitar apenas de um pequeno apoio, permaneçam na sala de aulas. Assim, o professor poderá ver o que fazem e como o fazem. 6. O objectivo do apoio pedagógico é proporcionar uma ajuda numa área ou matéria, a fim de que a criança possa permanecer na classe regular. Procure recuperá-la ao nível dos restantes colegas para que possa reintegrar-se na turma o mais depressa possível. 7. Se a criança não progride bem numa matéria por falta de livros didácticos adaptados, não é de apoio pedagógico que ela precisa, mas sim de meios de aprendizagem. Muito mais do que a dar-lhe um apoio constante, deverá, nesse caso, empregar o máximo possível de tempo a elaborar os materiais didácticos ou a gravar os textos indispensáveis à criança. 8. Se a criança tiver necessidade de um apoio pedagógico, não hesite em pedir auxílio aos seus pais e família. Dever-lhes-á dar directrizes precisas, sendo de toda a conveniência que eles se associem à educação da criança. 9. Seja realista quanto às suas expectativas. Se uma criança tem maus resultados em Matemática porque não é muito dotada para essa disciplina, não espere que ela se venha a tornar uma excelente aluna na mesma. Mas se ela tiver maus resultados em Matemática por ser preguiçosa ou por falta de exercício, aí poderá esperar uma melhoria se lhe multiplicar o número de exercícios e a fizer trabalhar mais. 10. Assegure um apoio pedagógico desde o momento em que a necessidade do mesmo se faça sentir em alguma matéria. Não o remeta para mais tarde. Se uma criança tiver acumulado dois anos de atraso na leitura, fazê-la recuperar levará muito tempo. 11. Se houver outras crianças com dificuldades nas mesmas matérias que o deficiente visual, ausculte o professor quanto à possibilidade de você próprio ou alguma outra pessoa poder fazê-los trabalhar em grupo. Dessa forma, todas as crianças com necessidade de apoio pedagógico beneficiariam, e a criança deficiente aperceber-se-ia de não ser o único aluno da turma a ter problemas nessa matéria. 12. Lembre-se de que não é obrigado a assegurar pessoalmente todo o apoio pedagógico. Tente arranjar quem o auxilie. Peça a outros professores do estabelecimento ou a outros alunos da turma que o ajudem. CAPÍTULO 8 O educador especializado deve servir de elo de ligação entre a casa e a escola. Cumpre-lhe manter os pais e a família ao corrente dos progressos escolares da criança. Se ela faltar à escola devido a problemas em casa, deverá explicar ao professor o que se passa. Deverá deslocar-se regularmente ao domicílio da criança. Os pais devem saber como o seu filho progride na escola. É preciso explicar-lhes como podem ajudá-lo a reforçar os seus conhecimentos e as capacidades que ele está a adquirir. Eles poderão obter essas informações falando consigo. Se a criança estiver a aprender a servir-se de uma bengala para se deslocar da escola para casa, e os pais não forem informados a esse respeito, provavelmente não a deixarão treinar-se no seu uso. A maioria dos professores tem 30a 40 alunos a seu cargo e não têm tempo de se deslocar a suas casas. Quando efectuar essas visitas, tenha em atenção as seguintes considerações: 1. Efectue visitas regulares. Não se desloque a casa do aluno só quando houver algum problema. Se só o fizer quando a criança tiver contrariedades ou problemas, os pais passarão a associar as suas visitas a más notícias e não ficarão muito contentes ao vê-lo. 2. Informe os pais dos sucessos da criança. Sempre que ela fizer bem alguma coisa, diga-lhes. Isso estimulará a sua confiança nela. 3. Lembre-se de que você não é nem psiquiatra nem conselheiro conjugal. Se houver problemas no seio da família, não é a si que compete tentar resolvê-los. É bom que esteja consciente desses problemas (na medida em que eles se podem repercutir na criança), mas você não tem nem a formação nem os conhecimentos necessários para lhes fazer face. 4. As conversas de ordem privada que escutar ou tiver no decurso das suas visitas deverão permanecer confidenciais. Não deverá comentar com os seus amigos esse tipo de conversas ou quaisquer informações a respeito da família da crianças 5. Avise a família da sua intenção de visitá-la, antes de o fazer. Mande um recado pela criança, no sentido de saber se os pais dela estarão em casa em tal ou tal data e hora. Isso evitar-lhe-á deslocar-se em vão, caso a mãe tenha saído para ir às compras e o pai esteja no trabalho. 6. Não visite só um dos pais. Deverá encontrar-se com o pai, com a mãe, e até com outros membros da família. Todos têm um lugar importante na vida da criança e devem estar informados do seu bem-estar, dos seus progressos e do seu desenvolvimento. 7. Não se esqueça de que a criança tem também os seus direitos. Ninguém gosta de que falem de si nas suas costas. Esclareça a criança acerca do que irá discutir com os pais dela. Melhor ainda, faça por que ela esteja presente durante as suas visitas. 8. Pergunte aos pais se há alguma coisa que eles desejem que ensine à criança. É natural que eles tenham uma ideia mais precisa dos domínios em ela necessita de uma ajuda suplementar. CAPÍTULO 9 Enquanto educador especializado, você tem inúmeras responsabilidades. Eis aqui dez sugestões destinadas a facilitar-lhe as suas tarefas. 1. Comece desde já a reunir materiais Quando se começa a construir um auxiliar didáctico, ou quando se tenta preparar um exercício de educação sensorial, nada há de mais frustrante do que nos apercebermos de que não dispomos dos materiais apropriados. Perdemos horas à procura de seis seixos, de uma garrafa de plástico adequada, ou de cinco pedaços de tecidos de texturas diferentes. Comece, desde já, a juntar objectos desse tipo. Não deite nada fora. Mais dia menos dia, encontrará utilidade para tudo. E isto também se aplica a todo a material didáctico que tenha fabricado e às ideias que tenha ensaiado. Se um determinado auxiliar táctil se revelou útil, conserve-o para uma posterior reutilização. Se uma dada ideia funcionou, anote-a por escrito para a não esquecer. 2. Planifique racionalmente as suas deslocações entre escolas Se tiver de visitar crianças em duas escolas próximas uma da outra, tente fazê-lo no mesmo dia. Isso fá-lo-á ganhar tempo e evitar-lhe-á voltar todos os dias à mesma zona. 3. Estabeleça uma boa comunicação: A - Com o Director da escola. Previna-o da data da sua visita. Sempre que lá vá,
passe pelo seu gabinete, a fim de dar conhecimento da sua presença no estabelecimento de
ensino. Ele tem o direito e o dever de saber sempre quem se encontra no interior da sua
escola. Se levar consigo um convidado, um superior hierárquico ou um observador,
apresente-o ao Director antes de ir ver a criança. Em que é que isso lhe poderá facilitar o seu trabalho? Porque, com isso, poderá contar mais facilmente, em caso de necessidade, com a colaboração do Director e dos demais professores, com quem estabeleceu boas relações. Se tiver de sair com uma criança para uma lição de orientação e locomoção no exterior do estabelecimento, o Director dará de melhor vontade o seu consentimento, uma vez que o conheça e tenha confiança em si. Se pretender introduzir determinadas ideias, os outros professores apresentarão uma maior disponibilidade para confrontarem as suas ideias com as deles próprios, se já o conhecerem. 4. Saiba manter-se no seu lugar Quando for visitar uma criança a uma sala de aulas, lembre-se de que é um convidado, na sala e no resto do estabelecimento. Está lá para facultar uma ajuda suplementar à criança e ao respectivo professor, mas não para supervisar o trabalho deste último. Se ele se sentir ameaçado pela sua presença, nada deteriorará mais rapidamente as vossas relações. Você não é nem um superior hierárquico dele, nem um espião a soldo do Director da escola. Se desaprova a forma como um aula de noções de higiene é ministrada, refira cortês e diplomaticamente outros métodos pedagógicos que tenha tido ocasião de ver postos em prática; depois, não volte a tocar no assunto. 5. Não guarde os seus conhecimentos só para si Quando lho perguntarem, explique o que está a fazer, a razão por que ensina isto ou aquilo, ou porque é que utiliza este ou aquele auxílio, tanto mais facilmente elas o auxiliarão quando disso necessitar. Dar-se-ão conta de que ensinar uma criança cega não implica truques de magia e tornar-se-ão mais participativos. 6. Apele para as boas vontades É preciso construir um auxiliar didáctico? Gravar um livro? Encontrar alguém que leia em voz alta para a criança? Procure voluntários. Eles ajudá-lo-ão e fá-lo-ão ganhar tempo. Terá de explicar-lhes exactamente o que pretende e como fazê-lo, mas isso será largamente compensado pelo tempo que economizará depois. Não utilize essas boas vontades só para fabricar auxiliares didácticos e livros. Se tiver uma criança que esteja aprender a servir-se de uma bengala, e que precise de se treinar, arranje um voluntário para trabalhar com ela. Se a criança tiver necessidade de exercícios suplementares para contar e subtrair objectos, encontre alguém que lhe dedique um quarto de hora por dia. Será preciso que lhes dê alguma formação, também nesses campos, para que saibam exactamente o que podem ou não fazer, mas, tudo contabilizado, representará, para si, um ganho de tempo. 7. Tome diariamente notas referentes a cada criança Consagre uma secção do seu caderno de anotações a cada criança de que se ocupe. No
final de cada lição, anote por escrito: Essas notas são para seu próprio uso; não precisa de redigir um longo relatório. Restrinja-se às indicações que facilitem a organização do seu trabalho. Não lhe tomará mais que três minutos e fá-lo-á ganhar bastante tempo pois não terá de se perguntar o que é que ensinou na sessão anterior ou o que terá de levar consigo quando for dar a próxima lição. 8. Prepare-se devidamente Organize-se e prepare-se antes de ir visitar uma criança a uma escola. Em que é que vai trabalhar hoje? Tem todo o material necessário'- Tem as lições de leitura que vai transcrever para Braille? Perderá tempo, seu e da criança, se não for já com tudo devidamente preparado. Também não será correcto face à criança. Se não conseguir organizar-se e preparar-se antes de ir à escola, é preferível que não vá. Para a criança, será mais proveitoso ficar na aula e seguir as actividades normais, do que permanecer sentada a seu lado enquanto você tenta preparar a sua lição. 9. Mantenha-se em contacto com outros educadores especializados Eles podem-lhe dar ideias e material. Se necessitar de uma obra que algum deles tenha já transcrita para Braille, talvez possa pedir-lha emprestada. Dessa forma, ganhará tempo e poupará trabalho. 10. Aproveite as suas deslocações para reflectir Enquanto se desloca no seu carro, na sua bicicleta, ou a pé, para ir de uma escola a outra, aproveite para reflectir na sua próxima lição. Reveja-a mentalmente a fim de ficar perfeitamente preparado para leccioná-la. Pense no que irá necessitar na semana ou no mês seguintes. Tome as suas notas do dia. Isso ajudá-lo-á a manter-se organizado.
1. À data da realização desta obra, J. Kirk Horton exercia funções de
cooperação na área da educação de deficientes visuais na Indonésia e verifica-se que
está presente nesta obra a preocupação em encontrar respostas que sejam acessíveis a
países em desenvolvimento.
publicado por MJA |